segunda-feira, 8 de março de 2021

Análise de Mídia - 08/03/2021

DOS JORNAIS DE HOJE: O assunto nas capas dos jornais é o descontrole da pandemia no Brasil, mesmo que as abordagens sejam a partir de perspectivas diferentes. A Folha buscou fazer uma associação com o Dia Internacional da Mulher e anunciou que a pandemia ameaça 30 anos de avanços das mulheres. O Globo informa que o número de novas infecções já supera em 30% o pico da pandemia no Brasil. O Estadão, sempre muito preocupado com o que os EUA pensam – mas nesse momento trata-se de algo relevante – aponta que o governo estadunidense veem a piora da pandemia no Brasil como uma ameaça global. O Valor Econômico, por sua vez, expõe a preocupação do mercado financeiro e informa que o “mercado” quer uma alta maior e imediata da taxa Selic.
Há nos noticiários uma mudança sutil, mas significativa. As manchetes deixaram de ser tão diretamente críticas ao governo Bolsonaro, mas as informações das reportagens mostram que aumenta a insatisfação com o governo federal em diferentes setores da sociedade brasileira e, como aponta o Estadão, no mundo. Ou seja, nas semanas anteriores, a crítica a Bolsonaro partia mais dos jornais, agora ela vem da sociedade. O movimento ainda é tímido, mas aparece nas críticas dos economistas, dos cientistas e médicos que têm espaço nos jornais.
O Valor Econômico informa que é realista a projeção de que o Brasil pode atingir 3 mil mortes diárias nos próximos dias. Além disso, o jornal mostra que um centro de pesquisa financiado pela Eletrobrás corre risco diante da possibilidade de privatização da empresa. O Valor também aborda os conflitos do PT fluminense.
O Estadão informa que um americano, trompista, venceu a licitação para blindar os carros da PRF. O jornal também sugere que exista no Congresso uma ofensiva contra as leis anticorrupção. Já a Folha de S. Paulo informa que investidores estrangeiros estão deixando de investir na Bolsa brasileira em função da falta de estabilidade do governo Jair Bolsonaro.

 

CAPA – Manchete principal: ”Pandemia ameaça 30 anos de avanços das mulheres”

EDITORIAL DA FOLHA - ”Aparelho militar”: A crescente presença de militares em cargos políticos da administração federal tem se estendido às mais poderosas empresas estatais com controle da União. Reportagem da Folha mostrou que, com a nomeação do general Joaquim Silva e Luna para a presidência da Petrobras, chegará a 92 o número de dirigentes oriundos das Forças Armadas no comando dessas companhias —dez vezes o contingente verificado no final do governo Michel Temer (MDB). Os dados foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação, pela consulta de sites oficiais e nas assessorias das empresas. Em levantamento realizado em julho de 2020, o Tribunal de Contas da União (TCU) já constatava o exercício de funções governamentais, na esfera federal, por 6.157 militares —mais do que o dobro dos 2.957 registrados em 2016. Diante desse quadro não há como escapar à evidência de que o presidente Jair Bolsonaro, capitão reformado do Exército, promove aparelhamento militar do Estado. Do ponto de vista administrativo e técnico, é forçoso considerar que, embora produzam quadros respeitáveis, as Forças Armadas têm como missão precípua e constitucional zelar pela defesa nacional.
A formação militar e as regras que estruturam as corporações, baseadas em rígida hierarquia e respeito ao tempo de serviço, não foram concebidas para capacitar gestores eficientes de políticas, empresas e órgãos públicos com vocação para atuar em regimes de governança transparente e prestação de contas à sociedade. O caso exemplar dessa incongruência materializa-se na figura do ministro da Saúde, o general Eduardo Pazuello. Considerado entre colegas de farda um especialista em logística, revelou-se um desastre à frente de uma área complexa e estratégica, sob pressão da mais grave crise sanitária dos últimos cem anos. Suas exaustivas provas de inépcia se fazem acompanhar de subordinação convicta ao negacionismo irresponsável do presidente da República, com as sinistras consequências que se conhecem. Pazuello exemplifica outro perigo decorrente da vasta ocupação militar de funções governamentais. Oficial da ativa, o general expõe o Exército —ainda mais do que já fazem seus pares da reserva— ao escrutínio da opinião pública e dos demais Poderes em terreno que não é de sua alçada. Queira ou não, a instituição militar se associa, desnecessariamente, a uma aventura política com traços autoritários. Não é bom para as Forças, não é bom para o Brasil.

PAINEL - ”Pazuello agora pede ajuda, e Congresso é pressionado a assumir combate a Covid-19 diante de omissão de Bolsonaro”: Em meio à omissão, ineficiência e negacionismo de Jair Bolsonaro em um ano de pandemia, articula-se em Brasília um arranjo para colocar a cúpula do Congresso no comando do combate à crise da Covid-19, com o respaldo de governadores e até a participação do próprio ministro da Saúde. Após dez meses de submissão à cartilha bolsonarista e agora sob investigação, Eduardo Pazuello tem sinalizado com pedido de ajuda a gestores. A costura tem sido feita nos bastidores e com cuidado para não provocar a ira do presidente. A articulação envolvendo o Congresso parte de dois entendimentos em meio ao colapso nacional da saúde. Primeiro, os governadores querem evitar o desgaste de atuar sozinhos no pico da pandemia. Segundo, a polarização de Bolsonaro com eles chegou a um ponto em que a única forma de ter uma ação nacional é com o Legislativo junto. Aliados de Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG) tentam tratar o assunto como uma pacificação entre os Poderes e não como um atropelo ao governo federal. O discurso é que Bolsonaro está ciente que deve agir e uma participação do ministério mostrará esse comprometimento.
O plano é que um grupo criado por Lira com governadores na semana passada concentre as principais ações do país contra o avanço da Covid-19, coordenando a atuação do ministério e esvaziando as ordens negacionistas de Bolsonaro. A ideia é colocar mais pessoas nesse comitê, como secretários de saúde, parlamentares, especialistas, médicos. O Supremo foi procurado para dar apoio à iniciativa. Os principais pontos a serem comandados: fabricação e compra de vacinas, leitos de UTI, equipamentos suficientes para hospitais, e medidas de restrição para frear a transmissão. Depois de quase dez meses obedecendo todas as diretrizes do presidente, Pazuello passou a indicar a gestores nos últimos dias que não consegue tomar as medidas que lhe são cobradas por não ter respaldo no Palácio do Planalto. Apesar de políticos criticarem a atuação do ministro e o chamarem de incompetente nos bastidores, a leitura é a de que não é possível tirá-lo agora nem tirar a pasta da linha de frente do combate à pandemia, inclusive por questões legais (assinatura de documentos, divisão de dinheiro, etc). Para pessoas que falaram com o general nos últimos dias, a impressão é a de que a sinalização dele agora é reflexo da preocupação com a investigação de que é alvo em meio ao crescente número de mortes, que não para de bater recordes.
A Folha revelou neste domingo (8) que a White Martins pediu transporte de oxigênio a coronéis que assessoram Pazuello e não foi atendida. O jornal também mostrou que o Brasil rejeitou no ano passado proposta da farmacêutica Pfizer que previa 70 milhões de doses de vacinas até dezembro deste ano. O ministro acumula erros e acusações na condução da Saúde. As reclamações se dão também por ele ter chegado com o status de um especialista em logística, área que apresentou diversas falhas desde então, como as confusões em voos na entrega de vacinas, etc. Entre governadores, há quem defenda que a mobilização deveria isolar completamente o governo federal, deixando inclusive Pazuello de fora. João Doria (PSDB-SP) escreveu no grupo de WhatsApp dos gestores que é contra qualquer relação com genocídas, mentirosos e incompetentes, segundo suas palavras. Outra parte, porém, entende que a participação da União é obrigatória, inclusive para divisão de responsabilidades. “Se o governo federal não quiser participar, vamos ao Supremo para obrigá-lo. Entre os direitos de quem exerce a presidência da República não está o de se omitir criminosamente”, disse Flávio Dino (PCdoB-MA) ao Painel.

PAINEL - ”Mato Grosso anuncia colapso e pede socorro, mas estados dizem que não têm vaga para ajudar”
PAINEL - ”Governadores articulam anunciar medidas restritivas em conjunto contra avanço da Covid-19”
PAINEL - ”Prefeito de Natal afrouxa medidas restritivas mesmo com 84 pacientes na fila por UTI”

PAINEL - ”Comerciantes se unem em cidade da Chapada dos Veadeiros e decretam 'lockdown voluntário'”: Em Alto Paraíso de Goiás (GO), na Chapada dos Veadeiros, a disputa é entre comerciantes e a prefeitura. Como o município decidiu postergar o lockdown, comerciantes se uniram e decidiram parar por conta própria. O argumento é o de que a cidade não possui leitos de UTI. Batizada de “lockdown voluntário”, a paralisação prevê comércios de portas fechadas por 15 dias a partir da segunda (8). Cerca de 45 comércios, que vão desde pousadas, restaurantes e casas de veraneio, aderiram.

”Conversas sobre candidaturas ao Planalto ignoram mulheres em momento de luta por maior participação”
”Entenda compra da mansão de R$ 6 mi por Flávio Bolsonaro”

OPINIÃO - ”Paulistas vivem e morrem sob a maldição do BolsoDoria”: Enquanto o mundo inteiro apresenta números declinantes nas mortes causadas pela pandemia —até nos Estados Unidos, o campeão de óbitos, o que se vê é um patamar estacionário—, o Brasil, na contramão, bate recordes sucessivos. No dia 3 de março, veio mais um: 1.840 mortes em 24 horas, segundo o consórcio dos órgãos de imprensa. Hospitais públicos e privados colapsam. Não há leitos nas UTIs. Não há oxigênio. Não há espaço para se empilharem os cadáveres. Em todos os cenários, o óbvio se escancara: o despreparo das autoridades agrava o quadro, mata gente e faz da moléstia que se alastra, entre mutações e desinformação oficial, a metáfora mais cruel do desgoverno que vitima os brasileiros.
O estado de São Paulo é o epicentro dessa metáfora. Na unidade federativa mais rica da nação, há mais vítimas fatais do novo coronavírus do que em várias regiões mais pobres. Isso em termos proporcionais, não apenas absolutos. Analisando os dados do Painel Coronavírus (covid.saude.gov.br/, consultado em 4/3), podemos ver que, se fosse um país, o estado paulista, com letalidade de 2,9% e mortalidade de 131 por 100 mil, teria uma performance pior que a do Brasil, com letalidade de 2,4% e mortalidade de 123 por 100 mil —e não nos esqueçamos de que o Brasil figura entre os piores do planeta no trato dessa pandemia. Por que isso acontece? A resposta é tão desoladora quanto clara. Isso só acontece porque aqui, em São Paulo, o desgoverno foi elevado ao quadrado. Além de pagarem pelo negacionismo criminoso do presidente da República, que estimula aglomerações em todas as suas aparições e desdenha dos que usam máscara, os paulistas pagam também pela marquetolagem irresponsável de seu governador, João Doria.
No Palácio do Planalto, Jair Boslonaro, o fascistófeles, ao tempo que elogia a ditadura militar e seus torturadores, dá demonstrações seguidas de desprezo pelos direitos humanos, pela ciência, pela saúde e pela vida de seus compatriotas. No Palácio dos Bandeirantes, o governador faz pose de rei da vacina em capas de revista, mas sua incompetência engalanada só faz piorar o caos. Doria se apresenta como uma inteligência atenta às pesquisas científicas. Sempre que pode, e também quando não pode, gosta de se lançar como o oponente sensato contra o negacionismo presidencial. Encenações à parte, promove turnês da vacina por cidades diversas, provocando aglomerações bolsonáricas. Quando os sinais da segunda onda já eram alarmantes, preferiu acenar com agrados ao comércio em vez de ser rigoroso na proteção da saúde de sua gente. Seus acochambramentos atrasaram as necessárias medidas de isolamento para combater o contágio. Suas ambiguidades empurram mais doentes para os hospitais superlotados. É assim que, em São Paulo, temos a tragédia brasileira potencializada. Em Bolsonaro, a administração calamitosa decorre de uma combinação mortífera: o desprezo pela dignidade humana aliado a limites intelectuais gravíssimos. Em Doria, a demagogia do papagaio de pirata do Instituto Butantan decorre de outro mix, igualmente tóxico: o culto do dinheiro, o próprio incluído, aliado a uma ambição sem limites. Para tornar as coisas ainda mais angustiantes, o governador não se envergonha de nada. Faz ares de que se arrepende do papelão de 2018, quando modificou o próprio sobrenome eleitoral para BolsoDoria, com o objetivo pegar carona como penetra na popularidade do candidato da extrema direita antidemocrática, apologista das armas e da violência.
Na verdade, não se se retrata de coisa nenhuma. Apoiou Bolsonaro como uma chacrete na eleição de 2018 porque viu nisso um atalho para buscar os votos que lhe faltavam. Agora, quando dá a entender que não gostaria de ter feito o que fez, reincide no mesmo golpe, mas com o sinal trocado. Ele não quer se penitenciar de seu ato, quer apenas reeditá-lo, desta vez em sentido contrário. Em 2018, trocou a alma por um punhado de votos de bolsonaristas furibundos. Agora, diz o oposto do que dizia para, em 2022, abocanhar os votos de quem não suporta mais o bolsonarismo. Se para alguns a política exige pactos com o diabo, Doria se julga esperto o suficiente para tapear não apenas o eleitor, mas o próprio Satanás. Ele se endivida com as piores forças deste mundo —e dos outros, também—, com o detalhe de que não quer pagar o preço. Neste mundo, deve sua eleição em 2018 a Bolsonaro. Nos outros mundos, sabe-se lá a quem pede socorro para 2022. E aqui estamos nós, os paulistas. Seguimos vivendo —e sobretudo morrendo— sob a maldição do signo de BolsoDoria. Não, o vírus não é o nosso pior inimigo. O pior inimigo que temos, aquele que nos sequestra o ar, é o monstrengo de duas cabeças que agencia o vírus e dizima sem descanso o que um dia aprendemos a chamar de esperança.
* Eugênio Bucci - Jornalista, professor da ECA-USP e conselheiro do Instituto Vladimir Herzog, é autor de "Existe Democracia sem Verdade Factual?" (ed. Estação das Letras e Cores)
*Hamilton Varela - Professor titular do Instituto de Química de São Carlos da USP

