segunda-feira, 23 de março de 2020

Mídia 23/03

DOS JORNAIS DE HOJE: Folha de S. Paulo e Estadão publicam pesquisas de opinião sobre a atuação de Jair Bolsonaro na crise do coronavírus. O Datafolha indica que o apoio ao presidente se mantém e que é maior entre homens. Já a pesquisa Ibope publicada pelo Estadão toma como base apenas a cidade de São Paulo, na qual 40% consideram a atuação de Bolsonaro péssima e 8% a consideram ruim. Novamente, a parcela que mais apoia o presidente é de homens. As duas pesquisas detectaram que mulheres, jovens, pobres e negros são os que menos apoiam Bolsonaro.
A epidemia mantém todas as atenções no governo federal. A crise com o Congresso ficou em segundo plano, apenas temas como a possibilidade de adiar as eleições geram embate entre as partes na imprensa. O conflito agora é de posições entre Bolsonaro e diversos especialistas que são ouvidos pelos jornais. A Folha entrevistou o economista Eduardo Gianetti, o Globo entrevistou um urologista professor da USP que critica a postura do governo federal. Já o Valor, entrevistou um diplomata brasileiro que foi embaixador na China. Ele falou sobre o incidente diplomático provocado por Eduardo Bolsonaro e Ernesto Araújo.
Além disso, o noticiário foca em disseminar informações sobre o coronavírus como números sobre a doença e cuidados a serem tomados pela população. Outro assunto presente é a situação econômica. Folha, Estadão e Valor Econômico abordam um encontro do presidente da Caixa com empresários como o presidente da XP que pediram a implementação de um ‘plano Marshall’ para salvar a economia. Além disso, foi dito nessa conversa que o Brasil pode atingir a marca de 40 milhões de desempregados. Os jornais ainda tratam da injeção de dinheiro na economia pelo BNDES. O Valor Econômico publica reportagem sobre o acordo Boeing/Embraer que estaria sendo reavaliado pela empresa estadunidense.
O jornal O Globo foi o único a publicar reportagem sobre a organização de grupos em favelas do Rio de Janeiro para gerar consciência sobre o coronavírus. Pouco tem se falado nos jornais sobre as condições de vida nas áreas pobres do país e como estas podem ser afetadas pela epidemia. O médico entrevistado pelo jornal carioca afirma que o número de leitos hospitalares no Brasil por habitante é muito baixo, que está abaixo do nível de países em que a epidemia atingiu os maiores números.
 
 
CAPA – Manchete principal: *”Atuação de Bolsonaro na crise tem pior avaliação”*
EDITORIAL DA FOLHA - *”Vírus eleitoral”*: Em política, perdoe-se o lugar-comum, toda crise é uma oportunidade. Não haveria de ser diferente com essa que talvez seja a maior emergência sanitária que o país enfrentou na sua história recente, a pandemia do coronavírus. Desde que o regime de urgência instalou-se entre autoridades de saúde do país, foi possível discernir com clareza o grau de comprometimento de diversas autoridades. O chefe de Estado tratou o tema com ligeireza. "Histeria" e "gripezinha" foram expressões usadas por Jair Bolsonaro acerca da Covid-19. Após a irresponsável participação em atos contra outros Poderes, houve uma inflexão atabalhoada, mas ao menos o presidente começou a reconhecer a emergência. Já o ministro Luiz Henrique Mandetta (Saúde), conduz um trabalho visto como técnico --a controversa proposta de adiar as eleições municipais foi feita após a pesquisa. E os governadores assumiram o papel de gestores de crise. Alguns podem ter sido draconianos antes do tempo, como Ibaneis Rocha (MDB-DF), mas ninguém quis ser visto como omisso. O exemplo mais evidente está em São Paulo, onde João Doria (PSDB) tornou-se face pública da comunicação dos esforços no estado. O resultado é aferível na pesquisa Datafolha publicada nesta segunda. Ali, Bolsonaro tem 35% de aprovação a seu trabalho na crise --ante reprovação quase idêntica, de 33%. Em comparação, governadores (cada entrevistado avaliou o de seu estado) têm 54% de menções positivas, e a pasta da Saúde, 55%.
Clivagens da eleição de 2018 ainda são visíveis, como o Nordeste liderando a rejeição ao Planalto --cujo desempenho, na região, é considerado péssimo ou ruim por 41%. Se as presepadas do presidente são amplamente reprovadas (84% entendem que ele agiu mal ao confraternizar-se com manifestantes), nem tudo é má notícia para ele. Ressalvando o fato de que a metodologia da atual pesquisa, realizada por telefone, a torna incomparável com os usuais levantamentos presenciais, os 35% de aprovação são compatíveis com o apoio médio que Bolsonaro vinha registrando. Indica-se assim preservação desse contingente do eleitorado. Há pontos de dissonância, contudo. Num segmento em que o presidente sempre teve maior apoio, o daqueles mais ricos, a reprovação a sua gestão de crise é de 51%. Novamente, o dado demanda reavaliação mais aprofundada, mas sugere que o dano à imagem presidencial evidenciado pelos panelaços em áreas que votaram em Bolsonaro parece estar se enraizando. Na via oposta, governadores que miram o Planalto no pleito de 2022, como Doria ou Wilson Witzel (PSC-RJ), terão de encontrar um ponto de equilíbrio se não quiserem ver suas ações contra a pandemia confundidas com peças de campanha.
PAINEL - *”Empresários defendem confinamento para enfrentar coronavírus e salvar economia”*: Empresários passaram a pedir aos governos estaduais e ao comitê de crise do governo federal que determinem o confinamento da população como medida fundamental para a crise do coronavírus. Eles partem da avaliação de que a paralisação da economia é irreversível, mas avaliam que a decisão pode acelerar a retomada. Eles pedem a continuação dos serviços essenciais para abastecimento, mas usam a China como exemplo para defender a necessidade do isolamento. Os pedidos têm sido feitos desde a semana passada e foram reforçados na reunião com o presidente Jair Bolsonaro, na sexta (20). O empresário Abílio Diniz foi um dos mais enfáticos. Representantes de outros setores produtivos também defendem a ideia, como única alternativa para a turbulência passar rápido.
PAINEL - *”Ministro do STF envia minuta de PEC de semipresidencialismo a políticos que o procuram sobre crise”*: O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, enviou nos últimos dias a parlamentares a minuta de uma proposta de Emenda à Constituição (PEC) que transforma o regime brasileiro em semipresidencialista, redigida por ele em 2017. O texto era uma resposta aos que escreviam para pedir ideias sobre o que fazer neste momento de crise, diante da inépcia do presidente Bolsonaro. O ministro defende abertamente a proposta desde que presidia o Tribunal Superior Eleitoral. A parlamentares, Gilmar Mendes disse que seria para mandatos futuros, com mais chance de aprovação.
PAINEL - *”Procuradoria diz que comitê criado por Bolsonaro e STF é 'ameaça de devastação constitucional'”*: A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão enviou ao Congresso neste domingo (22) um posicionamento no qual classifica como "ameaça de devastação constitucional" o projeto de lei que cria um comitê nacional de órgãos de Justiça para evitar litígios durante a crise do coronavírus. O órgão aponta que, se essa legislação já estivesse em vigor, nenhuma das recomendações feitas pelo Ministério Público Federal, relativas ao bolsa família, a situações de despejos e atenção à população em situação de rua no contexto da doença poderiam ter sido feitas.
PAINEL - *”Governo de SP entra com mais de 50 ações judiciais por crise do coronavírus”*
*”Avaliação de Bolsonaro na gestão da crise é muito pior que a de governadores e ministério, diz Datafolha”* - Em crescente disputa com governadores de estado acerca da condução da crise do coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro é pior avaliado do que eles neste quesito. É o que revela pesquisa do Datafolha, que ouviu 1.558 pessoas de 18 a 20 de março. Feita por telefone para evitar contato com o público, ela tem margem de erro de três pontos para mais ou para menos. Bolsonaro tem sua gestão da pandemia aprovada por 35%, enquanto governadores são vistos como ótimos ou bons em seu trabalho por 54%. Mesmo o Ministério da Saúde é mais bem avaliado que o presidente: 55% aprovam o trabalho da pasta de Luiz Henrique Mandetta. Bolsonaro tem protagonizado episódios polêmicos desde que o novo coronavírus tornou-se o tema central de governos de todo o mundo, nas últimas semanas. Primeiro, o presidente minimizou o perigo, dizendo que se tratava de “histeria" propalada pela mídia. Depois, insuflou manifestações públicas em seu favor e contra outros Poderes. No dia 15, participou de ato e abraçou pessoas mesmo estando sob recomendação de isolamento devido aos casos de contaminação na comitiva de sua viagem aos EUA.
