terça-feira, 17 de março de 2020

Bolsonaro chama cuidados com pandemia de histeria


Com a pandemia provocada pelo novo coronavírus a pleno vapor no mundo, o presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem que vê nas precauções uma mobilização contra seu governo. “Se a economia afundar”, afirmou em entrevista a José Luiz Datena, da rádio Bandeirantes, “acaba o governo. Há disputa de poder nisso aí.” Em geral simpático ao presidente, Datena o pressionou sobre a decisão de cumprimentar pessoas nas ruas, durante as manifestações governistas de domingo. “Estou sozinho num canto apanhando de todo mundo”, explicou. “Tenho obrigação moral de saudar o povo que ficou na frente do Palácio do Planalto. Se me contaminei, é responsabilidade minha. Está havendo uma histeria.” Bolsonaro foi enfático. “Se resolvi apertar a mão do povo, é um direito meu.” (Infomoney)
Datena não poupou críticas. “Estou perplexo, até porque ele tem ainda testes para fazer. Ele está se colocando em risco, contrariou norma médica. É um péssimo exemplo contrariar ordem médica no meio de um surto.” (Folha)

Assista à entrevista do presidente.

É um tema que está gerando desgaste no Planalto. Bolsonaro começou a perseguir e minar o trabalho do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. O motivo: o ministro se apresentou junto com o governador paulista João Doria para falar da pandemia, registra o Radar. (Veja)
Não ficou só nisso. Lauro Jardim conta que o presidente se irritou com a decisão, pelo ministro, de vetar a saída de novos cruzeiros turísticos. Mandetta teve de se esforçar para manter a ordem. (Globo)
Enquanto boicota Mandetta, Bolsonaro vem se aconselhando com Antonio Barra Torres, um contra-almirante da reserva que está no comando da Anvisa. Torres já esteve, este ano, cinco vezes no gabinete do presidente. O ministro da Saúde, duas. Entre os temas comuns dos dois ex-militares estão motos e armas. (Estadão)
Pois é... Nos EUA, Donald Trump já mudou o tom. “A situação é muito ruim”, admitiu, evitando seu tom em geral hiperbólico. “A cada dia, cada um de nós tem um papel crítico para interromper a transmissão do vírus. O presidente americano pediu que ninguém reúna grupos de mais de dez e sugeriu, realisticamente, que os sacrifícios coletivos podem ir até julho e agosto. (CNN)
Não por aqui. Estimulado por Bolsonaro, um grupo decidiu manter um encontro conservador marcado para Belo Horizonte, que começa na sexta-feira. O evento reunirá 500 autodenominados conservadores de todo o país. (Folha)



O ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou um pacote emergencial de R$ 147,3 bilhões para encarar o impacto da pandemia. Em grande parte, não há dinheiro novo, mas antecipações e atrasos. A segunda parcela do décimo terceiro de aposentados e pensionistas será adiantada para maio — R$ 23 bi — e, o abono salarial, para junho — R$ 12,8 bi. Haverá reforço do Bolsa Família, e valores não sacados de PIS/Pasep serão transferidos para o FGTS de forma que possam ser sacados. O governo vai se abster da cobrança de alguns tributos. Vai adiar o pagamento do FGTS pelas empresas por três meses (R$ 30 bi), do naco da União do Simples Nacional (R$ 22,2 bi), reduzirá pela metade as contribuições para o sistema S pelo mesmo período. Guedes atacou o Congresso, se queixando de a privatização da Eletrobrás não ter sido ainda autorizada. (Valor)
Então... Nos EUA, o Fed anunciou a recompra de US$ 700 bilhões em títulos, dinheiro que entra em circulação na economia imediatamente.
Dólar fechou pela primeira vez acima de R$ 5. Esse é um novo recorde histórico nominal, sem contar a inflação. A alta da moeda é pelo avanço do coronavírus e por uma expectativa de corte de juros no Brasil. O esperado é que esta semana o BC corte a taxa em 0,5%, chegando a mínima histórica de 3,75%. Ontem a Bolsa ainda teve o seu quinto circuit breaker do mês, quando as negociações são interrompidas por 30 minutos. O Ibovespa fechou em queda de 14%. Em Wall Street, o S&P 500 caiu 12%, sua maior queda desde a disseminação do vírus. As bolsas na Europa também abriram em baixa em torno de 2%. Enquanto o mercado asiático fechou estável. (Folha)
Com a volatilidade, os agentes de mercado estão começando a pedir o fechamento das bolsas até o pânico passar. A Bolsa de Filipinas se tornou a primeira a cancelar as operações. (Estadão)
Na Europa, montadoras estão fechando suas fábricas. Fiat, Renault, Peugeot, Ford e Nissan estão sofrendo com a falta de peças. (Folha)



Editorial do Estadão: “Bolsonaro, que teve contato com mais de uma dezena de infectados pelo coronavírus, deveria ter se mantido em isolamento, conforme orientação médica. Ao não fazê-lo, colocou em risco a saúde de um número indeterminado de pessoas e a sua própria — que é, por razões óbvias, uma questão de Estado. O presidente foi tão gritantemente irresponsável que custa a crer que não soubesse o que fazia. E, se sabia, o fez de caso pensado: para ele, a saúde dos brasileiros é irrelevante, bem com os impactos econômicos e sociais tremendos da quarentena a que o País começa a ser submetido para tentar frear o avanço da covid-19. A única coisa que interessa a Jair Bolsonaro é seu projeto de poder, que está acima do Brasil e de todos os brasileiros.”
Editorial da Folha: “A atitude estúpida de ir ao encontro de sua diminuta seita de extremistas neste domingo (15), em Brasília, indica que o país não contará com o chefe de Estado na condução da resposta à maior urgência humanitária em décadas. Pelo contrário, Jair Bolsonaro ameaça tornar-se obstáculo à extraordinária coordenação de esforços e recursos necessária para mitigar o impacto que o espalhamento da Covid-19 exercerá no sistema de saúde, no bem-estar de dezenas de milhões de brasileiros e na economia, duramente atingida.”
Editorial do Globo: “O tamanho da falta de sensatez de Bolsonaro, no plano pessoal, pode ser medido pelo fato de que, também no domingo, foi informada mais uma contaminação pelo coronavírus na comitiva que viajou com ele aos Estados Unidos. Seu primeiro teste foi negativo. Serão feitos outros. Por óbvio, deveria se precaver. Quanto ao aspecto político, deverá haver desdobramentos, com a finalidade de que o Planalto respeite os limites que a Carta estabelece ao Executivo.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário