segunda-feira, 2 de novembro de 2020

Análise de Mídia 02/11

 



 

CAPA – Manchete principal: *”Partidos violam divisão de verbas a negros e mulheres”*

EDITORIAL DA FOLHA - *”Escolinha do Jair”*: Até para o padrão de balbúrdia e inoperância seguido pelo governo de Jair Bolsonaro desde seu início, é espantoso o grau de entropia observado nas últimas semanas. Conflitos intestinos entre ministros, ataques públicos a adversários reais ou imaginários e intermináveis intrigas palacianas revelam, bem mais que divergências em torno de ideias ou propósitos, uma administração sem rumo. Um destampatório do titular da Economia, Paulo Guedes, em audiência no Congresso, foi o mais recente episódio do gênero. Ao discorrer mais uma vez sobre sua cisma em recriar um imposto nos moldes da velha CPMF, Guedes descambou na quinta-feira (29) para uma diatribe contra a federação dos bancos, que estaria a financiar um “ministro gastador” —presumivelmente, Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional). Noticiou-se que, apenas dois dias antes, Bolsonaro pedira um pacto de silêncio a seu primeiro escalão, na esteira de um entrevero entre Ricardo Salles (Meio Ambiente) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo). Convenha-se, porém, que o exemplo de cima não ajuda. Desde que veio a público, poucos meses atrás, o vídeo da fatídica reunião em que o presidente da República indicava seu intento de interferir na Polícia Federal, o país conheceu sem disfarces o chefe inseguro e rude, que exigia em meio a palavrões a fidelidade canina de seus auxiliares.
Não poucos, na ocasião, trataram de corresponder de imediato a tais expectativas —no caso mais ruidoso, o então titular da Educação, Abraham Weintraub, defendeu a prisão de ministros do Supremo Tribunal Federal, o que lhe custaria o cargo depois. Embora tenha recuado nos ataques às instituições republicanas, Bolsonaro nunca abandonou a rotina de bravatas, declarações impensadas e desautorizações em público de ministros. Sente-se visivelmente confortável no caos que patrocina —e que não basta para disfarçar a inação de seu governo. Tanto quanto pode, terceiriza responsabilidades, como se viu na reforma da Previdência conduzida pelo Congresso e, agora, no combate à pandemia, deixado a cargo de governadores e prefeitos. Num regime presidencialista, entretanto, a omissão do chefe de Estado e a ineficácia de sua equipe cedo ou tarde resultam na paralisia em áreas cruciais —como se vê hoje na agenda econômica, a despeito dos riscos crescentes para a recuperação do país e a própria sobrevivência política do governo. Em artigo recente publicado no jornal Correio Braziliense, o general Otávio do Rêgo Barros, ex-porta-voz de Bolsonaro, falou de governantes que passam a rejeitar a discordância e “são tragados pelos comentários babosos dos que o cercam ou pelas demonstrações alucinadas de seguidores de ocasião”. Não foi preciso citar nomes.

PAINEL - *”Para oposição e centrão, Maia ainda quer disputar a presidência da Câmara”*: A entrevista de Rodrigo Maia (DEM-RJ) à Folha consolidou a percepção em vários setores do Congresso de que ele não desistiu de tentar ser reconduzido à presidência da Câmara. O parlamentar declarou que Arthur Lira (PP-AL) é o candidato de Jair Bolsonaro (sem partido) à Casa e afirmou que não excluirá a esquerda de nenhum acordo que envolva sua sucessão. Para líderes da oposição e do centrão, o gesto teve como objetivo polarizar os deputados para assegurar apoio de um campo na briga. A Constituição veda a reeleição de Maia. Há uma ação no STF para tratar do assunto. Embora o parlamentar negue publicamente essa opção, a aposta em partidos de centro e contra Bolsonaro é que, se conseguir uma saída jurídica, o deputado disputará de novo o comando da Casa. Maia diz que há quatro ou cinco nomes que poderia apoiar na eleição do ano que vem. Para parlamentares, o fato de ele ainda não ter escolhido um deles cria um cenário para que o deputado diga, caso possa se lançar, que não houve consenso entre seus aliados e embarque na briga pela Câmara. Para nomes importantes da esquerda, na entrevista, Maia quis amarrar o apoio do campo e construir uma narrativa que impeça os oposicionistas de votar em Lira sob pena de ficarem com a pecha de eleger um governista. A oposição na Câmara soma cerca de 130 votos de 513 e é considerada a fiel da balança na briga pelo comando da Casa em fevereiro de 2021.
O impasse em torno da instalação da CMO (Comissão Mista do Orçamento), uma prévia da disputa pela presidência da Câmara, não deve acabar tão cedo. Maia ofereceu um trato em que a bancada feminina ficaria com a relatoria do Orçamento em 2021 e em troca, seu aliado Elmar Nascimento (DEM-BA) presidiria o colegiado neste ano. Pela ideia, Flávia Arruda (PL-DF), que representa o centrão na briga, seria a relatora, mas o acordo enfrenta resistência. A tendência é que só haja um desfecho quando as tratativas para a sucessão da Câmara tiverem resolvidas entre os dois grupos.

PAINEL - *”Alcolumbre deve indicar secretário-geral da Mesa do Senado para vaga no CNJ”*
PAINEL - *”Justiça rejeita pedido de Russomanno para tirar do ar propaganda eleitoral de Joice”*
PAINEL - *”Nos EUA, Barroso encontra time da OEA que acompanhará eleição municipal no Brasil”*

PAINEL - *”Ex-ministros e militares avaliam que meio ambiente no Brasil sofrerá forte impacto se Biden vencer”*: Ex-ministros das Relações Exteriores, embaixadores e militares avaliam que, se Joe Biden, candidato democrata, vencer a eleição nos EUA, a política no Brasil que mais sofrerá impactos será a do meio ambiente. “Os EUA terão posição de pressão por meio de exigências ambientais em acordos comerciais e econômicos”, diz o ex-chanceler Aloysio Nunes. Celso Amorim, também ex-ministro, avalia que Bolsonaro terá de dar uma guinada e ser mais incisivo no combate ao desmatamento sob pena de ficar severamente isolado pelos Estados Unidos e a Europa.

DELTAFOLHA - *”Partidos descumprem regra de repasse de verba de campanha para negros e mulheres”*: A distribuição feita pelos partidos da verba pública de campanha não está cumprindo, até o momento, a regra de divisão proporcional entre homens e mulheres, negros e brancos. Compilação feita pelo DeltaFolha com base na prestação de contas parcial dos candidatos entregue à Justiça Eleitoral mostra que apesar de pretos e pardos somarem 50% do total de candidatos, eles foram destinatários de cerca de 40% da verba dos fundos Eleitoral e Partidário. Os autodeclarados brancos reúnem 60% do dinheiro, apesar de representarem 48% dos candiatos. Decisão de outubro deste ano do Supremo Tribunal Federal estabeleceu que os partidos devem dividir o dinheiro público de campanha de forma proporcional ao número de candidatos negros e brancos que lançarem. Apesar de a legislação determinar desde 2018 distribuição dos recursos às mulheres na proporção das candidaturas lançadas (neste ano, 33,5%), por ora a maior parte das siglas não cumpriu essa regra. Na média, homens foram beneficiários de 73% do dinheiro. De todos os 33 partidos —o Novo e o PRTB abriram mão do Fundo Eleitoral—, só os nanicos de esquerda PCB e PSTU cumpriram ambas as regras, de acordo com as prestações de contas parciais.
A observação do cumprimento das regras pela Justiça Eleitoral se dará após as eleições, na análise das prestações de contas finais das siglas e candidatos, mas a proporção de recursos liberadas até o momento, além de mostrar prioridade dos caciques partidários para homens e brancos, deixa negros e mulheres em desvantagem, na média, por ter menor tempo hábil para uso do dinheiro na campanha. O primeiro turno das eleições está marcado para o dia 15. "Começou a sair o dinheiro esta semana, mas de forma ainda muito lenta. Avaliamos que houve um grande despreparo dos partidos. Mesmo que saia o dinheiro daqui pra frente, vai ser em um tempo tão nocivo que não vai atingir o objetivo de dar um 'upgrade' nas candidaturas de negros no país", diz o presidente do MDB Afro, Nestor Neto, candidato a vereador em Salvador. Articulador político do movimento Bancada Preta —que visa estimular o aumento da participação de negros em postos políticos de comando—, Eduardo Barbosa, conhecido como Bob Controversista, afirma que já há discussão sobre como mobilizar instituições e Ministério Público para que a lei seja cumprida.
Ele cita que uma das candidaturas a vereador priorizadas pelo grupo, por exemplo, a de Paulão (PT), em Francisco Morato (SP), recebeu apenas R$ 2 mil, na última quarta (28), a pouco mais de 15 dias das eleições. "É inadmissível demorar tanto para chegar e, quando chega, vem desse jeito." Na última terça-feira (27) o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Luís Roberto Barroso, promoveu mais uma reunião com dirigentes partidários para discutir as eleições. O encontro virtual foi pautado mais uma vez pelas reclamações das siglas sobre as cotas de gênero e racial. Sobre essa última, a principal crítica é a de que a Justiça a adotou em cima da hora, não possibilitando aos partidos se preparar. Apesar de a necessidade de repassar o dinheiro proporcionalmente ao número de mulheres candidatas vigorar desde 2018, o presidente do PSL, Luciano Bivar, disse a Barroso, segundo relatos feitos à Folha, que o partido tem dificuldade de encontrar candidatas mulheres para cumprir a exigência. Bivar foi indiciado pela Polícia Federal sob suspeita de comandar em Pernambuco, em 2018, esquema das candidaturas laranjas, mulheres lançadas com o único intuito de desviar verba da cota de gênero. O caso foi revelado pela Folha. Em entrevista à Folha, na época, Bivar afirmou que a política "não é muito da mulher". Em reunião anterior, os dirigentes partidários disseram que o cumprimenbto da cota racial, decidida de última hora, é "inexequível". Na ocasião, Barroso disse compreender a dificuldade. "O que posso sugerir é que, de boa fé, tente se cumprir a decisão." Eventual descumprimento ou desvios dessas cotas podem resultar em punições na área eleitoral —como cassação de chapas eleitas, multas e bloqueio de repasse de verbas— e criminal. Os fundos Eleitoral e Partidário são a principal fonte de financiamento dos candidatos, com orçamento total em torno de R$ 3 bilhões neste anos. Entre os principais partidos, aqueles que mais concentraram os repasses de verba eleitoral pública em candidatos brancos foram PDT (77%), PSDB (76%), PL (67%), PSL (65%) e MDB (65%).
Só seis partidos distribuíram, até a prestação de contas parcial, recursos na proporção dos candidatos negros lançados ou acima: cinco nanicos (PCB, PTC, PSTU, UP e Avante) e o DEM.O partido presidido pelo prefeito de Salvador, ACM Neto, tem como principal destinário da verba pública da sigla o seu vice e candidato à sua sucessão, Bruno Reis, que se declara pardo. No caso das mulheres, os partidos com menor repasse proporcional de verbas, entre os grandes, são DEM (19%), PSB (20,5%), PSDB (22%) e MDB (23%). Doze estão cumprindo a regra —PMN, PCB, DC, PSTU, Podemos, Pros, PV, PC do B, PSOL, Cidadania, PSC e PMB. Esse último, o Partido da Mulher Brasileira, é o campeão, com 71%, mas graças apenas ao repasse para a candidatura da própria presidente da sigla, Suêd Haidar, que disputa a prefeitura do Rio e foi destinatária de um quarto de toda a verba nacional do partido, R$ 300 mil. Haidar não tem nem 1% das intenções de voto, segundo pesquisa do Ibope divulgada nesta sexta-feira (30). Conforme a Folha mostrou na última semana, há uma enorme concentração do dinheiro público de campanha em poucas mãos. Até aquela data, menos de 1% dos cerca de 550 mil candidatos havia recebido algum aporte dos fundos. A prestação de contas parcial, cujo prazo de entrega encerrou-se no dia 25, trata da aplicação de dinheiro público da ordem de R$ 800 milhões. O projeto 72horas, que acompanha os dados relativos aos fundos, informava que até a sexta-feira (30) esse valor havia subido para R$ 976 milhões, mas o padrão de distribuição continuava similar à das prestações entregues uma semana antes: 73% da verba para homens, 62% para brancos.
Legendas dizem que estão empenhadas em cumprir as cotas
Em nota, o PSL afirmou que ao final irá cumprir as cotas e que eventuais atrasos ocorrem devido ao sistema de controle montado pelo partido. "Seguindo as normas de compliance interno, o PSL definiu uma série de requisitos para que os recursos sejam liberados. Cada diretório estadual precisa encaminhar uma lista dos candidatos locais, com um requerimento de recursos e um recibo comprovando o repasse dos mesmos. No caso das candidatas mulheres, elas necessitam ainda preencher um documento confirmando que são candidatas por livre e espontânea vontade. E no caso das candidaturas de negros e negras, é preciso também preencher um documento reconhecendo a etnia, como previsto na legislação eleitoral", afirma a sigla. Sobre a reclamação de Bivar da falta de candidatas, o partido afirmou que "a intenção e o esforço do PSL são no sentido de cumprir integralmente o financiamento eleitoral previsto pelo sistema de cotas" e que se isso não for possível o partido "vai reduzir o repasse para as candidaturas de homens e brancos e devolverá os recursos aos cofres públicos".
O MDB disse nesta sexta (30) que já repassou aos diretórios estaduais, responsáveis pela distribuição aos candidatos, R$ 134 milhões do Fundo Eleitoral, sendo 48% para mulheres e 40% para negros. "O MDB trabalha para cumprir as metas de distribuição de recursos, de acordo com a legislação. O partido entende que as medidas adotadas fortalecem a democracia e aumentam a participação de setores da sociedade que, historicamente, foram prejudicados até então." O presidente do PSB, Carlos Siqueira, também afrmou que o partido instruiu os direitórios regionais para cumprir ambas as cotas, mas que ainda há muito dinheiro a ser repassado às mulheres e que a aferição da aplicação proporcional dos recursos se dará na prestação de contas final. Em nota, o DEM afirmou que cumprirá a regra da cota feminina e que a análise dos dados nessa fase da campanha, "além de ignorar a estratégia eleitoral do partido, desconsidera o fato natural de que o maior aporte de recursos ocorre na reta final das eleições, respeitando o desempenho das candidaturas". Também em nota a assessoria do PSDB disse que o partido está cumprindo as regras e que "os dados não refletem as autorizações dadas aos estados e lideranças". A direção nacional do PL afirmou que cumprirá todas exigências legais dentro dos prazos previstos. O PDT não respondeu.