A esses episódios se colocaram em oposição governadores como João Doria (PSDB-SP) e Wilson Witzel (PSC-RJ), que têm enfrentado com graus draconianos diferentes a crise, mas adotando atitudes proativas enquanto criticam o Planalto. O paulista, particularmente, tem buscado apresentar-se como um líder mais responsável e com apelo nacional —no sábado (21), sugeriu que moradores do estado colocassem bandeiras do Brasil em suas janelas como forma de união na crise. Mesmo Mandetta acabou na linha de tiro de Bolsonaro, já que desobedeceu o chefe e apoiou pessoalmente os esforços de Doria, que governa o estado mais afetado do país. A situação aparentemente se acalmou quando o ministro participou de entrevista coletiva com Bolsonaro na quarta (18), na qual teceu vários elogios ao presidente. A taxa de aprovação ao trabalho de Bolsonaro se confunde com o apoio que ele vem registrando nas últimas pesquisas, o que indica uma cristalização de sua base. Igualmente, consideram ruim ou péssima sua gestão da crise 33%, enquanto 26% a avaliam como regular e 5%, não sabem. Naturalmente, isso precisa ser aferido por pesquisas com metodologias idênticas, já que a atual foi feita por telefone e a série histórica de aprovação do presidente é colhida presencialmente. Outro dado significativo, que deverá influenciar os crescentes debates acerca da governabilidade sob Bolsonaro, é que apenas 15% dos ouvidos que votaram nele no segundo turno se dizem arrependidos. Isso impactará a formulação de táticas de políticos que vinham apostando no desgaste mais acentuado do presidente, levando a ruptura.
Por outro lado, quem se arrepende assume uma visão mais crítica do presidente. Isso em relação ao conjunto avaliado em perguntas acerca do desempenho de Bolsonaro. Mas o transbordo da polarização política para a avaliação do desempenho presidencial não se verifica, contudo, de forma imediata na estratificação de resultados. Alguns grupos que usualmente apoiam o presidente mantêm sua aprovação no caso do vírus, como os homens (42% de ótimo e bom, ante 29% das mulheres). Mas o presidente perde apoio significativo entre os mais ricos (renda acima de 10 salários mínimos, 51% de ruim/péssimo) e mais instruídos (com ensino superior, 46%). Isso pode sugerir um padrão de mudança, especialmente se a situação econômica se deteriorar ainda mais devido à pandemia. Já o corte regional reproduz, de grosso modo e a despeito das diferenças metodológicas, o padrão dos mapas de orientação política recentes. A condução do Planalto da crise é rejeitada por 41% dos nordestinos, 34% dos moradores do Sudeste, 24% daqueles do Norte e Centro-Oeste e 23% dos sulistas. Como se vê, o Sul segue uma fortaleza do bolsonarismo —lá, ele registra a maior aprovação de desempenho sobre o coronavírus, 42%.
Também é notável que o apoio aos governadores não é necessariamente em oposição ao do presidente. Segundo um cruzamento feito pelo Datafolha, o índice de aprovação de governadores na crise chega a recordistas 69% justamente entre aqueles que também avaliam bem o trabalho de Bolsonaro. O Sul é a região em que os chefes estaduais estão mais bem avaliados, com 61% de ótimo e bom. A seguir vêm Norte/Centro-Oeste (56%), Sudeste (52%) e Nordeste (51%). As atitudes mais notórias de Bolsonaro na crise foram mal avaliadas pela população, indica a pesquisa. Concordam com a avaliação presidencial de que há “histeria” acerca do novo coronavírus 34% dos ouvidos, enquanto a assertiva é rejeitada por 54%, ante 3% que nem concordam nem discordam e 8% que dizem não ter opinião. Já o episódio do ato na praça dos Três Poderes, no dia 15, foi reprovado por 68% e aprovado por 27%, enquanto 4% não opinaram. Aqui, quando se cruza a questão com o índice daqueles que têm muito medo do coronavírus (36% da população), a taxa de reprovação sobe 78%. Como a Folha mostrou neste domingo (22), a população brasileira está assustada com a emergência sanitária causada pela pandemia. Para 88%, trata-se de uma questão séria.
Além dos 36% que se dizem com muito medo, há outros 38% que relatam ter um pouco de temor. A chance de ser infectado pelo patógeno é estimada como possível por 83% (20% alta, 33% média e 30%, baixa). Hábitos diversos foram mudados e, para 73%, medidas mais duras como a quarentena que foi anunciada por São Paulo no sábado (21) são necessárias e desejáveis. O comportamento do presidente continua sendo um fator de divisão. Para 20%, ele se comporta de maneira adequada ao cargo sempre, e 27% acham que ele o faz na maioria das vezes. Na outra metade, 26% creem que Bolsonaro não se porta como um presidente, e 20%, que ele é assim na maior parte das vezes. O grupo que rejeita totalmente a forma com que Bolsonaro se comporta salta para 34% entre aqueles com nível superior, grupo que usualmente dá mais apoio a ele. A pesquisa apresenta um quadro desafiador e nuançado para o presidente, que vinha perdendo apoio político de forma acelerada devido à crise com o Congresso acerca do manejo de R$ 30 bilhões do Orçamento. A questão esteve no cerne dos atos contra o Legislativo e o Supremo Tribunal Federal no dia 15, que não foram maciços, mas reverberaram pela presença de Bolsonaro. A crise agora ganhou o componente imprevisível do coronavírus, que exigirá respostas políticas responsáveis, mas que serão consideradas ativos eleitorais em 2022.
PESQUISA FOI FEITA POR TELEFONE PARA EVITAR CONTATO COM PÚBLICO
A pesquisa Datafolha realizada de quarta (18) a sexta-feira (20) utilizou o método telefônico para evitar o contato pessoal entre pesquisadores e os 1.558 entrevistados em meio à pandemia. Os limites impostos pela técnica telefônica não prejudicaram as conclusões devido à amplitude dos resultados apurados e pelos cuidados adotados. A margem de erro é de três pontos percentuais para mais ou menos. Esse método não se compara à eficácia das pesquisas presenciais feitas nas ruas ou nos domicílios. É por isso que, apesar de aproximadamente 90% dos brasileiros possuírem acesso pelo menos à telefonia celular, o Datafolha não adota esse tipo de método em pesquisas eleitorais, por exemplo. O método telefônico exige questionários rápidos, sem utilização de estímulos visuais, como cartão com nomes de candidatos. Além disso, torna mais difícil o contato com os que não podem atender ligações durante determinados períodos do dia. Assim, mesmo com a distribuição da amostra seguindo cotas de sexo e de idade dentro de cada macrorregião, e da posterior ponderação dos resultados segundo escolaridade, os dados com o método telefônico não são comparáveis com pesquisas de rua.
