quarta-feira, 11 de março de 2020

Mídia 10/03

DOS JORNAIS DE 10/03:O grande destaque das capas dos jornais é o dia de pânico nos mercados internacionais. O risco de recessão global existe, mas o presidente Jair Bolsonaro está alheio a tudo. Pior, ele atua para aumentar a pressão sobre o Congresso. A conjuntura faz com que surja um debate sobre a necessidade de o governo estimular a economia através de gastos públicos ou se a agenda de reformas é a “solução” para o país. Mesmo nos jornais que costumam ouvir apenas economistas ligados ao mercado, há divisão entre especialistas.
Enquanto isso, Jair Bolsonaro radicaliza seu discurso e afirma que houve fraude nas eleições de 2018. O presidente disse ter provas, mas não as apresentou. É a primeira vez que Jair Bolsonaro ataca o sistema eleitoral desde que foi eleito. Os jornais trataram a notícia sem grande polêmica ou destaque. A tentativa de causar fervor no país pode ser reflexo da disputa nas redes. Empresas de análise afirmam aos jornais que o bolsonarismo está perdendo espaço, que apenas os mais radicais continuam a apoiar as pautas do presidente nas redes. Sempre preocupado com eleições, Bolsonaro estaria traçando a estratégia para indicar Sergio Moro ao Supremo, de acordo com o Valor Econômico.
 
 
CAPA – Manchete principal: *”Mercados têm dia de pânico; Bolsa desaba 12%, maior queda do século”*
EDITORIAL DA FOLHA - *”Bolsonaro e a crise”*: O mergulho dos preços do petróleo, gatilho para desvalorizações acentuadas dos maiores mercados acionários nesta segunda (9), vai completando o quadro de crise econômica global, algo que não ocorria desde o final da década passada. Pela primeira vez na história moderna, a China figura no epicentro do abalo internacional. O gigantismo que atingiu nas cadeias de suprimento industrial, no consumo e até no turismo faz-se notar mundo afora no momento em que o país asiático é obrigado a reduzir bruscamente sua atividade a fim de combater uma epidemia viral. As ondas recessivas que se difundem a partir do engasgo chinês são reforçadas pelo espalhamento dos casos de covid-19, o que vai inibindo a circulação de pessoas, serviços e mercadorias e pressionando sistemas de saúde globalmente. O Brasil já começa a sofrer esses choques, seja porque é importante parceiro comercial chinês e grande fornecedor de alimentos e minério para o mundo, seja pela expectativa de impacto direto do novo coronavírus sobre a população e a atividade econômica brasileiras. Quanto ao arsenal de defesa contra solavancos externos, o país está desfalcado de capacidade fiscal. Em razão dos desvarios cometidos também a pretexto de mitigar efeitos da crise de 2008-9, a dívida pública explodiu e grandes déficits federais se tornaram recorrentes.
Por outro lado, a taxa de juros de curto prazo decidida pelo Banco Central está nas mínimas históricas e, diante da perspectiva de queda no preço dos combustíveis, em tese poderá ser reduzida ainda mais —até o momento em que a elevação do dólar, seu efeito colateral, pesar nas expectativas da inflação, o que ainda não ocorre. Um estoque respeitável de reservas cambiais também permite ao BC tentar evitar oscilações bruscas na cotação da moeda americana. Toda a política econômica de resposta à tormenta externa deveria se voltar a essa estratégia de mitigações. Crises globais, inclusive as mais violentas, são passageiras, mas podem deixar sequelas duradouras se forem mal administradas pelas autoridades responsáveis. Para isso, é imprescindível que o Executivo coordene-se com os outros Poderes, em especial com o Legislativo, em torno das medidas emergenciais e estruturais a serem tomadas. A atual algaravia, em que o ministro Paulo Guedes (Economia) se aproveita da crise e empurra os custos para o Congresso, não vai levar a nada construtivo. O presidente da República, que age como se não fizesse ideia do que ocorre no mundo, também colaboraria se deixasse de semear discórdias e insuflar as suas falanges. Já que a incompetência do Planalto parece insanável, que ao menos haja esforço pelo entendimento.
PAINEL - *”Para políticos, Bolsonaro parece omisso em meio à turbulência global”*: As imagens de Jair Bolsonaro com Emerson Fittipaldi e, depois, com Romero Britto em meio à turbulência que levou a Bolsa de Valores à maior queda desde 1998 produziram, na classe política, a percepção de que o governo não sabe o que fazer diante da crise global e tem pouco apreço a medidas eleitoralmente duras. Outrora salvador da pátria, Paulo Guedes (Economia) perdeu o status entre congressistas que, diante da inoperância presidencial, se dizem dispostos a flertar com o populismo. A única ação de Bolsonaro, avaliam políticos, foi ter convocado manifestações populares que, a depender dos efeitos da crise na economia, podem se voltar contra o próprio governo com pedidos por mais gastos em tempos de restrição fiscal. Neste caso, parlamentares se dizem dispostos a embarcar no jogo presidencial e "ouvir a voz das ruas".
PAINEL - *”AGU diz que ex-PGR cometeu erro grosseiro ao dar adicional a servidores”*
PAINEL - *”Com avanço de vírus, Ministério da Saúde abre espaço pra discutir fechamento de escolas”*
PAINEL - *”Meirelles diz que venda de reservas pelo BC pode ajudar a contrair a economia”*: Ex-presidente do Banco Central na última grande crise global, em 2008, Henrique Meirelles afirma que a venda de reservas cambiais só deve ser acionada para suprir escassez de dólares localizada, não para moderar a alta da moeda. O risco é contribuir para a contração da economia doméstica, já em curso.
PAINEL - *”Governadores calculam efeito de coronavírus sobre receitas locais”*
*”Inteligência artificial atua como juiz, muda estratégia de advogado e 'promove' estagiário”*
JOEL PINHEIRO DA FONSECA - *”Três anos de reformas, resultados pífios; o que deu errado?”*
*”Folha lança newsletter para temas jurídicos; saiba como recebê-la”*
*”Advogados contestam tratamento diferenciado a juízes e promotores em fóruns”*
ENTREVISTA - *”Para magistrada, machismo involuntário de juízes pode afetar decisões sobre mulheres”*: Coordenadora da comissão que trata de igualdade de gênero da Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil), a magistrada Tani Maria Wurster, 44, afirma que a participação das mulheres no Judiciário é um fator fundamental para a democracia. Nos últimos dez anos, diz a juíza, o número de mulheres promovidas para cargos na segunda instância cresceu apenas 1% na Justiça estadual. Na Federal, caiu 3%. Para Tani, o machismo da sociedade impacta a forma como a Justiça trata as mulheres em suas decisões, seja culpando vítimas para inocentar criminosos sexuais, seja na dificuldade em reconhecer o papel do trabalho feminino em todas as suas vertentes, incluindo o doméstico. "As expectativas em relação ao comportamento da mulher na sociedade podem interferir nas decisões judiciais", diz Tani, em entrevista à Folha. "É muito importante que os juízes estejam atentos para não reproduzirem padrões involuntários e inconscientes discriminatórios."
- O que os dados sobre a participação feminina no Judiciário indicam?
- A participação das mulheres no Judiciário é fundamental para a democracia, mas a gente tem um déficit de representatividade feminina. Cinquenta e dois por cento da população brasileira é formada por mulheres, mas só 39% dos magistrados no país são mulheres —desses 39%, quase metade, 45%, são juízas que se encontram no nível mais baixo da carreira. Outra coisa é que tem havido uma estagnação da participação feminina no acesso aos cargos de segundo grau. Nos últimos dez anos, o aumento de magistradas nos cargos de desembargadora foi apenas de 1%. Na Justiça Federal, essa dificuldade de acesso ao segundo grau é ainda mais acentuada: houve uma redução do percentual de mulheres em mais de 3%.
- E por que que as mulheres não são promovidas?
- É difícil atribuir uma causa única para um problema tão complexo quanto a desigualdade de gênero. O problema é um reflexo de um padrão de discriminação, várias vezes involuntário e inconsciente, que já existe na sociedade. Mas é seguro dizer que uma delas é a divisão sexual do trabalho, que impacta todas as carreiras. Há pesquisas que indicam que as mulheres gastam até cinco vezes mais [tempo] do que os homens no trabalho doméstico, que é não remunerado. É um tempo que elas não estão despendendo no estudo, no lazer ou no mercado de trabalho. Isso pode gerar impacto tanto nas escolhas individuais das juízas no momento, por exemplo, de prestar um concurso público para a magistratura ou para se candidatar a uma promoção. Isso porque na maioria dos casos do Poder Judiciário a promoção implica uma mudança do local de residência. Se você é a principal responsável pelo cuidado dos filhos ou de um parente doente, isso tem um impacto familiar maior.