FOLHA EXPLICA - *”Entenda o que é o poder de polícia da Justiça Eleitoral e como funciona a fiscalização”*

*”Acusado de beneficiar evangélicos, Crivella sofre rejeição até de base eleitoral religiosa”* - Alvo de ações sob acusação de beneficiar grupos evangélicos, o prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (Republicanos), vê a rejeição a sua candidatura à reeleição invadir sua base eleitoral entre os cristãos. Bispo licenciado da Igreja Universal, o prefeito é rejeitado por 38% dos evangélicos, segundo pesquisa Datafolha divulgada no dia 22. O número é menor do que os 58% no eleitorado como um todo, mas representa mais de um terço no grupo religioso. O cenário fez com que Crivella reforçasse o vínculo religioso de sua candidatura, estratégia pública oposta àquela que adotou em todas as eleições majoritárias em que acumulou derrotas desde 2004. Nas eleições anteriores, o prefeito sempre buscou se desvincular da Igreja Universal e seu passado como bispo. Com o novo cenário político após a eleição do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), Crivella tem repetido as menções a Deus e religião. A rejeição de parcela expressiva dos evangélicos ocorre após uma gestão na qual o candidato do Republicanos foi sucessivamente acusado de beneficiar fiéis de seu credo. Crivella é alvo de duas ações civis públicas movidas pelo Ministério Público e enfrentou pedido de impeachment sobre o tema. A primeira ação foi proposta em 2018 e narra nove situações nas quais, segundo a Promotoria, Crivella beneficiou grupos evangélicos. “Observa-se uma tendência do demandado [Crivella], atual administrador municipal, em privilegiar determinado seguimento religioso, bem como, de forma sutil, perscrutar informações a respeito da religião professada pela população e pelo funcionalismo público”, afirma a ação. O processo, ainda não julgado, inclui o episódio conhecido como “Fala com a Márcia”. Trata-se da uma reunião no Palácio da Cidade na qual ele oferecia privilégios a líderes de igrejas evangélicas em demandas de serviços públicos. “Estamos fazendo o mutirão da catarata. Contratei 15 mil cirurgias até o final do ano. Então, se os irmãos tiverem alguém na igreja com problema de catarata, por favor falem com a Márcia", disse o prefeito, em áudio divulgado pelo jornal O Globo.
A ação também trata de censos religiosos feitos dentro de órgãos públicos e uso da estrutura municipal para eventos da Igreja Universal. “Parece crível que os espaços públicos administrados pelo município passaram a ser uma extensão dos templos da Igreja Universal do Reino de Deus”, diz o MP-RJ. No mês passado, Crivella foi alvo de nova ação civil pública, na qual foi acusado de ceder ilegalmente um terreno do município para projeto da igreja evangélica Marca de Cristo. Além da cessão, a prefeitura realizou obras no local, segundo a Promotoria. Uma das peças desta ação revela uma estratégia de Crivella nos bastidores da pré-campanha: a participação intensa na inauguração de igrejas ou espaços a elas vinculadas. Os supostos benefícios não geraram um retorno eleitoral ao prefeito. Com uma administração mal avaliada, ele corre o risco de ficar fora do segundo turno da disputa. O nível de rejeição sempre foi um dos empecilhos de suas tentativas eleitorais majoritárias até 2016, quando sempre via a candidatura desidratar até a data do primeiro turno. Em 2008, sua rejeição no início da campanha era de 31%, sendo 10% entre os evangélicos pentecostais —dos quais fiéis da Universal fazem parte— e 17% dos não pentecostais. Oito anos depois, 22% declaravam que não votariam no bispo licenciado, sendo 7% entre pentecostais e 11% entre não pentecostais. Na eleição de 2016, o fato de enfrentar um adversário marcadamente de esquerda como Marcelo Freixo (PSOL) fez com que ele adquirisse um apoio maciço entre evangélicos, o que não tinha conseguido nas eleições anteriores. Às vésperas do segundo turno, 92% dos evangélicos pentecostais e 80% dos não pentecostais declararam que votariam em Crivella, segundo o Datafolha.
Este ano, o prefeito segue tendo seu principal eleitorado entre os cristãos. Mas o nível está bem diferente do identificado há quatro anos: apenas 28% desses entrevistados declararam que votam em Crivella. Algumas liderança evangélicas evitam se engajar na campanha de Crivella em razão da boa relação construída com Paes durante a gestão do candidato do DEM (2009-2016). Entre algumas das ações do ex-prefeito está o financiamento de algumas edições da Marcha para Jesus. O ex-prefeito tem 23% das intenções de voto entre evangélicos, sendo rejeitado por 43% nesse grupo —percentual maior do que os 31% no eleitorado em geral. Uma das estratégias de Crivella agora é, além de ressaltar o vínculo religioso, colar a imagem à do presidente. Após Bolsonaro declarar um apoio constrangido —que incluiu até um elogio ao ex-prefeito Eduardo Paes (DEM), adversário na disputa—, o prefeito conseguiu gravar um vídeo ao lado do aliado a fim de exibi-lo na reta final de campanha do primeiro turno. Na Justiça, Crivella nega ter beneficiado evangélicos. Afirma que o caso da reunião tinha como objetivo prestar contas e divulgar serviços. "Desde o início de sua gestão, o prefeito Marcelo Crivella já recebeu os mais diversos representantes da sociedade civil parta tratar dos mais variados assuntos, tanto em seu gabinete como no Palácio da Cidade", afirmou a prefeitura na ocasião. ​ Em nota, a campanha de Crivella negou qualquer benefício a evangélicos em sua administração. E reenviou frases do prefeito numa entrevista concedida à Folha em setembro de 2019. "Sou um bispo evangélico. Tudo o que digo, absolutamente tudo, já traz uma ideia ao repórter de que ali está falando o bispo com posições bíblicas. Se você for a um culto meu na igreja, com certeza vai ouvir eu pregar o Evangelho. Mas aqui, na prefeitura, não”, afirmou ele na ocasião. “Política e religião são coisas que caminham entrelaçadas porque ambas são sobre servir ao próximo. Temos que nos preocupar em separar o Estado e a igreja. Agora, o político professar sua fé é natural, não tem absolutamente nenhuma mácula na democracia, em que prevalece a maioria, com respeito à minoria", disse à época.

*”Folha realiza debate virtual com candidatos a vereador em São Paulo”*
CELSO ROCHA DE BARROS - *”Grande porre mundial dos anos 2010 está passando?”*

*”Alvos da Lava Jato, ex-tesoureiros são apostas do PT no interior de SP e no Grande ABC”* - Dois ex-tesoureiros de campanhas petistas que foram alvos da Lava Jato são a aposta do Partido dos Trabalhadores para conquistar prefeituras importantes no interior de São Paulo e no Grande ABC. Após a operação, iniciada em 2014, o PT perdeu a Presidência da República e viu definhar boa parte do seu capital político e eleitoral. Hoje, o partido governa apenas sete cidades no estado de São Paulo. Em 2012, no seu auge, o PT conquistou o comando de 72 dos 645 municípios paulistas, incluindo a capital, que foi administrada por Fernando Haddad. Uma razão encontrada pelos petistas para essa queda tão brusca no estado (88% menos prefeituras conquistadas entre as eleições de 2012 e 2016) foi justamente a Operação Lava Jato, que mirou os integrantes da legenda. Em 4 de março de 2016, a Polícia Federal bateu à porta de José de Filippi Junior, ex-prefeito de Diadema (1993 a 1996 e 2001 a 2008). “Eu estava me preparando para nadar”, conta Filippi, que foi investigado por ter sido tesoureiro das campanhas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006, e da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2010. Naquele dia, o próprio Lula foi alvo de uma condução coercitiva para depor.
Fillipi nunca foi acusado formalmente, mesmo sendo alvo daquela fase da operação, batizada de Aletheia, que aprofundava investigações de desvios na Petrobras. “Eu não fui nem indiciado e nem denunciado. Investigaram dez anos da minha vida e eu estou aí à disposição de autoridades para debater. E isso pela condição de eu ter sido tesoureiro das campanhas, não por eu ter sido prefeito”, diz Filippi. “Isso aí para mim é página virada. Os meus adversários tentam me associar a isso, mas até o povo está respondendo”, diz o petista, que faz referência a uma pesquisa do instituto ABC Dados, que indica boas chances de ele ir para o segundo turno da eleição para a prefeitura de Diadema. Segundo essa pesquisa, Filippi tem 31% da preferência do eleitorado. É quase três vezes o índice do segundo colocado, Revelino Almeida, o Pretinho, do DEM, que tem 11%. “São 13 candidatos, cerca de seis ou sete com alguma musculatura. Estamos nos preparando para ver quem será nosso adversário no segundo turno”, diz José de Filippi. Foi em Diadema que o PT conquistou sua primeira prefeitura, em 1982, com Gilson Menezes. Em Araraquara, a situação do atual prefeito, Edinho Silva, é semelhante. Uma pesquisa interna do PT aponta que ele está na frente na disputa. A medição diz que ele deverá ter como principal adversário o médico Luís Cláudio Lapena Barreto (Patriota). O petista prevê uma eleição disputada para ele e para seus correligionários do estado. “O antipetismo ainda está forte. Melhor que em 2016, mas ainda está forte”, diz o prefeito de Araraquara.
Edinho já estava no cargo de prefeito quando, em 9 de novembro de 2018, sua casa foi vasculhada por policiais federais. A investigação fazia parte da Operação Capitu, fase da Lava Jato que procurava provas de um esquema de corrupção no Ministério da Agricultura durante o governo Dilma. Edinho foi tesoureiro da campanha eleitoral de 2014 e ex-ministro de Dilma. A investigação não avançou sobre ele, que ainda não foi ouvido pelos investigadores e não há sequer denúncia pelos procuradores. A Justiça Eleitoral arquivou dois inquéritos contra ele, que havia sido acusado por dois executivos da Odebrecht de pedir R$ 1 milhão para a campanha de Aloízio Mercadante a governador de São Paulo em 2010. Edinho também foi acusado de arrecadar dinheiro para a campanha da ex-presidente Dilma em 2014 por meio de caixa dois, verna não declarada à Justiça Eleitoral. Por falta de provas, o processo também foi arquivado. Edinho foi denunciado na ação conhecida como “Quadrilhão do PT”, que acusa a existência de uma organização criminosa no partido para desvio de verbas do governo Dilma. Outra denúncia foi feita pela Lava Jato na investigação envolvendo a indústria farmacêutica EMS, onde há a suspeita de que PT e o laboratório operaram caixa dois de campanha de mais de R$ 1 milhão na eleição presidencial de 2014. A investigação teve início com a delação do ex-senador petista Delcídio do Amaral. Ele afirmou que Edinho teria indicado a EMS para cobrir dívidas da campanha dele em Mato Grosso do Sul. Nos dois casos Edinho Silva não é réu, já que o juiz ainda não decidiu se aceita a denúncia.
O PT também disputará com boas chances a Prefeitura de Guarulhos, segundo maior município de São Paulo, com mais de 1,3 milhão de habitantes. Eloi Pietá lidera com 28% a pesquisa RealTime. Em seguida vem o atual prefeito da cidade, Gustavo “Guti” Henrice Costa (PSD), com 25%. Pietá foi prefeito de Guarulhos entre 2001 e 2008. A realidade do PT no estado, porém, é bem menos animadora do que nessas três cidades. Na capital paulista, onde o partido sempre sempre esteve entre os dois primeiros colocados desde 1988, o candidato petista Jilmar Tatto anda mal nas pesquisas. Aparece com 4% das intenções de votos no Datafolha do último dia 22 e 4% na última pesquisa Ibope, de sexta-feira (30). Dirigentes e ex-ministros petistas disseram, pedindo anonimato, que a previsão é de que o partido não conquiste muito mais que oito prefeituras no estado. O PT terá candidatos a prefeito em 137 cidades paulistas. Em 109 municípios, a legenda terá apenas candidatos a vereador. “Teremos um total de aproximadamente 2.900 candidatos a vereadores e vereadoras. Das sete cidades que administramos hoje, teremos candidatos e candidatas em cinco, sendo quatro disputam a reeleição.”, diz Valmir Pracidelli, que comanda o grupo de trabalho eleitoral do PT, em São Paulo.
PT NO PODER
Número de prefeituras conquistadas pelo PT no estado de São Paulo
2000 – 38
2004 – 56
2008 – 64
2012 – 72
2016 – 8