CELSO ROCHA DE BARROS - ”Vale a pena apoiar o genocídio?” - Não há mais nenhuma projeção razoável em que o número de brasileiros mortos na pandemia de Covid-19 fique abaixo de 300 mil. Essa marca deve ser alcançada no final deste mês ou no começo do próximo. Se governadores e prefeitos tiverem grande sucesso com as medidas restritivas que estão adotando, talvez consigamos evitar os 350 mil. O que decidirá se ficaremos mais perto do terço de 1 milhão de mortos, do meio milhão de mortos ou do 1 milhão inteiro será a corrida entre as novas variantes mais contagiosas do vírus, as vacinas que Bolsonaro não comprou e o lockdown que Bolsonaro tenta proibir. Pois bem, talvez interesse ao leitor saber que, enquanto tudo isso acontece, muita gente, entre os ricos e poderosos, civis e militares, ainda pensa o seguinte:
“Certo, o governo Bolsonaro causou essa mortandade toda. É bonito? Não é bonito. Por outro lado, ele não perdeu popularidade nos primeiros 200 mil cadáveres. Talvez sobreviva a mais 200 ou 300 mil cadáveres. Enquanto Bolsonaro tiver chance de reeleição, é melhor continuar a apoiá-lo, ou, ao menos, esperar para ver quantas centenas de milhares de cadáveres são necessárias para que um presidente brasileiro comece a perder voto”. O cenário com que essa turma conta é o seguinte: o acordão continuaria barrando o impeachment de Bolsonaro. Centenas de milhares morreriam, mas imediatamente perderiam o título de eleitor. A capacidade de os brasileiros se importarem com quem morreu continuaria tão baixa quanto foi em 2020.
Em algum momento a vacina chegaria, pois os outros países já teriam se vacinado e sobraria imunizantes para retardatários como o Brasil. Nesse quadro, a vacina poderia causar uma recuperação da economia no final do ano ou no começo do próximo, o que poderia reeleger Bolsonaro. Vou dar aula de moral e cívica sobre o valor da vida humana para essa turma? Eu não. Só tentaria quem não os conhecesse. Mas fica um aviso à turma de sempre: pode dar errado. O auxílio emergencial neste ano será bem menor. Talvez uma população indiferente a 100 mil mortos não seja indiferente a 300 mil, até pelo aumento da probabilidade de ser sorteado pelo vírus. Montar um acordão de impunidade da Covid tão logo depois do acordão contra a Lava Jato é testar muito a paciência do eleitorado. No fim do ano, muitos recursos que poderiam ter vindo para o Brasil agora já terão ido para países que vacinaram mais cedo. E a vacina não trará de volta apenas a atividade econômica: também trará os protestos de rua. Deem uma olhada no que está acontecendo no Paraguai enquanto conversamos.
Houve um sentimento geral de que Bolsonaro se fortaleceu com a eleição de Arthur Lira para a presidência da Câmara. Como vai essa ideia? Desde que “recuperou as rédeas do poder”, Bolsonaro fez uma bagunça na Petrobras e desistiu publicamente de combater a pandemia. Parece ter sido mais um daqueles “agora o governo Bolsonaro começa de verdade” que falhou. Não sei quantos desses cabem em um mandato. Enfim, quem quiser continuar apostando em Bolsonaro tem que se lembrar do seguinte: está se amarrando a algo que certamente será reconhecido como criminoso se a política brasileira voltar ao normal. E a probabilidade de isso acontecer na eleição de 2022 pode estar começando a subir.
* Celso Rocha de Barros - Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).

”Ministério Público teme ofensiva de centrão e Bolsonaro contra Lei de Improbidade Administrativa”

”Entenda pedido de Lula no STF para anular sentenças de Moro e o que isso pode mexer com eleições de 2022”

”Comitiva brasileira é obrigada a usar máscara e seguir medidas contra a Covid em Israel”

”Em Israel, Ernesto Araújo e Eduardo Bolsonaro condenam comparação entre Brasil e câmara de gás” - Em visita a Israel, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Ernesto Araújo, e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) criticaram duramente a ideia de que o Brasil “é uma câmara de gás a céu aberto”, que faz parte da “Carta aberta à Humanidade”, divulgada nesta sábado (6) por religiosos e intelectuais. Para eles, não se pode comparar o que acontece no Brasil na pandemia de Covid-19 com a metodologia nazista que matou milhões de judeus e outras minorias durante o Holocausto. “Isso é algo que totalmente extrapola qualquer comparação que possa ser feita. É algo que, no meu entender, violenta a memória das vítimas do Holocausto”, disse Ernesto ao final de uma visita à chancelaria israelense, em Jerusalém. “É uma colocação totalmente absurda e acho que é ofensiva para comunidade judaica de todo o mundo e também para não judeus que, como nós, vemos a especificidade da coisa horrível que foi o Holocausto. Qualquer comparação que banalize, ainda mais uma comparação tão absurda quanto essa, é algo que não ajuda ninguém e que prejudica a ideia de que nunca mais possa haver nada como o Holocausto”, continuou o chanceler brasileiro. O deputado Eduardo Bolsonaro chamou a expressão de “infelicidade não tão inocente”, acusando o padre Júlio Lancelloti, um dos signatários da carta, de fazer ataques a seu pai, o presidente Jair Bolsonaro. Ele também deu a entender que comparar a situação do Brasil com a de uma câmara de gás foi intencional no momento em que uma comitiva brasileira está em Israel.
“Foi uma infelicidade da CNBB que não dá para dizer que foi tão inocente assim. Não é a primeira vez que o padre Júlio Lancellotti faz ataques direcionados contra o presidente Jair Bolsonaro, mas esse ficou bem vil, justamente que existe uma comitiva brasileira aqui em Israel, buscando levar para o Brasil medicamentos para combater a Covid”, disse. “Esse tipo de declaração realmente é incabível e causa revolta aqui. Comparar o que foi o Holocausto com mais de 6 milhões de vidas perdidas durante o regime nazista nada tem a ver com atual pandemia.” Segundo o filho do presidente, “o Brasil tem feito seus esforços, tem excelentes números com relação à vacinação e veio aqui [para Israel] procurar mais um remédio para combater a pandemia”.
O Brasil tem batido seguidos recordes de mortes por conta do coronavírus. Foram 1.498 novas mortes registradas nas últimas 24 horas. Com isso, neste sábado (6), o país somou mais de 10 mil mortes pela doença em sete dias. Foi a primeira vez desde o início da pandemia que isso acontece. Na última semana, o país completou ainda sete dias seguidos com novos recordes de média móvel de mortes, com o último alcançado neste sábado, de 1.455. O recorde anterior era de 1.423. A referência à câmara de gás também foi discutida na reunião com o chanceler israelense, Gabi Ashkenazi. “Lamentei muito ler, isso aconteceu durante o nosso encontro e condeno veementemente, fortemente esta linguagem usada, este exemplo. Isso é algo ultrajante. Nós nos opomos fortemente a isso. Usar essa linguagem é algo inaceitável", disse o ministro. Toda a comitiva brasileira usou máscaras durante o encontro —algo obrigatório em qualquer prédio público em Israel, incluindo em encontros fechados e para fotografias. O ministério israelense, inclusive, preparou máscaras especiais com as bandeiras do Brasil e de Israel para distribuir aos convidados.
Em certo momento, a assessoria da chancelaria israelense precisou pedir que Ernesto Araújo colocasse a máscara para uma foto com o ministro israelense. Ele respondeu “Oh, yes”, antes de colocá-la. O deputado Eduardo Bolsonaro também estava de máscara, mesmo ajustando-a muitas vezes no nariz. Após o encontro, o Itamaraty divulgou uma nota chamando a conversa de "muito amigável e produtiva” e dizendo que haviam sido discutidas "ideias sobre questões urgentes da agenda internacional" e que os países "concordaram em dar prosseguimento à coordenação entre Brasil e Israel”. Além de passarem "em revista caminhos para a recuperação no contexto da pandemia de Covid-19, sob as perspectivas de saúde pública, de progresso tecnológico e de resiliência socioeconômica”, segundo o texto, o encontro abordou também os desenvolvimentos recentes no Tribunal Penal Internacional (TPI) e no Conselho de Direitos Humanos (CDH). Na quarta-feira (3), o TPI anunciou a abertura de uma investigação formal sobre possíveis crimes cometidos tanto por israelenses quanto por palestinos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. Israel critica o processo, em objeção apoiada pelo Brasil. Em fevereiro, o governo brasileiro se alinhou a Israel e encaminhou ofício ao TPI informando que o país queria participar como “amicus curiae” (amigo da corte) na apuração preliminar do caso.
Após a reunião entre os chanceleres —primeiro compromisso da delegação brasileira que chegou a Israel neste domingo (7) para três dias de visita—, a Folha perguntou a Ernesto se o Brasil tem o que aprender com a maneira como Israel tem enfrentado a crise do coronavírus. O país decretou três lockdowns no último ano, mantém a obrigatoriedade de uso de máscaras em todos os locais públicos e privados e é o mais avançado do mundo na campanha de vacinação. “A situação dos países é bastante diferente em termos de tamanho, em termos de logística”, respondeu o ministro. “No Brasil, existe essa circunstância que, por uma decisão do Supremo Tribunal Federal, basicamente cada estado adota suas próprias medidas. Não há uma possibilidade de uma orientação federal." O chanceler também disse que, assim como Israel, “o Brasil também está em um esforço de vacinação, está progredindo”. “Israel é um dos países que estão mais na frente no mundo, mas o Brasil não está atrás de outros grandes países, como os europeus, que estão mais ou menos na mesma faixa em termos de proporção de população vacinada.” O Brasil aplicou, em média, 49,8 doses em cada 1.000 habitantes, enquanto Israel é o líder mundial, com 998,8 inoculações em cada 1.000 pessoas. Há vários países europeus acima de 100 vacinados em cada 1.000 pessoas, segundo dados compilados pelo Our World in Data.
O chanceler brasileiro afirmou que a visita a Israel é justamente para continuar esse esforço contra a Covid-19 e buscar, no país do Oriente Médio, soluções para a pandemia. Um dos objetivos principais da missão é o interesse do governo brasileiro no spray nasal israelense que trataria de doentes graves com a doença. O medicamento foi desenvolvido pelo Hospital Ichilov (Tel Aviv), mas ainda não passou por todas as fases de teste. “Israel é um dos polos tecnológicos, farmacêuticos, médicos, mais adiantados do mundo. O fato de que estão desenvolvendo medicamentos aqui é algo muito promissor, queremos estar juntos”, disse Ernesto. “O Brasil também tem um esforço nesta área [de tratamento]. Isso não quer dizer que não queiramos trabalhar com a vacina, continuamos trabalhando, existe um cronograma, como o Ministro da Saúde do Brasil tem dito. Então, a nossa cooperação em relação à Covid deve se concentrar, com Israel, nessa questão dos medicamentos. Isso é o que pode fazer a diferença.” Na reunião entre os dois ministros do exterior, que durou pouco mais de uma hora, Brasil e Israel assinaram acordos de cooperação em áreas tecnológicas. O chanceler israelense elogiou a posição do governo Bolsonaro em prol de Israel em fóruns internacionais, mas não deixou de demonstrar a preocupação com o Brasil neste momento da pandemia. “Temos acompanhado nos últimos dias a situação no Brasil e em nome do povo de Israel, gostaria de expressar minha solidariedade ao povo brasileiro. Tenho certeza de que vocês prevalecerão. Posso prometer a você que Israel fará tudo o que puder para apoiar seus esforços para vencer a Covid. Estamos prontos para ajudar no que for possível. Exploraremos oportunidades de investimento conjunto em pesquisa para desenvolvimento de medicamentos ou outras soluções possíveis para o vírus.”