- Os dados do CNJ indicam que, em nível de estudo e capacitação, homens e mulheres juízes são equivalentes. Que hipóteses ajudam a explicar os motivos para as mulheres serem menos promovidas por merecimento no Judiciário?
- Acredito que um fenômeno que pode explicar isso é o que se tem socialmente em relação ao lugar da mulher na sociedade. Quando a mulher adentra o espaço público, que é o espaço do trabalho, essa presença causa um desconforto. Não se trata de discriminações voluntárias e conscientes. Parte disso se explica pela premissa de que o lugar que é ocupado histórica, social e culturalmente pela mulher é o espaço doméstico. Agora isso é sutil, é inconsciente, e pode influenciar decisões que são tomadas a partir de critérios subjetivos.
- A sra. acha que fez diferença ter a ministra Cármen Lúcia, uma mulher, na presidência de CNJ e STF?
- Eu não tenho dúvida de que a existência de mulheres no Judiciário e em cargo de maior hierarquia tenha uma influência positiva no resultado geral do exercício da jurisdição. O que eu preciso deixar claro é que não há uma diferença essencial nas decisões proferidas por homens ou mulheres. O que difere são as experiências que as mulheres vivem enquanto grupo, que não são as mesmas dos homens. Permitir que decisões judiciais sejam proferidas por pessoas iguais e que compartilham as mesmas experiências —por exemplo, majoritariamente por homens brancos— impede a influência das experiências dos demais grupos sociais —mulheres, homens negros, mulheres negras, homossexuais— sobre o resultado final do exercício da jurisdição. É imperativo da democracia que os vários grupos que compõem a sociedade sintam-se também representados naqueles que proferem as ordens judiciais. As expectativas em relação ao comportamento da mulher na sociedade podem interferir nas decisões judiciais, que podem ser proferidas tanto por homens como mulheres.
- Ou seja, o machismo presente na sociedade, em homens e mulheres, está presente em decisões judiciais.
- Exatamente.
- Como a sra. vê essa questão?
- É muito importante que os juízes estejam atentos para não reproduzirem padrões involuntários e inconscientes discriminatórios. Vou dar um exemplo: decisões judiciais sobre violência sexual nas quais o comportamento da vítima é levado em conta para absolver o agressor, ou o fato de ela estar eventualmente bêbada. Uma decisão nesse sentido pode representar esse viés discriminatório, da expectativa de que a mulher deva se comportar de um determinado modo, relacionado ao recato e à decência, que justifique a absolvição do acusado.
- Mais algum exemplo?
- Na concessão da aposentadoria rural, é preciso ficar reconhecido o trabalho em regime de economia familiar, que pressupõe que o trabalho do grupo familiar seja indispensável à subsistência. Se você parte do pressuposto da valorização do trabalho rural do homem, da desvalorização do trabalho doméstico da mulher e da desvalorização do trabalho dela no campo, você pode eventualmente reconhecer que as horas que a mulher do campo trabalha cuidando dos filhos não é trabalho rural. Então, você nega o pedido de aposentadoria para ela —embora, se você computar as horas totais do dia, ela trabalhou mais horas do que o marido, porque somou o tempo de trabalho doméstico com o do trabalho do campo.
- O presidente da República tem incentivado ataques a mulheres, inclusive a jornalistas, como aconteceu com uma repórter da Folha. Esse tipo de ataque dificulta o trabalho das mulheres também no Judiciário?
- A democracia se enfraquece quando são proferidos ataques depreciativos sobre a pessoa da profissional. Esses comentários são utilizados como estratégia para desqualificar o exercício da profissão e afetam o sentido da democracia. Construir uma sociedade livre, justa e solidária é um dos objetivos da República inscritos na Constituição, assim como promover o bem-estar de todos sem preconceito de origem, raça, sexo, cor e idade e qualquer outra forma de discriminação. É essencial que todos estejam atentos e vigilantes a práticas autoritárias. Para além de uma ofensa vulgar, que fundamenta uma estrutura que autoriza a discriminação das mulheres nas relações cotidianas e sustenta a naturalização de violência física, sexual e psicológica, essas práticas autoritárias fragilizam o tecido social e ameaçam a democracia. Todas as manifestações que procuram desqualificar a atuação profissional das mulheres a partir da ofensa em razão de serem mulheres não só estruturam e naturalizam violências sofridas cotidianamente como também fragilizam o tecido social e ameaçam os pilares da democracia.
*”'Não sei de nada', diz Toffoli ao ser questionado sobre ato do dia 15 a favor de Bolsonaro”* - O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), José Dias Toffoli, se recusou a comentar, nesta segunda-feira (9), a iniciativa do presidente Jair Bolsonaro de conclamar a população a participar de manifestações agendadas para domingo (15) em apoio a seu governo. As manifestações são organizadas por ativistas conservadores e, além de bandeiras em defesa do presidente e das Forças Armadas, apresentam ataques ao Congresso e ao Judiciário. Nas redes, há algumas convocações de caráter autoritário, pedindo o fim do Legislativo e do Supremo Tribunal Federal. "Não sei de nada”, afirmou Toffoli, após discursar na abertura do 21º Congresso Internacional de Arbitragem Marítima, no Rio de Janeiro. Em seu breve discurso, Toffoli afirmou, no entanto, que a função da Justiça é de pacificação de conflitos, tarefa que requer suporte da sociedade. “A função última do Poder Judiciário é promover a pacificação social. É necessário que a sociedade também atue de forma cooperativa”, disse Toffoli.
O presidente do STF disse ainda que “o Brasil tem orgulho de sua magistratura e de seu Judiciário”. Presente ao Congresso, o ministro do Supremo Luiz Fux também se recusou a comentar. Ao chegar, ele disse que só se manifestaria sobre os temas em debate no encontro. “Nada de lá de fora.” Na saída, voltou a se esquivar: “não gosto de falar rápido para não falar errado”, argumentou. Ex-presidente do STF, Ellen Gracie informou que, com o avanço do coronavírus, participantes do encontro cancelaram viagens ao Brasil e assistem ao Congresso via internet.​ No sábado (7), Bolsonaro pediu que a população participe das manifestações programadas para o próximo dia 15 e afirmou que político que tem medo de rua não serve para ser político. A declaração foi dada em Boa Vista para cerca de 400 pessoas, entre autoridades políticas roraimenses e simpatizantes. A organização do protesto tomou forma após o ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno, dizer, em fala captada por transmissão na internet, que o governo era alvo de chantagem em disputa por controle do Orçamento da União. “Não podemos aceitar esses caras chantageando a gente. Foda-se”, afirmou o ministro.
Em Roraima, Bolsonaro afirmou ainda que o movimento quer mostrar que quem dá o norte para o Brasil é a população. “É um movimento espontâneo, e o político que tem medo de movimento de rua não serve para ser político”, afirmou. “Então participem, não é um movimento contra o Congresso, contra o Judiciário. É um movimento pró-Brasil." Diante disso, parlamentares da oposição decidiram reforçar a ação contra o acordo feito entre governo e Congresso na semana passada em torno da execução do Orçamento. Na última semana, após um entendimento entre Palácio do Planalto e parlamentares, o Congresso manteve vetos de Bolsonaro ao chamado Orçamento impositivo, que ampliaria em R$ 30 bilhões a fatia de recursos sob poder de decisão de deputados e senadores. Como segunda parte da tratativa, o governo enviou projetos ao Congresso para que ao menos metade desse valor fique sob o poder do Legislativo, permitindo que o Executivo retome o restante. No mês passado, Bolsonaro já havia encaminhado a amigos um vídeo de convocação aos protestos. O endosso gerou críticas de figuras como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), do líder da oposição na Câmara, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) e do presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz.
+++ A reportagem menciona que Fernando Henrique Cardoso criticou a postura de Jair Bolsonaro, mas não menciona que o ex-presidente Lula também fez críticas. Existe uma seletividade do jornal que não tem explicação.