ANÁLISE - *”Ministro da Saúde alivia, mas não anula desgaste de Bolsonaro na crise, mostra Datafolha”*
*”Veja quem são os 23 infectados da comitiva de Bolsonaro em visita aos EUA”*
*”Ministro da Saúde defende adiar eleições municipais por coronavírus, mas Maia e Barroso resistem”*
*”Jornais brasileiros unificam capas em combate ao coronavírus”*
KARINA KUFA E PEDRO SUAVE - *”Ao matarmos o tempo buscamos a fuga, ignorando as lições de Fernando Pessoa”*
CELSO ROCHA DE BARROS - *”Derrubar Bolsonaro ajudaria ou atrapalharia o combate à epidemia?”*
*”Crise do coronavírus cria apreensão, força dispensas e molda rotina no Congresso”*
*”Morre Lila Covas, ex-primeira-dama do estado de São Paulo”*
*”Líderes adotam discursos de guerra contra pandemia”*
*”Merkel adota auto-isolamento depois que médico que a atendeu teve contágio por coronavírus confirmado”*
*”Boris lança ofensiva para manter 1,5 milhão de doentes em casa e evitar sobrecarga de hospitais”*
*”Portugal vai repatriar 1.300 passageiros de cruzeiro que chegou a Lisboa do Brasil”*
*”Cuba e Rússia enviam médicos para ajudar Itália no combate ao vírus”*
*”Chile decreta toque de recolher a partir deste domingo”*
*”EUA instalarão hospitais de campanha nos pontos mais afetados pelo coronavírus”*
ENTREVISTA DA 2ª - *”'Descontentamento contra Bolsonaro na pandemia pode levar país a conflagração', diz Eduardo Giannetti”*: O economista e filósofo Eduardo Giannetti da Fonseca vê sinais de descontentamento social contra o governo Jair Bolsonaro que podem crescer na esteira da crise do coronavírus, levando o país a uma conflagração. “Podemos ter uma situação de privação material gravíssima. A próxima onda de descontentamento já está começando a se erguer”, diz. Um dos intelectuais mais respeitados do país, Giannetti tem estudado os movimentos sociais que se tornaram cíclicos desde junho de 2013, quando o reajuste de tarifas de transporte deflagrou protestos em várias cidades. “Houve uma perda, possivelmente irreparável, de capital político pelo equívoco cometido diante da crise atual”, diz o economista, que foi assessor de Marina Silva nas três candidaturas presidenciais dela. Segundo ele, ao agir como um “sub-Trump” —referência ao presidente dos EUA, Donald Trump—, Bolsonaro acreditou que poderia empurrar o custo das medidas necessárias à contenção da propagação do coronavírus para o futuro. “É uma postura negacionista igualzinha à que eles têm em relação à mudança climática, o mesmo menosprezo pela ciência. Mas com uma diferença: a temporalidade da pandemia não é a mesma da mudança climática.” Giannetti acrescenta que, como a fatia da população vulnerável no Brasil é muito maior que a de países ricos, a tendência é que os efeitos econômicos adversos da crise sejam mais acentuados aqui. Mas ele vê a chance de um efeito colateral positivo da calamidade: “Se esta crise tiver como efeito colateral a corrosão, a destruição e a redução a pó dessa direita populista, ela não terá sido totalmente perdida. Lideranças desse tipo colocam em risco à humanidade”.
- Por que o coronavírus levou a uma pandemia? 
- Crises de saúde pública e propagação de doenças contagiosas são uma constante na história. Nada seria menos improvável do que um mundo em que eventos de baixíssima probabilidade nunca acontecem. Eles acontecem. A diferença é que, no passado, eram locais; agora, são globais. Além disso, nos últimos 12 meses, o mundo ficou mais imprevisível.
- Por quê? 
- Há três razões. Aumentou muito a interdependência na produção, nas finanças, no transporte, no comércio. O fato de as pessoas viajarem muito hoje deu uma outra dinâmica à propagação dessa doença. O segundo fato é a tecnologia. Ela nos faz ficar com o radar ligado permanentemente e propaga com uma rapidez de vírus situações de aguda incerteza em relação ao futuro. O terceiro ponto é que estamos em um território novo em termos de política, que é a polarização raivosa. Ela aumenta a imprevisibilidade.
- Como isso ocorre? 
- A guerra comercial entre EUA e China foi, claramente, motivada pelo projeto de perpetuação no poder de Trump. A iniciativa de bombardear o Iraque foi uma medida intempestiva, sem aval do Congresso, que só um presidente desgovernado faz, ameaçando levar a humanidade a uma guerra.
- Essa forma de governar tem levado a falhas de política pública? 
- Sim . E o Bolsonaro é um sub-Trump. Ele copia mal o que o Trump faz nos EUA. A reação inicial de Trump e Bolsonaro à epidemia foi minimizar. Dizer que era uma histeria, um falso alarme da mídia, que não afetaria a economia. É uma postura negacionista igualzinha à que eles têm em relação à mudança climática, o mesmo menosprezo pela ciência, pelas evidências e também pelo futuro. Mas com uma diferença: a temporalidade da pandemia não é a mesma da mudança climática. Eles foram atropelados e, felizmente, vão sofrer uma enorme erosão de seu capital político.
- Há ignorância por trás dessa postura ou é uma estratégia? 
- Isso é puramente estratégia de perpetuação no poder. As pessoas se incomodam com cenários ameaçadores. O raciocínio deles é de cálculo eleitoral. Se a economia continuar indo bem, eu me reelejo. Então, não vou tomar as medidas necessárias para conter a expansão da epidemia que vão prejudicar a economia, porque isso mina a minha condição de reeleição. Mas a realidade se encarregou de atropelá-los, porque ela tolera desaforo até um certo ponto, depois, não mais. Se essa crise de saúde pública tiver como efeito colateral a corrosão, a destruição e a redução a pó dessa direita populista, ela não terá sido totalmente perdida. Lideranças desse tipo colocam em risco a humanidade. Eles perderam totalmente o pé da situação. Os dois [Bolsonaro e Trump], agora, parecem cachorros com o rabo entre as pernas e estão em apuro político. Bolsonaro chegou a desautorizar, com ações, as recomendações de seu ministro da Saúde. Ele encarna o pequeno corporativismo brasileiro, age olhando para seu eleitorado potencial e tentando favorecê-lo. O tempo todo. Na reforma da Previdência aos militares, na sublevação das polícias civis e militares, favorecendo os canais de televisão que o apoiam. Ele é a encarnação do que há de mais mesquinho no corporativismo brasileiro.
- Já há sinais de como a população está reagindo a essa postura do presidente? 
- Eu não tenho elementos de pesquisas, mas tudo o que eu observo em conversas, encontros, os panelaços, o sentimento geral que eu detecto é que eles, realmente, sofreram uma perda, possivelmente irreparável, do seu capital político pelo equívoco que cometeram. A crise revela a qualidade do líder. Tem líderes que crescem em uma crise e outros que encolhem. Claramente, Trump e Bolsonaro encolheram. Com a mudança climática, a temporalidade não permite que isso aconteça, mas o coronavírus os desmascarou.
- Como o sr. avalia os anúncios de medidas econômicas no Brasil contra crise?
- A notícia de hoje [sexta, 20] é o conflito entre o presidente e os governadores. Era só o que faltava, dentro do Estado brasileiro cada um dizendo uma coisa. O conflito entre Executivo, Legislativo e Judiciário. No meio desta crise, o presidente participa de um movimento contra os Poderes da República.
- O que mais lhe preocupa em termos econômicos? 
- Temos uma situação de profunda desigualdade e de população vulnerável economicamente muito mais séria do que nos países maduros. São pessoas que vivem com o orçamento muito apertado a cada mês e que vão perder a renda. Acho que R$ 200 [ajuda proposta pelo governo para os mais vulneráveis] é pouco. Não vai dar conta. É o contingente enorme de brasileiros que vive um dia de cada vez —e estamos falando de dezenas de milhões— que deve ser o foco maior de preocupação.
- Como o governo pode aumentar gastos no atual contexto de aperto fiscal? 
- O Estado brasileiro tem três caminhos. Ou ele tributa, o que, no momento, é totalmente inviável. Pelo contrário, vai cair muito a arrecadação e ele será mais flexível na cobrança dos impostos, o que é correto. Ou ele se endivida, ou seja, joga a conta para gerações futuras. Ou ele faz emissão primária, expande a base monetária. Se houver demanda voluntária por dívida pública, será esse o caminho. Se não houver, ele vai gastar imprimindo dinheiro.
- Esse terceiro cenário não causaria inflação? 
- Essa relação não é tão direta e tão linear. Na crise de 2008 e 2009, os bancos centrais expandiram brutalmente seus passivos e fizeram emissão primária em doses cavalares, e não veio uma onda de inflação porque essa massa financeira não foi exercida como poder de compra. Como a demanda estará muito deprimida, acho que a emissão primária agora não terá impacto. Mas a prerrogativa do governo de criar dinheiro do nada é um brinquedo muito perigoso. É a bomba atômica econômica. É uma tecnologia para ser usada com muita parcimônia, em circunstâncias muito especiais. Não pode virar, como já ocorreu no Brasil, um novo modo de vida.
- Em que o governo deveria gastar neste momento? 
- Em saúde pública e assistência direta às pessoas —que, de outra maneira, vão morrer de fome ou ficar em uma situação desesperadora— e em situações que geram renda, como investimentos em saneamento.
- Há o risco de que o tecido social brasileiro não aguente mais essa crise? 