”Israel quer teste de spray contra Covid no Brasil porque país é miscigenado, diz Eduardo Bolsonaro” - Em viagem a Israel, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) voltou a citar o interesse do governo brasileiro no spray nasal israelense que trataria de doentes graves da Covid-19. Após a chegada ao Ministério das Relações Exteriores de Israel, em Jerusalém, como parte da delegação brasileira liderada pelo ministro do Exterior Ernesto Araújo, o filho do presidente Bolsonaro voltou a dizer que o objetivo principal da viagem é falar sobre esse medicamento, desenvolvido pelo Hospital Ichilov (Tel Aviv), mas ainda em fase inicial de testes. “O objetivo da viagem aqui dar todo o suporte necessário ao embaixador Ernesto Araújo nessa missão que tem tudo a ver com a pandemia”, disse Eduardo Bolsonaro. “O novo medicamento, chamado EXO-CD24, tem tido uma eficiência perto de 100% nos primeiros testes com relação ao combate à Covid-19, e a nossa expectativa é de que nós possamos aqui traçar acordos de cooperação para trazer para o Brasil a fase 3, a chamada fase de teste”. Segundo o deputado, os israelenses estariam interessados na participação brasileira porque “o Brasil é um povo famoso por ser miscigenado, com material genético bem diversificado”. Isso ajudaria na obtenção de testes mais amplos sobre a droga. “As expectativas são altas, estamos aqui cumprindo essa agenda, mas tem outras laterais também, como operação tecnológica, áreas de telemedicina e agência espacial”, disse o filho do presidente.
O Hospital Ichilov anunciou há um mês estudos com o spray nasal EXO-CD24, desenvolvido pelo professor Nadir Arber. A droga, anunciada no começo de fevereiro, foi testada apenas em 30 voluntários em estado grave que estavam internados no Ichilov, até agora. Segundo o hospital, 29 pacientes se recuperaram em 3 a 5 dias. Entusiasmado, o primeiro-ministro do país, Benjamin Netanyahu, chegou a receber o professor em seu gabinete e chamou a droga de milagrosa. Ainda não há, no entanto, resultados publicados em artigo científico de fase 1. O governo brasileiro quer assinar um acordo com o Ichilov para realizar as fases 2 e 3 dos testes com o medicamento no Brasil. Para isso, o presidente Jair Bolsonaro disse que iria em breve pedir à Anvisa uma análise para uso emergencial da droga no Brasil. A delegação do Itamaraty e de outros ministérios desembarcou em Israel neste domingo (7). O primeiro compromisso foi na chancelaria israelense, em Jerusalém, onde o ministro Ernesto Araújo foi recebido pelo colega israelense Gabi Ashkenazi. Araújo deve ser recebido nesta segunda-feira (8) pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.
O grupo inclui, também, o secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Hélio Angotti Neto, o secretário de Pesquisa e Formação Científica do Ministério da Ciência e Tecnologia, Marcelo Morales, os deputados Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e Hélio Lopes (PSL-RJ), e o Secretário Especial de Comunicação Social do Ministério das Comunicações, Fábio Wajngarten. Antes da chegada do ministro brasileiro e do filho do presidente, o chanceler israelense, Gabi Ashkenazi, perguntou a assessores como pronunciar o sobrenome de Eduardo Bolsonaro. Todos os presentes estavam usando máscara, que é obrigatória em todos os prédios e locais públicos, em Israel. Quem não usa máscara recebe uma multa que pode chegar a 500 shekels (cerca de R$ 850). Israel está na vanguarda internacional no combate ao novo vírus, tendo empreendido uma campanha de vacinação em massa. Dados indicam uma queda brusca no número de infecções e mortes após o avanço da campanha de imunização. Ao longo do ano passado, a estratégia dos israelenses para controlar a disseminação da Covid-19 esteve baseada em regras de isolamento social, incluindo lockdowns quando houve avanço na contaminação, e no rastreamento de pessoas contaminadas. Já no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro desde o início da pandemia critica medidas de distanciamento social e promove aglomerações. A velocidade da vacinação no país esbarra na escassez de doses após o fracasso de negociações com laboratórios produtores, como a Pfizer.

MATHIAS ALENCASTRO - ”Spray contra Covid é novo episódio da diplomacia da tranqueira entre Brasil e Israel”
”Após reforma ministerial, Paraguai tem 2ª noite de protestos contra presidente”
”Mesmo com repressão violenta, milhares voltam a protestar em Mianmar”
TODA MÍDIA - ”Guerra das vacinas passa por batalha de estudos preliminares”

”Inadimplência deve aumentar com auxílio menor e desemprego elevado”

PAINEL S.A. - ”Supermercado registra alta na compra parcelada de comida no cartão”

PAINEL S.A. - ”Heineken explica rótulo apagado em garrafa retornável”
PAINEL S.A. - ”De volta à fase vermelha, restaurante reclama de gargalo em delivery em SP”
PAINEL S.A. - ”Nubank quer contratar 3.300 mulheres nos próximos anos”
PAINEL S.A. - ”Taurus lança revólver cor-de-rosa exclusivo no mercado brasileiro para o Dia da Mulher”

”Estrangeiros saem da Bolsa brasileira após intervenção de Bolsonaro na Petrobras” - A intervenção do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na Petrobras impulsionou a saída de R$ 6,784 bilhões em investimento estrangeiro da Bolsa brasileira em fevereiro, o pior saldo mensal desde julho de 2020, sem considerar as compras de ações em ofertas iniciais (IPOs) e subsequentes de ações (follow-on). Entre os dias 1º e 18 de fevereiro, antes de Bolsonaro dar o primeiro sinal de que interferiria mudança na estatal, havia uma entrada líquida de R$ 4,6 bilhões de dinheiro estrangeiro, de acordo com dados da B3. No dia 22, a segunda-feira após o anúncio de troca no comando da estatal, saíram R$ 6,85 bilhões, segundo dados da B3 compilados pela XP. No dia 23, foram R$ 2,35 bilhões a menos. Nos últimos três pregões do mês, a venda de ações desacelerou e o saldo foi negativo em R$ 2,14 bilhões." "Se tem uma coisa que gringo não aceita é problemas de governança. A temática de ESG lá fora fica cada vez mais forte", afirma Romero Oliveira, diretor de renda variável da Valor Investimentos. ESG é a sigla para melhores práticas ambientais, sociais e de governança e é um fator que ganha cada vez mais relevância nas decisões de investidores. A saída de recursos se estende pelos dois primeiros pregões de março, com saldo negativo de R$ 1,5 bilhão até o dia 2. No ano, o saldo ainda está positivo em R$ 15,3 bilhões, em razão dos R$ 23,5 bilhões de entrada líquida em janeiro, mês em que o início do governo Joe Biden nos Estados Unidos deu um tom positivo aos mercados.
Um reflexo da deterioração da imagem do Brasil aos olhos do investidor estrangeiro foi a piora dos principais indicadores financeiros do país. Desde a crítica de Bolsonaro ao atual presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, em uma live na noite do dia 18 de fevereiro, o dólar subiu 4,4% ante o real, que teve o terceiro pior desempenho dentre emergentes no período, atrás apenas da lira turca e do rand sul-africano. Em relação às principais moedas globais, o dólar americano se valorizou apenas 1,5% no mesmo intervalo, segundo dados da Bloomberg. O risco-país, desde então, subiu 23%, indo de 159,7 pontos para 196,5 pontos, maior nível desde novembro de 2020. O CDS funciona como um termômetro informal da confiança dos investidores em relação às economias dos países, especialmente emergentes. Se o indicador sobe, é um sinal de que os investidores temem o futuro financeiro do país; se ele cai, o recado é o inverso.
Além da incerteza quanto à agenda liberal do governo, o mercado se preocupa com a piora da pandemia no Brasil e a volta do auxílio emergencial. Apesar do teto para a ajuda estabelecido pela PEC Emergencial, contrapartidas imediatas para o novo gasto não foram apresentadas. Investidores temem o aumento de gastos do governo, pois ele eleva a relação dívida/PIB (Produto Interno Bruto) e deteriora a capacidade de o país honrar com seus compromissos. A alta nos juros futuros refletem este temor. O juro para outubro de 2021 foi de 2,905% ao ano para 3,295% desde o dia 18 de fevereiro. O juro para março de 2025 foi de 6,63% ao ano a 6,95% ao ano. Juros futuros são taxas de juros esperadas pelo mercado nos próximos meses e anos. São a principal referência para o custo de empréstimos que são liberados atualmente, mas cuja quitação ocorrerá no futuro. Além da intervenção na Petrobras, há um outro fator que impulsiona a saída de recursos do Brasil: a alta nos juros dos títulos do Tesouro americano (Treasuries), o que impulsiona um fluxo de investimentos para os Estados Unidos em detrimento de países emergentes.

PAINEL S.A. - ”Ministério da Justiça questiona farmacêutica sobre remédio para controle de peso”
”Falta de pagamento de contas de água e luz bate recorde em dezembro, diz Serasa”
”Cronograma da reforma tributária em 2021 sofre atrasos”
”País se despede de Selic a 2% após efeito limitado no custo da dívida”

MARCIA DESSEN - ”A aritmética dos investimentos”
”Retomada econômica deve ter ação de incentivo a mulheres”
”Veja depoimentos de 6 economistas mulheres sobre a profissão”
RONALDO LEMOS - ”Os NFTs, o wi-fi 6 e o Mapa da Música”
”Veja como declarar o auxílio emergencial no Imposto de Renda”

”Empreendedora no Brasil encara crise, machismo e dupla jornada”
”Pandemia interrompe participação crescente de mulheres no empreendedorismo, diz Sebrae”

”Mais afetadas pela depressão, mulheres não recebem diagnóstico em 70% dos casos, diz estudo”
DEPOIMENTO - ”Não percebi que estava indo além dos meus limites”