*”Sem apresentar provas, Bolsonaro diz que houve fraude eleitoral e que foi eleito no 1º turno”* - Sem apresentar provas, o presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta segunda-feira (9) que houve fraude eleitoral em 2018 e que foi eleito no primeiro turno. Segundo o presidente, é preciso aprovar um sistema seguro de apuração de votos no Brasil e que, se bobear, a esquerda pode voltar ao poder em 2022. A declaração foi feita durante um evento com apoiadores brasileiros em Miami, onde o presidente escalou seus embates e minou mais uma vez sua relação com o Congresso, a imprensa e, desta vez, com a Justiça Eleitoral. "Pelas provas que tenho em minhas mãos, que vou mostrar brevemente, eu fui eleito no primeiro turno mas, no meu entender, teve fraude", disse Bolsonaro. "E nós temos não apenas palavra, temos comprovado, brevemente quero mostrar, porque precisamos aprovar no Brasil um sistema seguro de apuração de votos. Caso contrário, passível de manipulação e de fraudes. Então acredito até que eu tive muito mais votos no segundo turno do que se poderia esperar, e ficaria bastante complicado uma fraude naquele momento." Após 30 minutos de discurso, porém, ele não apresentou nenhum indício concreto do que chamou de fraude eleitoral na eleição de 2018 e também não respondeu sobre possíveis provas após o evento, quando foi questionado por jornalistas sobre o assunto. Essa é a primeira vez que Bolsonaro fala que tem provas da fraude eleitoral desde que ocupa o Palácio do Planalto. Em outubro de 2018, o então candidato do PSL fez um pronunciamento na internet no qual disse suspeitar que só não havia vencido Fernando Haddad (PT) no primeiro turno devido a fraudes nas urnas eletrônicas.
Antes da segunda etapa da eleição, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) mandou fazer uma auditoria externa que comprovava a segurança do sistema de urna eletrônica no Brasil. Ainda em sua fala desta segunda, Bolsonaro fez pressão sobre o Congresso ao dizer que as manifestações marcadas para o dia 15 de março podem arrefecer caso os presidentes da Câmara e do Senado desistam da divisão do Orçamento. Ele também atacou a imprensa e afirmou que o grande problema do Brasil é a esquerda. Apesar de já estar na Presidência há mais de um ano, afirmou que a oposição aparelha o Estado e "patrocina o atraso no país." "Você tem de afastar, não pode ser complacente. Foi o [Mauricio] Macri na Argentina complacente, perdeu. Foi o [Sebástian] Piñera também, está com problema seríssimo, conta com manifestações quase que diárias, quando começaram os movimentos que diziam que era espontâneo mas mais de uma dezena de estações de metrô foram queimadas simultaneamente, então é orquestrado, sim, não há dúvida que pelo pessoal do Foro de São Paulo. E o Brasil? Será que estamos livres disso? Eu acredito que se bobearmos, volta em 2022, no mínimo. E temos que trabalhar contra essa proposta." Bolsonaro aproveitou a plateia de apoiadores para fazer uma retrospectiva de sua carreira militar e política, chorou ao falar da facada que levou em setembro de 2018, durante a campanha, e repetiu que só está vivo por um milagre. Ainda emocionado, acrescentou que sua mulher, Michelle Bolsonaro, "não entende muito de política" e, portanto, ficou surpresa quando ele decidiu concorrer à Presidência.
*”Bolsonaro pressiona Congresso e põe Justiça Eleitoral em xeque 6 dias antes de atos pró-governo”* - O presidente Jair Bolsonaro pressionou nesta segunda-feira (9) o Congresso, alvo dos atos previstos para domingo (15), ao dizer que a população não quer o Parlamento como "dono do destino de R$ 15 bilhões" do Orçamento. Em evento nos EUA, Bolsonaro também voltou a colocar em xeque a Justiça Eleitoral ao afirmar, sem apresentar provas, que houve fraude na eleição de 2018 e que, na prática, ele foi eleito no primeiro turno. As declarações do presidente ocorrem às vésperas das manifestações de bolsonaristas que miram ataques ao Legislativo e ao Judiciário —e que ele nega ser contra os dois Poderes. Bolsonaro atrelou os atos do dia 15 de março ao acordo que selou a divisão do Orçamento de R$ 30 bilhões entre governo e Congresso e que teve aval do próprio presidente. "Ontem, anteontem, troquei umas mensagens com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, falando sobre a questão do dia 15 de março que, no meu entender, é algo voluntário por parte do povo, não é contra o Congresso, não é contra o Judiciário, é a favor do Brasil que, afinal de contas, devemos obedecer e seguir o norte apontado pela população. E o que a população quer, que está em discussão lá em Brasília: não quer que o Parlamento seja o dono do destino de R$ 15 bilhões do Orçamento."
Bastante aplaudido diante de uma plateia de brasileiros em Miami, nos EUA, o presidente disse ainda que, caso os presidentes da Câmara e do Senado se pronunciem contra a partilha de recursos, poderão, inclusive, sinalizar que estão alinhados com o Planalto e, assim, arrefecer os protestos marcados para o próximo fim de semana. "É isso que está em jogo no momento. Acredito ainda que se, até o dia 15, os presidentes da Câmara e do Senado anunciem algo no tocante a dizer que não aceitam isso e se a proposta chamada PLN4 [projeto de lei do Congresso Nacional nº 4] tiver dúvida no tocante a ficar com eles, para que venham destinar os recursos para onde eles acharem melhor, e não o Executivo, acredito que eles possam botar até um ponto final na manifestação. Não um ponto final, porque ela vai haver de qualquer jeito no meu entender, mas para mostrar que estamos, sim, afinados no interesse do povo brasileiro", completou Bolsonaro.
Sem apresentar provas, Bolsonaro ainda afirmou que houve fraude eleitoral em 2018, aproveitando para defender a aprovação de um sistema seguro de apuração de votos no Brasil. Segundo ele, se bobear, a esquerda pode voltar ao poder em 2022. "Pelas provas que tenho em minhas mãos, que vou mostrar brevemente, eu fui eleito no primeiro turno mas, no meu entender, teve fraude", disse Bolsonaro. "E nós temos não apenas palavra, temos comprovado, brevemente quero mostrar, porque precisamos aprovar no Brasil um sistema seguro de apuração de votos. Caso contrário, passível de manipulação e de fraudes. Então acredito até que eu tive muito mais votos no segundo turno do que se poderia esperar, e ficaria bastante complicado uma fraude naquele momento." Após 30 minutos de discurso, porém, ele não apresentou nenhum indício concreto do que chamou de fraude eleitoral na eleição de 2018 e também não respondeu sobre possíveis provas após o evento, quando foi questionado por jornalistas sobre o assunto. Embora já tenha levantado suspeitas sobre a Justiça Eleitoral anteriormente, é a primeira vez que Bolsonaro diz ter provas da fraude eleitoral desde que ocupa o Palácio do Planalto —embora sem apresentá-las. Em outubro de 2018, o então candidato do PSL fez um pronunciamento na internet no qual disse suspeitar que só não havia vencido Fernando Haddad (PT) no primeiro turno devido a fraudes nas urnas eletrônicas. Antes da segunda etapa da eleição, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) mandou fazer uma auditoria externa que comprovava a segurança do sistema de urna eletrônica no Brasil.
Nesta segunda, Bolsonaro e a primeira-dama, Michelle, visitaram o atelier de Romero Britto, em Miami. O artista plástico entregou ao presidente um quadro com a sua imagem. Bolsonaro também pintou uma tela, iniciada por Britto, com o retrato de Michelle. O presidente falou em discurso sobre o risco da esquerda voltar ao governo em 2022. "Você tem de afastar, não pode ser complacente. Foi o [Mauricio] Macri na Argentina complacente, perdeu. Foi o [Sebástian] Piñera também, está com problema seríssimo, conta com manifestações quase que diárias, quando começaram os movimentos que diziam que era espontâneo, mas mais de uma dezena de estações de metrô foram queimadas simultaneamente, então é orquestrado, sim, não há dúvida que pelo pessoal do Foro de São Paulo. E o Brasil? Será que estamos livres disso? Eu acredito que se bobearmos, volta em 2022, no mínimo. E temos que trabalhar contra essa proposta."
+++ A manchete da Folha deveria ser outra. Se a institucionalidade fosse levada mais à sério, o jornal diria que Jair Bolsonaro coloca a presidência da República em xeque ao fazer acusações sem provas, ao utilizar factoides e mentiras – como a fala sobre o Foro de São Paulo -, para criar uma narrativa política que lhe convém.