- Podemos ter uma situação de privação material gravíssima para milhões de brasileiros e podemos caminhar para algum tipo de onda de descontentamento que gere conflagração. Tenho acompanhado as sucessivas ondas de descontentamento que tem se visto no Brasil desde 2013. A próxima onda já está começando a se erguer, aparentemente, vai ser contra o Bolsonaro. Assim como uma onda o elegeu, muito baseado no sentimento antipetista, essa mesma dinâmica, que é muito violenta de um tempo para cá no Brasil, pode desaguar em uma situação de contestação popular ampla da legitimidade desse status quo.
- O sr. vê motivos para a abertura de um impeachment? 
- Impeachment não é “recall”. Não temos esse instituto. Tem de ter um fato jurídico muito definido e sustentado. Francamente, não vejo ainda esse ato que justificaria a gravidade de um impeachment, por mais que meu desejo pessoal seja que este governo termine o mais rapidamente possível. Mas acho que o melhor efeito dessa crise pode ser derrubar essa mascarada, essa chanchada macabra.
- Nas urnas? 
- Sim. O ideal, para Bolsonaro e seu grupo político, é, de novo, uma polarização com o Lula e o petismo. Para o país, seria realmente um desastre. Acho que temos de unir as forças do campo democrático progressista como elas se uniram contra a ditadura militar. Hoje, temos um inimigo que é igual ou pior que o regime militar. Se não conseguirmos nos unir em uma oposição democrático-progressista, com um projeto que seja aceito por todos, vamos polarizar de novo, e a chance de eles continuarem aumenta muito.
- Por que o governo Bolsonaro é igual ou pior que a ditadura militar? 
- Porque ele ameaça destruir todas as conquistas que tivemos no Brasil da redemocratização para cá. A ordem democrática, o início de um processo de redistribuição de renda, de direitos de minorias. É uma ameaça de retrocesso e de uma nova forma de autoritarismo que acho gravíssima e que, no plano simbólico, já está mais do que escancarada. Eles trabalham para criar uma situação de conflagração em que se justifique um gesto de ruptura.
*”Possível corte no salário e quarentena exigem faxina no orçamento familiar”*
PAINEL S.A. - *”Presidente de dona da Sadia defende cautela para evitar desabastecimento”*: Quando as primeiras medidas de restrição de circulação começaram a ser discutidas por estados e municípios, na semana passada, levantando preocupações com o abastecimento de alimentos, Lorival Luz, presidente da BRF (dona das marcas Sadia e Perdigão), assumiu nova atribuição: explicar a cadeia produtiva, destacando, desde a importância de ter borracharia nas estradas até as embalagens. Na sexta, em conferência com Bolsonaro e empresários, Luz falou da necessidade de preservar o fornecimento. “A nossa indústria começa no produtor que colhe o grão. Precisa de um caminhão com um motorista para levar à fábrica de rações, onde alguém tem de estar trabalhando, e depois distribuir para granjas, incubatórios de aves, suínos”, afirma Luz. Se a cadeia for rompida, os animais morrem, disse o executivo à coluna. “E gera um outro problema, que é o processamento sanitário dessa enorme quantidade de animais”, afirma. “Depois começa uma segunda etapa: o transporte até as fábricas. Lá, o nosso time produz, faz nuggets, presunto, lasanha. É uma atividade de pessoal intensivo e precisa de embalagens, que chegam de caminhão. Se fura um pneu, precisa ter uma borracharia”, diz Luz. O executivo segue explicando em detalhes o caminho até a prateleira do supermercado e pequeno varejo de bairro, onde há mais trabalhadores para repor os produtos. Neste domingo (22), entidades do setor como Abia(alimentos), Abicab (chocolates e balas), Abrafrigo (frigoríficos), ABPA (proteína animal), Abir (refrigerantes)e Abiec (indústrias exportadoras) convocaram um aplausaço nas janelas para homenagear seus trabalhadores da indústria de alimentos.
PAINEL S.A. - *”Sindicatos buscam acordo com empresas para evitar corte de emprego e salário”*: Críticos à proposta do governo de cortar salários e jornada em até 50% na crise do coronavírus, sindicatos estão buscando seus próprios acordos com as empresas. Para o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, as medidas para proteger empregos estão sendo tomadas de forma autoritária. Alvaro Ferreira, da central CSB, diz ter recebido dezenas de chamados de empresas de confecção desde quinta (19). Cinco acordos foram fechados, a maior parte flexibilizando regras de férias. A CUT também vê tendência de negociação.
PAINEL S.A. - *”Consumidor vai economizar com brinquedo e item de moda, diz consultoria”*
PAINEL S.A. - *”Empresa de ônibus se queixa de medidas que atingem o setor”*
*”Fundador da XP pede Plano Marshall contra coronavírus”* - O fundador da XP Investimentos, Guilherme Benchimol, disse neste domingo (22) que o governo brasileiro precisa de um Plano Marshall para evitar que o país enfrente uma situação de caos social gerado por desemprego durante o enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. O plano conhecido como Marshall foi conjunto de medidas para a reconstrução da Europa depois da Segunda Guerra Mundial. No sábado, a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) disse que a crise do coronavírus exige um novo plano do tipo. Em videoconferência com a participação do presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, Benchimol considerou não ser improvável que o Brasil chegue a 40 milhões de desempregados até o fim do segundo trimestre. Ele citou a previsão apresentada neste domingo à agência Bloomberg por James Bullard, do Fed de St. Louis, de que a taxa de desemprego nos Estados Unidos poderá chegar a 30% em meio à paralisação da atividade econômica. Apresentado como interlocutor da equipe econômica, o presidente da Caixa foi mais de uma vez cobrado de um plano mais estruturado de incentivos e crédito que possam garantir fluxo de caixa às empresas e evitar o empobrecimento das parcelas mais vulneráveis da população, mas não se comprometeu e disse que passaria à equipe do ministro Paulo Guedes as questões levantadas. Guimarães afirmou que deverá apresentar novas medidas de estímulo à economia nesta semana. Entre as propostas, ele apontou novas reduções de juros em linhas de crédito mais caras, como cheque especial, e no aumento do prazo para pagamentos de financiamentos contratados com o banco. O presidente da Caixa disse mais de uma vez que o banco certamente ampliará o prazo para os pagamentos de funcionamentos. Segundo ele, as parcelas cujos pagamentos forem prorrogados serão incorporadas ao saldo devedor, evitando assim que, em alguns meses, o devedor tenha que pagar duas parcelas ao mesmo tempo. “Vamos apoiar a economia brasileira. Temos um volume de caixa muito grande e vamos injetar dinheiro na economia de maneira direta e indireta”, disse. A necessidade de um novo Marshall foi mencionado mais de uma vez pelos participantes da reunião virtual.
Além de Benchimol, estavam na conversa Benjamin Steinbruch, da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), Wilson Ferreira Júnior, da Eletrobras, Rubens Menin, da MRV e da CNN Brasil, André Street, da Stone, e Marcos Ross e Rafael Furlanetti, da XP. Ross, economista da XP, disse considerar que há espaço para o governo atuar por meio de política fiscal. Ações de ajuste na política monetária, como a redução nos juros, serão insuficientes, segundo o analista. Para ele, há a necessidade de “se alavancar em dívida” e “despejar dinheiro para as faixas mais vulneráveis”. Durante a videoconferência​, o economista da XP também endereçou ao presidente da Caixa um pedido por menos burocracias. “Meu entendimento é de estamos caminhando na direção correta, mas, nesse momento, a gente não pode burocratizar para [o cidadão] pegar dinheiro”, disse. “E eventualmente parte desse dinheiro vem a fundo perdido”.
Para Steinbruch, da CSN, a Caixa deve avaliar a necessidade de oferecer capital para as pequenas e médias empresas, especialmente para o pagamento dos salários. O executivo também pediu a prorrogação do prazo para os impostos pagos pelo empresariado. “O preço para retomar a atividade depois vai ser muito mais custoso. É claro que a questão de saúde é prioridade”, afirmou. André Street, da Stone, disse que “apesar de defensor absoluto do livre mercado”, também entende que o momento pede atuação do governo para garantir o funcionamento da economia. A empresa colocou R$ 100 milhões em microcrédito disponível aos clientes o que, segundo ele, deve facilitar o enfrentamento do período. O dinheiro emprestado será pago nas vendas futuras. A videoconferência realizada nesta tarde fez parte de uma série de encontros virtuais realizados pela casa de investimentos com diversos agentes da economia. A diferença entre essa e as demais foi a participação de um integrante do governo -o presidente da Caixa- tratado com um interlocutor junto à equipe econômica do ministro Paulo Guedes. Empresários cobraram neste domingo maior articulação política do governo federal com prefeitos e governadores, mais tempo para o pagamento de impostos e mais atenção à situação dos micro e pequenos empresários.