”Pandemia deflagra crise do cuidado e põe em risco conquistas femininas” - No pior cenário que imaginei para esta reportagem, ela seria substituída por um aviso: “As repórteres, editoras e personagens do texto que ocuparia este espaço, todas mães, não tiveram condições objetivas, sanitárias e humanas para concluírem a proposta inicial. Foi mal. É o que temos pra hoje”. Os desencontros, interrupções, gritos e choros que acompanharam entrevistas aqui reportadas sugeriam um grau de desarranjo e imprevisibilidade capazes de surpreender os melhores planejamentos. Também mãe de crianças pequenas e às voltas com as tentativas de acomodar em 24 horas as demandas constantes de três frentes de trabalho (remunerado, doméstico e parental), fiz o que foi possível, não sem me sentir devedora e inadequada mesmo dentro do meu evidente privilégio. Um ano após o início da pandemia e do distanciamento social no Brasil, mulheres que têm filhos parecem estar no limite. Sobrecarregadas, exaustas e frustradas, elas perderam a autonomia, o emprego, o sono ou a cabeça —tudo junto ou em combinações variadas. Ao fechar creches e escolas e isolar pessoas, a crise sanitária global fez ruir as redes de apoio (solidárias, públicas ou contradas) que permitiam a essas mulheres ter vida produtiva relativamente independente, ameaçando retroceder conquistas femininas em décadas.
Não surpreende, portanto, que as mulheres tenham sido mais afetadas pela crise global, a ponto de inspirar a expressão em inglês “shecession”, flexão de “she” (ela) e “recession” (recessão) —algo como “a recessão delas”. Mulheres foram mais impactadas pela pandemia em sua integridade física (com o aumento da violência doméstica) e saúde mental (apresentaram transtornos mentais), além da estabilidade financeira. Elas perderam mais emprego e vêm sendo preteridas nas recontratações, além de não conseguirem participar como antes da produção científica ou mesmo da vida pública. O percentual de mulheres brasileiras que trabalhavam ou buscavam trabalho no segundo trimestre de 2020 (45,8%) caiu ao mesmo nível de 30 anos atrás (45,8%), depois de se manter bem acima de 50% ao longo de todos esses anos, segundo dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) e Pnad Contínua. Para as que conseguiram fazer home office, a sobrecarga do trabalho doméstico aumentou com as crianças (e suas aulas virtuais) em casa, colocando parâmetros pré-pandêmicos de produtividade em xeque. Já as mães que precisaram sair para trabalhar se viram diante do medo da contaminação e do impasse de não terem com quem deixar os filhos, o que levou ao abandono do trabalho ou a demissões.
Além disso, os setores de alimentos e serviços domésticos, que contratam mais mulheres e mais mulheres negras, foram os mais afetados pela Covid-19, e isso penalizou esses grupos de maneira desproporcional. Foi assim com Vailma Santos, 26, mãe solo de Heloísa, 5, que trabalhava num restaurante estrelado de São Paulo até maio de 2020, quando foi demitida. “Senti uma turbulência por dentro e um medo enorme de falhar como mãe”, diz, emocionada. “Nunca falo sobre isso. Não tenho tempo”, chora ela. Contratada no final do ano como auxiliar de limpeza, Vailma hoje remunera a própria mãe para que cuide de Heloísa enquanto ela trabalha. Na volta para casa, se dedica a outros desafios da pandemia materna. “Heloísa confunde S com Z. E professora tem paciência, né? Eu não tenho tanta. Estou sempre cansada”, admite. “Queria oferecer opções melhores pra minha filha, mas sozinha é complicado.” Transformadas em arremedos de professoras a contragosto, mães tiveram de sobrepor à jornada tripla a responsabilidade pela escolarização remota das crianças. É uma conta que não fecha. Sem mágica, ela só se resolve à medida que a mulher abre mão de horas de sono, rotinas de autocuidado e tempo de lazer. Esse pacote compromete o bem-estar físico e emocional dessas mulheres, com repercussões nas próprias funções cognitivas e, portanto, no desempenho produtivo e na funcionalidade. “O estresse crônico que atinge as mães com a sobreposição desses trabalhos todos trouxe uma sobrecarga de atenção, que agora fica ativada de maneira mais frequente e intensa”, explica o psiquiatra Gilberto Sousa Alves, professor de saúde mental da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Segundo ele, que também leciona na Universidade Federal do Maranhão (UFMA), a pandemia provocou uma primeira onda de aumento na incidência de transtornos mentais da ordem de 30%, com medo da morte, consumo excessivo de álcool, estresse pós-traumático pela morte de parentes e até ideias suicidas. Mulheres eram maioria. O medo da morte bateu com força na atriz e professora de movimento Gabriela Cordaro, 42, mãe de Martim, 7, e Lina, 4. Ela teve suspeita de Covid-19 e, depois, uma sequência de febres inexplicáveis. “Comecei a ter problemas para dormir. Deitada, ficava pensando em todas as desgraças do mundo e sentia muita insegurança em relação ao que poderia acontecer”, lembra. No auge dessa sensação, ela começou a mandar suas senhas e informações sobre os filhos para a irmã. Vai que... O psiquiatra Alves avalia que uma “segunda onda de transtornos tem ocorrido agora e é consequência da primeira onda”. “Ela envolve esgotamentos, problemas de sono e de concentração, irritabilidade, esquecimentos, distrações e perdas de compromissos, que ainda geram culpa porque as mães se pressionam e sofrem pressão”, diz. “Planejar e monitorar tarefas requer muita energia do ponto de vista neurobiológico. E fazer isso o dia todo, por tanto tempo, é muito exaustivo. O cérebro humano não está preparado para esse tipo de uso tão prolongado.” Andressa Reis, 36, criadora de conteúdo para mães, diz estar nessa loucura. “Tenho filtrado muita coisa para poder focar naquilo que é mais necessário. Se quiser armazenar tudo no meu HD, vou simplesmente pifar”, avalia. “Hoje, eu anoto tudo no planner, só que depois esqueço de olhar.”
A pesquisa Women in the Workplace 2020, que a consultoria internacional McKinsey realiza anualmente com mulheres que trabalham nos EUA, apontou que as profissionais com filhos se sentem 2,6 vezes menos confortáveis que seus pares masculinos para compartilhar sua condição parental, além de se preocuparem 2,1 vezes mais com o julgamento dos colegas sobre sua necessária dedicação a tarefas de cuidado em casa. “A tarefa do cuidado é uma dimensão importante da vida, mas é percebida socialmente como perda de tempo. Isso leva mulheres que estão em posição de destaque a escondê-las para não parecerem nem frágeis nem menos produtivas”, avalia Noemia Porto, 49, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), mãe de cinco, sendo dois ainda adolescentes, que passou a cuidar também da mãe de 78 anos durante a pandemia. “Tudo isso coincide com um pano de fundo estrutural, algo que a gente não quis, mas que recebe desde que nasceu. Só que, mesmo assim, resolvemos que vamos viver igualitariamente no espaço público.” Essa arquitetura patriarcal mantém sobre as mulheres a responsabilidade pela economia do cuidado, tão essencial quanto invisível e desvalorizada, agora também embalada pelos constantes chamados de “mamãe!”. Só não ouve quem não quer. A multiplicidade de pressões virou de cabeça para baixo a vida dessas mulheres, alterando de maneira determinante as condições objetivas da sua participação no mercado de trabalho e autonomia. Segundo a série histórica do relatório da McKinsey, mulheres e homens deixavam postos de trabalho com a mesma taxa até 2020, quando o número de mulheres superou o de homens pela primeira vez. As entrevistadas declaram se sentir ansiosas, estressadas e inadequadas diante de expectativas criadas sob o paradigma pré-pandêmico que hoje lhes parece impossível cumprir.
“É humanamente insuportável cumprir essas tarefas todas, das quais eu tentei cuidar como se fosse o planner do escritório”, explica a advogada e psicóloga maranhense Larissa de Oliveira, 37, mãe de Lucas, 5. “Tive uma redução clara de produtividade, e transitar para uma vida estritamente doméstica foi bem difícil." "Batalhei para ter meu espaço e de repente me vi numa posição que eu lutei muito para não assumir, até por preconceito mesmo. Nossa tendência é enxergar o cuidado como algo menor, mas é uma necessidade básica. Se isso não estiver organizado, nada lá fora funciona”, conclui. Em 2019, apenas 1 a cada 50 das mulheres entrevistadas considerava desacelerar sua carreira ou deixar de trabalhar para cuidar da casa e dos filhos. Em 2020, a pandemia alterou essa proporção de maneira drástica, e 1 a cada 3 entrevistadas considerava esses caminhos antes inimagináveis.
A sobrecarga por acúmulo de funções é inescapável para as mais de 11 milhões de mães solo do país —majoritariamente pobres e negras. “Desde março de 2020, estou em home office. De lá pra cá, devido ao acúmulo de funções de uma mãe solo que está com o filho fora da escola, pedi demissão do meu emprego formal de assessoria de imprensa”, relatou a artista visual Bruna Alcântara, mãe de Tom, 5, por meio do canal que a Folha abriu para ouvir o desabafo de mães sobre o contexto imposto pela pandemia. Bruna conta ter encontrado “tempo para a arte” enquanto “cozinho, lavo, passo e cuido de criança”. Ela é autora das obras que ilustram esta reportagem e integram a série “Mãe Pandêmica”. “Estou cansada, exausta. Ainda assim, não existe nenhuma maneira de parar de produzir, criar e maternar”, descreve ela. Para Bruna, pesa ainda o fato de o governo brasileiro que, “além de não reconhecer a existência da doença e do seu perigo, também não reconhece as desigualdades de gênero como um problema e como uma questão agravada na pandemia”. O governo não está sozinho em mais esse negacionismo, sugerem dados sobre a divisão sexual dos trabalhos de cuidado doméstico e com pessoas. Antes da pandemia, mulheres gastavam, em média, o dobro de horas semanais que homens nessas atividades de cuidado, segundo pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 2019.
Com o confinamento, esse abismo parece ter se aprofundado. Segundo pesquisa do Datafolha, encomendada pelo C6 Bank, 57% das mulheres que passaram a trabalhar em regime de home office na pandemia disseram ter acumulado a maior parte dos cuidados com a casa. Entre os homens, esse percentual é de 21%. Ao entrevistar casais heterossexuais com filhos, o relatório da McKinsey revelou o descompasso na percepção de mães e de pais sobre o próprio envolvimento e responsabilização por esse trabalho. Enquanto 72% dos pais afirmavam dividir com a parceira em pé de igualdade os cuidados com filhos e casa, apenas 44% das mães diziam o mesmo sobre seus companheiros. “A gente já entrou na pandemia com um cenário de desigualdade profunda e, em maio, as mulheres já estavam levantando a mão pra avisar que estavam sobrecarregadas”, diz Giulliana Bianconi, 36, mãe de Martina, 5, e diretora da Gênero e Número, organização que analisa dados para amparar os debates de direitos das mulheres. “Cerca de 25% dos brasileiros são crianças e adolescentes. Quem cuida deles?”, questiona.
Para Giulliana, mulheres não cuidam melhor do que homens, mas essa divisão acontece porque cada um se responsabiliza por aquilo que julga ser seu papel. Flexibilidade no trabalho, portanto, tem de ser pensada também para os homens, de modo a permitir que eles também se responsabilizarem por esses cuidados. “Meu marido tem alguma flexibilidade no seu trabalho, e é isso o que me permite trabalhar também. Se não, acho que eu já teria me separado”, afirma, em tom de brincadeira. “Porque nesse caso a guarda compartilhada liberaria ao menos dois dias úteis por semana para eu me concentrar em outra coisa.” A psicóloga Evelyse Claussi, 43, mãe de duas meninas, aponta que o Brasil ainda está em processo de desconstruir a mulher como aquela que cuida e o homem como aquele que provê. “Tem uma naturalização desse lugar materno, que não é biológico, mas uma construção social à qual as mulheres respondem com dificuldade de dizer que têm outros interesses.” Confortável para os parceiros, essa dinâmica é absorvida pelas crianças, que passam a direcionar suas demandas para quem, de fato, as atende. E isso explica cenas tão corriqueiras quanto surreais, em que crianças gritam pedidos para as mães, mesmo estão sentadas no colo dos pais. Diante da enxurrada diária desses chamados durante a pandemia, Evelyse passou a reagir com uma barganha bem humorada: “Pago dez centavos para quem disser pai no lugar de mãe!”. Nem sempre dá certo.

OPINIÃO - ”Lembrar das mulheres faz parte da cura do Brasil”
”Governo recebeu 105 mil denúncias de violência contra mulher em 2020”
THIAGO AMPARO - ”Discurso à nação brasileira”
”Mais de 60 mil adultos deixaram de estudar durante a pandemia em SP”

”Antes de colapso, White Martins pediu transporte de oxigênio a coronéis que assessoram Pazuello e não foi atendida”
”Pfizer confirma que governo rejeitou em 2020 oferta de 70 milhões de doses de vacinas”
”Maioria dos fabricantes brasileiros de cloroquina não recomenda o remédio para Covid-19”
”Até abril, 77% dos vacinados no país vão receber a Coronavac”

”Epidemiologista Pedro Hallal é novo colunista da Folha”
BOM PRA CACHORRO - ”Hospitais veterinários públicos atenderão apenas urgências durante a fase vermelha em São Paulo”

MÔNICA BERGAMO - ”Explosão de internações por Covid-19 multiplica valor pago por médicos em UTIs”
MÔNICA BERGAMO - ”Terreno da estação Brás do Metrô passa para a CPTM”

MÔNICA BERGAMO - ”Lava Jato tirou R$ 172 bi de investimentos e 4,4 milhões de empregos, diz CUT”: A Lava Jato fez o Brasil perder R$ 172,2 bilhões em investimentos e encerrou 4,4 milhões de empregos no país. É o que afirma um estudo da CUT (Central Única dos Trabalhadores) elaborado pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). O valor que, segundo o levantamento, deixou de ser investido equivale a 40 vezes os R$ 4,3 bilhões que o Ministério Público Federal diz ter recuperado com a operação. Com isso, os os cofres públicos deixaram de arrecadar R$ 47,4 bilhões em impostos, sendo R$ 20,3 bi em contribuições sobre a folha de salários. A pesquisa diz que o setor mais atingido foi o da construção civil, que perdeu 1,1 milhão de postos de trabalho.