*”Paraninfo deixa formatura de jornalismo escoltado após falar de ataques de Bolsonaro”* - Após fazer um discurso crítico aos ataques do presidente Jair Bolsonaro à imprensa, o professor da Unisinos (Universidade do Vale do Rio dos Sinos) Felipe Boff, 40, deixou escoltado o auditório onde ocorria uma formatura do curso de jornalismo, da qual ele era paraninfo, em São Leopoldo (RS). A fala de Boff, no último sábado (7), havia sido abafada por vaias e agressões verbais da plateia, composta por cerca de 700 pessoas, convidados dos 34 formandos da área de comunicação, sendo 21 de jornalismo. Um vídeo do episódio foi compartilhado nas redes sociais por um dos críticos ao discurso. As imagens mostram que, enquanto Boff falava, parte da plateia vaiava e gritava “chega”. “Professor metendo o pau no presidente, estragando a formatura dos formandos. Que vergonha, olha o que esse cara está fazendo!”, disse o homem que gravava o vídeo. Quando as vaias ficaram mais fortes, professores e alunos que estavam no palco se levantaram e aplaudiram a fala. Em apoio a Boff, colegas que o acompanhavam na mesa oficial da cerimônia também se posicionaram atrás dele. Professor de jornalismo na Unisinos, Boff explicou que a escolta por seguranças da instituição foi oferecida pela própria organização do evento, para evitar ataques após o ocorrido durante a fala dele na formatura. Ele afirmou que, apesar da medida, não houve agressões posteriores e que, já na recepção, foi cumprimentado por grande parte de alunos e familiares presentes na cerimônia.
No discurso, o professor afirmou que “a imprensa brasileira vive seus dias mais difíceis desde a ditadura militar”. Ele elencou alguns dos ataques de Bolsonaro contra profissionais, como à repórter Patrícia Campos Mello, da Folha, contra a qual dirigiu ofensas de cunho sexual. Ela apresentou à Justiça uma ação com pedido de indenização por danos morais contra o presidente. Boff também citou o levantamento da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), que apontou que quase dez ataques por mês foram desferidos pelo presidente a jornalistas, veículos de comunicação e à imprensa, em geral em suas redes sociais, no primeiro ano de governo. “Esta é a mensagem a ser destacada nesta noite: quando tenta calar e desacreditar a imprensa, o atual presidente da República ameaça não só o jornalismo e os jornalistas. Ameaça a democracia, a arte, a ciência, a educação, a natureza, a liberdade, o pensamento. Ameaça a todos, até aqueles que hoje apenas o aplaudem –estes que experimentem deixar de bater palma para ver o que acontece”, completou o professor aos presentes. A repercussão negativa de parte da plateia sobre o discurso, para Boff, mostra a dimensão do ataque à liberdade de imprensa no Brasil. “Principalmente porque o presidente incita esse tipo de atitude, de censurar, de tentar calar jornalistas na marra. Se a maior autoridade da nação se sente à vontade para xingar jornalistas, por que o seu apoiador não se sentiria?”, disse à Folha.
Para o professor, o episódio, apesar de lamentável, ajudou a propagar a mensagem que gostaria de passar com o discurso de formatura. “É para despertar as pessoas a também defenderem a imprensa, já que amanhã podem ser as novas vítimas”, afirmou. Em nota, a Unisinos afirmou que respeita as diversas posições e que preserva e estimula a pluralidade de ideias e, por isso, os professores escolhidos pelos alunos como paraninfos “têm o direito de fazer uso da palavra e liberdade para se expressarem conforme suas convicções pessoais”. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e a Federação Nacional dos Jornalistas manifestaram solidariedade ao professor, afirmando que “repudiam toda e qualquer forma de ataque à liberdade de expressão e de pensamento”. As entidades afirmam que a ação contra o discurso “representa uma intimidação à atividade profissional e é condenável”.
+++ O problema é a Folha não entender que o tratamento que a imprensa dá à cobertura política resulta em ações desse tipo em que um professor é atacado por defender a liberdade de imprensa.
*”USP promove seminário sobre reformas constitucionais”*
*”Twitter classifica vídeo retuitado por Trump como manipulado”*
*”Chile tem greve de mulheres e novas manifestações”*
*”Bolsonaro dá versão falsa para exclusão da Folha de cobertura”*
*”Incêndio destrói milhares de urnas eletrônicas na Venezuela”*
*”Guedes quer reformas contra crise, mas Congresso defende desidratar PEC do ajuste”* - No dia em que o principal índice da Bolsa brasileira teve a maior queda diária do século, o ministro Paulo Guedes (Economia) se disse sereno. Ele defendeu as reformas para conter a crise. Em resposta às declarações de Guedes, o Congresso cobrou mais ações e sinalizou que irá desidratar a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial. Ela cria gatilhos para conter gastos públicos. A disputa entre Arábia Saudita e Rússia pelo preço do petróleo agravou a fuga de investidores de ativos mais arriscados, já contagiada por causa do novo coronavírus. As principais Bolsas mundiais fecharam em forte queda nesta segunda-feira (9). O Ibovespa recuou 12,17%, aos 86.067 pontos, a maior queda diária percentual desde 1998. O dólar fechou em alta de 2%, a R$ 4,727. A convulsão nos mercados gerou reação de parte dos Poderes e chegou a Brasília. Guedes afirmou que a equipe econômica está tranquila. Segundo o ministro, "a democracia brasileira vai reagir transformando essa crise em avanço das reformas". "[É hora de] Os três Poderes, com serenidade, cada um resolver sua parte", disse. A orientação de Guedes à equipe econômica foi a de intensificar o discurso de que a crise exige o aprofundamento das reformas. Para ele, o momento de turbulência ajudará a convencer a sociedade sobre a necessidade de ajustes. Não está nos planos do governo adotar medidas de estímulo, como ampliação do investimento público ou concessão de incentivos tributários.
Na mesma linha, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, confirmou que não há "nenhuma medida emergencial" a ser adotada pelo governo Jair Bolsonaro. Ele ainda negou que haja previsão de aumento da Cide –contribuição sobre o preço dos combustíveis recolhida pelo governo federal. Em meio à crise aguda, governo e Congresso batem cabeça sobre medidas a serem tomadas. A discussão está centrada em uma ação imediata para a crise atual, enquanto as reformas têm efeito de médio e longo prazos. "Nós estamos prontos para ajudar, como colaboramos no ano passado com toda agenda de reformas. Acho que elas [reformas] ajudam, mas certamente não são o único ponto para solucionar os danos da crise", disse Maia. Maia externou contrariedade com as cobranças de Guedes pela aprovação das medidas. "Ainda não chegou nem a administrativa nem a tributária, e a [PEC] emergencial, o governo decidiu encaminhar uma pelo Senado e não usar a do deputado Pedro Paulo, que estava pronta desde 2017, 2018", criticou. Apesar de não ter indicado quando vai enviar as reformas, Bolsonaro chancelou as decisões de Guedes. Em Miami, onde falou a um grupo de empresários brasileiros, disse ser leal à política econômica do ministro. "Honrar compromissos, buscar retaguardas jurídicas e garantias. Temos, na pessoa do nosso ministro da Economia, um homem conhecido dentro e fora do Brasil, o senhor Paulo Guedes, e às suas politicas econômicas somos leais e buscamos implementá-las de todas as formas", disse.
"Estamos mostrando que estamos no caminho certo. Aqui nos EUA estamos mostrando isso", afirmou o presidente. Bolsonaro ainda atribuiu a queda nos mercados à cotação do petróleo e ao coronavírus. “No meu entender está superdimensionado o poder destruidor desse vírus”, disse. “Mas acredito que o Brasil não é que vai dar certo, já deu certo.” Uma das medidas que ajudaria a abrir espaço para o governo fazer investimentos públicos, como defendido por Guedes e Maia, a PEC Emergencial deve ser desidratada no Senado e na Câmara. Esta é uma das três PECs do pacotaço que altera regras fiscais e orçamentárias. Congressistas indicam que irão impor ritmo próprio à análise da matéria. Nesta semana, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) fará audiências públicas para a PEC Emergencial. Pelo cronograma definido pela presidente do colegiado, senadora Simone Tebet (MDB-MS), o relator da proposta, senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), apresentará seu parecer na próxima semana. O texto será votado até a primeira semana de abril. O texto já enfrenta resistências no Senado. Congressistas dizem que a PEC Emergencial criminaliza o servidor.
"Embora importante, a PEC Emergencial que precisamos não é esta que está posta pelo governo. A base é ela, mas tem excessos que, em vez de aquecer a economia, dar credibilidade ao país, conforto para investidores, vai travar a economia porque tem uma parte dela que fala em redução de jornada de trabalho e salário de servidor público, que é quem hoje aquece a economia", afirmou a senadora à Folha. Tebet é contra o dispositivo que permite a redução em 25% da jornada dos funcionários públicos com redução proporcional dos vencimentos. O texto cria gatilhos para quando União, estados e municípios tiverem problemas financeiros. Para evitar que o governo gaste mais do que arrecada, medidas de ajuste serão acionadas quando a despesa corrente exceder 95% da receita corrente.