*”Fala de Boulos contradiz sua crítica a França sobre uso da polícia em caso de violência doméstica”* - O candidato do PSOL à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos, afirmou em entrevista que a polícia não deve ser chamada para resolver problemas, inclusive de violência doméstica, em acampamentos sem-teto. Em vídeo de 2014, o líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) afirma que a solução para conflitos na ocupação deve ser coletiva e não envolver a polícia. “Ocupação tem problema. O marido bateu na esposa. Como que nós vamos resolver isso? [Se] Foi lá fora, chama a polícia. Chama o conselho tutelar se bateu na criança. Nós vamos reproduzir essa...? O que nós vamos fazer nesse caso?”, questiona Boulos. “Temos que ter uma política de discussão coletiva, de solução coletiva para esses problemas, definir coletivamente um regimento interno. […] É a construção de uma forma de poder que não é você chegar: deu um problema, chama a polícia. Nós não chamamos uma vez a polícia, por exemplo, na ocupação Nova Palestina, que está há seis meses com 8.000 famílias. A polícia não foi lá uma vez para resolver um problema. Problemas tiveram milhares, podemos ficar falando duas horas de cada um deles aqui”, completa. Em debate na TV Bandeirantes, em 1º de outubro, Boulos questionou seu adversário Márcio França (PSB) por ter dito que a polícia não tem que se envolver em casos de violência doméstica. Boulos recuperou uma fala de abril de 2018 do então governador França em que ele defendeu a tese que a Polícia Militar poderia ser mais eficiente se não tivesse que atender a tantas brigas domésticas. Em resposta à Folha, a campanha do PSOL afirmou que a interpretação de que Boulos diz que a polícia não deve ser chamada em caso de violência contra a mulher é fake news e distorce a verdade. "No movimento [MTST] a violência contra a mulher não é tolerada. Sempre que necessário, a polícia é acionada", diz em nota. Após a divulgação da reportagem, França comentou pelo Twitter: "Eu sempre disse que Boulos é inexperiente! Se autolacrou. No meu caso era fake, no episódio dele tem uma imagem falando pessoalmente o que ele diz que não falou. 'Solução coletiva' para marido agressor??? Tem que ser cadeia!". Segundo pesquisa Ibope divulgada na sexta-feira (30), Boulos e França estão empatados tecnicamente em terceiro lugar. Boulos tem 13% das intenções de votos, e França, 11%. A margem de erro é de três pontos percentuais para mais ou para menos. Eles estão atrás do candidato à reeleição Bruno Covas (PSDB), que alcançou 26%, e de Celso Russomanno (Republicanos), com 20%.
A entrevista de Boulos, concedida aos veículos Revista Vaidapé, Coletivo Sacode, ONG Elenko, Rádio Várzea e Jornal A Nova Democracia, foi feita em junho de 2014 e está disponível na íntegra no YouTube. O vídeo foi recuperado neste domingo (1º) por uma candidata a vereadora do PDT, que integra a coligação de França. Na ocasião, Boulos respondia a uma questão sobre a construção de poder popular, que ele definiu como a construção de soluções coletivas fora do estado. Mais adiante, na entrevista, Boulos diz que o MTST busca "combater a violência doméstica que também existe na ocupação". Ele critica ainda o feminismo de esquerda por ser abstrato e não dialogar com as mulheres da periferia. Questionada pela reportagem, a campanha de Boulos afirmou que "em nenhum momento é dito que a polícia não deve atuar em caso de violência contra mulher". "Quem faz essa leitura, a partir da entrevista de 2014, está distorcendo a verdade e contribui para criações de fake news. Quando dizemos que a polícia não precisou ser acionada, é justamente porque o diálogo coletivo, conduzido pelas próprias mulheres, inibiu atos de violência", diz a nota. "No movimento a violência contra a mulher não é tolerada. As mulheres têm a quem recorrer, são protegidas e encontram abrigo. Sempre que necessário, a polícia é acionada. O que o MTST faz é o que governo do estado e a prefeitura deveriam fazer para garantir segurança e integridade física e emocional aos cidadãos e, em especial, às mulheres", segue o texto. "Márcio França, ao compartilhar uma visão preconceituosa sobre o movimento social, somente reforça o que todos já sabem: é um candidato com valores mais alinhados a direita", conclui a resposta do PSOL. No debate da TV Bandeirantes, o candidato do PSOL questionou se o rival aprovava "lavar as mãos" diante da violência contra a mulher e sugeriu que espectadores buscassem na internet o nome do político do PSB mais a expressão feminicídio, o que fez reportagem da Folha sobre a afirmação da época virar a mais lida do site do jornal. Nas horas seguintes ao debate, as mensagens com o nome de França mais replicadas no Twitter continham o termo "briga de casal". França afirmou no debate que a insinuação de Boulos era fake news. O candidato do PSB tem dito que sua fala de 2018 buscava defender maneiras alternativas de resolver os chamados casos de desinteligência. "Homem que agride mulher tem que ser preso. Ponto final", afirmou França sobre o embate com Boulos. "O Estado deve, sim, ter profissionais diferentes para atender cada tipo de ocorrência. Foi o que eu afirmei em 2018 e que foi distorcido em prol de cliques e de lacrações no ambiente virtual e mesmo no debate." Na entrevista de 2014, Boulos afirmou que os acampamentos do MTST buscam criar formas de atuação, decisão e solução coletivas fora do estado, com assembleias frequentes e grupos de sem-teto que elegem representantes e coordenadores. “O estado é um estado capitalista, controlado pelos capitalistas, e o nosso papel é construir uma contra-hegemonia que nós chamamos de poder popular para fora do estado. […] Todos sabemos aqui o quanto a sociedade capitalista contemporânea promove o individualismo e as soluções individuais, a falta de alternativa coletiva para os problemas. Queremos fazer o inverso: essa reapropriação coletiva do espaço e das soluções”, disse Boulos.
Mais adiante, Boulos dá um exemplo sobre as deliberações e regras coletivas no acampamento em relação a um problema comum, o de abuso de consumo de álcool. “Nas ocupações, particularmente a bebida é associada à briga, a problema. Tem gente que bebe demais e, de fato, arruma briga na ocupação, isso é comum de se ver. Então a tendência dos regimentos é proibir isso”, diz. Boulos também discorre sobre machismo e feminismo e admite que a violência doméstica existe na ocupação. Ele afirma que há machismo no MTST e que há um esforço para combatê-lo. Critica, por sua vez, o feminismo da esquerda por não dialogar com a periferia. “O movimento não é mais machista que a sociedade em geral. O machismo que tem dentro de uma ocupação é o machismo que tem fora da ocupação. O movimento busca, dentro das suas possibilidades e dos mecanismos que tem, dialogar com isso e estabelecer contra-tendência a isso”, diz. “Não é algo fácil [combater o machismo]. O movimento busca produzir debates nas ocupações, fazer discussões, combater a violência doméstica que também existe na ocupação”, completa. Em seguida, Boulos diz que o movimento está “um pouco distante do discurso feminista mais da esquerda”. “Muitas vezes, o discurso feminista da esquerda é abstrato, que não dialoga com a maioria do povo, não dialoga com as mulheres da periferia, por exemplo. Dialoga na USP, na PUC e ali faz sucesso. Mas com a mulherada da periferia não chega, não. E, quando chega, muitas vezes é rechaçado, porque chega de forma arrogante, prepotente, achando-se dono da verdade. A gente não busca fazer dessa forma”, diz.

*”Covas é alvo de ações de improbidade que miram suspeitas em licitações de Carnaval e Zona Azul”*

*”Conflito entre fazendeiros e indígenas gera tensão e isola esquerda no sul da BA”* - Nas margens da BR-101, o prefeito Vinícius Ibrann (DEM) quis dar demonstração de força. Em carreata no sábado (17), reuniu dezenas de motos, carros, quadriciclos, caminhões com as carrocerias cheias de eleitores, carroças e até um jet-ski, devidamente rebocado. Seu oponente, Ariosvaldo Vieira (Republicanos), vereador por cinco mandatos, deixou de lado a estratégia de terra ocupada para pedir votos de casa em casa. Mirou a zona rural e visitou produtores do assentamento Dois Irmãos na manhã de domingo (18). Mesmo em lados opostos na eleição de Buerarema, cidade de 18 mil habitantes do sul da Bahia, Ibrann e Vieira têm uma trajetória político-ideológica em comum: ambos sempre estiveram em partidos de direita e, em 2018, apoiaram a eleição do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). As urnas na cidade refletem o histórico de conflitos entre os fazendeiros e os indígenas tupinambás, que isolaram os partidos de esquerda e fizeram da cidade bastião da direita baiana. Além dos dois candidatos a prefeito, a eleição deste ano em Buerarema tem 71 candidatos a vereador. Nenhum deles é do PT, PC do B, PDT, PSB e PSOL ou qualquer outra legenda da esquerda brasileira. Os conflitos na cidade giram em torno da criação da Terra Indígena Tupinambá, área de 45 mil hectares localizada entre os municípios de Ilhéus, Una e Buerarema. O processo de demarcação da área, onde vivem cerca de 8.000 indígenas, foi iniciado em 2004. A terra já foi identificada e delimitada pela Funai (Fundação Nacional do Índio) e houve parecer favorável da AGU (Advocacia-Geral da União) pela demarcação, mas o processo está parado desde 2016. Os conflitos na região são históricos, mas ganharam força no início desta década, quando sob liderança de Rosivaldo Ferreira da Silva, o cacique Babau, 45, os tupinambás passaram ocupar terras da região em um processo que chamaram de "retomada das terras". Cerca 150 fazendas foram ocupadas. O acirramento da disputa de terras resultou no envio da Força Nacional em 2013, que ficou mais de um ano na região. Babau foi preso pelo menos quatro vezes sob acusação de invadir as terras e passou mais de seis meses em presídios estaduais e federais. Desde então, a questão indígena se tornou central na política de Buerarema. Os partidos de esquerda, que em sua maioria apoiaram a demarcação de terras dos tupinambás, acabaram sendo rechaçados por parte da população.
Na cidade, moradores não raro se referem aos tupinambás como invasores e questionam até a origem indígena deles. Os indígenas rebatem: defendem que a região é ocupada há séculos por comunidades tradicionais e afirmam que a maior parte das terras da região foi alvo de grilagem. Apoiador de Ibrann, o caminhoneiro Gildevando Batista dos Santos, 59, afirma que teve uma fazenda de 27 hectares invadida pelos tupinambás: "Perdi a minha principal fonte de renda", diz ele, que pleiteia uma indenização do governo federal. Entre os apoiadores do candidato oposicionista, o comerciante e postulante a vereador Cristian Santana, o Papinha (PSD), conta uma história semelhante. Ele diz que teve uma fazenda de cacau de 45 hectares tomada por grupos de tupinambás há sete anos. Desde então, passou a nutrir ódio por partidos de esquerda. "Aqui, se a gente souber que o cara é o PT, a gente queima o carro e dá tapa. O PT apoiou essas pestes [indígenas]", afirma Papinha. Ele também critica Bolsonaro por, após quase dois anos de mandato, não ter resolvido o imbróglio na região. "Se não resolver, ele vai se tornar outro descarado em quem ninguém vai votar em Buerarema". Em 2018, Bolsonaro teve 55% dos votos na cidade. Com um histórico de militância no município, o professor Edjaldo Vieira, 45, afirma que os esquerdistas tiveram que se abrigar em outros partidos para disputar a eleição para a Câmara de Vereadores. A maioria foi para o PSD, que faz parte da coligação de Vieira. Mas também há petistas na cidade que apoiam o candidato do DEM.
Edjaldo diz que os governos dos ex-presidentes Lula e Dima Rousseff, ambos do PT, fizeram muito pela região e cita como exemplo a eletrificação da zona rural, por meio do programa Luz para Todos. Mas confirma que os conflitos ofuscaram os benefícios de obras e programas sociais. "Sou simpatizante da causa indígena, mas acho que eles foram usados para fortalecer a direita na nossa cidade. Nosso candidato a prefeito, infelizmente, é um bolsonarista." Cercadas pela serra do Padeiro, vivem 218 famílias de tupinambás. Para chegar no local, é preciso percorrer pelo menos 40 quilômetros em estradas de terra, que se bifurcam como em um labirinto. Plantações de cacau, abacaxi, banana e galpões para criação de aves espalham-se pelas terras ocupadas pelos indígenas. Os tupinambás raramente saem da região. O cacique Babau e outros já foram alvo de emboscadas, sofreram ameaças de morte e, por isso, evitam circular pela zona urbana de Buerarema. O clima ficou tão hostil que eles simplesmente desistiram de participar da política em Buerarema. Todos transferiram seus títulos eleitorais para Una, cidade vizinha que também integra a área ocupada e onde a relação com poder local é menos conflituosa. Babau diz que a política na região sempre foi dominada pelos mesmo grupos, desde a época dos coronéis do cacau. "Nunca foi eleito em Buerarema um partido de esquerda. Qualquer um que tenha uma posição de esquerda, é mais fácil o cara morrer do que assumir uma eleição em Buerarema. Sempre foi nesse nível. "Com a pandemia, os tupinambás voltaram a ter conflitos com a prefeitura após implantarem barreiras sanitárias em uma estrada que dá acesso à área ocupada.
O prefeito Ibrann, que chegou a mandar um ofício para o governo do estado pedindo o fim das barreiras, diz que vê pouca relação dos indígenas com a eleição local. E nega a pecha de que Buerarema é uma cidade bolsonarista. "Não tem esse negócio de bolsonarista. Simplesmente não votamos em quem não traz benefício para nossa cidade", diz ele, que é filho do ex-prefeito Orlando Filho. Vieira, candidato da oposição, diz que o histórico de conflitos impactou o comércio e impulsionou a migração no município. O principal destino é a cidade de Brusque (SC), para onde seguem pelo menos três vans cheias de passageiros toda semana. A disputa direita versus direita na eleição criou uma situação insólita, com candidatos de diferentes correntes ideológicas abrigando-se em um único partido. O caso mais extremo é o do PSD, partido criado em 2011 pelo ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, que na época afirmou que a sigla não era "nem de direita, nem de esquerda, nem de centro". Em Buerarema, o partido abriga petistas, bolsonaristas e até mesmo um monarquista que tem o escritor Olavo de Carvalho como seu guru. O cenário é resultado da união em torno da candidatura de Vieira. A candidatura é amparada por uma coligação entre o Republicanos e o PSD, que indicou o candidato a vice Wagner do Mototáxi. As duas legendas agruparam os candidatos a vereador que apoiam Vieira. Com 19 anos, João Vitor Santana (PSD) disputa sua primeira eleição na cidade. Com um broche com o brasão do Império brasileiro na lapela da camisa, ele afirma que começou a se interessar por política aos 14, quando passou a assistir na internet vídeos de Olavo de Carvalho e Enéas Carneiro. Foi a partir de Olavo que ele chegou a Bolsonaro, a quem passou a apoiar com entusiasmo e para quem fez campanha em 2018.
Em 2019, viajou até Vitória da Conquista para ver o presidente de perto. Levou uma bandeira de um metro e meio com as imagens de Bolsonaro, Olavo, Enéas e Donald Trump. Focado na eleição, diz achar que tem boas chances de conquistar uma cadeira na Câmara: "Não é só Buerarema, o Brasil tem uma identidade conservadora". No domingo (18), ele foi até a comunidade rural Dois Irmãos conversar com eleitores junto com Vieira. Na mesma caravana estava a atriz Maria das Graças Santos, a Gal Macuco, 60, que vestia uma camisa vermelha com a imagem de Marielle Franco. Com uma trajetória de militância na esquerda, ela filiou-se ao mesmo PSD para disputar uma vaga na Câmara. "Eu não sou e nunca serei de direita. Mas, aqui na cidade, o PT está morto, o PC do B está morto, nenhum deles tem força para eleger um candidato. Não tive outra opção", afirma. Gal, que também é presidente da Associação de Mulheres Empreendedoras de Buerarema, pretende trabalhar para incrementar a cultura da cidade caso seja eleita. Mesmo em extremos ideológicos, Santana e Gal Macuco têm boa relação. Os dois frequentam o mesmo centro espírita e costumam trocar ideias, mesmo sem esperança de um convencer o outro. "Esse menino não tem jeito", diz Gal, aos risos, antes de abraçar seu companheiro de chapa.