MÔNICA BERGAMO - ”Divórcio foi o terceiro tema mais julgado em varas paulistas em 2020”
MÔNICA BERGAMO - ”Taís Araujo e Marília Gabriela participam da campanha que reivindica Nobel póstumo para física sérvia”
MÔNICA BERGAMO - ”Secretaria da Cultura do governo Bolsonaro pede mínimo de 72 horas para responder jornalistas”
MÔNICA BERGAMO - ”Médica Ludhmila Hajjar recebe Prêmio Mulheres na Ciência, da USP”

CAPA – Manchete principal: ”Número de novas infecções já supera em 30% pico da pandemia”

”Homens de confiança – Bolsonaro estimula auxiliares a se lançarem candidatos no ano que vem”
”Sem partido, presidente negocia com DC, PMN e PSC”

”Meio ambiente tem o menor orçamento em 21 anos”

”Governadores de oposição lideram engajamento virtual” - Governadores que fazem oposição ao presidente Jair Bolsonaro e que vocalizam críticas à postura do governo federal na pandemia da Covid-19 tiveram os números mais expressivos de aumento de seguidores e de interações nas redes sociais desde março de 2020. O levantamento, feito pela plataforma MonitoraBR, considera separadamente dados de perfis dos governadores no Facebook, Twitter e Instagram, até o início deste mês, e de posts deles com referência ao coronavírus. Na soma do engajamento — isto é, o total de reações, respostas e compartilhamentos em cada post, dividido pelo número de posts — nessas três redes, o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), aparece com 25,5 mil interações médias, o maior índice dos governadores. Entre os resultados de maior destaque, aparecem também Eduardo Leite (PSDB), do Rio Grande do Sul; Flávio Dino (PCdoB), do Maranhão; João Doria (PSDB), de São Paulo; e Rui Costa (PT), da Bahia, todos alcançando mais de 10 mil interações médias, considerando o engajamento em todas as redes. Aliado de Bolsonaro, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), é a exceção entre os governantes estaduais com maior destaque nas redes. Zema, segundo colocado no ranking geral de engajamento, é também um dos que mais ganhou seguidores no Twitter desde o início da pandemia, atrás apenas de Dino e Doria. O governador de São Paulo, embora tenha a maior base de seguidores no Facebook na comparação com outros governadores, foi o único que teve variação negativa nesta rede: em relação a março do ano passado, Doria aparece com quase 120 mil seguidores a menos.
Doria, que tem estabelecido um antagonismo com Bolsonaro e é pré-candidato à Presidência em 2022, tornou-se um dos principais alvos da militância bolsonarista nas redes. Ele também é alvo de protestos, nas ruas e na internet, por conta de medidas restritivas para combate à pandemia no estado, normalmente com a participação de categorias que formam a base de apoio a Bolsonaro, como os caminhoneiros. A página de Doria no Facebook teve 624 mil reações negativas a mais do que reações positivas de internautas. Na outra ponta, Camilo Santana e o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), outro crítico do presidente, tiveram os maiores saldos positivos, com cerca de 500 mil reações favoráveis a mais do que as reações negativas. Entre os posts que citavam os termos “pandemia” ou “Covid”, publicações feitas por Doria e Camilo obtiveram as maiores repercussões individuais. No Facebook, um post do governador de São Paulo, em janeiro, comemorando a primeira aplicação da vacina desenvolvida pelo Instituto Butantan teve 112 mil interações. No Instagram, o governador do Ceará teve 125 mil interações com um post, no último mês, criticando “aqueles que debocham da ciência, ignoram a luta dos profissionais de Saúde e (...) desrespeitam a dor de milhares de famílias”, numa indireta a Bolsonaro. A postagem mais recente de governadores a ter alcançado grande repercussão foi um tuíte do gaúcho Eduardo Leite, no último dia 27, com um apelo à população para reduzir a circulação do vírus, de modo a aliviar a lotação de leitos hospitalares, inclusive para outros problemas de saúde. Até o dia 1º de março, o post teve 37 mil interações.

”Aumento explosivo – Casos diários de Covid já são 30% mais altos do que no pico de 2020”
”Variantes são consequência, e não causa de espalhamento”

”Damares só gastou ¼ da verba para violência contra mulher”
”Brasil registrou 105 mil denúncias em 2020, quase 290 por dia”
”País pode perder até 4 anos de aprendizagem na educação básica em 2020”

”À beira do limite – Taxa de ocupação de UTIs na capital chega a 96%; oito cidades do interior não têm mais vagas”
”Vacinação no Rio está garantida só até quarta”
”Serviços agonizam – Sem nova rodada de ajuda do governo, empresas fecham as portas e demitem”

”Aliados do Planalto querem policiais fora da PEC”

 

CAPA – Manchete principal: ”EUA veem ameaça global em piora da pandemia no Brasil”

EDITORIAL DO ESTADÃO - ”Uma transformação muito positiva”: O cenário político está tão conturbado que se pode perder de vista uma transformação muito positiva que vem ocorrendo aos poucos. Se de fato for completada, essa mudança pode proporcionar benefícios importantes para a qualidade da representação do regime democrático e para o ambiente de negociação das políticas públicas. Refere-se aqui à diminuição do número de partidos políticos, fruto da cláusula de barreira que começou a ser aplicada em 2019. Para ter uma ideia da transformação que a cláusula pode gerar, apenas 18 dos 33 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) atingiram o patamar mínimo de 2% dos votos válidos com base nas votações em candidatos a vereador em 2020, segundo o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). A taxa de 2% de votos válidos é o limite mínimo fixado pela Emenda Constitucional (EC) 97/2017 para que, na legislatura seguinte às eleições de 2020, partidos políticos tenham acesso aos recursos do Fundo Partidário e à propaganda gratuita de rádio e televisão. Caso não aumentem sua representatividade em 2022, legendas como PV, Pros, PCDOB, Novo, Rede e PSTU não terão direito a recursos públicos e a tempo de rádio e televisão. Ao diminuir os incentivos a partidos nanicos, a cláusula de barreira é um passo importante para reduzir a atual fragmentação partidária. Um sistema político com 33 partidos é uma aberração disfuncional.
A quantidade atual de legendas não gera melhor representação. Há muitas siglas para o eleitor votar, mas não há um aumento de opções políticas viáveis. Para que sejam minimamente efetivas, propostas políticas demandam um mínimo de representatividade. Além disso, a diminuição do número de partidos pode contribuir para um ambiente de negociação política menos fisiológico. A fragmentação partidária é um convite à transformação da política em balcão de negócios. No regime vigente, mesmo os poucos eleitores que votam em partidos nanicos saem enfraquecidos, uma vez que seus representantes não dispõem de mínima relevância representativa no Legislativo. Há apenas uma ilusão de representação. Em razão de seus bons frutos, a cláusula de barreira é adotada em muitos países. Por exemplo, Alemanha, Suécia e Noruega têm porcentuais mínimos acima de 4%. No Brasil, há um bom tempo tenta-se implantar algum limite para as legendas. Aprovada em 1995, uma primeira versão da cláusula de barreira foi declarada inconstitucional pelo Supremo em 2006.
Em 2017, o Congresso aprovou a atual cláusula de barreira, a ser implementada gradativamente. Por exemplo, a partir de 2026, os partidos precisarão alcançar 2,5% dos votos válidos ou eleger 13 deputados federais. Além de ser menos restritiva do que a de 1995, a nova cláusula foi aprovada por meio de uma Emenda Constitucional, o que evita eventuais discussões sobre inconstitucionalidades. É de justiça reconhecer que a diminuição do número de partidos políticos não é mero resultado de disposições legais. O próprio eleitor concentra o seu voto em alguns partidos. Nas últimas eleições, por exemplo, cinco partidos se destacaram pelo número de prefeitos eleitos: MDB (783), Progressistas (687), PSD (654), PSDB (521) e DEM (466). Depois, com números bem menores, ficaram o PT (182) e o PSL (90). Essa concentração de votos mostra que, mesmo com muitas legendas, o eleitorado encontra sua representação em alguns poucos partidos. Ou seja, é o próprio eleitor que distribui desigualmente os votos entre as legendas. Além de evidenciar que a cláusula de barreira não diminui a representatividade política, a concentração de votos em alguns partidos mostra que, no conjunto das 33 legendas, existem realidades muito díspares. Há partidos, por exemplo, com enorme capilaridade, capazes de eleger cinco centenas de prefeitos. Ao fixar limites mínimos de representatividade, a cláusula de barreira ajuda a diferenciar os partidos das meras siglas. Sua aprovação foi uma vitória importante, que não merece ser desfeita. Seus frutos podem gerar um novo cenário político.

COLUNA DO ESTADÃO - ”Mulher de ministro tem cargo na Embratur”: Cristiane Freitas, mulher do ministro Tarcísio de Freitas (Infraestrutura), foi contratada pela Embratur no governo de Jair Bolsonaro. Ela é coordenadora de Integridade e Integração desde novembro do ano passado e responde à gerente Catiane Seif, que, como a Coluna mostrou em janeiro, é mulher do secretário da Pesca, Jorge Seif. O salário de Cristiane, segundo dados oficiais, está entre R$ 20 mil e R$ 23 mil mensais, excluídos auxílios como os de refeição, educação e saúde. A Embratur e o ministério dizem que não se trata de nepotismo.
» É... Antonio Rodrigo Machado, professor de Direito no Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), porém, vê nepotismo na contratação.
» ...sim. “Apesar de a súmula 13 do STF não incluir serviço social autônomo (como a Embratur), há uma clara infração no caso dos princípios de moralidade administrativa e impessoalidade, que levaram os ministros a estabelecer parâmetros para nepotismo”, afirmou Machado à Coluna.
» Não é. Elival Ramos, professor de Direito da USP, avalia que o caso de Cristiane “não pode ser enquadrado (como nepotismo) pelas regras do STF”. Crítico ao fato de o Supremo ter estabelecido as regras, ele defende que o Congresso legisle sobre o assunto e que casos duvidosos sejam analisados individualmente.
» CV. No caso de Cristiane, um resumo do currículo no site da Embratur diz que ela atuou como sócia-gerente de um preparatório para concursos. Não há menções sobre formação acadêmica.
» Com a... À Coluna, a Embratur disse que “o parentesco da funcionária com o ministro da Infraestrutura não teria o condão de conduzi-la ao quadro de funcionários da agência, tampouco serve para configurar a prática de nepotismo”.
» ...palavra. O ministério da Infraestrutura também negou tratar-se de nepotismo e disse que não “tem nenhuma ligação com qualquer contratação que seja realizada pela agência”.
» Espaço aberto. O ministro Tarcísio e Cristiane foram procurados pelas assessorias dos órgãos, mas não se manifestaram.

”Ofensiva na Câmara pode atenuar leis anticorrupção” - Depois de fracassar na tentativa de blindar parlamentares da prisão, a Câmara se prepara para enfrentar, nas próximas semanas, uma série de discussões com potencial para afrouxar leis anticorrupção e dificultar investigações. Nos bastidores, as medidas são chamadas de “pacote da impunidade” por adversários do presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-al). A ofensiva reúne propostas que vão de mudanças nas leis de Improbidade Administrativa, Ficha Limpa, lavagem de dinheiro e proteção de dados para fins penais até a inviolabilidade de escritórios de advocacia.
A agenda é de interesse do Centrão, bloco de partidos que voltou ao comando da Câmara com a eleição de Lira. Logo no primeiro mês à frente da Casa, ele tentou aprovar a jato uma nova Proposta de Emenda à Constituição nesse pacote: a PEC da Blindagem, que amplia a imunidade parlamentar e restringe a possibilidade de prisão de deputados e senadores. Foi uma resposta corporativa à prisão de Daniel Silveira (PSLRJ), determinada no dia 16 pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), após o deputado bolsonarista divulgar um vídeo nas redes sociais com ofensas à Corte e apologia à ditadura militar. A manobra para aprovar a PEC sem passar pelo crivo de uma comissão só não vingou por pressão do Supremo e críticas de eleitores. Diante do desgaste provocado na imagem do Congresso com a tentativa de autoproteção em um momento de agravamento da pandemia, os partidos se dividiram e Lira foi obrigado a recuar, enviando a PEC para análise de uma comissão especial. O presidente da Câmara rejeita o carimbo atribuído à iniciativa. “Não há impunidade nem blindagem. Nossa prioridade é não permitir que a gente viva nesse contexto de crise institucional semanal”, disse Lira em recente live promovida pelo grupo Prerrogativas, que reúne advogados. “Não vai faltar coragem para debater os temas necessários, que tenham clamor.”
Na semana passada, a Mesa Diretora da Casa liberou o funcionamento das comissões, que estavam paralisadas, entre elas o Conselho de Ética. À exceção da PEC da Blindagem e da ideia em negociação de apresentar uma proposta separada para alterar a Lei da Ficha Limpa, as demais proposições do “pacote” foram herdadas do período em que Rodrigo Maia (DEM-RJ) era presidente da Câmara. Algumas estão sendo preparadas desde 2019 e passaram por comissões especiais de juristas. É o caso da proposta de criação da Lei Geral de Proteção de Dados Penal (LGPD-PENAL) e da reforma da Lei de Lavagem de Capitais. Propostas feitas nessas comissões indicam que há risco de entraves às investigações e abrandamento de penas. Em 2020, o ritmo foi lento e nenhuma delas chegou a ser votada, apesar da derradeira tentativa de emplacar a proibição para ações de busca e apreensão em escritórios de advogados com base apenas na palavra de delatores. “Tem comissões trabalhando há bastante tempo, que ainda não deram resultado. Outras estão mais adiantadas, como é o caso da que trata da improbidade. (A análise) vai ser muito no caso a caso, mas não vai haver corte em tudo”, afirmou Margarete Coelho (Progressistas-pi), que faz parte do núcleo de confiança de Lira. Foi ela a relatora da PEC da Blindagem, que amplia a imunidade parlamentar, e a deputada integra a maior parte dessas comissões.
Suspiro. O deputado Lafayette Andrada (Republicanos-mg), relator do projeto de prerrogativas dos advogados, disse que, “como houve uma série de atropelos”, Lira ainda não teve tempo para se debruçar sobre todas as propostas: “Quando houver um suspiro, essas pautas vão andar. Essas comissões voltarão ao normal, elas não morreram”. Na Câmara, além da comissão da improbidade, a que está mais adiantada é a que trata da prisão após condenação em segunda instância. As duas já têm relatórios finais. Com as revelações da Operação Spoofing, mostrando a troca de mensagens entre procuradores e o ex-juiz Sérgio Moro no processo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os parlamentares que costumam defender a Lava Jato temem ser derrotados. A portas fechadas, muitos manifestam receio de que o momento político favoreça acabe afrouxando a norma. No caso da improbidade administrativa, sete dos atuais 24 integrantes da comissão especial criada na Câmara podem ser beneficiados por mudanças na lei, como revelou o Estadão. Eles respondem a processos , e as alterações propostas podem livrálos de eventuais punições. Recentemente, o presidente Jair Bolsonaro disse que a atual Lei de Improbidade é burocrática e “engessa o prefeito”. Já o líder do governo, Ricardo Barros (Progressistas-pr), defendeu a liberação da contratação de parentes no serviço público. Ou seja, quer autorizar o nepotismo, hoje proibido pela Lei de Improbidade e também pelo Supremo.
Ficha Limpa. Criada em 2010 inspirada nos movimentos anticorrupção, a Lei da Ficha Limpa, por sua vez, também deve sofrer modificações, assim que a pandemia arrefecer, como mostrou o Estadão. A proposta chegou a entrar na PEC da Blindagem, mas foi retirada na frustrada tentativa de votar o texto a toque de caixa. Agora, a ideia do PT e de partidos do Centrão, como o Progressistas e o Republicanos, é apresentar uma PEC separada, prevendo a possibilidade de novos recursos judiciais para salvar a candidatura de políticos hoje proibidos de disputar eleições porque foram condenados por decisões colegiadas. Para Lira, a Lei da Ficha Limpa “não pode ser uma prisão perpétua”. Condenado na Lava Jato, o expresidente Luiz Inácio Lula da Silva ficou inelegível em virtude dessa lei. Para o deputado Aliel Machado (PSB-PR), a Câmara não deve se precipitar em votações polêmicas sem ter certeza de que terá apoio: “Lira me disse que todas as discussões devem ser decididas no plenário, não vai segurar nada”. Machado assume em breve a presidência da comissão especial da PEC que analisa a prisão em segunda instância. O Supremo derrubou, no fim de 2019, a possibilidade de execução antecipada de pena. A medida era um dos pilares da Lava Jato e a decisão permitiu a libertação de Lula. Agora, a Câmara pode alterar a Constituição e prever a execução antecipada da pena. Em conversas reservadas, porém, parlamentares admitem que a chance de uma reviravolta assim ocorrer é próxima de zero. Machado acredita que o texto pode ir a plenário em 45 dias, mas não quer se precipitar. “Pautar a prisão em segunda instância de um dia para o outro, como aconteceu com a PEC da imunidade, pode fazer com que se perca todo o trabalho”, disse o parlamentar.