Guimarães tende a não ceder às pressões de categorias do serviço público. Porém, ele poupou do corte de jornada e salário servidores que ganhem até três salários mínimos (R$ 3.135). O texto em tramitação ainda proíbe reajustes, criação de cargos, reestruturação de carreiras e concursos. O governo queria aprovar a matéria ainda 2019. "Se o governo não se mexer, não vai acontecer nada. Você acha que, em um ano eleitoral, eles [parlamentares que querem eleger prefeitos e vereadores] vão brigar com corporação de funcionário público?", avaliou o senador. O Orçamento deste ano prevê que a PEC entre em vigor no segundo semestre. Com isso, seriam economizados R$ 6 bilhões neste ano, valor que foi realocado para programas sociais, como o Minha Casa, Minha Vida e o SUS da assistência social, além de construção de rodovias e apoio a projetos de desenvolvimento sustentável. Nesta segunda, a diretora de Pesquisa do FMI (Fundo Monetário Internacional), Gita Gopinath, afirmou que os países precisam agir para impedir que crises, como a epidemia de coronavírus, provoquem danos permanentes para famílias e empresas.
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*”Estratégia de Guedes de restringir gasto público divide economistas”* - A estratégia do Ministério da Economia de manter restrições a investimentos públicos e apostar nas reformas econômicas neste momento de desaceleração econômica mundial divide os economistas do setor privado. Para a economista Monica de Bolle, professora da Universidade Johns Hopkins, há chances de uma contração econômica no Brasil neste ano, e o governo precisa deixar a agenda de reformas em segundo plano e priorizar uma agenda de resposta à crise. "A agenda de reformas continua sendo tão importante quanto antes. Ela só deixa de ser prioritária. Precisa haver agora um pensamento diferente: como evitar que a economia brasileira tenha uma recessão neste ano", afirma. "O governo precisa ter uma agenda de resposta à crise, coisa que não tem, na qual o principal foco do gasto público é o investimento, principalmente em infraestrutura. O ministro Paulo Guedes não queria investimento em infraestrutura? É hora de fazer." De Bolle defende a revisão da regra do teto de gastos, que tem limitado principalmente os investimentos do setor público. Diz ainda que o Brasil fez uma redução expressiva da taxa de juros, que está próxima de zero em termos reais (descontada a inflação), o que permite ao governo aumentar gastos que impulsionem o crescimento econômico. "Com a taxa de juros real baixa, a gente ganhou um espaço na dívida pública que não tinha. Em momentos de crise, esse espaço é para ser usado."
A economista Zeina Latif, por outro lado, diz que seria um equívoco adotar políticas tradicionais de estímulo econômico, o que pode piorar a confiança no país, além de ter pouco efeito na recuperação da atividade. "Digamos que a gente tenha de tomar medidas mais sérias do lado da saúde. Se você não for responsável agora, quando realmente precisar desses recursos, corre o risco de não ter", afirma. "Significaria rasgar o esforço fiscal e ainda comprometer recursos que podem ser necessários se essa epidemia atingir uma escala que a gente não está imaginando." Ela afirma, no entanto, que os ruídos na relação entre Congresso e governo e as falas do ministro Guedes têm contribuído para a piora na percepção sobre o Brasil. "É um momento de seriedade, de mostrar harmonia entre Poderes. As falas do governo estão trazendo mais incertezas." A professora de economia do Coppead/UFRJ, Margarida Gutierrez, também avalia que o importante neste momento é ganhar a confiança dos agentes econômicos, reduzir os ruídos políticos e aprovar reformas. "Usar política fiscal, nem pensar. Isso poderia soar como se estivesse abandonando a estratégia de redução do desequilíbrio fiscal e vai ter um aumento mínimo de demanda, porque o investimento leva tempo para maturar."
O colunista da Folha e ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa defende uma reforma do teto de gastos, o que inclui um limite diferenciado para os investimentos. Ele lembra que o FMI (Fundo Monetário Internacional) e o Banco Central Europeu recomendaram uso de política fiscal para combater a crise, o que inclui reforço da rede pública de proteção social e saúde. Nesse sentido, ele afirma que a legislação permite a abertura de crédito extraordinário para reforçar o sistema público de saúde no Brasil, sem descumprir o teto de gastos. De acordo com o ex-ministro, com os juros reais próximos de zero, o custo de financiamento do governo é baixo e um aumento no endividamento no curto prazo é compensado posteriormente pelo crescimento da economia gerado por investimentos. Barbosa afirma que o investimento estatal hoje não é suficiente nem para manter a infraestrutura já construída. Diz ainda que é possível ter serenidade, como disse o ministro da Economia, mas ao mesmo tempo e tomar medidas para estabilizar a economia diante de um choque que pode ter efeitos próximos do verificado na crise de 2008/2009. "Tem gente acha que porque o choque é externo, a política econômica não tem de fazer nada. Pelo contrário, a política econômica tem de compensar isso. Política econômica não é só reformas de longo prazo. É estabilização de curto prazo também", afirma.
José Ronaldo Souza Júnior, diretor do Ipea e professor do Ibmec-Rio afirma que o governo pode tentar aumentar os investimentos, mas por meio de concessões e atração de investimentos privados, sem elevar os gastos públicos. Ele afirma não trabalhar com a possibilidade de que o coronavírus gere uma crise financeira no Brasil, com problemas para o sistema bancário ou para grandes empresas por conta de endividamento. "Não tem nada de tão urgente para lidar. É um impacto por conta de piora de expectativas e do cenário internacional. A melhor forma de combater isso é melhorar as expectativas para o país. Essa crise aguda vai atenuar nos próximos meses", afirma."Se aproveitar isso para acelerar as reformas, atrair capital para infraestrutura, quando a retomada vier, ela será mais rápida. Se mudar a política fiscal, vai agravar a situação. Esse caminho não resolve."
Marcos Lisboa, presidente do Insper e colunista da Folha, afirma que é preciso adotar medidas emergenciais e estruturais. "Primeiro o país precisa se organizar e os Poderes pararem com disputas para enfrentar um problema que é grave. Na questão do Orçamento, é preciso lançar mão de recursos extraordinários para o poder público dar conta das necessidades da saúde da população", afirmou. Ele defendeu também utilizar a Cide, que é uma contribuição que incide sobre gasolina e diesel, para estabilizar a flutuação dos preços dos combustíveis e disse que os estados podem ter problema de arrecadação. Disse ainda ser importante a aprovação da PEC Emergencial. "No quesito estrutural, é preciso resolver os problemas que impedem o país de crescer, como a reforma tributária. Outra agenda que não foi para frente é a abertura comercial. E, por fim, a agenda de concessões e investimentos em infraestrutura."
O professor Eduardo Correia, do Insper, diz que a saída normal para uma crise como a atual é expandir o crédito com participação do Estado, como fizeram Brasil e EUA em 2008/2009, o que contraria a filosofia do governo atual. “A resposta dele [Paulo Guedes] é que precisa de mais reformas, é apostar em uma política de austeridade. O Brasil estava fazendo uma coisa importante, que é um ajuste fiscal, mas era em outro contexto internacional. Política de austeridade em momento de crise não funciona.” ​O professor Rodrigo De Losso, da FEA-USP, diz que o governo pode acelerar concessões e privatizações, mas que deve continuar reduzindo gastos para aumentar a confiança dos investidores. “Aumentar gastos é o caminho certo para piorar a situação. Contas públicas ajustadas sinalizam coisas boas, e as pessoas ficam confiantes em manter o capital aqui e, eventualmente, trazer recursos.
+++ A Folha de S. Paulo consultou a opinião de um ex-ministro da Fazenda de governos do PT, isso é algo raríssimo. De fato, não é uma prática corriqueira do jornal. O jornal diz que Nelson Barbosa é ex-ministro, mas não diz de qual governo.