A avaliação geral é que diante da quase paralisia da atividade econômica, muitos elos do setor produtivo estão sob risco. Há ainda o imprevisível: não se sabe exatamente por quanto tempo o cenário será crítico. É hora de o governo intervir. Para Benjamin Steinbruch, presidente da CSN, o momento exige medidas pragmáticas, que possam proteger os mais vulneráveis e garantir a sobrevivência das empresas. A prorrogação do prazo para o pagamento de impostos e a abertura de uma linha de crédito para que pequenas e médias empresas possam manter a folha de pagamento em dia foram algumas das possibilidades apontadas pelo executivo. “Vamos ter que conviver com essa onda, mas precisamos dar uma certeza que será possível tocar os negócios. Cada um vai tentar estender os prazos aos seus clientes”, disse. “Estou falando para os clientes que estamos dispostos a suportá-los. A gente vai contribuir também”, afirmou Steinbruch. O engenheiro Rubens Menin, líder do clã familiar dono MRV, Banco Inter e LOG, e fundador da CNN Brasil, relatou ter recebido informações de pequenos comerciantes, como salões de cabeleireiro, que não terão condições de se manter. “Esse pessoal será dizimado. Eles não têm capital de giro”, diz. Para o empresário, as medidas de combate ao coronavírus no aspecto da saúde deve ser articulado com o lado econômico. “Se a gente quebrar a cadeia produtiva, não vamos conseguir levantar o país.” Menin pediu ao governo, por meio do presidente da Caixa, uma melhor sintonia com as prefeituras e governos estaduais em relação às ordens de paralisação total das atividades. “Não podemos nos dar ao luxo de má vontade com prefeitos”, disse. Para Menin, os postos de controle montados em obras são bons exemplos de que é possível continuar trabalhando. O diretor da XP, Rafael Furlanetti, que conduzia a conversa, notou que “todos aqui estão pedindo que o governo atue de maneira fiscal mais expansionista”, noção corroborada pelo economista da casa de investimento, Marcos Ross, para quem há espaço para o governo gastar.
O presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Jr, comparou a atual crise com o racionamento de energia, política de economia implantado em 2001 e que exigia das famílias e empresas redução no consumo de energia elétrica. “Temos que endereçar a perspectiva econômica, precisamos de equilíbrio. Na época do racionamento, não sabíamos quanto tempo ia demorar e acabou em sete meses porque houve um compromisso e 96% dos consumidores cumpriu suas metas de redução”, disse. Também no domingo, executivos da XP também conversaram por videoconferência com o presidente do conselho do Hospital Israelita Albert Einstein, Cláudio Lottenberg, e João Adibe, do grupo Cimed, a quem ofereceram a criação de uma coalização empresarial para aumentar a compra de ventiladores mecânicos. A demanda por esse tipo de aparelho é alta, pois o sistema respiratório é o mais comprometido por quem tem o Covid-19. Diante da pandemia, o consumo o farmacêutico quadruplicou na última semana em São Paulo, de modo que o abastecimento não deu conta da velocidade no aumento. Isso levou a uma revisão das linhas de produção, especialmente dos produtos para prevenção e cuidados paliativos. Lottenberg, do Einstein, defendeu a atividade da telemedicina e apontou que a falta de regulação impede uma melhor utilização da prática. Em outra reunião à distância, Flávio Borges Martins, do Grupo Martins (proprietário do atacado de mesmo nome), relatou um aumento de até 25% no volume de compras em relação ao mesmo período do ano passado e uma desaceleração na procura por equipamentos eletrônicos. Martins descartou o risco de abastecimento. Segundo ele, houve grande engajamento da indústria.
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*”BNDES anuncia injeção de R$ 55 bi na economia contra efeitos do coronavírus”* - O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) anunciou, neste domingo (22), medidas que totalizam R$ 55 bilhões que visam mitigar os efeitos da pandemia de coronavírus na economia. O valor equivale a quase a totalidade dos desembolsos do banco em 2019. Banco do Brasil e Caixa, as outras duas grandes instituições financeiras do governo, já haviam adotado ações para mitigar os reflexos do vírus na economia, como reforço no crédito e corte em juros. São quatro as medidas anunciadas pelo BNDES:
1) transferência de recursos do fundo do PIS-Pasep para o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), no valor de R$ 20 bilhões;
2) suspensão temporária de pagamentos de parcelas de financiamentos concedidos diretamente para empresas, no valor de R$ 19 bilhões;
3) suspensão em caráter temporário de pagamentos de parcelas de financiamentos indiretos para empresas no valor de R$ 11 bilhões;
4) ampliação do crédito para micro, pequenas e médias empresas, via bancos parceiros, no valor de R$ 5 bilhões.
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) participou da teleconferência na qual Montezano detalhou as medidas anunciadas. Bolsonaro afirmou que o combate ao vírus deve ser tratado com cuidado, porque a doença pode ser fatal para os idosos, mas disse que também é muito importante garantir a manutenção dos empregos —na véspera, o presidente dissera que “governadores irresponsáveis” estão proporcionando desemprego com medidas que restringem a atividade econômica. Segundo Montezano, o objetivo da suspensão dos pagamentos das parcelas de financiamentos diretos e indiretos tem como objetivo "dar tranquilidade e alívio de caixa para as empresas brasileiras". Serão atendidos com a medida setores como petróleo e gás, aeroportos, portos, energia, transporte, mobilidade urbana, saúde, indústria e comércio e serviços. A ampliação do crédito para micro, pequenas e médias empresas ocorrerá por meio da linha BNDES Crédito Pequenas Empresas, que passará a contemplar empresas com faturamento anual de até R$ 300 milhões. O limite de crédito por beneficiário aumentará de R$ 10 milhões para R$ 70 milhões. As empresas terão dois anos de carência e cinco anos de prazo total para pagar esse financiamento.
A transferência de recursos para o FGTS já havia sido anunciada na última semana pelo Ministério da Economia, que indicará quais os critérios para os trabalhadores efetuarem novos saques. Montezano afirmou que essas são apenas as primeiras medidas tomadas pelo banco e que as ações durarão até o fim da crise do coronavírus. Ele disse, ainda, que o BNDES veio se preparando silenciosamente nas últimas duas semanas para lidar com os efeitos da pandemia. "Houve uma verdadeira revolução tecnológica no banco, mudaram todos os sistemas operacionais. Temos condições técnicas de operar com 100% dos funcionários trabalhando de casa", afirmou. Montezano disse, também, que o BNDES ainda discute produtos para as companhias aéreas, os estados e municípios e os setores do turismo, bares e restaurantes. Quando lhe foi perguntado sobre a venda de ações e a devolução antecipada de recursos ao Tesouro Nacional, Montezano disse que as duas possibilidades estão temporariamente suspensas. "No momento atual, qualquer venda de ações se torna muito desafiadora. O mercado está muito volátil, é complicado vender qualquer ação. Esperando a normalização dos mercados, voltamos a discutir. Da mesma forma, a devolução ao Tesouro. A instrução foi que a gente focasse nesse momento nos esforços para a superação da crise", afirmou.
OPINIÃO - *”Governos, formulem políticas urgentes, não deixem as empresas falir”*
RONALDO LEMOS - *”Empresas de tecnologia têm de agir na Covid-19”*
*”Sindicato teme exposição ao coronavírus e decreta estado de greve para 40 mil em SP”* - O sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos decretou estado de greve para todos os 40 mil funcionários das fábricas da região. A alegação é que os funcionários estão expostos ao surto do novo coronavírus. A greve pode atingir grandes fábricas da região, como a Embraer, empresas de telecomunicações e de tecnologia. Luiz Carlos Prates, 63, dirigente da secretaria nacional da CSP Conlutas – Central Sindical e Popular, responsável pelo sindicato dos metalúrgicos da região, afirma que a principal reivindicação é a licença remunerada para todos os funcionários. Segundo ele, ficariam de fora da greve funcionários de empresas que tiverem ligadas diretamente à fabricação de algo que possa ter utilidade essencial durante a crise deflagrada em razão do coronavírus, como latas para alimentos. “O decreto [do governador João] Doria não propõe a paralisação da indústria, mas o trabalhador não pode ser bucha de canhão e se contaminar porque está indo trabalhar”, diz Prates, que é conhecido como Mancha. Segundo ele, não será necessário fazer assembleia. “Até mesmo porque não é recomendada a aglomeração de pessoas neste momento. Estamos em contato com os trabalhadores nas redes sociais, e a adesão tem sido grande.’