”Partidos ignoram lei de apoio a mulheres”
”Israel ‘obriga’ Araújo a usar máscara”

CARLOS PEREIRA - ”O caminho sem volta da Operação Lava Jato”: Tem sido cada vez mais disseminada uma interpretação de que a operação Lava Jato foi uma cruzada quixotesca de um grupo de promotores e do juiz Sérgio Moro, que só conseguiu sucesso porque um grupo anti-pt queria tirar Lula e o PT do poder. Esse grupo anti-pt teria “dado corda” para a Lava Jato e depois usado a operação para promover o impeachment da presidente Dilma Rousseff – e para, logo em seguida, matar a própria Lava Jato antes que eles fossem suas novas vítimas. Essas interpretações conspiratórias pressuporiam uma extrema sofisticação estratégica. Cometem o equívoco de tomar as intenções dos atores a partir dos resultados que foram atingidos. O fato de os componentes da Lava Jato terem agido de forma estratégica em seus cálculos de ação política não necessariamente significa que seus resultados foram consistentes com suas preferências. Ou seja, nem todos os resultados da força-tarefa eram previsíveis ou mesmo foram por ela previstos. Outra interpretação pueril é imaginar que o término da Lava-jato seria, necessariamente, sinônimo de retorno do sistema político ao equilíbrio predatório anterior. Um legado de várias transformações institucionais, organizacionais e tecnológicas foi deixado pela força tarefa. Por mais “garantismos” que estejamos observando recentemente, inclusive na PGR e na Suprema Corte, os riscos e custos de engajamento em comportamentos desviantes aumentaram exponencialmente, mesmo que de forma não linear. A Lava Jato equivaleria à famosa “pílula vermelha” do filme Matrix, que impediria a sociedade de “desver” as mazelas do sistema político.
Diante do desempenho inconteste da Lava Jato, o contrafactual é a força-tarefa não ter sido enterrada antes. Desconfio de que não exista, no mundo, precedente de uma operação coordenada entre polícia, Ministério Público e Judiciário de combate à corrupção que tenha durado tanto tempo. Talvez a maior falha dos atores envolvidos na Lava Jato foi a de não ter tido a coragem de decretar o seu final quando ainda estava no auge. É preciso fazer uma distinção entre retrocessos na política de combate à corrupção e retrocessos institucionais. Essa distinção é difícil de ser entendida, até porque as instituições afetam a política e também são afetadas por ela. Mas só ingênuos acreditaram que no governo do Capitão não haveria retrocessos do primeiro tipo. O segundo tipo de retrocesso será mais difícil de acontecer, pois as regras e os procedimentos desenvolvidos com a Lava Jato e outras operações são dotadas de resiliência institucional. A trajetória da Lava Jato deve ser pensada a partir das muitas alterações percebidas nas coalizões ao seu redor, na medida em que, ao longo desses sete anos, mudaram as forças políticas e os interesses de cada grupo em apoiar ou bloquear a operação.
Em momentos de grande incerteza política e eleitoral, em que elites políticas atuais percebem que é improvável que continuem a controlar o processo político no futuro, elas buscam “travar” a política. Nessas ocasiões, é esperado que “amarrem as mãos” de elites políticas futuras por meio de uma ampla delegação de poderes que preserve a autonomia e independência de juízes e promotores. Essa foi a escolha do constituinte de 1988, quando havia grande incerteza sobre quem iria ocupar o cargo de maior poder na república. Na medida em que legisladores e juízes/promotores tinham objetivos comuns (ex. controlar um Executivo poderoso), não haveria problemas com a delegação de amplos poderes às organizações de controle, como a Lava Jato. Problemas emergiram quando legisladores se viram ameaçados com a atuação coordenada de juízes e promotores que traziam não só limites ao Executivo, mas a eles próprios.

”Por comércio aberto, grupo faz protesto diante da casa de Doria”

”Rosa rejeita ação de Moro contra Lula” - A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), rejeitou uma ação apresentada pelo ex-ministro da Justiça Sérgio Moro contra o acesso do expresidente Luiz Inácio Lula da Silva às mensagens da Operação Spoofing. A investigação mira um grupo de hackers que invadiu celulares de autoridades, atingindo o próprio Moro e procuradores que atuaram na força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. O ex-juiz também queria que o Supremo declarasse que são inadmissíveis como prova as mensagens obtidas pelo grupo de criminosos. O acesso de Lula às mensagens foi autorizado pelo ministro Ricardo Lewandowski. No mês passado, a 2.ª Turma do STF confirmou o entendimento de Lewandowski, mantendo o acesso do petista ao material. O placar elástico, de 4 a 1, escancarou o isolamento do relator da Lava Jato na corte, Edson Fachin.
Ao entrar com uma reclamação no Supremo, a defesa de Moro argumentou que Lewandowski não teria competência para decidir sobre o acesso de Lula às mensagens. O ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro alegou que Lula utilizou um “subterfúgio processual” para “contornar a prevenção” de Fachin, responsável por analisar casos da Lava Jato e recursos decorrentes de condenações impostas contra o petista. Moro também alegou ao Supremo que as mensagens apreendidas na Spoofing são ilegais, obtidas por criminosos, e imprestáveis para quaisquer fins. A ação é assinada pela sua mulher, a advogada Rosângela Wolff Moro. Antes de assumir os casos da Lava Jato em Curitiba, o então juiz atuou no gabinete de Rosa Weber no STF, auxiliando a ministra no julgamento do mensalão. Em uma decisão de 19 páginas, Rosa Weber apontou para a impossibilidade jurídica de o pedido ser aceito. “No caso concreto, ainda há o agravante de que já submetida, a decisão reclamada, ao crivo da Segunda Turma desta Corte, que manteve, em sua integralidade, o ato decisório ora hostilizado”, escreveu a ministra.

”Desavença entre Biden e chefe do BID ameaça recursos para América Latina” - Quando Mauricio Claver-carone se lançou à presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em 2020, ele já sabia o que o time do então candidato democrata Joe Biden pensava sobre ele: uma figura ideológica e pouco qualificada. Carone, então parte do governo de Donald Trump, manteve a candidatura – e foi eleito. Biden também. Agora, para ampliar empréstimos e influência do banco na região, ele precisa do apoio dos democratas. Para pedir um aumento de capital de US$ 80 bilhões para ajudar os países atingidos pela covid, Carone afirma que o banco terá de cortar empréstimos em meio à pandemia – e o espaço seria ocupado por atores como a China. Como os EUA são o maior acionista do BID, com 30% de participação, ele precisa de um acordo com Biden. O Brasil tem 11,4% de participação. Se aprovado, será o primeiro aumento de capital desde 2010. “O governo Biden terá de decidir. A crise da covid é sem precedentes? O BID é o melhor veículo para uma ação coletiva para a região? Se o governo achar que o banco é o melhor veículo para essa resposta coletiva para América Latina, então, precisará apoiar o aumento de capital”, afirma Daniel Runde, vicepresidente do Center for Strategic and International Studies (CSIS), de Washington. No comando do banco, Carone adaptou seu discurso para buscar convergência com Biden. Do governo Trump, ele importou o eixo de política externa compartilhado por republicanos e democratas: a ideia de reduzir a presença da China na região aumentando a influência dos EUA.
Para se aproximar da pauta de Biden, defende o aumento de capital de forma sustentável, com criação de um fundo para investimentos climáticos e iniciativa de preservação da Amazônia. Ele afirma que não há resistência por parte da Casa Branca, mas aliados do próprio presidente do BID afirmam: ele sabe que a oposição ao seu nome pode atrapalhá-lo. “Se os acionistas não conseguem colocar uma candidatura alternativa de consenso para retirar Mauricio, então precisam parar com as intrigas internas”, diz Runde. Carone não foi apenas um integrante do governo Trump, mas um lobista pró-embargo a Cuba e um dos principais articuladores de uma política e retórica antissocialismo. Seu nome é malvisto na ala de esquerda do Partido Democrata – e entre muitos técnicos do governo. Carone foi eleito em um momento de desorganização dos países da região. Pelo rodízio, seria a vez de Brasil ou Argentina chefiarem o BID. Por já serem os maiores acionistas, os EUA costumam ficar de fora da presidência. Mas Trump não apoiaria uma candidatura do governo de esquerda de Alberto Fernández. Restaria ao Brasil, portanto, fazer campanha pelo apoio de Washington. O nome apresentado pelo ministro Paulo Guedes, o economista Rodrigo Xavier, no entanto, era considerado desconhecido para a maioria dos países da região, o que abriu caminho para Carone.
Plano. Semana passada, um grupo de senadores americanos propôs o projeto de lei que autoriza o aumento de capital de US$ 80 bilhões do BID. O texto fala em ampliar o poder da instituição em “um momento em que a região sofre o impacto econômico da pandemia e de furacões devastadores”, além da crise migratória de venezuelanos. O texto foi proposto por cinco senadores, sendo três democratas, incluindo o presidente da Comissão de Relações Exteriores, Bob Menendez. O apoio bipartidário, comemorado por Carone, ainda é visto com ceticismo por quem acompanha as negociações. Primeiro, porque foi proposto no comitê que debate política externa, e não pelos responsáveis pelo orçamento. Segundo, porque Menendez é visto como um dos democratas “mais conservadores” no Senado, o que indica que a sua bênção ao projeto de Carone não significa apoio da ala progressista do partido. Ao anunciar o projeto, Menendez disse que o aumento de capital garantirá que o BID esteja “mais bem preparado para enfrentar os desafios crescentes da mudança climática nas Américas, apelando para o estabelecimento de seu primeiro fundo ambiental”, um aceno a uma das principais prioridades do governo Biden. Já o republicano Marco Rubio, vê a medida como uma estratégia para “conter o avanço da China na região”.
O banco tem uma reunião, entre 17 e 21 março, na Colômbia, e Carone precisa chegar com uma agenda conjunta, já em concordância com os acionistas. Mas, se não há barreiras colocadas pelo governo Biden, no mínimo há um atraso na discussão. Até agora, os EUA não indicaram o diretor que representará o país no BID. Sem representante formal, não se sabe qual a posição do governo americano. Não é só o BID que não tem representante formal do governo Biden. A cadeira americana na Organização dos Estados Americanos (OEA) tem um interino. A instituição foi usada por Trump para pressionar o regime de Nicolás Maduro. Ou seja, as duas organizações regionais (BID e OEA) são comandadas por trumpistas hostis ao governo Biden. Na OEA, o atual o secretáriogeral, Luis Almagro, foi reeleito no ano passado com apoio de Trump, Bolsonaro e outros 22 países da região. Almagro promoveu uma guinada à direita, suspendendo a Venezuela e reconhecendo os diplomatas do antichavista Juan Guaidó como representantes oficiais – o que não foi seguido na ONU, por exemplo.