*”Governos precisam agir rápido para evitar crise longa com coronavírus, diz FMI”*
*”Trump planeja discutir com Congresso corte de imposto sobre folha de pagamento”*
*”Alemanha lança plano de socorro a empresas e empregos ameaçados pelo coronavírus”*
*”Bolsa cai 12%, pior tombo do século; dólar bate R$ 4,79”* - A Bolsa brasileira teve sua maior queda do século nesta segunda-feira (9). O Ibovespa, maior índice acionário do país, despencou 12,17%, a 86.067 pontos, menor patamar desde 26 dezembro de 2018. Essa é a maior queda diária, em termos percentuais, desde 10 de setembro de 1998, quando a Bolsa caiu 15,8%, em período marcado pela crise financeira russa. Nesta sessão, o índice abriu em forte queda e, às 10h30, as negociações foram interrompidas quando a desvalorização superou 10%. Esse é o nível para que se acione o chamado circuit breaker, que leva à suspensão do pregão. É o primeiro circuit breaker desde o episódio conhecido como Joesley Day, em maio de 2017, e sexto da história. A suspensão foi de meia hora. Os mercados financeiros de todo o mundo vivem nesta sessão a perfeita definição de dia de pânico. O dólar disparou, apesar da intervenção do BC (Banco Central). O risco-país teve uma das maiores altas da história e os juros futuros subiram. Desde o pico mais recente, quando atingiu a máxima histórica de 119.527 pontos, em 23 de janeiro, o índice cai mais de 27%. A queda apaga todo o ganho do mercado de ações desde o início do governo de Jair Bolsonaro, em janeiro de 2019. O dólar abriu nesta segunda em forte alta. Na máxima, bateu R$ 4,794, mas teve a disparada parcialmente contida pela venda à vista de US$ 3 bilhões de reservas pelo BC –o triplo do inicialmente previsto. O plano, na sexta-feira, era vender US$ 1 bilhão. À tarde, o BC fez mais um leilão à vista, vendendo US$ 465 milhões. Apesar das intervenções, a moeda fechou em alta de 2%, a R$ 4,727. O turismo está a R$ 4,92 na venda. Em algumas casas de câmbio, chega a ser vendido acima de R$ 5.
Dentre emergentes, o real teve a quarta pior queda da sessão, atrás dos pesos colombiano e mexicano e do rand sul-africano. O BC anunciou novo leilão à vista na terça (9), de US$ 2 bilhões, entre 9h10 e 9h15, logo na abertura das negociações. O pessimismo sinaliza principalmente uma piora nas perspectivas de impacto econômico com a disseminação do coronavírus. A desaceleração da economia global por causa da doença já é considerada inevitável. Pesam neste início de semana a decisão do governo da Itália de colocar 16 milhões de pessoas no norte do país em quarentena, e da guerra de preços do petróleo entre grandes países produtores. O quadro é de muita aversão a risco, com investidores em todo o mundo buscando ativos considerados mais seguros, como ouro, dólar e títulos do Tesouro americano. A busca pelo Tesouro faz o rendimento destes títulos desabarem. Nesta sessão, os rendimentos dos títulos do Tesouro americano de dez e de trinta desabaram para suas mínimas históricas: 0,997% ao ano e 0,543% ao ano. Economistas agora aguardam medidas do governo brasileiro para amenizar o impacto da crise. Nesta manhã, o FMI (Fundo Monetário Internacional) recomendou aos governos do mundo que sejam ágeis na adoção de planos para evitar que o coronavírus tenham efeitos prolongados de retração econômica. Sugeriu medidas como aumento do crédito e liberação de seguro-desemprego.
O risco-país brasileiro, medido pelo contrato de CDS (Credit Default Swap) de cinco anos subiu 30,3%, uma das maiores altas da história em um dia. O índice retornou ao patamar de janeiro de 2019, aos 186 pontos. Desde a deterioração dos mercados acionários com a epidemia de coronavírus, em 20 de janeiro, a Bolsa brasileira cai 27,3%. Esse é o primeiro período de grande turbulência de pequenos investidores, que mais que dobraram a sua participação na Bolsa. De 2018 até fevereiro, o número de CPFs com ações compradas saltou de 813 mil para 1,95 milhão. “O psicológico fica afetado. Investidores inexperientes ficam ainda mais aflitos porque é primeira vez que enfrentam uma queda acima de 10% e acabam se desfazendo das ações. Quem não tem uma assessoria, acaba tomando decisões precipitadas”, afirma Carolina Barros, sócia da Ella's Investimentos, agente autônomo de investimentos ligada à XP. Segundo Carolina, os clientes pessoa física se desfizeram de cerca de metade da sua cesta de ações, em busca de investimentos mais seguros, com preferência a CDBs de liquidez diária e Tesouro Selic.
A deterioração nos mercados nesta segunda sinaliza ainda os efeitos negativos da retração no preço do petróleo. O contrato futuro do barril do tipo Brent chegou a cair mais de 30% nesta sessão e agora é negociado ao patamar de US$ 34,47, queda de 23,8%. É a menor cotação desde 2016. “A decisão da Arábia Saudita pega os mercados de surpresa e adiciona preocupações. Por ora, o impacto nos mercados está sendo avassalador”, escreveu a corretora Guide em relatório desta segunda. As ações da Petrobras, cuja receita é atrelada ao preço do barril de petróleo, tiveram a maior queda percentual da história. As preferenciais (mais negociadas) despencaram 29,7%, a R$ 16,05. As ordinárias (com direito a voto) caíram 31%, a R$ 16,92. Os patamares são os menores desde agosto de 2018, quando a estatal se recuperava de perdas decorrentes da paralisação dos caminhoneiros, quando a companhia adotou programa de subvenção e o preço do diesel caiu. “A mudança no preço do petróleo envolve diretamente a rotina operacional não só da Petrobras, mas de todas as companhias que pautam suas orientações com esse preço de referência”, diz Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos. No ano, o petróleo cai quase 50%, reflexo da percepção de que a demanda pelo produto será menor com a redução da atividade econômica global. Uma queda de consumo já é certa: querosene de aviação, com a redução das viagens causada pelo coronavírus. O Goldman Sachs apontou que o óleo pode ficar ao redor de US$ 30 por barril ao longo do segundo e do terceiro trimestre, sem descartar uma queda para US$ 20.
Já os juros brasileiros sobem, reflexo do temor de investidores sobre os impactos da doença sobre a economia brasileira. Na dúvida, a preferência é por cobrar mais para emprestar ao governo. A curva de juros futuros mostra uma aposta do mercado em Selic a 4% ao ano, se distanciando dos 3,5%. Hoje, a taxa básica está a 4,25% ao ano. Uma queda de braço entre a Arábia Saudita (membro da Opep) e a Rússia, que se recusou a cortar a produção para fazer frente à queda do preço da matéria-prima já está sendo chamada de guerra do preço do petróleo, com impactos em escala global. O Banco do Brasil se disse confiante na retomada da economia brasileira e que está preparado para atender clientes em momentos de necessidade e capital de giro. “É natural que os ânimos do mercado se exaltem diante de incertezas, mas os fundamentos econômicos de longo prazo não mudaram, continuam sólidos. O coronavírus e o stress internacional são pontuais e transitórios. Os mercados tendem a se acomodar após o susto do inesperado, estamos confiantes na reaceleração da economia e do crédito", afirma Rubem Novaes, presidente do Banco do Brasil. No exterior, Bolsas americanas tiveram o pior pregão desde 2008, ano da crise financeira. S&P 500 caiu 7,6%, Dow Jones, 7,8% e Nasdaq, 7,3%.
VINICIUS TORRES FREIRE - *”Baixa do petróleo vai tirar ainda mais dinheiro do governo”*
OPINIÃO – *”Alta do dólar e crescimento medíocre é combinação perigosa para o Brasil”*
*”Petrobras diz que é prematuro projetar impactos de queda do petróleo”*
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ANÁLISE - *”Rússia assume riscos na guerra de preços do petróleo com os sauditas”*
VAIVÉM DAS COMMODITIES - *”Crise externa eleva ganhos de produtores de soja no Brasil”*
NIZAN GUANAES - *”Informationvírus”*
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*”Quais as lições que podemos tirar da bolha da internet, que completa 20 anos nesta terça”*
*”Folha tira dúvidas sobre a declaração do IR”*
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ENTREVISTA - *”Autoestima de crianças negras é demolida pelo racismo, diz autora de livros infantis”*: Filha de tricoteira, Kiusam de Oliveira, 54, levava nos bolsos das capangas (cinturões de crochê) bloquinhos e lápis desde os dois anos. "Registra, escreve tudo o que você quiser", dizia a mãe da escritora e arte-educadora. Ela escreveu, e ainda escreve, tudo o que vê, sente, pensa e repensa. Durante 27 anos de magistério, ela anotou tudo. Em 2009, lançou o seu primeiro livro infantil, "Omo-Oba: histórias de princesas", em que recupera contos e mitos de orixás femininos na forma de princesas. Foi em 2013, porém, que todas as suas anotações sobre como falam, agem e se relacionam as crianças deram origem ao livro "O mundo no black power de Tayó". Tayó é uma menina negra de seis anos e que tem o cabelo black power. O livro discorre sobre a sabedoria ancestral mas também sobre a valorização da identidade negra ante a hegemonia branca do que é bonito, questionando estereótipos racistas. No livro seguinte, Kiusam mergulhou de vez nos direitos humanos. A obra, "O mar que banha a ilha de Goré", se passa em uma ilha na costa do Senegal recheada de sabedoria ancestral, antigo entreposto por onde passaram milhares de africanos que foram desumanizados e vendidos como mercadoria. É neste último livro que o racismo, a infância e os direitos humanos se cruzam com mais intensidade.