Prates também afirma que, em razão da situação excepcional com a pandemia, não será necessário fazer a comunicação para as empresas com 48 horas de antecedência, como está previsto em lei. A advogada Cássia Pizzotti, sócia da área trabalhista do escritório Demarest, rechaça as informações do sindicalista. Segundo ela, a greve não tem respaldo legal. “Esse comunicado de greve geral na indústria metalúrgica não atende os requisitos da lei de greve por dois motivos. Primeiro porque não observa o prazo mínimo de 48 horas para comunicação sobre a paralisação e não se tem notícia de que tenha havido assembleia. Segundo porque não há prova de negociação prévia e não há direito a ser questionado”, diz a advogada. Pizzotti afirma que a licença remunerada só está prevista para casos de suspeita ou confirmação de Covid-19. “O direito que eles estão invocando [licença remunerada] só se aplica para caso de suspeita ou de confirmação, não para qualquer trabalhador. Como não há imposição de isolamento nem restrição para circulação em relação a pessoas que não estão doentes, as demais não têm direito a licença remunerada”, diz ela.
A advogada diz ainda que, por enquanto, não existe nenhum tipo de restrição de pessoas ou de manutenção de qualquer atividade. Já Prates afirma que a prioridade do sindicato é defender a vida do trabalhador. Ele também diz que o afastamento com licença remunerada, sem descontar de férias ou banco de horas, não vai atrapalhar a saúde financeira das empresas. “São grandes indústrias, com muito dinheiro. Os governos terão que ajudar as empresas que não tiverem condições de se sustentar”, diz o sindicalista. Na sexta-feira (20), montadoras como FCA Fiat Chrysler, Honda, PSA Peugeot Citroën, BMW e Renault confirmaram o fechamento de suas linhas de produção e deram férias coletivas para todos os funcionários. Na maior parte delas, a paralisação começa nesta segunda-feira (23). A volta ao trabalho está inicialmente prevista para a segunda quinzena de abril. Mas as empresas afirmam que o retorno vai depender da evolução da pandemia do coronavírus. A estimativa da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) é que as montadoras empregam 125 mil pessoas.
*”Fechamento generalizado de escolas impõe desafio inédito à educação”* - Além do efeito devastador na saúde, no cotidiano e na economia, a pandemia do coronavírus provoca também uma situação sem precedentes na educação. Segundo estimativa da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), o fechamento de instituições educacionais em decorrência do vírus já atinge metade dos estudantes no mundo, um total de 890 milhões em 114 países. No Brasil, todos os estados já decidiram suspender aulas. A medida foi seguida por colégios privados e faculdades. Educadores agora avaliam quais serão as consequências dessa paralisação forçada. O aumento da desigualdade é um dos riscos mais temidos. De maneira geral, e muitas vezes sem planejamento, países têm apostado na educação a distância como solução para o período de confinamento.
Os resultados da adoção massiva desse modelo, bem como o período ao longo do qual ele será necessário, ainda são desconhecidos, mas algo parece certo: estudantes com pior nível socioeconômico terão mais dificuldades. Basta ver a movimentação das escolas na primeira semana de interrupção gradual das aulas em São Paulo. As particulares já começaram com aulas ao vivo transmitidas por computador e plataformas online nas quais os alunos acessam conteúdos e podem interagir com a turma. Nas públicas, os professores ainda não sabem como será o uso de tecnologia, uma vez que muitos estudantes não têm computador em casa. O governo de São Paulo negocia com operadoras patrocínio para bancar a conexão de wi-fi do jovem que tenha ao menos um smartphone. O secretário da Educação, Rossieli Soares, já afirmou que qualquer solução só será adotada como principal se for acessível a todos. As condições materiais, claro, não são o único desafio do isolamento. Com filhas trigêmeas de 9 anos, o médico Vamberto Maia Filho tem as acompanhado nas tarefas de casa desde que o Santi, colégio no Paraíso (região central de SP) onde elas estudam, anunciou a interrupção das aulas. A escola preparou para o período atividades online e off-line.
“Não vou mentir: o primeiro dia [de atividades em casa] foi catastrófico”, conta o pai. “Era um volume muito grande de material, e elas ainda não estavam adaptadas.” Agora, diz ele, ficou mais fácil, mas Valdemar avalia como fundamental a sua presença ou a de sua mulher por perto para acompanhar o processo —algo natural para o casal, que já fazia isso. “Nessa idade, não tem chance de elas seguirem sozinhas. A plataforma, por exemplo, permite que alunos falem entre si. Se deixar, vira zorra e desconcentra”, diz. O contexto de participação dos pais e acesso a tecnologia contrasta com o descrito por Mariana (nome fictício), professora de um colégio público em Mogi das Cruzes (Grande SP) que pede para não ser identificada. Ela diz temer pelas lacunas de aprendizagem que seus alunos podem adquirir no período sem aulas.
Em primeiro lugar, porque ela própria está sem computador em casa, e muitos dos seus estudantes passam pelo mesmo. Em segundo, porque não sabe que atenção eles terão para atividades remotas neste momento sem ninguém para acompanhar de perto. “Os pais dos meus alunos são autônomos, a cabeça deles não vai estar voltada para os estudos, mas para se manterem vivos nesse período.” A duração da emergência do coronavírus é vista por autoridades e educadores como chave para determinar se a suspensão das aulas irá de fato aumentar a disparidade entre alunos ricos e pobres. Estudos mostram que até as férias de verão produzem perdas de aprendizagem com maior efeito entre os de pior nível socioeconômico. “As dificuldades crescem exponencialmente quando o fechamento de escolas é prolongado”, afirmou na quinta-feira (19) Stefania Giannini, diretora-geral assistente da Unesco para a Educação. “Escolas, ainda que imperfeitas, cumprem um papel de equalização na sociedade e, quando elas fecham, as desigualdades se tornam muito maiores.” Não é só entre grupos sociais que o efeito da paralisação escolar pode ser diferente. Entre níveis de ensino também. A fase de alfabetização é vista como uma das mais difíceis de se transpor para o mundo online. E lacunas nessa etapa, se não resolvidas, deixam sequelas por toda a vida escolar.
Em live nas redes sociais, o secretário Rossieli afirmou que deverão ser enviadas orientação aos pais com filhos nesse estágio, mas previu obstáculos, uma vez que é difícil para as famílias ajudar a desenvolver habilidades como a de fixar a mão e a grafia. “Certamente na hora que voltarem as aulas nós vamos ter uma dificuldade muito grande em relação ao que a gente precisa fazer com alfabetização”, disse, citando os estudos relativos aos prejuízos de longos períodos sem aulas para a aprendizagem. Há também quem veja a questão de forma mais otimista. “Os pais de crianças em alfabetização devem se tranquilizar, não é uma interrupção que vai impedi-las de concluir o processo”, diz Cristina Nogueira Barelli, coordenadora do curso de pedagogia do Instituto Singularidades. Ela avalia, por outro lado, ser importante que as redes comecem a pensar em avaliação a ser feita na retomada das aulas, a fim de planejar eventuais ações reparadoras. Outra fase considerada delicada por parte dos educadores é a dos alunos do 3º ano do ensino médio. Professor do Laboratório de Redação, cursinho que tem se destacado nas notas da Fuvest, Adriano Chan decidiu interromper as aulas por enquanto, já contando com a possibilidade de adiamento de vestibulares.