*”EUA votam com medo de eleição descambar para violência armada”*
TODA MÍDIA - *”Para o NYT, 'clara vantagem' de Biden; para o WP, 'não mais'”*
*”E se... Trump se recusar a aceitar uma eventual derrota para Joe Biden?”*
*”E se Trump e Biden empatarem no número de votos no Colégio Eleitoral?”*

ANÁLISE - *”Três cenários da eleição dos EUA podem levar a longa e perigosa disputa”*
MATHIAS ALENCASTRO - *”O futuro das eleições dos EUA está no Texas”*
*”Na reta final, Biden e Trump fazem maratona de comícios em estados decisivos”*
*”Morre aos 74 anos Robert Fisk, celebrado correspondente de guerra”*

*”Idoso é resgatado após ficar 33 horas sob escombros em terremoto na Turquia”*
*”'Reeleição de Trump traria dúvidas até sobre eleições livres nos EUA em 2024', diz Yascha Mounk”*

*”Mineração, agricultura e bancos vencem pandemia, diz estudo da Economia”* - Enquanto a maioria das atividades econômicas no país registra retração de faturamento durante a pandemia do coronavírus, grandes setores têm conseguido não só evitar a crise como registrar crescimento de dois dígitos. A conclusão é de estudo do Ministério da Economia, que aponta como vencedores da pandemia os setores de mineração, agricultura, logística e atividades financeiras. O levantamento da pasta surgiu como forma de orientar a concessão de crédito por bancos públicos às atividades mais afetadas, mas também acaba trazendo mais clareza sobre a situação de diferentes setores no país durante a crise. A pasta baseou sua análise principalmente nos dados de faturamento levantados a partir de notas fiscais eletrônicas nas bases da Receita Federal, além de documentos fiscais de 12 unidades federativas. Também foram usados indicadores adicionais como dados de transação de cartão de crédito. O ministério usou como referência valores faturados pelas empresas de abril a julho de 2020 e fez dois cálculos a partir disso, para reduzir eventuais efeitos sazonais. O primeiro comparou os números com igual período do ano passado. E o segundo confrontou os valores com os registrados no começo deste ano, de janeiro a março (antes da pandemia). A mineração teve o maior crescimento. O setor registrou de abril a julho de 2020 um faturamento 37,6% maior frente aos mesmos meses de 2019 e de 26,2% frente a janeiro a março de 2020. Isso gerou um avanço médio de 31,9% no faturamento, conforme a metodologia da pasta. Apesar de integrantes do próprio ministério ressaltarem ao longo dos últimos meses a dificuldade de medir dados em meio às distorções causadas pela pandemia, os resultados têm correspondência com números divulgados mais recentemente por empresas. A mineradora Vale, por exemplo, apresentou na semana passada lucro líquido de R$ 15 bilhões no terceiro trimestre. O valor representa mais do que o dobro dos R$ 6,5 bilhões registrados um ano antes. A Vale creditou o aumento ao crescimento da demanda chinesa por minério de ferro. As vendas tiveram um boom influenciadas por uma retomada no país asiático, que são impulsionadas por investimentos significativos em infraestrutura e construção para estimular a economia após o surgimento do novo coronavírus. "A participação da venda para a China aumentou muito neste ano. É um efeito Covid", disse Marcello Spinelli, diretor-executivo da Vale, na quinta-feira (29).
Para Sérgio Lazzarini, professor do Insper, os dados do ministério coincidem com indicadores observados por economistas. Ele chamou atenção para o fato de o principal vetor no topo da lista ser o comércio internacional. Está inserida nessa lógica a agricultura, segunda colocada na lista. O preço das commodities no mercado global e o patamar do câmbio têm estimulado as exportações e o setor registra um avanço de 18% no faturamento. A pecuária, um pouco mais abaixo na lista, avança 10%. Já setores ligados ao cenário doméstico também têm mostrado avanço impulsionados pela concessão do auxílio emergencial, embora em patamares não tão fortes. Entra nessa análise a atividade de logística, terceira colocada na pesquisa, com crescimento de 15% movido também pela demanda por entregas. "O auxílio emergencial forneceu renda e mudou o padrão de consumo, com as pessoas pedindo mais pela internet também por causa da pandemia", afirmou Lazzarini. No caso das atividades financeiras, a crise gerou uma necessidade significativa por crédito por parte de empresas e pessoas. Isso alavancou os números em 14%. "Os bancos vão bem na crise e fora da crise", resumiu o professor. Segundo ele, as instituições conseguem se proteger durante momentos de turbulência e contar com ajuda estatal em momentos como o atual, de necessidade de manutenção de emprego e renda. Segundo o Banco Central, os bancos lucraram R$ 22,4 bilhões no primeiro trimestre deste ano e R$ 18,4 bilhões no segundo. Apesar de positivo, o lucro total registrado pelas instituições no primeiro semestre foi 31,9% menor que no mesmo período de 2019. ​Na outra ponta da lista, os maiores perdedores da crise foram as atividades artísticas, de transporte aéreo e de passageiros por outros modais, hotéis e restaurantes.
As incertezas com o fim do ano e o fim auxílio do auxílio emergencial causam ainda mais dúvidas sobre o desempenho das atividades no cenário doméstico. Os supermercados, por exemplo, têm mostrado dados de arrefecimento nos últimos dias com a diminuição do beneficio do governo e o avanço da inflação. Mesmo atividades ligadas ao setor externo passam por incertezas. A Vale trabalha com a perspectiva de que a atividade econômica da China tende a se normalizar e retomar um caminho mais distante dos investimentos pesados em infraestrutura e em direção ao consumo. "O nível de investimento no país ainda está pífio e sem perspectiva de melhorar. Ainda tem o risco de novas ondas do coronavírus e o calendário da vacina. Ainda é muito incerto o que vai acontecer no futuro", afirmou Lazzarini. A lista vai orientar concessões de crédito como os com recursos do FGI (Fundo Garantidor de Investimentos), administrado pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). O programa tem previsão para usar até R$ 20 bilhões da União em garantias de empréstimos. Uma portaria assinada pelo secretário especial de Produtividade e Emprego, Carlos da Costa, foi publicada recentemente para servir de referência a bancos públicos na concessão de empréstimos. As instituições não são obrigadas a emprestar para os setores da lista, que serve apenas como orientação. O Ministério da Economia afirmou que, caso haja alterações no cenário econômico, há possibilidade de novas portarias para atualizar a lista dos setores mais impactados.

*”Governo tenta votar projeto que abre caminho para conta em dólar no Brasil”* - Mesmo com a resistência expressa da oposição, o governo tenta votar até o final do ano o projeto de lei que muda as regras do mercado cambial e abre caminho para que pessoas físicas mantenham contas em dólar no Brasil. O texto é uma das prioridades do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Foi também um dos motivos que o levou, na semana passada, a questionar o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), sobre o andamento das reformas, em conversa que acabou sendo vazada a jornalistas e que abriu um atrito público entre ambos. A expectativa era que a urgência do projeto fosse votada na última terça-feira (27), mas uma obstrução da base do próprio governo impediu a apreciação do requerimento. Caso aprovada, ainda assim a análise do texto depende da decisão do governo de retirar a urgência para votação de uma outra proposta, a modernização da navegação de cabotagem no país. Segundo Maia, assim que a pauta estiver livre, o texto deve ir a voto. “A gente pode votar a urgência e logo na semana seguinte a lei cambial, que hoje parece importante”, disse, em entrevista à Folha. “E esse foi um tema que, de fato, o presidente do Banco Central perguntou se eu tinha condição de votar. E eu falei que, assim que a gente conseguir resolver essa questão da cabotagem, a gente vai conseguir votar essa matéria.” O projeto de lei, enviado pelo Executivo há um ano, dá mais autonomia para que o BC regule o mercado de câmbio, cuja legislação atual é fragmentada em mais de 40 leis e outros dispositivos. A norma mais antiga ainda em vigor é de 1920, que autoriza o governo a emitir papel-moeda. Alguns trechos dispõem sobre compra e venda em moeda estrangeira. Um decreto de 1933 fala em “coibir o jogo sobre o câmbio”, assegurando apenas operações legítimas. O texto chegou a ser revogado em 1991, mas voltou a valer em 1998. Há ainda regras que foram editadas entre as décadas de 1930, 1940 e de 1950, por exemplo, que ainda valem. A proposta em tramitação era uma das apostas do BC para o primeiro trimestre deste ano, mas a pandemia do coronavírus atrasou votações e suspendeu as negociações no Congresso.
Um dos objetivos com a nova lei é adequar o Brasil às recomendações da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico). Relator do texto na Câmara, o deputado Otto Alencar Filho (PSD-BA) qualifica a legislação atual como ultrapassada e defende que seja reformulada. “Hoje, o país tem uma legislação cambial complexa ao extremo, que dificulta o comércio exterior, as atividades de exportação e importação, e afeta a vida das pessoas”, critica. “O mundo mudou, os avanços tecnológicos não param e temos normas editadas em 1920 regulando o câmbio brasileiro, o que é totalmente incoerente.” Ele afirma que o texto busca dar segurança jurídica, transparência e contribuir para a retomada do desenvolvimento econômico do país no pós-pandemia. Após a aprovação na Câmara e no Senado e a sanção do presidente Jair Bolsonaro, a autoridade monetária precisará aprovar regulamentação própria para o segmento. Antes da crise sanitária, a expectativa da autarquia era publicar regulamentação ainda em 2020. Uma das alterações que mais chamam a atenção no projeto foi a possibilidade de o BC editar regulamentação para que pessoas físicas possam manter contas em moeda estrangeira no Brasil. Helen Naves, sócia da área bancária do escritório Demarest, elogia a medida. Ela diz que hoje só é possível manter conta em moeda estrangeira em situações específicas regulamentadas, como no caso de embaixadas, consulados, corretoras de câmbio e agências de turismo.
Na avaliação dela, a iniciativa favorece o investimento em uma moeda forte, o que já é permitido em outros países. Como o projeto só dá poderes ao Banco Central para regular contas em moeda estrangeira, não há uma definição de como ficaria a garantia do FGC (Fundo Garantidor de Créditos) nos depósitos do tipo. O projeto também traz mudanças substanciais ao mercado de câmbio. Retira, por exemplo, a proibição de que bancos estrangeiros que possuam conta em reais no país façam pagamentos no exterior. Atualmente, a instituição só pode usar a conta para fazer pagamentos no Brasil. “O projeto não avança totalmente na conversibilidade do real, em que comerciantes possam aceitar moedas estrangeiras como pagamento, mas traz mais segurança jurídica ao mercado de câmbio”, diz o economista-chefe da consultoria Análise Econômica, André Galhardo. Além disso, o texto simplifica a entrada de investidores estrangeiros. Hoje, quem mora fora e quer aplicar na Bolsa ou em títulos públicos brasileiros precisa fazer o registro de capitais estrangeiros no BC, o que aumenta a burocracia e custa caro. A nova legislação também poderá beneficiar importadores e exportadores. O projeto retira restrições como exigência de que bancos brasileiros só financiem importação se o produto entrar no país e a proibição de que empresas estrangeiras que importam bens produzidos no Brasil não possam ser financiadas diretamente no exterior por instituição bancária brasileira.
O projeto não entra na condução da política cambial, que, hoje, é flutuante (sem interferência do governo). Galhardo destaca, no entanto, que mesmo que a nova lei não estabeleça a política cambial, o real poderá ser fortalecido. “Devem diminuir os impactos gerados por crises internas e externas no mercado de câmbio. A moeda fica mais livre e sofre menos com volatilidade”, pondera. O economista avalia que há espaço que o comércio exterior cresça. “O Brasil responde por 1,5% do comércio exterior do mundo, mesmo percentual desde a década de 1990. Não posso fazer uma relação de causa e efeito e concluir que a legislação atual atrapalhou essa expansão, mas com certeza a modernização poderá contribuir para isso”.