- Como é o seu processo de escrita?
- Eu escrevo a mão cada versão e cada revisão em cadernos. Escrevo sobre o que vivi e sobre o que meus estudantes vivem. O universo infantil é um universo meu. Eu gosto dele, o observo e registro todas as conversas entre as crianças, as respostas e as perguntas. Em 2016, por exemplo, uma criança me perguntou se eu sabia o que era o sonho. Ela disse que "o sonho é uma bola de ar. Uma bola de ar que se enche de formas e desenhos, e quando a gente acorda, essa bola estoura e a gente esquece os sonhos". Esses registros são muito importantes porque retratam a faixa etária dessas crianças e, para além disso, porque elas têm uma forma muito peculiar de pensar e elaborar seus próprios conceitos. Isso fica em mim. Na hora da escritas essas falas vem todas à tona. Esse universo em que elas vivem é poderoso.
- E a temática racial?
- A temática racial é fundamental no Brasil. As crianças negras precisam de estratégias. Os adultos que as rodeiam precisam fortalecê-las para que possam responder ao que vão ouvir ou encontrar pelo caminho. Eu trabalho ludicamente questões duras por meio da literatura usando o combate ao racismo e o empoderamento da criança negra. Busco tratar desses assuntos de forma que a criança possa potencializar ou redescobrir o autoamor. A ancestralidade é uma característica dos meus textos. Ela vem da sabedoria de uma pessoa mais velha que traz conselhos que fundamentam sua fala e sua prática a partir de contextos do que o povo negro viveu no passado. Como alguém que perde suas raízes vai dar conta de projetar o futuro ou viver decentemente o presente? Na hora de mandar textos para editoras, a minha estratégia é sacar da gaveta um texto que vai tocar nas feridas desse país. Não teria efeito algum escrever apenas sobre bichinhos fofos. Os direitos humanos são essenciais. Vamos ver então quais editoras querem bancar isso?
- Como abordar assuntos tão complexos levando em consideração os processos de amadurecimento?
- Com verdade em primeiro lugar. Partindo da realidade de cada um. Quem lida com crianças sabe que elas trazem aquilo que ouvem e que vivenciam no cotidiano. Crianças de quatro ou cinco anos já trazem essas experiências [racistas], ainda que por reproduções. Nenhuma criança nasce racista, mas pode se tornar, como disse Martin Luther King. Se a criança trouxer uma história ou se ouvirmos algo, não podemos deixar passar. No do livro da Tayó, tem uma parte em que outras crianças de sua escola dizem que o cabelo dela é ruim, ao que ela responde: "o meu cabelo é muito bom, porque ele é fofo, lindo e cheiroso. Vocês estão com dor de cotovelo porque não podem carregar o mundo nos cabelos como eu posso". Acho que nunca mais vou ter outra sacada como essa.
- Como se dá a formação da autoestima na infância, segundo sua avaliação e percepção, entre negras e não negras?
- A nossa autoestima é formada a partir dos sim e dos não que recebemos. "Nossa, como você é linda. Olha a cor dos seus olhos, seu cabelo liso, parece uma anjinha." Isso cria na criança não-negra uma autoestima elevada. Ela passa a se gostar porque a criança se vê a partir do olhar do adulto. "Olha esse cabelo, vamos tratar ele? Eu tenho um produto que alisa", dizem à crianças negras. A autoestima parte daí, do olhar adulto que aprova ou reprova. A criança internaliza isso. Quando a violência é grande a criança passa a se achar feia, ruim, ignorante, sem talentos, e ela levará isso para o resto da vida.
- Você acredita que está mais difícil falar de racismo e de direitos humanos hoje do que estava há 30 anos?
- Não. As redes sociais facilitaram muito, porque há 30 anos nós falávamos sobre racismo e as pessoas debochavam. Diziam que vivíamos em uma democracia racial e que negros até casavam com brancos. Com a internet, as pessoas começaram a perceber que não dá mais para dizer que o racismo não existe. Nos últimos três anos a coisa ficou muito escancarada. Do ano passado para cá ficou ainda pior.
- A que você atribui essa piora?
- Eu percebo que isso tem muito a ver com o governo violento. A partir de falas violentas de integrantes do governo, as pessoas passaram a nos ofender diretamente, se reportando a exemplos "maiores" como se tivessem respaldo. Isso vai se espalhar e vai piorar muito.
- Como trabalhar a descoberta da própria racialidade com crianças que tem a pele mais clara e vivem nesse limbo?
- Me lembro de um projeto que participei com crianças de nove anos. Elas me escreviam cartas e eu as respondia. Nas cartas, me diziam "eu sou morena, sou moreno". E eu perguntava o que era ser moreno, fui provocando. Uma das crianças, quando me viu, apertou minha bochecha e disse "professora, finalmente vou saber o que é que é morena". Durante a roda de conversa, uma outra criança disse "morena sou eu". O amigo dela riu e respondeu: "como você é morena? Você é da minha cor e eu sou negro". Quando você está em roda, a criança negra pode não saber que é negra, mas alguém sempre saberá. Um adulto não precisa, do alto do seu conhecimento, dizer isso. Junte as crianças e jogue e veja o que acontece. Questione as crianças. Jean Piaget diz que quando a criança acha que está entendendo tudo, você deve tirar dela um degrau e deixar que escorregue para que seja forçada a reconstruir, por outros caminhos, o conhecimento. Kiusam de Oliveira tem 54 anos e nasceu em Santo André, no estado de São Paulo. Oliveira é mestre em psicologia e doutora em educação pela USP (Universidade de São Paulo). Além dos 27 anos de magistério e 15 como educadora de crianças com deficiência, é autora de três livros infantis, "Omo-Oba: histórias de princesas", "O mundo no black power de Tayó" e "O mar que banha a ilha de Goré".
*”Trans abraçada por Drauzio na TV foi condenada por estupro e morte de criança”* - Suzy Oliveira, detenta transexual abraçada pelo médico Drauzio Varella na edição de 1º de março do Fantástico, da TV Globo, cumpre pena em Guarulhos (SP) por estuprar e matar uma criança com menos de 14 anos usando meio cruel e recurso que impossibilite a defesa da vítima, segundo informou a Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo (SAP). A secretaria não divulga o nome de registro da detenta, mas indica os artigos do Código Penal que levaram à condenação. A reportagem mostrava a situação de pessoas transexuais no sistema penitenciário, e Suzy foi uma das entrevistadas. "Há quanto tempo você está sem receber nenhuma visita na cadeia?", pergunta Drauzio, que conduziu a reportagem e é voluntário no sistema penitenciário desde 1989. "Oito anos, sete anos", responde a detenta. Ele diz: "Solidão, né, minha filha", e dá um abraço na entrevistada. A cena provocou uma mobilização de internautas para que Suzy recebesse cartas, num movimento incentivado inclusive pelo governo paulista, que divulgou o endereço da unidade em que ela está, a Penitenciária José Parada Neto. A partir daí ela recebeu centenas delas, livros, bíblias, chocolate e maquiagens, entre outras coisas.
A produção não informava, entretanto, por qual motivo as entrevistadas haviam sido condenadas, o que provocou especulações ao longo dos dias seguintes dada a extensão de sua pena e o fato de ela não poder progredir para regime semiaberto. Neste fim de semana, quando sites e contas em redes sociais passaram a divulgar o motivo da condenação, depois confirmado pela SAP, o médico e a emissora se tornaram alvos de críticas e ataques nas redes sociais, capitaneados por personalidades conservadoras e bolsonaristas, mas disseminados também em outros grupos. Uma das filhas do médico disse em rede social que passou a receber ameaças físicas, que serão denunciadas. No fim da tarde desta segunda, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se manifestou sobre o caso, declarando que "enquanto a Globo tratava um criminoso como vítima, omitia os crimes por ele praticados". O presidente enalteceu "a internet livre" por disseminar a razão do crime e lamentou o veto à prisão perpétua na Constituição.
