terça-feira, 19 de maio de 2020

Foi um dia de caos

Foi um dia de caos, no Supremo Tribunal Federal, com o site e seus servidores instáveis durante boa parte da tarde devido a testes de segurança. A um ponto, chegou a circular a informação de que havia um ataque hacker — não se confirmou. Foi neste ambiente que chegou ao gabinete do ministro-relator Celso de Mello o pen-drive com o vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, em que o presidente Jair Bolsonaro teria ameaçado o ministro Sérgio Moro de demissão caso não lhe fosse permitido intervir na superintendência da Polícia Federal, no Rio. Celso está em casa, no interior de São Paulo, e os técnicos da Corte fizeram para ele um streaming pessoal. O decano começou enfim a assisti-lo às 18h. “Recebi a equipe da Polícia Federal, que me atualizou sobre o andamento das investigações criminais e entregou-me o vídeo”, escreveu o ministro. “Após esse encontro, comecei, agora, a assistir, devendo liberar minha decisão até sexta, talvez antes.” Pontuou com exclamação. Tanto a Advocacia Geral da União quanto a Procuradoria-Geral da República pediram que o conteúdo seja liberado apenas parcialmente. (Poder 360)

José Casado: “Quem assistiu ao vídeo da reunião ministerial de 22 de abril pôde confirmar: o governo resolveu preencher com palavras o vazio de ideias sobre a crise humanitária. Morreram mais de 16 mil pessoas até ontem. São 1.105% mais vítimas do que o país possuía apenas um mês atrás. As cenas gravadas são de inusual crueza. O Planalto surge como centro de um pandemônio político na pandemia. Bolsonaro e alguns ministros se desqualificam em atmosfera de vulgaridades, incapazes de discernir entre a realidade e a fantasia autoritária. O vídeo contém fragmentos de um processo de suicídio político, em câmera lenta. É parte do mosaico de autoflagelo que justifica pressões crescentes, hoje materializadas em três dezenas de pedidos de impeachment. A construção do impedimento está se tornando fato político, a despeito da decisão do procurador-geral sobre eventual crime de responsabilidade ou de Maia rejeitar os atuais pedidos de impeachment. É impossível prever o desfecho, mas Bolsonaro percebeu o quanto já aumentou o custo da sua permanência no poder. Ontem entregou ao grupo de Valdemar Costa Neto, do PL, notório ex-presidiário do mensalão, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, onde se gasta por ano o equivalente a 20% do orçamento do Ministério da Saúde.” (Globo)



Começa uma discussão, no governo federal, sobre a extensão para além de 30 de maio da ajuda emergencial de R$ 600 ao mês. A equipe econômica informou ao Planalto que concorda com a discussão desde que outros gastos sociais, que considera ineficientes, sejam retirados — na lista do time de Paulo Guedes estão o abono salarial, o seguro-defeso e a farmácia popular. O auxílio custa cerca de R$ 45 bilhões ao mês e a retirada de outros programas permitiria alocar recursos. (Estadão)

De acordo com pesquisa do DataPoder360, a manutenção da popularidade de Bolsonaro na casa dos 30% está relacionada ao pagamento do auxílio. (Poder360)
Enquanto isso... O consumo das famílias, responsável por cerca de dois terços do PIB, despencou 6,5% em março de acordo com o Monitor do PIB, indicador do Ibre. A queda do PIB no mês, comparado a fevereiro, foi de 5,3%. (Folha)



Mathias Alencastro: “A esquerda brasileira padece de uma ilusão portuguesa. Muitos acreditam que a famosa geringonça, a aliança entre socialistas, bloquistas e comunistas, seria, na sua encarnação tropical, uma parceria entre PT, PC do B e PSOL. Mas o gênio do premiê português, António Costa, está na sua capacidade de mobilizar esses partidos da esquerda para ocupar o centro político. Com o apoio envergonhado dos seus aliados, ele capturou as bandeiras conservadoras do rigor fiscal e da segurança pública. Moscou, Istambul, Budapeste estão na linha de frente do combate ao populismo de seus respectivos chefes de governo. Em todas essas cidades, os progressistas foram além da experiência portuguesa, juntando partidos de todos os bordos. Vale tudo em nome da luta contra o autoritarismo. Enquanto isso, em São Paulo e no Rio, a intransigência do parisiense Ciro Gomes, a relutância de Lula em reconhecer o colapso da hegemonia petista, e as micro-querelas do PSOL inviabilizaram a frente ampla. Transformado pela pandemia, o Consórcio do Nordeste está criando as condições para a emergência de uma geringonça nos moldes da portuguesa. Basta olhar para a parceria produtiva entre Rui Costa e ACM Neto e para as conversas exploratórias entre Flávio Dino e Luciano Huck. Assombrado pelas suas derrotas recentes, o campo progressista demora a se transformar. Mas nada de desespero: a formação de uma aliança tranversal que incorpore o melhor do petismo está muito mais avançada do que o marasmo atual deixa transparecer.” (Folha)

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