ENTREVISTA: MAURÍCIO CLAVER-CARONE, presidente do BID - ”Região quer EUA como parceiro e investidor”

”Trumpista venceu licitação para blindagem na PRF” - A empresa Combat Armor Defense do Brasil, cujo presidente é o americano Daniel Beck, conhecido militante trumpista participante da marcha em Washington que terminou no dia 6 de janeiro na invasão do Capitólio, ganhou em dezembro uma licitação de R$ 11,7 milhões para blindar veículos da Polícia Rodoviária Federal (PRF). A contratação ocorreu por pregão eletrônico, para transformações de viaturas da Superintendência da PFR do Rio. A PRF é subordinada ao Ministério da Justiça. A Combat Armor Defense também venceu uma segunda licitação, no Ministério da Defesa, em 24 de novembro de 2020 para a compra de uma caminhonete blindada no valor de R$ 273 mil, mas a reportagem não encontrou no Portal da Transparência informações sobre a assinatura desse contrato. A empresa se instalou no Brasil em 2019, em Vinhedo (SP), após a eleição de Jair Bolsonaro.
Beck fez campanha para a reeleição de Donald Trump. Ele é adepto de teorias da conspiração que, sem apresentar provas, alegam que a eleição de Joe Biden foi fraudada. Também afirmava em janeiro que Trump teria um segundo mandato, apesar de ter sido derrotado nas eleições de 2020. Defendia ainda o uso da ivermectina contra a covid-19 e dizia que a maior epidemia do mundo hoje é a de pedofilia e não a causada pelo Sars-cov-2. O empresário é filho do fundador da empresa, Doyle Beck. Dan Beck esteve presente em Washington, no Trump International Hotel, no dia 5 de janeiro deste ano (véspera da invasão ao Congresso dos EUA) e postou vídeo em suas redes sociais dizendo que havia se encontrado com Rudolph Giuliani, então advogado de Trump, e com Michael Lindell, CEO da empresa Mypillow, conselheiro de Trump. Lindell mantém contatos com o filho do presidente Bolsonaro, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) pelo menos desde 2018. Eduardo estava em Washington naquele dia.
Em seu site, a Combat Armor informa estar presente em 30 países. No Brasil, pretende vender veículos blindados e blindagens para as polícias estaduais e para o Exército. Um de seus principais produtos é uma versão do caveirão, feita por meio da adaptação de um picape. Ela foi testada pelas polícias do Rio, Espírito Santo e Minas. A direção da empresa demonstra ter interesse nos Bolsonaros – entre as 17 pessoas que o perfil dela segue nas redes sociais estão os de toda a família Bolsonaro. A licitação da PRF que deu origem ao contrato com a empresa dos aliados de Trump foi lançada em dezembro passado e finalizada no mesmo mês. Era na modalidade “Pregão Eletrônico”, em que o governo apresenta um preço de referência e sai vencedora a empresa que dá o maior desconto em relação a esse preço. No caso desta compra, não houve desconto.
Segundo dados do Portal da Transparência, a Combat Armor Defense venceu dois itens da disputa (que tinha cinco itens) apresentando o mesmo preço de referência, uma vez que teve adversários. Ela levou o principal item, que consistia na adaptação de 30 Viaturas Blindadas de Operações Táticas (VBOTS), enquanto os demais itens tinham uma viatura cada. Esse lote estava orçado em R$ 11,5 milhões – o outro item incluía a reforma de uma viatura com caçamba por R$ 200 mil. A outra empresa na disputa – Linkway Importação e Exportação – venceu três itens, num valor total de R$ 610 mil. Até 31 de dezembro, a PRF já havia empenhado R$ 11,1 milhões. Foi a primeira vez que a Combat, criada segundo a Junta Comercial paulista em março de 2019, fez negócios com o governo brasileiro. O Estadão procurou representantes da Combat Armor Defense na sede da empresa. Mas ninguém atendeu. Também procurou ontem a PRF e o Ministério da Defesa.

”Protestos por renúncia crescem no Paraguai”

”Para os EUA, descontrole da pandemia no Brasil e variante ameaçam o mundo” - Uma ameaça para o mundo. É assim que a imprensa americana retrata a atual situação da pandemia de coronavírus no Brasil, ecoando a preocupação de cientistas, autoridades da área de saúde e do governo americano sobre os efeitos do descontrole da propagação de uma nova variante do Sarscov-2 no País. Nos EUA, a população já discute quando a vida poderá voltar ao normal, diante da aceleração do ritmo de vacinação e da indicação de que até o fim de maio o país terá doses de imunizante para todos. Depois de um ano como epicentro da pandemia, os EUA agora veem uma luz no fim do túnel e a ameaça do lado de fora. Mais especificamente no Brasil. “Há uma sensação de alarme sobre a natureza não controlada da pandemia no Brasil e o ritmo lento da vacinação – especialmente agora que o Brasil é a fonte de uma nova e preocupante variante da covid-19”, afirma Anya Prusia, do Brazil Institute do Centro de Estudos Wilson Center, em Washington. “A atenção aqui está voltada para a disseminação dessa cepa mais contagiosa, a P.1, que se originou em Manaus.”
Os primeiros dois casos da variante P.1 foram registrados nos EUA em janeiro, horas depois de o presidente Joe Biden revogar uma decisão de Donald Trump e recolocar a restrição de viagens do Brasil aos EUA. Duas pessoas que estiveram no Brasil foram diagnosticadas com a nova cepa em Minnesota. Até agora, os EUA registraram 13 casos da mutação, em ao menos sete Estados. Mas ainda não há transmissão comunitária, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Mas não foi a chegada nos EUA da cepa de Manaus que alarmou os americanos e sim a recente situação da pandemia no Brasil, que tem batido recorde de mortes. “Enquanto a pandemia continuar a crescer, ninguém estará a salvo”, disse o porta-voz do Departamento de Estado americano, Ned Price, em coletiva de imprensa. Em pronunciamentos e entrevistas recentes, o principal infectologista do governo americano, Anthony Fauci, tem ressaltado que a cepa P.1 está associada a uma maior transmissibilidade e à preocupação de que a mutação possa interromper a imunidade induzida naturalmente e pela vacina.
Há cerca de um mês, Fauci afirmou que isso preocupa os americanos, que não devem derrubar tão cedo o bloqueio de passageiros que estiveram no Brasil. Nesta semana, ele voltou ao tema. “O Brasil está numa situação muito difícil. A melhor coisa é vacinar o maior número de pessoas o mais rápido possível”, disse Fauci, que chegou a dizer que os EUA poderiam ajudar os brasileiros. O ritmo de vacinação nacional, porém, não anima. O Washington Post descreveu a vacinação brasileira como um processo de “escassez e atrasos”, enquanto o The New York Times reporta uma vacinação lenta e sem sinalização de melhora. “O país atingiu o pior momento. Surgiram variantes que parecem mais mortais para pessoas saudáveis, e os cientistas documentaram coinfecção por múltiplas variantes”, escreveu Kevin Ivers, vice-presidente da consultoria americana DCI Group, em relatório. “A preocupação é que a disseminação acelere essas coinfecções no Brasil e leve a uma explosão de novas variantes mais agressivas.” A situação brasileira foi definida pelo Washington Post, no dia 4, como “terreno fértil” para outras variantes. O risco foi mencionado também por cientistas, como Bill Hanage, epidemiologista da Faculdade de Saúde Pública da Universidade Harvard.
Nas redes sociais, o também epidemiologista e economista da área da saúde Eric Feiglding, membro da Federação de Cientistas Americanos, postou que o Brasil precisa da ajuda de líderes estrangeiros. “A epidemia descontrolada do Brasil será uma ameaça ao mundo, mas ainda não é muito tarde”, disse ao Estadão. “Mas é preciso ter sequenciamento genético, controle de fronteiras, quarentenas e testagem em massa.” Para a epidemiologista brasileira Denise Garrett, vice-presidente do Sabin Vaccine Institute, com base em Washington, se o Brasil não for capaz de controlar a situação, os bloqueios de viajantes devem se intensificar. O neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, pesquisador da Universidade Duke, que nos últimos dias ganhou espaço em jornais estrangeiros pedindo uma pressão de outras nações sobre o Brasil, chama a atenção para a “geopolítica da pandemia”. “É a diplomacia do século 21. Já tem países trocando mercadorias por vacinas”, afirmou. “Se o fluxo ficar desimpedido, a doença desse país vai migrar para os outros.”
Falta de liderança. Na imprensa e entre analistas americanos, Jair Bolsonaro é o presidente que propaga desinformação, é cético sobre a vacina e está em choque com governadores. “Como aconteceu com Trump, o vácuo de liderança de Bolsonaro deu ao vírus abertura para se espalhar”, disse o Washington Post. Um dia antes, o The New York Times colocou a preocupação com o Brasil em sua capa. A crise no País já chamou a atenção no ano passado, com as imagens de cemitérios lotados em Manaus e São Paulo. Desta vez, a preocupação é diferente, porque o que acontece no Brasil, segundo os americanos, pode colocar em xeque os avanços do resto do mundo.

”Elas e suas histórias de força e superação”
”Disque 100 e Ligue 180 recebem 290 denúncias por dia em 2020”
”Brasil tem média recorde de mortes pelo 9º dia”

”Executivos miram curso de programação para liderar equipes e dar ‘up’ na carreira”
”Com aumento da demanda, escolas criam até MBA”

 

CAPA – Manchete principal: ”Mercado quer alta maior e imediata da taxa Selic”

”Economia caminha para um semestre perdido” - Primeira metade do ano deverá ser marcada pela combinação de atividade fraca e inflação ainda elevada

”Logística do Exército mira gargalos para facilitar transporte de insumos” - Objetivo é definir os eixos prioritários para transportar suprimentos para qualquer área do território no menor tempo possível

”Privatização ameaça centro de pesquisa” - A privatização da Eletrobras lança dúvidas sobre a sobrevivência do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), criado em 1974, que se tornou referência na América Latina em inovações no setor. Com um quadro de 270 pesquisadores e orçamento em torno de R$ 200 milhões anuais, a instituição ainda tem 80% de suas receitas provenientes da estatal. A MP 1.031, medida provisória publicada na semana passada para acelerar o processo de privatização, prevê que a “nova” Eletrobras não terá mais que fazer contribuições financeiras ao Cepel depois de quatro anos - contados a partir da perda de controle acionário pelo governo. Os aportes compulsórios serão reduzidos à razão de 25% por ano. A grande pergunta, entre dirigentes e funcionários do centro, é sobre a viabilidade de repor todo esse financiamento por meio da venda de produtos e serviços a clientes privados. Essa fonte de recursos tem crescido gradualmente, mas ainda é considerada insuficiente para substituir os aportes da Eletrobras e de suas subsidiárias. Outros associados a instituição de pesquisa - grupos como CTEEP, Engie e WEG - fazem contribuições bem menores. “Podemos caminhar para uma vida sem a Eletrobras, mas não pode ser de uma hora para outra”, afirmou ao Valor o diretor-geral do Cepel, Amilcar Guerreiro. “São quase 50 anos vivendo sob uma mesma estrutura de financiamento. Não sei se quatro anos são tempo suficiente para fazer essa transição. Eu diria que é pouco.”
Outros são mais enfáticos e avaliam que sua existência está ameaçada. “Tal como foi enviada pelo governo ao Congresso, a MP põe o centro na UTI e à beira da morte”, afirma Ikaro Chaves, diretor da Associação de Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobras. “Perder o Cepel é perder a cabeça pensante do setor elétrico brasileiro.” Com 34 laboratórios, o centro tem um histórico de inovação. Todo o sistema interligado nacional, que permite a transferência de grandes “blocos” de energia entre regiões de um país com dimensões continentais, é operado a partir de modelos e softwares desenvolvidos pelo Cepel, como o Newave. Uma de suas unidades, em Adrianópolis (RJ), tem um laboratório que permite ensaios em linhas de transmissão de ultra-alta tensão - como a que liga a hidrelétrica de Belo Monte ao Sudeste - como se os técnicos estivessem em campo. O centro vem trabalhando agora com pesquisas na geração eólica, inclusive sobre a integridade estrutural de pás aerogeradoras e um programa envolvendo tintas anticorrosivas, a fim de evitar problemas em usinas perto do litoral. Guerreiro, do Cepel, reconhece que há espaço para buscar mais clientes privados, mas faz um alerta: “Em nenhum lugar do mundo um centro de pesquisas sobrevive apenas com a venda de seus produtos e serviços. Até porque inovação decorre também de falhas, do que não deu certo e como aprendemos com essas experiências”.
Outras instituições de excelência ainda têm respaldo estatal. Nos Estados Unidos, o Departamento de Energia gerencia 17 laboratórios - os mais similares ao Cepel (Oak Ridge e NREL) operam com aporte governamental na faixa de 80% a 85%. O Korea Electric Power Research Institute é subsidiária da “Eletrobras coreana”. No México, um instituto similar é um órgão da administração pública. Dezenas de emendas parlamentares à MP abordam o Cepel. O senador Jean Paul Prates (PT-RN) propôs esticar o “desmame” para dez anos, com corte de 10% ao ano nas contribuições associativas da Eletrobras, em vez dos quatro anos originais. “O patrimônio tecnológico construído ao longo de mais de 45 anos não deve ser colocado em risco pela adoção de um cronograma irrealista de desvinculação da Eletrobras”, afirma Prates. O deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) sugere prazo de 12 anos. Para Chaves, da associação de engenheiros e técnicos, não se trata só de buscar uma “emenda salvadora” na MP para garantir financiamento ao Cepel. Com uma Eletrobras sob controle privado, diz, aumenta a chance de a empresa buscar “soluções prontas” no mercado, inclusive importadas, em vez de desenvolvê-las internamente. “O Cepel inova e desenvolve porque tem demanda da Eletrobras. Uma empresa privada pode ir atrás de pacotes completos trazidos de fora. O futuro do centro pode ser o de mero homologador de equipamentos”, completa Chaves. O Ministério de Minas e Energia disse que o prazo de quatro anos permite ao Cepel uma transição visando novas fontes de recursos. “Ressalta-se que as contribuições da Eletrobras poderão continuar sendo feitas, [segundo] uma decisão de competência da empresa”.