PAINEL S.A. - *”Na contramão de loja física, varejo online acelera contratação temporária na Black Friday”*
PAINEL S.A. - *”Clientes de app de ônibus lotam email de agência de transportes”*

PAINEL S.A. - *”Susep aponta avanço de seguros no Brasil até setembro”*
PAINEL S.A. – *”Padronização de restaurantes deve permanecer no pós-pandemia”*

OPINIÃO - *”Enquanto Argentina não resolver problema da moeda nacional, crises não faltarão”*
*”Após paralisação por pandemia, CVC volta a ter voos fretados para Porto Seguro”*
*”Interesse pelo preço de alimentos e dólar bate recorde em 2020”*
RONALDO LEMOS - *”QAnon pode ajudar Trump a vencer”*

*”Huawei planeja fábrica de chips para superar sanções dos EUA”*
MARCIA DESSEN - *”Se liga na fraude”*

*”Trabalhador com mais de 50 anos ocupava 80% das vagas eliminadas no ano”* - Quando chegou a São Paulo em 1981, vindo da Paraíba, Josinaldo Ladislau dos Santos não imaginou que estaria em vias de completar 60 anos sem emprego e com poucas esperanças de voltar à ativa. Com 32 anos de trabalho com carteira assinada, ele ainda não tem direito à aposentadoria pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Tampouco consegue se manter no mercado. Há pelo menos quatro anos, só tem conseguido bicos, ora como faxineiro, ora como porteiro ou serviços gerais. O trabalho em edifícios é o que Josinaldo melhor conhece —são pelo menos dez anos dedicados à função de zelador. Neste ano, conseguiu ficar 30 dias em um prédio na região de Higienópolis, região de classe média alta na capital paulista. “Estava em cima, no prédio, olhei todos aqueles prédios, um monte. Fiquei me perguntando: ‘Não é possível que nenhum tenha um emprego para mim’”, afirma. Por lei, Josinaldo ainda não é um idoso. Ele tem 58 anos. Para ele, porém, a idade é o principal empecilho na conquista de uma vaga. “Pessoal vê os cabelos brancos e acha que a gente não serve mais.” A pandemia, segundo ele, agravou a situação. Os idosos são considerados grupos de risco em caso de contaminação pelo coronavírus. Há ainda a crise econômica decorrente da situação de saúde. A tecnologia, vista como aliada em funções mais qualificadas, para o trabalho de Josenildo é uma ameaça. Em um edifício onde trabalhou por pouco mais de três anos, o contrato da terceirizadora foi substituído por controle de acesso por biometria. “A gente olha para um lado, olha para o outro, o tempo passa. A gente vai perdendo o gosto. Quer trabalhar, mas não tem. O mercado de trabalho ficou muito difícil pra gente”, diz. O desânimo de Josinaldo quanto à disponibilidade de vagas para trabalhadores mais velhos se confirma pelas estatísticas e, de fato, se agravou com a pandemia. Neste ano, até o mês de setembro, 438,1 mil postos de emprego foram eliminados para quem tem a partir de 50 anos. Quando se consideram todas as faixas etárias, o saldo negativo é de 558,5 mil vagas. Enquanto as demais faixas etárias começam a ter a criação de empregos formais, segundo o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), os mais velhos veem a aceleração de um número de demissões muito superior ao de contratação.
Com isso, em 2020, quase oito de cada dez vagas eliminadas eram ocupadas por trabalhadores com mais de 50 anos. Mesmo em setembro, quando o saldo mensal ficou positivo em 313 mil vagas —o melhor resultado para o mês desde 1992— os que estão nessa faixa etária perderam vagas. A falta do emprego formal não é trágica para esses trabalhadores somente pela falta da renda. Mesmo que tenham décadas de contribuição à Previdência, ainda não há aposentadoria pelo INSS. Em 2020 entraram em vigor as novas regras para a concessão do benefício, que incluem períodos de transição, mas que exigirão dos trabalhadores mais tempo na ativa antes da aposentadoria. Quando se olha para aqueles com mais de 60 anos, a pesquisadora Ana Amélia Camarano, do Ipea (Instituo de Pesquisa Econômica Aplicada), destaca que a renda dos idosos é importante na composição orçamentária de 62,5 milhões de domicílios no país.
A maior parte dessa renda vem de aposentadorias e pensões. Os rendimentos do trabalho, porém, não são desprezíveis, pois representam 34,8% do total de valores. Entre o primeiro e o segundo trimestres deste ano, levantamento feito pela pesquisadora com base em dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios),do IBGE, mostra que 600 mil trabalhadores com mais de 60 anos perderam ocupação e continuam desempregados. Outro 600 mil desistiram de tentar nova vaga. “Em parte porque eles estão com medo de se expor e em parte pelo preconceito dos empregadores. Você fala em grupo de risco e isso gera um barreira. E ainda existem os outros preconceitos que já existiam”, diz. E a desocupação acaba sendo mais do que um problema passageiro. “A pandemia agrava ainda mais a situação, até porque essas pessoas estão ficando muito tempo fora do mercado de trabalho. Quanto mais tempo fora, mais difícil é voltar”, diz Ana Amélia. Para Luciana Fontes, superintendente do Cebrac (Centro Brasileiro de Cursos) e dona de uma agência de empregos, a resistência das empresas a trabalhadores mais velhos está ligada às restrições sanitárias, mas também a uma falta de entendimento quanto às possibilidade de ter esse funcionário nos quadros. No Cebrac, diz, mais trabalhadores na faixa dos 40 anos buscam cursos para que possam se reciclar ou se preparar para a necessidade de ter alternativas à ocupação atual. O curso de manutenção de celulares e computadores é procurado principalmente por homens acima de 55 anos. “Eles veem a possibilidade de uma renda rápida se for necessário”, afirma.
A busca por cursos demonstra interesse em atualização e sempre foi importante, mas ficou mais relevante na pandemia, diz a gerente sênior da Catho, Bianca Machado. “Esse é um dos pontos que os recrutadores vão perguntar: ‘Quais cursos você fez no distanciamento social?’”. Para ela, a resistência na contratação de mais velhos é um efeito do fator grupo de risco. “Mas a gente acredita que a recolocação vai ser aquecida pela necessidade de experiência. A senhoridade é um contraponto muito importante para as organizações.” Com 55 anos, Elza Goes da Silva está prestes a concluir um curso de assistente administrativo. Com o que aprendeu, diz não ter grandes esperanças em conseguir uma colocação. “Quem é que vai arrumar emprego de aprendiz depois dos 50? Eu sou aprendiz né?” No entanto, Elza afirma que o conhecimento adquirido e as aulas de desenvolvimento pessoal expandiram seus horizontes: agora ela quer ser terapeuta holística.
+++ Toda essa parcela da sociedade está em sofrimento por ter sido demitida, mas a quem essas pessoas culpam? Elas conseguem compreender que o sistema é perverso e se livra dos trabalhadores mais caros para que as empresas possam contratar trabalhadores com salários mais baixos? Se o país é dirigido pelo lema de que “é difícil ser patrão no Brasil”, a perversidade vai ser muito maior. No entanto, essa parcela não enxerga o sistema como inimigo e muito menos identifica quem luta contra a lógica do sistema.

*”Confira como investir em cenário de juros baixos e incerteza econômica”*
*”Juro baixo traz bom momento para migrar financiamento imobiliário”*

*”A cada 23 dias, MPF tenta afastar Salles do cargo de ministro do Meio Ambiente”* - A cada 23 dias, em média, o MPF (Ministério Público Federal) tenta afastar Ricardo Salles do cargo de ministro do Meio Ambiente. A instituição entende que ele age, com dolo —quando há intenção— e cálculo, contra o ambiente. A iniciativa dos procuradores da República vem encontrando, até agora, resistência na Justiça. Já houve adiamento de um julgamento, distribuição errônea de um recurso, demora na citação ao ministro —quando a parte é informada do processo— e até mesmo contestação por parte da Corregedoria do MPF. Doze procuradores propuseram uma ação de improbidade administrativa contra Salles em 6 de julho. Desde então, nesta ação, eles pedem o imediato afastamento do ministro, em razão de ações, omissões, práticas e discursos que levaram ao que chamam de um desmonte de políticas ambientais. Diante de negativas da Justiça até mesmo em julgar o pedido, os procuradores têm recorrido em série. Eles já precisaram protocolar um recurso contra o envio da ação de Brasília para Santa Catarina. Em outra iniciativa, os procuradores reiteraram a necessidade de se decidir logo sobre o afastamento.
Apresentaram ainda um novo agravo —um recurso feito à segunda instância da Justiça— pedindo urgência para se decidir sobre o afastamento de Salles. Os procuradores também recorrem à mesma segunda instância contra decisão da Justiça que garantiu a permanência do ministro. Essa movimentação significa um ato processual a cada 23 dias, em média, para tentar tirar Salles do cargo. A Folha questionou a assessoria do ministro sobre as acusações feitas pelo MPF e sobre a insistência por seu afastamento do cargo. Não houve resposta até a conclusão desta reportagem. A tentativa mais recente de remover o ministro da pasta foi um agravo de instrumento protocolado no TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) na semana passada. A Procuradoria contestou a decisão do juiz federal Márcio de França, de Brasília, que não enxergou "prova cabal" do comportamento do ministro contra o processo e o manteve no cargo. O MPF insistiu que Salles comete "atos de desmonte doloso das estruturas de proteção ao meio ambiente, configuradores da improbidade administrativa". Segundo os procuradores, o ministro age para desestruturar normas, órgãos, orçamento e fiscalização. O agravo de instrumento é o tipo de recurso apropriado para questões tidas como urgentes. No TRF-1, o relator é o desembargador Ney Bello. Ele já decidiu, de forma liminar (decisão provisória), que a primeira instância deveria deliberar sobre o pedido para o afastamento urgente de Salles. O juiz o manteve no cargo.
A questão, porém, não está resolvida. A 3ª Turma do TRF vai votar, em julgamento previsto para terça-feira (3), de quem é a competência para julgar a ação. Esta análise deveria ter ocorrido uma semana atrás, mas foi adiada. O último recurso apresentado pelo MPF, pedindo de novo o afastamento de Salles, acabou distribuído para outra desembargadora da turma, e não para Ney Bello. Isso deve atrasar uma tomada de decisão. Chamado de "erro material", o procedimento foi corrigido, e o caso foi enviado ao gabinete do desembargador na noite de quinta-feira (29). No meio do caminho, houve ainda uma contestação da Corregedoria do MPF à presença de 12 procuradores na ação. Boa parte deles é da força-tarefa Amazônia, criada por ato da PGR (Procuradoria-Geral da República). A ação, originalmente, é da Procuradoria da República no DF. É comum a assinatura múltipla em procedimentos do tipo, como forma de despersonalizar a acusação. O procedimento da corregedoria acabou arquivado, segundo integrantes do MPF. A ofensiva na Justiça segue sem resultados. O último andamento processual da ação de improbidade registra que os autos estão "suspensos por depender do julgamento de outra causa" —os agravos pendentes. Nos assuntos de sua pasta, Salles age com dolo, segundo o último recurso do MPF, e seus atos "atendem a uma lógica totalmente contrária ao dever estatal de implementação dos direitos ambientais". Nesse caso, o agravo foi assinado por uma única procuradora, Marcia Brandão.
"Os efeitos da fragilização da estrutura administrativa são imediatos, como mostram os dados sobre o aumento do desmatamento e o avanço de atividades econômicas ilegais sobre áreas de floresta nativa, incluindo terras indígenas e unidades de conservação", escreveu a procuradora. "Apesar de variações no grau de implementação dos direitos, as sucessivas gestões do Ministério do Meio Ambiente jamais se dedicaram a desestruturar ou minar as políticas de Estado voltadas à proteção ambiental, mas sim a aperfeiçoá-las ou incrementá-las", afirmou. Os efeitos do que chama de desmonte podem ser irreversíveis, apontou o MPF. "A desregulamentação de medidas proibitivas, a desmobilização de servidores e o desmonte da fiscalização consistem em frentes permanentes de fragilização dos órgãos ambientais federais." Salles age de forma premeditada, segundo o agravo, e a continuidade dele no cargo de ministro vem alimentando a flexibilização de regras e o desmonte da fiscalização ambiental. O recurso do MPF fala em uma "verdadeira erosão das instituições relacionadas ao meio ambiente". Enquanto isso, Salles segue praticando atos que flexibilizam regramentos e a fiscalização ambiental e que aumentam índices de desmatamento e queimadas, conforme o entendimento do MPF. Ao mesmo tempo, o ministro acirra crises políticas no governo Bolsonaro. Primeiro, o titular do Meio Ambiente chamou o ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) de "maria fofoca", em uma postagem em sua conta no Twitter. Ministros militares querem Salles fora da pasta. Depois, o ministro chamou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de "Nhonho", o gordinho mimado da série “Chaves”. Em seguida, alegou que a publicação ocorrera em uso indevido de sua conta por terceiros.

*”Pantanal tem pior outubro de queimadas da história e fogo cresce 121% na Amazônia”* - As queimadas continuam castigando biomas brasileiros. Na Amazônia, o fogo aumentou 121% em outubro em relação ao mesmo mês em 2019. Enquanto isso, o Pantanal teve o seu pior outubro de incêndios já registrado. Na Amazônia, foram registrados 17.326 focos de queimada no último mês, segundo dados do Programa Queimadas, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Em outubro de 2019, foram 7.855 (menor valor já registrado no bioma para o mês). É o segundo pior outubro de queimadas da Amazônia dos últimos dez anos, atrás apenas de 2015, com 19.469 focos de calor. O fogo no bioma tem origem humana e é normalmente ligado ao desmatamento. O elevado valor ocorre apesar da proibição de uso de fogo na Amazônia e também da presença, desde maio, das Forças Armadas na floresta para a Operação Verde Brasil 2 contra ilícitos ambientais. Além de queimadas, o desmatamento também permanece em níveis elevados. Ao mesmo tempo, o Pantanal continua enfrentando o seu pior ano de queimadas. O fogo na região também tem origem majoritariamente humana (seja acidental ou proposital) e a situação se torna ainda mais complexa porque o bioma passa pela pior seca dos últimos 60 anos. Em outubro, foram 2.856 focos de calor, o maior valor já registrado para o mês. Trata-se de um aumento de 17% em relação ao mesmo mês de 2019. A situação, porém, parece ter apresentado pequena melhora quando comparada aos três meses anteriores. Em julho, agosto e setembro, o aumento das queimadas no Pantanal foi de, respectivamente, 241%, 251% e 181%, em relação aos mesmo meses de 2019. Setembro teve o maior número queimadas já registrado em qualquer mês no bioma. O uso de fogo também está proibido no Pantanal desde julho, por um decreto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que, porém, desdenhou do possível efeito do mesmo. O estado de Mato Grosso já havia proibido antes as queimadas.

