terça-feira, 22 de junho de 2021

Rosana Pinheiro-Machado: 'O que Lula deu e Bolsonaro abocanhou'

 


Tiros de fuzil, bombas de gás, ameaças. É assim que os indígenas da Terra Yanomami vivem desde 10 de maio, quando sete embarcações chegaram à região de Palimiú e abriram fogo cruzado contra os locais. Os ataques são motivados pelo cobiçado subsolo da terra indígena, que ocupa boa parte de Roraima, uma área maior do que a Bélgica no coração da Amazônia. Reportagem de Naira Hofmeister e Pedro Papini, do site InfoAmazonia em parceria com o EL PAÍS, mostra que há nada menos que 500 pedidos de autorização para mineração na zona, sobrepondo-se a um terço do território Yanomami. Nenhum deles tem chance de prosperar, já que é ilegal explorar terras indígenas. Os registros, no entanto, servem de chamariz para garimpeiros e aventureiros, agora animados pelo discurso pró-exploração de Jair Bolsonaro. “Nossos territórios foram invadidos pela ditadura militar e hoje isso tudo está se repetindo”, lamenta Davi Kopenawa, xamã e porta-voz desse povo.

A coluna da antropóloga Rosana Pinheiro-Machado analisa o fenômeno das chamadas “classes ingratas” —aquelas que tiveram sua vida material melhorada nos governos PT, mas votaram em Bolsonaro em 2018. A pesquisadora cita estudos sobre os BIFs (Brasil, Índia e Filipinas), os países emergentes que tiveram uma guinada autoritária recente, para falar das classes aspiracionais e como se relacionam com a retórica da extrema direita. "Mais do que dizer que nas manifestações de bolsonaristas só tinha tiozão de Harley-Davidson (pois isso nos faz bem), seria também interessante olhar a quantidade de moto de entregador de delivery que estava lá. Sim, ela mesmo, a moto comprada na era Lula", escreve. Já reportagem de Flávio Freire mergulha em outra faceta fundamental do bolsonarismo, a mobilização de seguidores, um trabalho estrategicamente elaborado nos porões da internet brasileira. O texto explica os meandros da investigação conduzida pela Polícia Federal que escancarou a relação do Governo com sua base fisiológica, dentro e fora do poder — uma dinâmica pensada e estruturada pelo clã Bolsonaro para blindar o Planalto.

Da Justiça vem uma notícia que abre um precedente histórico para a responsabilização de atos cometidos durante a ditadura militar brasileira. Carlos Alberto Augusto, o “Carlinhos Metralha”, foi condenado criminalmente a 2 anos e 11 meses de prisão por seu envolvimento no sequestro e desaparecimento do ex-fuzileiro naval Edgar Aquino Duarte em 1971. Stephanie Vendruscolo conta que esta é a primeira condenação penal de um repressor da ditadura brasileira, já que até agora, a Lei de Anistia de 1979 vinha sendo utilizada para o perdão irrestrito dos atos cometidos durante o período, apesar das condenações internacionais do Brasil no tema.

Ainda nesta edição, uma conversa com a cantora e compositora Liniker, que estrela a série Manhãs de setembro, da Amazon Prime Video, que estreará em 140 países na próxima sexta, 25 de junho. À repórter Joana Oliveira a artista conta como a maternidade, em suas múltiplas formas e desafios, é o fio condutor da obra. “Não romantizo a maternidade, mas tenho muita vontade de criar, de poder ser mãe num contexto onde minha criança seja amparada com amor, afeto e respeito. Vamos ver, quem sabe um dia…”, diz.


Mineração e garimpo disputam um terço da Terra Indígena Yanomami
Mineração e garimpo disputam um terço da Terra Indígena Yanomami
Ataques recentes de garimpeiros na região de Palimiú são a ponta do iceberg em um território maior do que a Bélgica, com mais de 3 milhões de hectares

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