Mais cedo, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, chamara a TV globo de “lixo” “a serviço do mal”, e o procurador da República Ailton Benedito escrevera que “está claro que um dos objetivos da ‘reportagem’ era ocultar a verdade sobre os crimes das transexuais, para obter apoio da sociedade enganada para a causa político-ideológica da Globo”. Houve reações do lado da esquerda, como da deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP), que afirmou que a condenação ao abraço de Drauzio veio de pessoas quem votaram em "um homem que elogia torturadores". A maior parte das críticas, no entanto, não ocorreu pelo abraço dado pelo médico, mas pela omissão na reportagem do crime que levou à condenação, o que teria gerado simpatia pela personagem e levado centenas de pessoas a enviarem cartas afáveis a ela.
No fim do domingo (8), Drauzio publicou nota em suas redes sociais em que disse que não perguntou os crimes cometidos pelas entrevistadas e afirmou ser médico, não juiz. “Há mais de 30 anos, frequento presídios, onde trato da saúde de detentos e detentas. Em todos os lugares em que pratico a Medicina, seja no meu consultório ou nas penitenciárias, não pergunto sobre o que meus pacientes possam ter feito de errado. Sigo essa conduta para que meu julgamento pessoal não me impeça de cumprir o juramento que fiz ao me tornar médico. No meu trabalho na televisão, sigo os mesmos princípios. No caso da reportagem veiculada pelo Fantástico na semana passada (1/3), não perguntei nada a respeito dos delitos cometidos pelas entrevistas. Sou médico, não juiz.” Na mesma noite, o Fantástico voltou ao tema em nota lida pelos apresentadores na qual responde que não informou o motivo que levou as detentas à prisão porque "este não era o objetivo da reportagem". A produção abordava as condições de vida das detentas, mas não questionava o sistema judicial nem advogava contra as razões da prisão. O texto institucional afirma, também, que o Fantástico apoia integralmente a nota de Drauzio. A própria Suzy, por meio de sua advogada, divulgou uma carta na qual apresenta-se também pelo nome Rafael Tadeu e diz não ter sido indagada sobre o motivo de sua condenação. "Eu sei que errei e muito. [Em] Nenhum momento tentei passar como inocente e desde aquele dia me arrependi verdadeiramente, e hoje estou aqui pagando por tudo que cometi." Drauzio, que é colunista da Folha, afirmou que não vai se pronunciar sobre o caso além do que já declarou na nota.
+++ A discussão simplista a que se limita a reportagem da Folha não colabora para o debate dentro da sociedade.
MÔNICA BERGAMO - *”Governo perde guerra nas redes e Congresso decide deixá-lo falando sozinho”*: A reação moderada de lideranças da Câmara dos Deputados e do Senado em relação à convocação de Jair Bolsonaro para as manifestações do dia 15 foi deliberada. Há uma convicção de que é preciso deixar o presidente falando sozinho —e não mais mergulhar em pautas determinadas por ele que desviam a atenção de problemas como o turbilhão econômico que varre o mundo. A análise política coincide com as de especialistas em monitoramento de redes sociais: a pauta econômica desgasta Bolsonaro e mudar de assunto o favorece. A consultoria Arquimedes coletou 208 mil manifestações de 2 a 6 de março sobre o PIB: 81,16% eram desfavoráveis ao governo. Um estudo da AP Exata distribuído a bancos e empresas e que circulou entre autoridades na segunda (9) dizia que “o governo vem perdendo a guerra da dominância narrativa nas redes. Seus apoiadores fazem muito barulho, mas só têm influenciado uma bolha cada vez mais radicalizada”. Se antes a capilarização abrangia outras bolhas, como a anti-PT, anti-corrupção ou a moralista, ela agora está “focada apenas no público que o idolatra”, diz Sergio Denicole, da AP Exata. A militância nas redes “já não consegue ultrapassar essa barreira, mesmo com a atuação de perfis de interferência que defendem o bolsonarismo nas redes”, como robôs, perfis fakes e adeptos. De acordo ainda com a análise distribuída pela AP Exata, isso explica o fato de Bolsonaro “ter convocado pessoalmente as pessoas às ruas”. Os analistas afirmam, no entanto, que os protestos do dia 15 podem ter volume, já que a bolha de apoiadores do presidente segue numerosa —apesar de mais restrita e radical. Os organizadores das manifestações de oposição marcadas para o dia 18 acreditam que o tamanho delas estará condicionado ao dos movimentos pró-Bolsonaro.
MÔNICA BERGAMO - *”Cartas de crianças não foram entregues a Suzy, diz administrador de presídios”*
MÔNICA BERGAMO - *”Lula não fala de candidatura com Haddad e PT de SP perde esperança”*: Fernando Haddad comunicou oficialmente ao PT municipal que não será candidato a prefeito. “A gente ainda alimentava uma expectativa. Tinha um boato de que o Lula, na viagem a Paris [em que foi acompanhado pelo ex-prefeito], o convenceria”, diz Laércio Ribeiro, presidente da legenda. “Mas eles nem tocaram no assunto, o Lula não falou nada”, segue. Na volta, Ribeiro procurou Haddad e ouviu dele que está definitivamente fora da disputa. O comunicado coincide com o lançamento da pré-candidatura de Guilherme Boulos, com ex-prefeita Luiza Erundina como vice.
A chapa aumenta a pressão sobre o PT por disputar com o partido o eleitorado de centro-esquerda.
MÔNICA BERGAMO - *”Skaf avisa MDB que está com um pé fora do partido”*

CAPA – Manchete principal: *”Guerra do petróleo e coronavírus elevam risco de recessão mundial”*
EDITORIAL DO GLOBO - *”Crise pressiona pela aceleração das reformas”*: O Brasil com Jair Bolsonaro no Planalto enfrenta uma turbulência financeira mundial com todas as características para rivalizar com a crise deflagrada em 2008, a partir do desmoronamento do sistema financeiro americano causado por enorme bolha especulativa no mercado de hipotecas, e que levou o mundo à recessão. Ainda é cedo para prognósticos seguros, mas a queda profunda das bolsas ao redor do planeta, à medida que os mercados abriam no Oriente, na noite de domingo e madrugada de ontem — um movimento em série que invadiu o Ocidente, contaminando Europa e Américas —, coloca o presidente da Republica diante de tarefas urgentes. Mercados tiveram quedas recordes, forçando o acionamento de freios (“circuit breakes”) que suspendem o pregão por um determinado tempo, para evitar um pânico maior. Aconteceu em Wall Street, que fechou com uma queda de 7,6%, no pior dia desde dezembro de 2008; e no Brasil (Ibovespa), onde as ações mergulharam 12,17%, pior resultado diário neste século. Ainda na noite de domingo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, divulgou pelo Twitter uma correta conclamação a que os poderes da República atuem com harmonia e espírito democrático, para que a crise vire uma “oportunidade de se somar forças em busca das soluções necessárias e urgentes”. Maia garantiu que “o Congresso está pronto para avançar com as reformas capazes de restabelecer a confiança”. Recado direto para Bolsonaro enviar enfim ao Legislativo a reforma administrativa e as propostas de mudanças tributárias, a se somarem aos dois projetos que já tramitam no Congresso. O ministro da Economia, Paulo Guedes, também deseja pressa.
Em vez de se dedicar à luta política, o presidente precisa agir de forma coordenada com os demais poderes, no acertado entendimento de Maia. Necessidade idêntica é colocada à frente de países. Em 2008/9, a atuação do Banco Central americano, Fed, com Ben Bernanke na direção-geral, tornou-se decisiva no combate às fortes pressões recessivas. Os juros foram praticamente zerados. Com este instrumento fora de combate, logo o Fed começou a emitir dinheiro por meio da compra, em grandes quantidades, de títulos encalhados nas carteiras privadas, pelo programa batizado de “quantitative easing”, afrouxamento monetário. Bancos faliram, mas não houve uma quebradeira. Os BCs europeus seguiram a cartilha. Mais uma vez as taxas de juros no planeta estão muito baixas. Novamente será necessário acionar outros mecanismos. A boa experiência na crise iniciada em 2008 é uma vantagem que o mundo tem. Pode-se chamar de “tempestade perfeita” a conjugação dos efeitos do coronavírus na economia mundial, devido à paralisação de cadeias globais de produção provocada pelo fechamento de fábricas de componentes na China, coma decisão da Arábia Saudita de fazerdes abar em cerca de 30% a cotação internacional do petróleo, numa desavença sobre cortes na produção coma Rússia. Turbina a crise do coronavírus. Altas doses de incertezas foram injetadas

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