*”Bolsonaro comemora liberação de pesca de sardinha em Noronha, ação que preocupa ambientalistas”* - O presidente Jair Bolsonaro comemorou a autorização para pesca de sardinha na área do Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha, uma flexibilização feita pelo governo federal que preocupa ambientalistas e que é rechaçada pelo governo de Pernambuco. A permissão para a atividade ocorrerá por meio de termos de compromisso firmados entre o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e pescadores locais. O ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) assinou o documento na sexta-feira (30), num ato realizado na ilha. A autorização da atividade também foi celebrada pelo secretário de Aquicultura e Pesca, Jorge Seif, que nas redes sociais se referiu aos opositores da atividade como “eco-xiitas” e “viúvas do ordenamento pesqueiro”. Seif e Salles viajaram para o arquipélago junto com outras autoridades do governo Bolsonaro, entre eles os ministros Milton Ribeiro (Educação) e Marcelo Álvaro Antônio (Turismo), além do presidente da Embratur, Gilson Machado. Bolsonaro republicou neste domingo (1º) um vídeo de Seif em uma reunião na ilha que tratou da assinatura do termo. “Inacreditável, mas em Fernando de Noronha a pesca da sardinha era proibida. Isso mesmo, os moradores da ilha importavam pescado do continente. Nossos parabéns ao secretário da Pesca Jorge Seif”, escreveu o presidente. O governo ainda não publicou informações oficiais sobre a extensão da autorização. No entanto, interlocutores disseram à Folha que a permissão se aplica para pescadores tradicionais e que haverá horários e locais controlados para a atividade. A autorização deve valer para os períodos de novembro e abril. A sardinha em Fernando de Noronha é usada como isca para pesca em alto mar.
Especialistas que atuam no local ressaltam que a maior parte da demanda por pescados no arquipélago é para suprir o turismo, e não a população local. O Secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco, José Antônio Bertotti, queixou-se que o estado não foi consultado sobre a medida e disse que ela coloca em risco o parque. "Não tem amparo técnico liberar a pesca dentro do Parque Nacional Marinho, contrariando inclusive uma resolução do próprio ICMBio. É colocar em risco o parque", disse. "O ecossistema do parque é berçário de espécies e não tem como coibir a pesca de outras espécies além da sardinha", afirmou. A pesca no parque —que corresponde a 70% da área de Fernando de Noronha— é proibida por conta dos riscos de impactos ambientais. Pescadores artesanais já podiam exercer sua atividade no restante do arquipélago, mas no período de ressaca os peixes se concentram na região do parque.
Embora haja divergências entre especialistas sobre o impacto no ecossistema de uma liberação controlada apenas para a sardinha, funcionários de órgãos ambientais consultados pela Folha disseram temer que a medida seja um primeiro passo para ampliar a atividade no arquipélago —o que teria maiores consequências para o equilíbrio ecológico. Outro receio é que pessoas que não são pescadores artesanais usem da autorização para exercer a atividade com fins comerciais. Além da comitiva de ministros, o filho mais velho do presidente, senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), também viajou para a ilha durante o feriado. Ele fez pedido de reembolso das tarifas aéreas, que somam mais de R$ 1.500, para o Senado Federal, mas depois sua assessoria disse que houve um equívoco na solicitação. De acordo com o gabinete do senador, o pedido de reembolso será suspenso. A permissão para a pesca de sardinha não é a primeira ação do governo Bolsonaro voltada para Fernando de Noronha que gerou polêmica. Durante uma reunião em 2019 com a vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos (PCdoB), Salles defendeu a liberação de voos noturnos para Noronha. Frequências aéreas noturnas afetam hábitos de algumas espécies de aves que vivem no arquipélago. O próprio presidente Bolsonaro já afirmou que a taxa de visitação para o parque marinho era um roubo e precisava ser revista. No entanto, em novembro do ano passado os valores foram reajustados pelo governo federal e ficaram mais caros.

*”Conservadores organizam frente para destravar pauta de costumes no Congresso”* - Se o primeiro ano de governo Jair Bolsonaro (sem partido) foi tomado pela reforma da Previdência e o segundo foi travado pela pandemia de Covid-19, a base conservadora do presidente está trabalhando na formação de uma frente parlamentar para destravar na segunda metade da gestão a pauta de costumes que acabou preterida. A deputada Bia Kicis (PSL-DF) está coletando assinaturas de colegas para formar a bancada. Até o final da semana passada havia apoio de 30 senadores e 100 deputados, segundo ela. A intenção é conseguir mais 80 assinaturas de deputados para que a bancada conservadora saia do papel ainda em 2020. Desde o ano passado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), têm servido de anteparo à pauta que trata de temas como homeschooling (educação em casa), escola sem partido, o que chamam de ideologia de gênero, e o combate à corrupção. Kicis disse acreditar que a formação do grupo até o final deste ano terá influência nas eleições para o comando das duas Casas, em fevereiro do ano que vem, embora haja parlamentares que apoiem a criação da bancada, mas não a veem como arma para interferir nas disputas. "Hoje, embora seja minoria, há uma força muito grande da ala progressista. Eles se impõem muito, pressionam muito o presidente da Casa. Não são maioria, mas são muito organizados", afirmou Kicis. "Então, se não nos unirmos, não nos organizarmos, embora sejamos maioria e representemos a maioria do povo brasileiro, não conseguimos levar adiante a pauta de interesse da população", disse a deputada. Kicis define conservador como alguém que "quer conservar o que tem de bom e mudar o que não é tão bom assim". Ela afirma que há pautas em comum entre os conservadores, como a defesa da vida desde a concepção, por exemplo, mas há divergências em temas como as armas. "Nem todos os conservadores são favoráveis, por exemplo, ao porte de armas, esta é uma questão que é um pouco controversa, mas a gente quer promover o debate sobre este tema. Se você não tem conservadores para fazer isso, ninguém vai fazer." No ano passado, a primeira tentativa do governo de aprovar o texto das armas foi desidratada pelo Congresso, que autorizou a ampliação do porte e da posse apenas por colecionadores, atiradores e caçadores.
Dos temas que já estão em tramitação, o grupo quer priorizar matérias relacionadas à prisão após condenação em segunda instância, voto impresso, contra a expansão das possibilidades de aborto e questões relacionadas a drogas, como o plantio de maconha mesmo que para uso medicinal. Muitas dessas pautas são bandeiras que ajudaram a eleger Bolsonaro e sua base ideológica, porém não caminharam na primeira metade do governo. "Havia um acordo, até com o Rodrigo Maia, que nós deixaríamos as pautas de costumes para o segundo ano. Fizemos um acordo de que a gente travaria estas batalhas nas comissões, mas não pautaria no plenário estes temas mais polêmicos, digamos assim", disse a deputada. "Só que, neste ano, quando era para estas pautas começarem a caminhar, veio a pandemia. Então, a gente não teve comissão, não teve nada. Já estamos atrasados e precisamos dar uma satisfação para a sociedade", afirmou Kicis. Um dos mais influentes deputados da Frente Parlamentar Evangélica, o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), apoia a criação da Frente Parlamentar Conservadora e não vê possibilidade de disputa entre as duas bancadas. "Acho que elas somam forças e [a bancada conservadora] amplia um pouco o leque da evangélica. Tem conservadores que não são evangélicos", afirmou Sóstenes. O deputado disse acreditar que as pautas das duas frentes serão basicamente as mesmas com uma ou outra divergência. Como exemplo, ele citou a proposta de legalização de jogos de azar. "Não sei se a conservadora ficará contra", disse o deputado.
Líder da Minoria na Câmara, o deputado José Guimarães (PT-CE) afirmou que vê com naturalidade a criação de uma frente, mas que o trabalho para inviabilizar a pauta conservadora do governo será mantido nos próximos dois anos. "Vamos continuar na mesma linha. Eles deviam estar preocupados em apresentar sugestões para a retomada do crescimento. Para este governo, se nem o centrão deu jeito, o que dirá uma frente", afirmou o deputado.O petista faz alusão ao bloco de partidos que costuma apoiar governos independentemente do ponto que ocupam no espectro político, desde que haja participação na administração por meio de cargos e liberação de recursos. Integrantes da base ideológica do governo reclamam nos bastidores que se sentem preteridos em relação aos aliados do centrão pela articulação política do Palácio do Planalto. Em um movimento recente, tentaram forçar a troca do ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, mas não obtiveram sucesso. Enquanto isso, a investida conservadora tenta ganhar o mundo. Kicis afirmou que está trabalhando na costura de uma frente conservadora sulamericana, reunindo parlamentares de outros países do continente. Ela disse já ter conversado com representantes de Colômbia, Chile e Argentina. "O objetivo é a gente se unir além das fronteiras, [unir] países que buscam preservar sua soberania, que são contra o desrespeito com que a esquerda e os globalistas tratam os países e os governos conservadores", disse a deputada.

*”Em áudio que viralizou, médico de Bolsonaro erra ao dizer que vacina contra Covid matou brasileiro”*

*”Folha errou em reportagem sobre participação privada na gestão da saúde pública”* - A Folha errou ao afirmar, em reportagem publicada na edição deste domingo (1º), que 73% dos serviços de saúde pública no país estão sob a gestão privada. Os números da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic 2018), citados na Pesquisa de Informações Básicas Estaduais do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), foram mal interpretados e mostram uma outra realidade da presença da iniciativa privada no funcionamento da rede pública de saúde. O total de serviços terceirizados no sistema chega a 13,2%, sendo que 73,3% dessa fatia está sob a gestão de entidades privadas. Quando se olha quem são as entidades privadas à frente dos serviços públicos de saúde, as OS (Organizações Sociais) comandam 58,3% do sistema terceirizado. As OS são entidades sem fins lucrativos contratadas para administrar hospitais e unidades de saúde. Elas também fazem a gestão de hospitais e executam as políticas públicas de saúde conforme as metas assistenciais estabelecidas nos contratos.
Em 2015, duas decisões do Supremo Tribunal Federal entenderam que estas são constitucionalmente permitidas e não afrontam os princípios do SUS (Sistema Único de Saúde). Já as empresas privadas, por meio das PPP (Parcerias Público-Privadas), ocupam 15% (outros 11% são geridos por consórcios públicos e 9,4% por fundações). As PPPs são contratos administrativos firmados entre o poder público e empresas privadas para criação de um serviço de saúde, manutenção e prestação de serviços. As parcerias público-privadas ganharam os holofotes na semana passada, quando o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) emitiu decreto, revogado após críticas, para avaliar um modelo de negócios para as UBS (Unidades Básicas de Saúde), sem mais detalhes. Nos últimos quatro anos, a participação da gestão privada nas unidades de saúde dos municípios brasileiros subiu 2,6 pontos percentuais. Nesses casos, os serviços públicos de saúde do município são garantidos por uma entidade não governamental (ONGs, instituições filantrópicas, santas casas, empresas, associações e outras entidades do Terceiro Setor). Mesmo quando a gestão é terceirizada, o serviço de saúde continua sob a responsabilidade do município. A correção de erros é característica da Folha, reforçada na última versão de seu Projeto Editorial, que diz: "Mesmo com as cautelas recomendadas e adotadas, um jornal comete erros e imprecisões; pode, em certas circunstâncias, prejudicar indevidamente a imagem pública de pessoas e organizações".

*”Investimento federal em comunidades terapêuticas sobe 95%”* - O repasse de verbas a empresas privadas que realizam tratamento com internação de dependentes químicos passou de R$ 153,7 milhões em 2019 para R$ 300 milhões neste ano, segundo o Ministério da Cidadania. Levantamento feito pela Folha mostra que 74% das comunidades terapêuticas que recebem financiamento federal são de matriz religiosa. A rede privada de tratamento para o vício em álcool e drogas foi expandida no governo de Jair Bolsonaro. Em 2018, havia 2.900 leitos patrocinados com dinheiro público no Brasil. Esse número subiu para 11 mil em 2019, e miram-se 20 mil vagas até o final de 2020. Consultado pela Folha sobre a ampliação da rede e sobre os motivos técnicos para o aumento de 95% do investimento, o Ministério da Cidadania não se pronunciou até a conclusão desta reportagem. O levantamento da Folha cruzou informações do mapa das comunidades terapêuticas com as informações em canais oficiais acerca das 487 entidades que recebem os repasses: 37% são católicas, 29% são evangélicas e 8% se dizem apenas cristãs. A expansão foi interrompida brevemente pela pandemia de Covid-19, mas logo foi retomada com a reabertura de um edital em junho de 2020.
Além disso, em outubro, o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, anunciou um projeto para internar dependentes químicos em situação de rua, em parceria com o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. O investimento extra de R$ 10,2 milhões será destinado à abertura de mais 1.400 leitos nas organizações já credenciadas. Em julho deste ano, o Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad) divulgou uma resolução que regulamentou como política pública a internação de crianças e adolescentes. Ela deve entrar em vigor no prazo de um ano. O Ministério Público Federal (MPF) e o Conselho Nacional de Saúde foram contra a medida, por considerarem a internação ilegal pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. O Conad foi um dos órgãos públicos que perderam participação popular em 2019. As decisões agora são tomadas exclusivamente por representantes governamentais. Entidades com conhecimento técnico sobre o tema, como o Conselho Federal de Psicologia e o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente não foram consultadas sobre a medida, que afeta jovens de 12 a 18 anos. Para especialistas em saúde mental, a expansão não atende a critérios técnicos ou médicos. Segundo o presidente da Associação Brasileira de Saúde Mental, Leonardo Pinho, o investimento está onde menos se veem resultados.
“A internação não é o mais importante e não é recomendada como tratamento. É para isso que existem os Caps.” O orçamento dos Caps (Centros de Atenção Psicossocial) previsto é de R$ 158 milhões, pouco mais de 50% do destinado a comunidades terapêuticas. A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do MPF vê no movimento do governo federal uma escolha política. A procuradora Lisiane Braecher, coordenadora do grupo de trabalho da PFDC sobre o tema, enfatiza que “o vício em álcool e drogas é questão de saúde mental, por lei”. E, diz, “a Política Nacional de Saúde Mental garante o direito ao tratamento no próprio território do dependente, com sua família e comunidade”. Mas a característica legal mais complexa quanto às comunidades terapêuticas é que, embora elas se insiram no contexto de um problema de saúde pública e sejam regulamentadas no Ministério da Saúde desde 2012, são credenciadas e financiadas pela pasta de Lorenzoni. Para Braecher isso burla normas do Sistema Único de Saúde, como a Política de Saúde Mental, que estipula que a internação precisa ser indicada pelo Caps e que o residente deve participar das decisões.
Organizações civis e órgãos de controle público também criticam o fato de que, apesar do aumento de dinheiro público investido, não haja fiscalização nem diretrizes de práticas médicas desses locais. A única inspeção regular nas comunidades é a sanitária, pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). O MPF diz pedir constantemente atualizações sobre as condições básicas de saúde e o cumprimento de direitos básicos dos pacientes, mas afirma não receber informações. “Não tenho conhecimento de o Ministério da Cidadania ter feito uma única inspeção nesses locais”, afirma Braecher. Dessa forma, não há controle nem padronização dos tratamentos oferecidos, o que abre espaço para modelos que não seguem as melhores práticas validadas pela ciência. Entidades ligadas a igrejas apresentam como metodologia a espiritualidade e a laborterapia (trabalho como terapia). “A lógica religiosa muitas vezes vê [o vício] não como um problema de saúde, mas de caráter. E isso vai contra todo conhecimento e procedimentos consolidados”, avalia o presidente da Abrasme. O último relatório de inspeção das comunidades terapêuticas foi divulgado em 2018. Na ocasião, o MPF e outros órgãos civis descreveram violações de direitos humanos, como privação de liberdade, violação à liberdade religiosa e à diversidade sexual. Também foram encontrados indícios de uso de castigos que poderiam ser enquadrados como tortura e a prática de trabalhos forçados sem remuneração.