Ele descartou lecionar a distância durante o confinamento. “Quando você está dando aula para aluno presencial, você vê pela cara dele quando ele não en tendeu alguma coisa. No online, parece que está tudo certo quando não está.” Não é consenso. Diretora pedagógica do Colégio Bandeirantes, em São Paulo, Mayra Lora avalia que o que se perde a distância é principalmente o convívio social, não o conteúdo. Para ela, os alunos dessa série têm ainda uma vantagem: a maior autonomia. O debate sobre a a manutenção da data de provas diante do impacto da pandemia sobre o calendário escolar provavelmente será colocado em pauta adiante, como já ocorre em outros países. Para João Marcelo Borges, diretor de estratégia política do Todos Pela Educação, é importante já pensar no adiamento do Enem, uma vez que o exame é porta de entrada para universidades, e os alunos mais pobres devem voltar do período sem aula com uma defasagem maior. Ele aponta que as ações do Estado para a educação no período de confinamento devem envolver medidas, que vão desde a nutrição ao apoio ao professor, passando pela comunicação com as famílias. Reabertas as escolas, será preciso trabalhar com as sequelas do isolamento na saúde mental. “Trata-se de algo que deve afetar toda a sociedade, mas, no caso das crianças, também contribuirá para dificuldades de aprendizagem.
ABAIXO-ASSINADO PEDE QUE TERCEIRIZADOS SEJAM MANTIDOS
A Secretaria estadual da Educação publicou resolução para suspender contratos com prestadoras de transporte escolar e alimentação no período sem aulas. Um abaixo-assinado agora pede que os terceirizados recebam licença remunerada, para que os trabalhadores não sejam penalizados
*”Isolamento em massa dá impulso a adeptos do ensino domiciliar”*
*”Testes rápidos da China serão para profissionais de saúde, diz ministério”*
*”Ministro da Saúde pede que população não use hidroxicloroquina”*
*”Brasil tem 25 mortes e 1.546 casos confirmados de coronavírus”*
ANÁLISE - *”Sem testes para coronavírus, governo pode obrigar população a escolha terrível”*
*”Campanha de vacinação contra a gripe começa nesta segunda (23)”*
*”Capital paulista tem portas fechadas, 0 km de congestionamento e briga por espirro”*
TABATA AMARAL - *”Coronavírus na Belíndia”*
*”Para evitar coronavírus, condomínios fecham áreas comuns de convívio”*
MARCELO LEITE - *”Precisamos de máscaras sim, e de muitos testes também”*
COLUNISTA EM CASA - *”Mariliz Pereira Jorge indica crochê para se desligar do mundo”*
MÔNICA BERGAMO - *”Adiamento das eleições municipais não é endossado por cúpula do Congresso”*
MÔNICA BERGAMO - *”Cremesp consegue liminar na Justiça contra pessoa que espalhava fake news sobre coronavírus”*
MÔNICA BERGAMO - *”Comitê de crise mapeia 17 laboratórios públicos para testes de coronavírus”*
MÔNICA BERGAMO - *”Sesc-SP suspende todos os shows de sua programação até 19 de abril”*
MÔNICA BERGAMO - *”Juca Kfouri e Gregório Duvivier participam de ação contra coronavírus”*
MÔNICA BERGAMO - *”Vereador pede reabertura de Hospital Sorocabana para acolher contaminados por Covid-19”*
MÔNICA BERGAMO - *”Rosa Weber pede a AGU dados sobre impacto do teto de gastos em crise do coronavírus”*

 
CAPA – Manchete principal: *”Testagem em massa vai começar pelos profissionais da saúde”*
EDITORIAL DO GLOBO - *”Somos todos responsáveis”*: A responsabilidade pelo sucesso ou fracasso será de todos. Na entrevista coletiva do Ministério da Saúde concedida no sábado, o secretário-executivo da pasta, João Gabbardo, pediu à população para não esperar o poder público para tomar atitudes. Disse, acertadamente, que como a imprensa há dias dá total prioridade ao noticiário do coronavírus, com repetidas informações práticas de como todos precisam se comportar, cada um deve saber a sua parte. É essencial se recolher, para evitar a retransmissão de um vírus veloz.
Neste sentido, foi frustrante, deseducativo e despido de qualquer espírito de cidadania, o carioca encher praias e bares no penúltimo fim de semana. Bem como idosos, grupo vulnerável ao vírus, continuarem no calçadão de Copacabana e praças, correndo risco de contrair a doença e ainda se transformar em uma plataforma ambulante de contaminação. É descabido o prefeito Crivella pensar em pedir ao Exército soldados para mandar pessoas de idade avançada para casa, por ser um desatino converter militares em guardas de costume. Mas inconsequência de idosos é inaceitável. Pode ser que a falta de sol no fim de semana tenha ajudado a esvaziar as ruas. A melhor hipótese é que esteja afinal aumentando a consciência da seriedade do momento, à medida que o número de contaminados e mortos cresce. É necessário entender que bastam alguns poucos irresponsáveis para muitos padecerem. Os empresários são um elo estratégico na crise. São eles que empregam a maior parte da força de trabalho e que, se nada for feito, serão obrigados a demitir em massa, porque a recessão fará com que suas receitas desabem. Ou desapareçam. A previsão para a economia americana é que a taxa de desemprego, na faixa de 4%, das mais baixas de que se tem registro, dispare para 20%. No Brasil, o índice se encontrava em janeiro em 11,2%. Estava em queda, vai subir outra vez, não se sabe até onde. Foi decretado pelo Congresso estado de calamidade pública, a pedido do Planalto, para o governo não obedecer à meta fiscal. Não conseguiria mesmo. Com as receitas em queda vertiginosa, as empresas precisam de dinheiro para pagar a folha de salários. Os bancos públicos serão mobilizados. É possível que também possam atrasar impostos.
Acionistas e executivos das empresas precisam também entender que são parte do esforço coletivo de reconstrução para o bem de todos, pessoas físicas e jurídicas. Empresas já recebem mais de R$ 300 bilhões anuais em incentivos, ou 4,5% do PIB, dinheiro do contribuinte. Para sobreviverem, como a sociedade deseja e precisa, alguns novos bilhões do Erário terão de ser repassados para o seu caixa. Será preciso muita seriedade de gestores e acionistas na administração desses recursos. A prioridade tem de ser a manutenção do emprego. O restabelecimento de margens de lucro pode ficar para depois. A questão social se torna grave junto com a econômica, só que ela explode rapidamente nas ruas. O chamamento à responsabilidade alcança os políticos. Muitos demonstram a mesma inconsciência de tantos diante do maremoto que se aproxima do país. Ano de eleições municipais, aspirantes a 2022 se agitam. Não causariam tantos danos se não fossem o presidente da República e os governadores de São Paulo e Rio de Janeiro, os dois maiores estados. É louvável que João Doria e Wilson Witzel estejam ativos diante da crise e procurem prestar contas diariamente por meio da imprensa. Mas enquanto Bolsonaro e os dois governadores fazem guerra de decretos e medidas provisórias para saber quem terá a primazia de fechar ou abrir portos, aeroportos e estradas —a União é que deve tratar do assunto, por óbvio —, a situação exige a cooperação entre todas as esferas do poder. Disso depende um país. Antes da crise, entre trabalhadores sem carteira de trabalho, trabalhadores domésticos e autônomos eram 46,8 milhões. Há ainda milhões que estão no mercado formal e que podem perder o emprego com a crise e aumentar a população deste Brasil pobre, a depender do entendimento entre os brasileiros.
*”Testes rápidos – Profissionais da saúde terão prioridade”*
*”Brasil demorou mais que Itália para pular de cem a mil casos”* - OBrasil levou mais tempo para passar de cem para mil casos de Covid-19 do que países como Itália e Espanha. Os dados utilizados são compilados pela universidade americana Johns Hopkins. O país passou de cem pessoas infectadas com o novo coronavírus no dia 13 de março. Naquele dia, foram registradas 151 casos. Oito dias depois, em 21 de março, o Brasil atingiu o milésimo teste positivo e chegou a 1.021 pessoas com a doença. Na Itália, esse movimento aconteceu entre 23 e 29 de fevereiro (seis dias); na Espanha, entre 2 e 9 de março (sete dias). Isso significa, na avaliação do estatístico especialista em epidemiologia Antonio Ponce de Leon, que o ritmo de infecções no Brasil está mais lento.
—Mas isso depende fortemente do número de testes realizados — pondera o especialista da Uerj.