”País pode ter 3 mil insolvências este ano” - Projeções do Grupo Allianz apontam para risco de o Brasil ter 3 mil insolvências de empresas este ano

”Araújo leva ‘chamada’ para colocar máscara em Israel” - “Bronca” ocorreu após a cerimônia de boas-vindas, quando ele foi convidado a posar para uma foto oficial com o chanceler israelense

”Volta do emprego fica mais distante e deve abalar renda” - Especialistas têm dúvidas sobre vacinação, impactos de novo auxílio e respeito ao “lockdown”

”Cadeia logística prevê impacto menor em nova onda” - Após um 2020 de turbulências e desabastecimento, setor avalia que o cenário crítico não se repetirá

”Concessão de metrô não vê melhora em cenário já crítico” - Com novas medidas de isolamento social, setor não vislumbra saída

”Economia desacelera com falta de vacina” - Economistas preveem recessão técnica como consequência da gestão do governo Bolsonaro em relação à pandemia

”Pico de 3 mil óbitos por dia é factível, dizem cientistas” - Céticos em relação a possível mudança de direção de Jair Bolsonaro (sem partido) no enfrentamento à pandemia, cientistas sustentam que o presidente deve ser responsabilizado pela situação de caos pré-instalada no país e acham pouco provável que a aceleração de casos e óbitos por covid-19 perca força nos próximos dias. Questionados sobre estimativas feitas pelo Ministério da Saúde de que, em cerca de duas semanas, a taxa de óbitos por dia chegará a 3 mil, conforme mostrou o Valor na sexta-feira, os especialistas afirmaram que as projeções estão muito próximas da realidade e que iniciativas isoladas para conter o avanço do coronavírus não surtirão grandes impactos. Ex-ministro da Saúde, o médico sanitarista da Fundação Oswaldo Cruz José Gomes Temporão não só acredita numa escalada proeminente da curva da pandemia, como antevê cenário de caos em razão de fatores conjunturais e estruturais. Segundo ele, a situação é crítica, com risco real de colapso da rede hospitalar na maioria dos Estados. “As projeções são completamente factíveis”, disse o cientista. Temporão observou, porém, que não há nenhum mérito da parte do governo Bolsonaro em fazer esse cálculo, principalmente porque nada fez para evitar que a crise sanitária chegasse a esse ponto. Ele lembrou que o médico Miguel Nicolelis fez essas projeções na semana passada. Em entrevista ao jornal “El País”, o neurocientista classificou a marca como “genocídio” e defendeu lockdown de 21 dias, com pagamento de auxílio aos que ficarem em casa.
“Estamos numa situação de interrupção do auxílio emergencial de R$ 600, subemprego estrutural e desemprego subindo, transporte público caótico, com pessoas aglomeradas. O presidente está ganhando essa guerra da comunicação, da informação... E a população deixou de usar máscara. As três variantes estão circulando, segundo a Fiocruz, em todo o território. E a cobertura vacinal caminha a conta-gotas”, observou Temporão. Membro do Observatório Covid-19 BR, frente que reúne hoje 81 especialistas, Roberto Kraenkel, professor do Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista (UNESP), apontou que o “grande motor da aceleração da pandemia é o cotidiano”. Portanto, não resta à sociedade alternativa senão pisar forte no freio e agora, frisou. “O país esperou a tempestade de janelas abertas.” “Não sei de onde o ministério tirou essa estimativa, mesmo se fossem 2.500. Eu não estou certo de que a cúpula do governo consegue fazer essas simulações, ou se isso é puro chute. Mas não parece inverossímil. Tudo vai depender das ações dos governos locais para tomar medidas que diminuam o contato entre as pessoas.” O físico, que na semana passada assinou com colegas a nota ‘Uma catástrofe se aproxima, mas ainda podemos evitá-la”, não acredita mais em reação do governo. Mas defende que o presidente seja cobrado para que responda pelo atual desastre, com impacto em seu capital político. “Bolsonaro vestiu a capa do cavaleiro da morte”, afirmou.
Na sexta-feira, num tom que coincide com posições de especialistas brasileiros, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse que o país precisa mudar a forma como lida com a crise. “O Brasil tem que levar a sério” a pandemia, disse ele, sem citar Bolsonaro. “Enquanto em muitos países os números estão decrescendo, no Brasil estão crescendo sem parar.” Ele defendeu ainda que o país adote “medidas agressivas de saúde pública e sociais” - contrariando o presidente, que disse na semana passada que a preocupação com a pandemia é “frescura” e que “lockdown não funciona”. Para Temporão, o cenário é altamente favorável para o vírus. “E além disso, as medidas de lockdown que vêm sendo tomadas estão totalmente descoordenadas. Então você fecha uma cidade, mas não faz barreiras sanitárias em relação a municípios contíguos. Um Estado fecha das 23h às 5h, outro faz isso por três, quatro dias, ou seja, caos total. O impacto disso? Muito questionável”, avaliou. O médico também não acredita que o governo vá mudar de postura, “a não ser que alguém pare o presidente Jair Bolsonaro”. Para ele, a sociedade não parece estar mobilizada. “Não me parece que alguma coisa vá realmente acontecer. Só nos restaria uma grande pressão da sociedade, das entidades e de outros setores que até o momento se mostraram calados, como o empresariado.”

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”PT do Rio recebe Haddad sob risco de desfiliações” - Às vésperas da visita do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad ao Rio, na quinta e sexta-feira, para agenda de pré-campanha à Presidência, o PT fluminense convive com a possibilidade de ver a saída de filiados para o PSB, cuja tendência nacional hoje seria a de se aliar ao ex-ministro Ciro Gomes (PDT) na disputa ao Planalto, no ano que vem. Descontentes com a liderança do ex-presidente do diretório regional, Washington Quaquá, nos rumos da legenda no Estado, o deputado estadual Waldeck Carneiro e os ex-deputados federais e ex-ministros Luiz Sérgio e Edson Santos estão entre aqueles que cogitam a desfiliação. No centro das alegações, estão motivos como perda de densidade eleitoral do PT no Rio e a aproximação com políticos que se elegeram com o apoio da família do presidente Jair Bolsonaro, como os prefeitos de Duque de Caxias e Belford Roxo. “A luta contra o bolsonarismo não é abstrata ou que só se dá em Brasília; se dá no Brasil”, diz Carneiro. O parlamentar, que é relator do processo de impeachment contra o governador afastado Wilson Witzel (PSC), também é crítico da iniciativa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pediu a Haddad que botasse o “bloco na rua”, percorrendo o país em pré-campanha. “Não é resistência ao nome do Haddad, mas a esse desfile de nomes em geral, sem um programa prévio”, diz.
Ex-prefeito de Maricá e um dos vice-presidentes do PT nacional, Quaquá nega o enfraquecimento do partido no Rio e defende o pragmatismo. Afirma que tem “setor do PT que gosta de perder” ao priorizar a disputa ideológica e relativiza a ligação dos prefeitos de Duque de Caxias, Washington Reis (MDB), e de Belford Roxo, Waguinho (MDB), com o clã Bolsonaro. “Eles apoiaram Lula e Dilma. Como são bolsonaristas? Se o Haddad ganhar, e vai, o Washington vai ser o maior haddadista do Rio de Janeiro”, diz o dirigente, para quem a chapa presidencial deveria repetir o perfil da que levou o PT à primeira vitória em 2002, tendo o empresário José Alencar (PL) como vice. Agora, o sonho de consumo chama-se Luiza Trajano, dona da rede de lojas Magazine Luiza e sem filiação partidária. Para Quaquá, nada impede que o PT aumente o arco de alianças aos que abandonaram a sigla e votaram pelo impeachment de Dilma Rousseff, como o PL e o PSD, também buscado por Ciro. “Para-brisa não tem retrovisor”, afirma. Visões desse tipo encontram resistência entre os dissidentes que tendem a sair do PT fluminense e se alinham à corrente mais à esquerda da sigla.
Uma das preocupações, antes de acordos com legendas conservadoras, é com a fragmentação de candidaturas e dos votos progressistas, já que além de Haddad e Ciro, o Psol pode lançar Guilherme Boulos e o PSB ainda não descarta um nome próprio. “Há uma tendência de que Bolsonaro já esteja com uma das vagas no segundo turno. Se a esquerda se pulverizar e houver uma candidatura competitiva da direita não fascista, pode ser que nem tenha um progressista no segundo turno”, aponta Waldeck Carneiro. O receio, diz, é compartilhado por gente como o ex-governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro (PT) e os deputados federais Alessandro Molon (PSB) e Marcelo Freixo (Psol), abertos à ideia de frente ampla. Para Quaquá, a dificuldade já parte da pretensão de Ciro em ser cabeça de chapa, apesar do pior desempenho em 2018. O pedetista teve 12,47% dos votos enquanto Haddad registrou 29,28% no primeiro turno. “Ciro é um cara interessante, qualificado, mas tem um problema pois falta voto. Quem tem voto é o PT, que foi ao segundo turno”, diz. O petista provoca: “Vamos continuar conversando com o PDT. Mas é que o Ciro é bipolar. Não sabe se acorda prefeito biônico da ditadura ou se acorda ministro do Lula”, diz, numa referência incorreta à trajetória do pedetista. Ciro não foi nomeado prefeito de Fortaleza pelo regime militar. Pertenceu ao PDS, que sustentava a ditadura, e foi eleito em 1988, após a redemocratização.
Segundo Quaquá, mesmo com o antipetismo Haddad pode se eleger, pois a disputa será “completamente diferente”, com a presença de forte sentimento anti-Bolsonaro. “O antipetismo é dinâmico, há momento em que é maior ou menor, sempre existiu e não é impeditivo”, minimiza. Waldeck Carneiro considera prematuro o lançamento de pré-candidaturas, “uns depreciando outros, do nosso próprio campo”. Em sua opinião, “sem juízo sobre sua capacidade ou inteligência”, “Ciro não ajuda, não agrega”, “mas pode ser até que o plano preferencial dele nem seja se articular com o campo progressista”. O deputado afirma que ainda tem tempo para definir seu destino, pois a janela de transferência só ocorrerá em um ano. Questionado sobre os insatisfeitos, Quaquá afirma que “identificou um movimento de poucas pessoas que vão sair” mas que isso teria mais a ver com cálculo eleitoral do que com incompatibilidade com o PT. “Acham que o Molon vai repetir a votação de 2018 e esperam ir na rabeira dele. Teremos ainda uma chapa federal forte e imaginam que possam não se eleger”, diz. Carneiro, por sua vez, critica a perda eleitoral, com a conquista de apenas uma prefeitura - a de Maricá, reduto de Quaquá - entre os 92 municípios do Estado.
Eleito em 2019 presidente do diretório como sucessor de Quaquá, João Maurício de Freitas diz que o partido cresceu 500%, entre 2016 e 2020, com o aumento de 96 mil para 450 mil no número de votos a prefeito - desempenho puxado pelos quase 300 mil votos de Benedita da Silva na capital, onde ficou em quarto lugar. Sobre a entrada do PT no governo de Washington Reis, Freitas diz que a decisão do vereador Eduardo Moreira de assumir uma secretaria é de “cunho individual”. Procurado pelo Valor, Edson Santos disse que não gostaria de tratar de assunto partidário interno pela imprensa.

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