*”Flordelis diz que denúncia contra ela foi baseada em depoimentos anônimos”*
MÔNICA BERGAMO - *”CNJ enviará 4.500 kits de coleta biométrica para presídios”*
MÔNICA BERGAMO - *”Pacientes com doenças raras têm dificuldade para obter tratamento mesmo com aval da Justiça, diz grupo”*

MÔNICA BERGAMO - *”Deputado do PT pede custos detalhados de viagem de Salles a Noronha”*: O deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) enviou ao Ministério do Meio Ambiente um ofício solicitando informações sobre a viagem do titular da pasta a Fernando de Noronha na semana passada. Na quinta (28), Ricardo Salles foi flagrado em um bar da ilha, horas antes de uma postagem em seu Twitter chamar o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, de “Nhonho”. Ele programava também passar o fim de semana em uma pousada de luxo, com diárias por volta de R$ 2 mil por pessoa. Padilha questiona a agenda da viagem oficial e os custos do deslocamento para os cofres públicos.

MÔNICA BERGAMO - *”PSOL questiona Turismo sobre suposta perseguição política a servidores da Casa de Rui Barbosa”*
MÔNICA BERGAMO - *”Professora da UFRJ acusa diretor do Instituto Italiano de Cultura de SP de censurar debate”*
MÔNICA BERGAMO - *”Organização oferece ebook gratuito para abordar política em sala de aula”*

CAPA – Manchete principal: *”Crédito garantido pelo governo vai a R$ 100 bi e dá fôlego às empresas”*

*”Bolsonaro em campo – Presidente faz apelo conservador para tentar frear esquerda na eleição”* - Faltando apenas duas semanas para o primeiro turno da eleição municipal, o presidente Jair Bolsonaro recorre a valores conservadores para tentar superar fragilidades de seus candidatos a prefeito no Rio e em São Paulo e, assim, conseguir levá-los ao segundo turno. Neste fim de semana, Celso Russomanno e Marcelo Crivella, ambos do Republicanos, divulgaram vídeos em que Bolsonaro diz que a vitória destes candidatos significaria impedir a volta da esquerda ao poder e reafirmaria o que ele chama de “valores da família”. As propagandas foram gravadas às pressas em um momento em que os dois candidatos estão ameaçados de não chegar ao segundo turno nas duas principais capitais do país. Pesquisa Ibope divulgada na sexta-feira mostra que, no Rio, Crivella está empatado numericamente com Martha Rocha (PDT) no segundo lugar, com 14% das intenções de voto. Na liderança está Eduardo Paes (DEM), que tem 32%. Já Russomanno perdeu a liderança confortável que tinha no início de outubro, com 26% das intenções de voto, e hoje está com 20%, em segundo lugar. Atrás dele vem Guilherme Boulos (PSOL), com 13%. O prefeito e candidato à reeleição Bruno Covas (PSDB) lidera com 26%. A margem de erro das pesquisas é de três pontos percentuais, para mais ou para menos. O tom da fala de Bolsonaro nos vídeos divulgados no fim de semana reedita a mensagem empregada por ele em 2018, quando venceu a eleição presidencial.
— Estamos há muitos anos juntos no Congresso Nacional, e as nossas bandeiras são as mesmas: a liberdade econômica e a defesa da família — diz Russomanno no vídeo, gravado no Aeroporto de Congonhas na última sexta-feira e divulgado no sábado.
Ele então é interrompido pelo presidente, que segue listando pautas que ele considera comuns com o candidato.
— É o conservadorismo, a questão da criançada em sala de aula. Não podemos admitir o risco de uma doutrinação em sala de aula — diz Bolsonaro.
No caso de Crivella, o prefeito e candidato à reeleição viajou até Brasília para fazer a gravação na sexta-feira. Até então o apoio do presidente a Crivella era velado. Neste domingo o prefeito postou em suas redes sociais o vídeo com o presidente. A propaganda fala em “convocação oficial do exército do bem”. Bolsonaro pede voto em Crivella contra o que chamou de “ideologia nefasta”, referindo-se à esquerda.
— Quem tem essa tendência de pintar de vermelho, essa ideologia nefasta que não deu certo em nenhum lugar do mundo... é mais um motivo para eu pedir ao eleitor vote no Crivella 10 para prefeito do Rio de Janeiro — diz o presidente, ao lado do prefeito.
O voto conservador varreu as urnas em 2018 e foi responsável pela eleição de Bolsonaro. Essa parcela do eleitorado assegura até hoje ao presidente parte expressiva de sua aprovação e popularidade. Bolsonaro tenta ressuscitar esse movimento nas eleições municipais, apesar de estas serem historicamente mais vinculadas a temas locais. A entrada do presidente na disputa contrariou o que ele havia dito meses antes de o pleito começar, quando prometeu que não se envolveria na campanha, pelo menos no primeiro turno. Depois, afirmou que teria participação em algumas cidades. Procurada, a Secretaria de Comunicação da Presidência afirmou ontem que o Palácio do Planalto não iria se manifestar sobre vídeos gravados pelo presidente.
Rejeição
A associação ao nome de Bolsonaro divide opiniões. Isso porque a rejeição ao presidente é alta tanto no Rio quanto em São Paulo. De acordo com pesquisa Ibope de outubro, este índice alcançava 38% no Rio e 48% em São Paulo. No caso de São Paulo, este fator já levou a alguns recuos. Russomanno foi lançado candidato dizendo que só entrou na disputa depois de ter garantido o apoio presidencial. No início da campanha, o candidato explorou com intensidade o vínculo com o Planalto e deixou claro que o objetivo central de Bolsonaro era impor uma derrota ao governador João Doria (PSDB), que virou seu desafeto. Uma das principais promessas do candidato é o auxílio paulistano, uma reedição do auxílio emergencial criado por Bolsonaro na pandemia. Em entrevista ao GLOBO no início de outubro, Russomanno disse que, a despeito de a rejeição de Bolsonaro ser alta em São Paulo, não agiria como “ um traidor”. Mas, à medida em que começou a cair nas pesquisas, passou a modular a associação com o presidente na a campanha. Na última semana, Russomanno reduziu a presença de Bolsonaro em seus programas no rádio e na TV e chegou a declarar posições contrárias a ele, como no caso da vacina chinesa Coronavac. Agora, a partir da gravação exibida no sábado, a campanha dá uma nova guinada, retomando a associação com o presidente.

*”Candidatos apoiados pelo presidente não decolam”*

*”Em cada sigla, uma regra para financiar mulheres”* - Com uma diretriz vaga do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre como deve ser distribuída a verba para mulheres nas eleições, cada partido adota uma metodologia. O resultado é que elas recebem recursos de maneira desigual, e alguns municípios têm baixo investimento em candidaturas femininas. A lei determina que, em cada cidade, partidos lancem ao menos 30% de candidatas a vereadoras, mas o valor mínimo de financiamento, no mesmo percentual, só precisa ser cumprido nacionalmente, não importando a que cargo concorrem. Nestas eleições, mulheres representam 13% do total de candidaturas a prefeito. A cota mínima de candidatas vale apenas em campanhas proporcionais, ou seja, para vereador e deputado. Há partidos que distribuem o dinheiro entre seus diretórios e exigem que, em nível estadual, seja cumprido o mínimo de 30% para candidaturas femininas. É o caso de PT, PSD, PTB, PSOL e PV. Já para outros, como Republicanos, PSL, PP, PSB, Cidadania, PROS e Podemos, a única regra é a distribuição de ao menos 30% da soma total para mulheres. O TSE diz que “o partido deve em nível nacional mandar 30% para candidaturas femininas” e que “pode eventualmente mandar menos para uma cidade e mais para outra”. Levantamento do GLOBO com base em dados do TSE mostra que 84 diretórios estaduais não repassaram dinheiro a candidatas. Vinte não repassaram dinheiro a homens. As legendas não cumprem a proporcionalidade em cada diretório, já que não há essa obrigação em todas as siglas.
Sem repasses
Um dos diretórios sem repasses para mulheres é o do PSL em Rondônia. Sargento Eyder Brasil, candidato a prefeito de Porto Velho e presidente estadual da sigla, declarou ter recebido R$ 437 mil do diretório que comanda, quase o total dos R$ 467 mil gastos pelo PSL no estado até agora. Procurado, ele não retornou. A cota de financiamento já valia em 2018, mas este ano há mais cargos majoritários em disputa, o que torna mais difícil cumprir a regra, segundo partidos. Por isso, há legendas que centralizaram os repasses para prefeitos no diretório nacional, a fim de garantir o cumprimento dos 30%. No PT, que tem a maior fatia do fundo eleitoral — R$ 202 milhões —, os diretórios estaduais receberam o dinheiro do nacional sob a condição de repassar as verbas cumprindo a cota para mulheres. Já o PSL, que tem a segunda maior fatia — R$ 199 milhões — , manda a verba diretamente para as mulheres. A sigla considera que a cota de 30% deve ser cumprida em nível federal, mas diz tentar manter essa porcentagem nos estados e municípios. Até agora, 1.052 dos diretórios que distribuíram dinheiro, 49% do total, não repassaram o mínimo de 30% para as mulheres, e 555 não repassaram dinheiro algum às candidatas. Por enquanto, candidatos declararam ter recebido apenas 50% dos R$ 2 bilhões do fundo eleitoral. Por isso, não é possível apontar quais partidos infringiram a regra. É comum o expediente de doar para candidatas a vice para cumprir a cota. A direção nacional do DEM repassou R$ 3,3 milhões para Ana Paula Matos (PDT), candidata a vice-prefeita em Salvador. Há candidatas a prefeita que não receberam nada, como Ione Barbosa, que concorre em Juiz de Fora (MG) pelo Republicanos. Ela diz que está “numa luta” para fazer campanha:
— A gente está passando aperto. Estou tendo doações de amigos e dinheiro pessoal. Conto muito com o fundo. Isso gera uma insegurança muito grande, mas entendo que seja uma questão burocrática.
Por lei, partidos são obrigados a fixar critérios de distribuição do fundo eleitoral, mas muitos tratam isso de forma ampla ou nem mencionam como será dividida a verba destinada às mulheres. Só o PCO lançou menos de 30% de mulheres: elas são 27,27% das 143 candidaturas. A sigla distribuiu menos de 10% do R$ 1,2 milhão que lhe cabe, sendo 76% a homens.

*”Câmaras do Rio e de São Paulo criaram 267 leis inconstitucionais”*

*”Sem creche – Vagas públicas diminuem em meio a crise no setor privado”* - Pela primeira vez nos últimos seis anos, o Brasil registrou queda no número de matrículas em creches públicas. Num cenário em que o país necessita criar cerca de 1,5 milhão de vagas até 2024, apenas para garantir o mínimo exigido pelo Plano Nacional de Educação (PNE), foram 30 mil crianças a menos nessa etapa escolar em 2020 em relação a 2019. Os dados são do Censo Escolar, colhidos em março — ou seja, ainda antes da pandemia. Especialistas acreditam que o número será ainda maior quando forem incluídos o segundo e terceiro trimestres deste ano.
— A demanda por creche é muito alta. É muito preocupante detectar a diminuição do número de matrículas— alerta Karina Fasson, educadora da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, voltada à infância.
De acordo com o Índice de Necessidade de Creche (INC), métrica criada pela instituição, mais de 5 milhões de crianças de 0 a 3 anos precisam de vaga em creche por serem de famílias pobres, com apenas um responsável ou porque a pessoa cuidadora é economicamente ativa, ou teria potencial para ser. Isso significa que pelo menos 1,2 milhão dessas famílias precisam, mas não encontram hoje vagas na creche. A educação infantil é responsabilidade das prefeituras. Segundo o Anuário Brasileiro da Educação Básica 2020, publicação do Todos Pela Educação com dados de 2019, 35,7% das crianças até 3 anos estão matriculadas em creche. São 3,8 milhões de matrículas, nas redes pública e privada. De acordo com o PNE, em vigor desde 2014, é preciso atender, até 2024, no mínimo, 50% das crianças de até 3 anos. Para isso, teríamos de ter 5,3 milhões de crianças matriculadas — portanto, o país precisaria abrir mais 1,5 milhão de vagas. As creches privadas têm hoje 1,4 milhão de matriculados, segundo o Censo Escolar de 2019. Mas o setor foi um dos mais abalados pela pandemia. Segundo a presidente da Associação Brasileira de Educação Infantil (Asbrei), Celia Moreno Maia, enquanto as públicas diminuem de tamanho de forma inédita nos últimos anos, as particulares já perderam, em média, metade dos alunos este ano.
— Os (novos) prefeitos enfrentarão a pressão por mais vagas nas creches públicas por conta do fechamento das privadas em um cenário em que terão menos verba — diz Gabriel Corrêa, gerente de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação.
Luiz Miguel Garcia, presidente da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Unime), acrescenta que o número do Censo Escolar pode ter subestimado a dimensão do problema, pois, neste ano, o prazo para coleta das informações foi mais reduzido.
Qualidade mínima
A falta de vaga na creche afeta mães em todo o país. Suellen Dias, de 21 anos, tenta matricular Enzo Miguel Dias Ribeiro, de 3, desde 2019. Ele vai passar da idade da etapa pedagógica sem poder cursá-la. E o irmão mais novo dele, Vicente, de 1 ano e três meses, já aguarda na fila.
— Se conseguisse as vagas ia ajudar muito no desenvolvimento deles e também na minha vida profissional — diz a mãe de três crianças, que abriu um mercado no quintal de casa, em Santa Cruz do Sul (RS), para trabalhar e cuidar dos filhos ao mesmo tempo.
A creche tem papel decisivo no desenvolvimento intelectual das crianças. O economista Daniel Santos, da USP, frisa que, com um padrão mínimo de qualidade, a etapa contribui para o desenvolvimento de sinapses, relações afetivas e o repertório da criança. Ele enfatiza, no entanto, que o aumento de vagas deve ser acompanhado por foco na qualidade.
— Ainda registramos maus-tratos nas creches com frequência inaceitável. Há relato de abusos verbais e de deixar criança olhando para a parede. Há creches onde se liga a TV e pronto. Assim a criança perde a oportunidade de ser estimulada e de expandir seu potencial. A creche precisa conversar com a criança — diz.
O professor da USP frisa ainda que a fatia do Fundeb, principal fundo de financiamento da educação básica do país, destinada à educação infantil é fundamental para se abrir mais vagas em unidades públicas. Ele espera que, no atual processo de regulamentação do fundo, o governo federal seja impedido de usar essa verba em programas de transferência de renda, tema em debate no momento no Congresso.
— Espero que isso não aconteça. Mas vagas em creches é um dos poucos temas consensuais no país — diz.