A barreira do 100º episódio é um limite arbitrário para presumir que um país já está tendo transmissão comunitária (ocorrências internas, não importadas). Itália e Espanha são os países europeus mais afetados pelo vírus. O primeiro registrou mais de 59 mil casos e 5,4 mil mortes. Já os espanhóis tiveram 28,7 mil pacientes com 1,7 mil mortes. Ambos, que tiveram seus sistemas de saúde colapsados por conta da doença, começaram o combate restringindo os testes apenas aos casos mais graves, mesma estratégia brasileira. A justificativa foi de que este é um recurso finito e caro. Já na avaliação da médica Gulnar Azevedo, presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, a notícia é boa, mas o pior está por vir.
— Só agora está entrando em áreas com muita densidade demográfica —explica.
*”Dengue, uma preocupação a mais – Ministério da Saúde teme que número de casos aumente com isolamento”*
*”Congresso resiste a adiamento de eleições”*
ENTREVISTA – MIGUEL SROUGI, professor da USP - *”Há pessoas que estão flertando com as trevas”*: Aos 73 anos, Miguel Srougi, um dos cirurgiões mais celebrados do país, critica a forma como o governo federal tem conduzido a crise do coronavírus. Para o professor da USP, nossa infraestrutura hospitalar sinaliza que os mais vulneráveis ficarão sem atendimento no pico da pandemia.
- Qual é a sua perspectiva com a pandemia?
- Eu sou urologista, não sou um infectologista, não posso fazer uma revisão científica profunda. Mas vemos os dados quantitativos e eles se pautaram por curvas que vão sendo construídas por autoridades médicas do mundo inteiro, que acompanharam a evolução da disseminação do coronavírus no mundo. Eles mostram que quando um país passa de cem casos, a curva que vinha subindo de forma lenta de repente empina e, a cada dois ou três dias, dobra os números dos casos. E nessas horas isso desorganizou todos estes países do ponto de vista de recursos e de capacidade para atender os doentes. Aqui no Brasil a gente está assistindo a este processo como espectador, no mundo inteiro morrendo gente, todo mundo assustado, e o Brasil otimista.
- Quais exemplos podem servir para o Brasil?
- As autoridades não estão falando mais em número de mortos, de casos, mas em arrumar hospital, leitos. Temos exemplos emblemáticos. Estas medidas de fazer o chamado lockdown (proibir as pessoas de saírem às ruas) não impedem o vírus de se difundir, ela apenas achata a curva dos casos, ela continua lentamente, e isso permite que o sistema de saúde vá se readequando e dando apoio aos doentes. Mas estas medidas não curam a pandemia, que só vai ser resolvida quando descobrirem remédio ou vacina. O Brasil pôde assistir ao que ocorria na China e na Itália, e perdeu tempo de se preparar, por exemplo, transformando fábricas para fazer respiradores.
- A política atrapalha o combate ao coronavírus?
- O problema do Brasil está muito claro: existem no governo federal pessoas que estão flertando com as trevas. O presidente, de forma incompetente e imoral, menosprezou a gravidade da pandemia, julgou que com palavras poderia desviar a atenção popular e impedir uma constatação óbvia: a ruína da assistência médica no Brasil, principalmente a dos mais necessitados. Os grupos mais bem posicionados socialmente vão sobreviver, pois têm mecanismos de defesa mais fortes.
- O Brasil já deveria estar todo em lockdown?
- O lockdown representa medida extrema, que deve ser deve ser adotada o mais cedo possível, já que a demora implica em mais pessoas infectadas e mais mortes. Contudo, a decisão para sua implementação não é simples, nem todos aceitam a perda da liberdade. O que se observou na presente pandemia é que os países mais atingidos implementaram inicialmente o distanciamento social e recorreram ao lockdown quando a situação sanitária e social alcançou níveis críticos insustentáveis. Ao final, todos reconhecem a pertinência dessa ação.
- E quanto a nossa infraestrutura hopitalar?
- Há um estudo muito curioso: nos países com mais de 10 leitos hospitalares por mil habitantes, todos tiveram baixo índice de mortes no coronavírus, coisa de 0,2% a 0,3%. Nos países que têm menos de 4 ou 5 leitos para cada grupo de mil habitantes, todos estão tendo alta mortalidade. Hong Kong tem 14 leitos para cada mil habitantes, o Japão, tem 10 leitos para cada mil habitantes e nestes países não morreu quase ninguém. A Itália tem 3,2 leitos para cada grupo de mil habitantes e foi esse desastre. O Brasil tem 1,95 leitos para cada mil habitantes. Estes números mostram que na hora que chegarmos no pico, não vai ter hospital para colocar este pessoal, não há leitos.
- Está correto criar leitos em estádios?
- É a forma que se tem agora de rapidamente melhorar a assistência. Quem vai sofrer mais são os pobres, mais vulneráveis. Eles vão morrer nas portas dos hospitais, não vão conseguir entrar, muito menos receber um tubo para respirar e sobreviver à pneumonia. O pobre vai morrer na calçada.
- O senhor prevê algum choque entre hospitais públicos e privados?
- Os hospitais já estão reduzindo o número de cirurgias eletivas, o que não for urgente será adiado. Hospitais estão se preparando para receber pacientes. Em áreas específicas, este pessoal é muito competente e está fazendo isso direitinho. Mas como teremos aumentos de casos, isso pode afetar muito. Nos últimos dez anos foram fechados de 40 mil a 50 mil leitos no país do SUS, por falta de recursos. Um sistema combalido, degradado em um país que tanto necessita. Os governos que recorrem aos hospitais privados têm uma lógica, mas nenhum deles vai transformar suas estruturas, caras e complexas, em hospitais de campanha. Mas certamente eles terão que colaborar.
- E no “day after”, qual será o legado do coronavírus?
- Na área política vai surgir um consenso claro: só as empresas privadas não conseguem fazer um país progredir. É importante ter um Estado forte também. Estamos vendo isso agora. Estado forte consegue conter esta ameaça à nação e estados que não são fortes não conseguem . Aquela história de entregar tudo para as empresas privadas não dá certo. A grande consequência social é que as pessoas vão aprender que a solidariedade e a compaixão são muito importantes dentro de qualquer sociedade. A gente não pode mais ficar impassível quando um morro despenca e morrem pessoas simples, que não têm capacidade para sobreviver dignamente, que moram nestes locais por absoluta falta de opção. Acho que o coronavírus vai unir a sociedade e deixar as pessoas um pouco mais solidárias e dotadas de compaixão. Agora mesmo os fortes estão ameaçados, os pobres vão morrer mais, mas os ricos também vão morrer.
*”Datafolha: 76% apoiam adoção de quarentena”*
*”Serviço essencial – Decreto diz que atividade da imprensa não pode ser interrompida”*
*”Casos no Rio sobem 60% - Capital tem 170 infectados. Decreto fecha parte do comércio a partir de amanhã”*
*”Comunidades se defendem da Covi-19 – Favelas criam ‘gabinetes de crise’, lançam campanhas e pedem doações”* - A confirmação do primeiro caso de contaminação pelo novo coronavírus na Cidade de Deus, em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio, acendeu o sinal de alerta em comunidades que, por conta própria, estão adotando algumas medidas preventivas. Enquanto as ações governamentais não chegam, moradores de lugares como o Complexo do Alemão e a Vila Kennedy arregaçam as mangas e vão a campo, criando inclusive gabinetes de crise informais, para mostrar à população como evitar a Covid-19 e buscar doações. O paciente da Cidade de Deu sé o único caso demorador de comunidade no Rio com Covid-19 confirmado pela prefeitura até ontem. A Secretaria municipal de Saúde informou que as unidades de atenção primária intensificaram orientações à população de comunidades, como objetivo de conter o coronavírus. No entanto, moradores de comunidades reclamam da morosidade das ações e do sistema de saúde. Alex Belchior, historiador e morador da Vila Kennedy, diz que a população sequer pode contar com as unidades de saúde, como a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da região, que sofre coma falta de médicos. O mesmo problema, segundo ele, afeta o Posto Municipal Waldir Franco, em Bangu.
— A comunidade não ficou esperando o governo. Tem carro de som alertando os moradores para a necessidade de ficarem casa. Começou também no sábado uma mobilização pelas redes sociais—diz.
FAIXAS E ALERTA NAS REDES
A comunidade criou ainda um grupo no WhatsApp, batizado de “Gabinete de Crise”, que reúne pessoas ligadas à área da Saúde, agentes comunitários, religiosos e lideranças comunitárias. Faixas e folders digitais também foram feitos para orientara população.

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