*”Vacina de Oxford terá revisão acelerada no Reino Unido”*
*”Brasil ultrapassa a marca de 160 mil mortes por Covid-19”*

*”A garantia é o Tesouro – Governo assume risco, destrava o crédito, e empréstimos para empresas passam de R$ 100 bi”* - O crédito para empresas, que praticamente secou no início da quarentena, voltou a ser combustível para a recuperação dos negócios, principalmente entre as pequenas empresas. Só o Programa Emergencial de Acesso ao Crédito (Peac), administrado pelo BNDES com garantia do governo, emprestou R$ 71,1 bilhões em menos de quatro meses. Somados aos R$32,8 bilhões liberados pelo Pronampe, programa para micro e pequenas empresas, foram concedidos R$ 103,9 bilhões em empréstimos com garantia do Tesouro Nacional. Isso foi possível porque a dificuldade de oferecer garantia, principal obstáculo para empresas conseguirem crédito, foi resolvida pelo governo, que passou a assumir a maior parte do risco. Mas os recursos podem acabar. O diretor de Crédito e Garantia do BNDES, Petrônio Cançado, admite que, mantido o ritmo acelerado de concessões, o limite de R$ 100 bilhões do Peac pode ser atingido antes do fim do programa, em 31 de dezembro. O banco já estuda uma nova linha para 2021, com garantias, mesmo sem participação do governo. Para o executivo, o apetite está ligado à demanda reprimida por crédito e à recuperação da economia. Mais de 90% das 89 mil empresas atendidas pelo programa do BNDES são micro, pequenas e médias. Os valores vão de R$ 5 mil a R$ 10 milhões.
— Vimos que era preciso apoiar as pequenas empresas na garantia porque representam parte importante do PIB e são grandes empregadores.
Mário Sérgio Telles, gerente de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), afirma que dar garantia para os empresários foi fundamental para deslanchar o crédito. E isso aconteceu a partir do terceiro trimestre:
— O início foi complicado, mas quando os fundos (garantidores de crédito) começaram a operar, a coisa mudou. As operações de crédito foram destravadas e passaram a crescer muito rápido. Em setembro, as concessões cresceram 10,5%, de R$ 162 bilhões em agosto para 178,9 bilhões em setembro.
Nem cartão de crédito
Alexandro Zubaran, CEO da Enjoy Hotéis e Resorts, foi um desses empresários que conseguiu crédito nessas condições. A previsão de faturamento para o Enjoy Olímpia Park Resort, no interior de São Paulo, para este ano de R$ 45 milhões caiu para R$ 19 milhões:
— A situação ficou preocupante, não sabíamos a extensão da crise. Buscamos em todos os bancos, não eram só negativas, as condições eram absurdas. Não aceitavam recebíveis (recursos a receber) nem de cartão de crédito.
A empresa conseguiu por meio da agência de fomento Desenvolve SP, ligada ao governo paulista, R$ 2 milhões para rede de hotéis e mais R$ 700 mil para um restaurante, ambos no interior do estado, com carência de um ano. Zubaran, que é sócio do Hotel Nacional no Rio, reaberto no ano passado, diz que ainda não conseguiu empréstimo para a unidade carioca. A dúvida paira sobre 2021, quando as linhas asseguradas pelo Tesouro Nacional devem cessar. Segundo Cançado, não há previsão de extensão do programa atual, mas o BNDES poderá manter as garantias no ano que vem, numa linha de crédito sem reforço do Tesouro. Os recursos viriam do próprio BNDES e de captações no mercado:
— A experiência mostrou a potência do instrumento de garantia. O desafio agora é criar algo perene, permanente.
É o que também defende a CNI, que a cobertura permaneça pelo menos até o primeiro semestre de 2021. Para Cançado, a vantagem das garantias é que com R$ 20 bilhões do Tesouro é possível oferecer até cinco vezes mais crédito. As taxas são em média de 0,87% ao mês. Em julho, Paulo Fernandes, dono de uma imobiliária em Palmas, no Tocantins, conseguiu pelo Pronampe empréstimo de R$ 74 mil para atravessar a crise, com taxa 3,25% ao ano, bem inferior aos 7%, 8% cobrados antes:
— Se o banco exigisse, teria que dar um bem pessoal, como uma casa, um carro .
O empresário diz que as receitas com aluguéis caíram 50%, e ele teve de demitir dois dos sete funcionários:
— Usei o dinheiro para apagar incêndio. Deu um fôlego. O mercado imobiliário em Palmas já está bem aquecido e não vou ter dificuldades para pagar o empréstimo. Já vou poder voltar a contratar.
O presidente do Sebrae, Carlos Melles, lembra que, no início da pandemia, só 8% das micro e pequenas empresas tinham acesso ao crédito. Esse índice subiu para 31%, mas Melles diz que, ainda assim, só metade dos empreendedores que pedem crédito consegue:
— O problema é que os bancos trabalham com uma taxa de risco muito reduzida, perto de zero. Quando a garantia apareceu, o crédito avançou.
Sinais de retomada
Na Desenvolve SP, onde Zubaran conseguiu viabilizar o empréstimo, sinais de retomada começam a aparecer. Os pedidos agora são também para investimento.
— Empresas estão começando a tirar projetos de investimento da gaveta. Estão se organizando com a volta da atividade, com a pandemia arrefecendo — diz Nelson de Souza, presidente do Desenvolve SP.
Foi para investimento que o empresário Sandro Meneghetti, um dos sócios da ZIT Gráfica, na Zona Norte do Rio, conseguiu R$ 2,6 milhões para comprar uma máquina e automatizar parte da produção. Voltado para impressão de livros didáticos, a empresa não viu sua demanda cair drasticamente. Mas na entressafra estudantil, entre um ano letivo e outro, quando a demanda do setor cai 80%, não teve outros clientes para compensar a queda como em anos anteriores. A produção caiu para 15% entre setembro e outubro:
— Conseguimos nos manter, mas o crédito só apareceu em outubro. Começamos a procurar em abril.
Izis Ferreira, economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC), começou a perceber sinais de retomada em outra estatística: o uso de cartão de crédito entre quem ganha mais de dez salários mínimos. A parcela nessa faixa de renda que usou o crédito subiu de 74,7% em agosto para 75,8% em setembro:
— Essas famílias estão aos poucos voltando a consumir.
O economista Claudio Frischtak, da Inter.B Consultoria, afirma que, ainda que a perspectiva para o início de 2021 seja de retomada lenta, os subsídios do Tesouro precisam ser retirados em dezembro:
— Se tem algo que a pandemia mostrou é que a questão das garantias é muito relevante. Esse custo de transição, para garantir a reorganização das empresas, justifica a ação do Tesouro, como foi feito em outros países. Mas é uma situação extraordinária. No ano que vem, os subsídios terão de ser racionalizados, voltando para certa normalidade. O Brasil está numa situação fiscal de muita fragilidade, com a solvência posta em xeque.
Mesma opinião tem Vinicius Carrasco, professor da PUC e ex-diretor do BNDES:
— Tem de deixar o mercado privado retomar seu papel de conceder o crédito.
Sergio Vale, economista -chefe da MB Associados,para 2021, não vê risco de crédito faltar. Ele teme falta de demanda, com as empresas ainda combalidas pela crise e com o rombo fiscal, que pode levar à alta de juros e da inflação:
— Quem vai tomar crédito, se o crescimento não vai acontecer, juro vai subir pelo risco fiscal, com inflação elevada? Se a estabilidade macroeconômica se perder, não tem sentido ter muito crédito.

*”Papéis de varejistas devem manter bom desempenho na Bolsa”*

 

CAPA – Manchete principal: *”Eleição americana pressiona política ambiental do Brasil”*

EDITORIAL DO ESTADÃO - *”A China se apruma”*: Após quatro dias de conclave, o Comitê Central do Partido Comunista Chinês apresentou as linhas gerais do novo Plano Quinquenal econômico e social. Os detalhes serão conhecidos nas próximas semanas e o Plano será formalizado no ano que vem. Mas o documento já reflete os efeitos da pandemia e das tensões comerciais internacionais sobre o regime chinês. O Plano Quinquenal é um resquício do leninismo soviético. Seria o mais próximo de um “programa eleitoral”, se a República Popular da China fosse de fato uma república e não uma ditadura de partido único.
O Plano de 2016 asseverava o objetivo do Plano anterior de transformar a China numa “sociedade moderadamente próspera”, com uma meta ambiciosa de redução da dívida e crescimento em torno de 6,5% ao ano. Ao contrário dos outros Planos, o atual não estabelece uma meta de crescimento, mas as estimativas apontam para algo como 5% ao ano. A redução é efeito não tanto da pandemia, mas sobretudo das “instabilidades e incertezas” resultantes da hostilidade comercial liderada pelos EUA. Analistas chineses preveem que o resultado das eleições americanas não afetará tanto a intensidade desta hostilidade, mas a sua forma. Uma nova gestão de Donald Trump pode recrudescer as pressões unilaterais em favor de condições comerciais vantajosas aos EUA, ao passo que uma gestão de Joe Biden talvez seja menos agressiva no confronto direto, mas mais capaz de coordenar resistências multilaterais ao regime chinês, sobretudo em questões ligadas aos direitos humanos. Este “ambiente internacional cada vez mais complicado” explica a ênfase do Partido naquilo que chama “Estratégia de Circulação Dual”, ou seja, manter o esforço de integração da China à economia globalizada e, ao mesmo tempo, beneficiar-se disso para estimular o consumo interno em busca de mais “autossuficiência” e redução da desigualdade. A estratégia dedica particular atenção à corrida tecnológica. Prevendo a possibilidade de limitações às importações de insumos tecnológicos e à exportação de sua tecnologia, o Partido insiste na prioridade de atingir “grandes saltos em tecnologias cruciais” atualmente dominadas pelos EUA.
Outro ponto importante é o compromisso climático. A China, de longe o maior emissor de carbono do mundo, respondendo por 28% das emissões globais, se compromete a atingir a neutralidade até 2060. A meta é distante e os meios precisam ser detalhados. Mas a simples fixação de um prazo já implica um salto adiante, fortalece os esforços de ativistas e outras jurisdições para promover suas próprias medidas de redução e mostra que o cerco está se fechando para governantes negacionistas, como Jair Bolsonaro. Do ponto de vista político, o Plano consolida inequivocamente a perpetuação no poder do secretário-geral do Partido, Xi Jinping. Em 2017 o Parlamento removeu da Constituição o limite de dois mandatos. O próprio Xi cuidou para que fosse embutido no Plano uma espécie de “Plano de 15 anos” para uma “Grande Nação Socialista Moderna”, sugerindo indisfarçavelmente o comando vitalício do líder mais poderoso desde Mao Tsé-tung. O fato de que não foi apontado nenhum civil como vice-secretário do Partido, tradicionalmente o sucessor do secretário-geral, confirma essa expectativa. Assim, o Plano não traz surpresas: nos próximos anos a China fortalecerá sua autocracia, continuará sua ascensão como potência econômica global (ainda que num passo mais moderado) e investirá pesadamente em inovação tecnológica. Mas isso num ambiente comercial cada vez mais volátil em comparação às últimas décadas. Para países como o Brasil, esse cenário redobra a necessidade de habilidade diplomática, seja para distinguir entre interesses econômicos comuns e dissensões político-ideológicas de modo a garantir que uma área não interfira indevidamente na outra (tarefa particularmente delicada quando se lida com um capitalismo de Estado), seja para defender os interesses nacionais em condição de equidistância na disputa geopolítica entre China e EUA.

COLUNA DO ESTADÃO - *”Analistas veem Paulo Guedes na corda bamba”*: Em uma relação de “morde e assopra” com o Legislativo e até com o governo que integra, Paulo Guedes deixou se ser um “intocável”, na avaliação de analistas políticos consultados pelo Barômetro do Poder de outubro, elaborado pelo Infomoney. Para 40% dos 15 entrevistados, as chances de o “ex-superministro” deixar o governo até 2022 são muito altas ou altas; outros 47% consideram regular essa possibilidade. Apenas 13% acham pouco provável a saída de Guedes. Para a maioria, a substituição dele, se ocorrer, será em uma reforma ministerial.
» Será... A maioria dos analistas políticos avaliou também que são altas as chances de o Congresso aprovar até o fim do ano a autonomia do Banco Central.
» ...que vai? Dentre os analistas, 47% acreditam serem altas ou muito altas as chances; 27% disseram que elas são regulares e outros 27% avaliaram como baixas. O texto está na pauta de amanhã do Senado. Se for aprovado, ainda precisará do aval dos deputados.
» Com atraso. Já o Renda Cidadã só deve sair do papel em meados do ano que vem, segundo o levantamento. As chances de aprovação até janeiro são consideradas baixas ou muito baixas por 66% deles, contra 33% de avaliações neutras.
» Ou um... Caso o novo programa social do governo federal não seja aprovado até janeiro, 50% dos analistas acreditam em uma nova prorrogação do auxílio emergencial pelo Planalto.
» ...ou outro. Outros 43%, no entanto, acham que o auxílio será encerrado e o Bolsa Família deverá ser retomado como está previsto na peça orçamentária encaminhada pela União ao Congresso em agosto.
» Dados da amostra. A edição de outubro do Barômetro do Poder foi realizada entre os dias 26 e 28.

*”Entidades ambientais civis reforçam atuação eleitoral”* - A crise da política ambiental do governo federal abriu espaço para a participação de organizações da sociedade civil nas campanhas eleitorais, além de deslocar o protagonismo do setor para prefeituras, governos estaduais e para a iniciativa privada. Símbolo disso são as ações para a construção de plataformas e de agendas para os candidatos a prefeito e vereador no País. A mais nova iniciativa reúne na véspera do primeiro turno das eleições 2020 entidades na Conferência Brasileira de Mudança do Clima para o lançamento, no dia 5, da Agenda Urbana do Clima, a quinta pauta suprapartidária construída neste ano para oferecer um caminho para a retomada verde no Brasil. Na semana passada, 12 governadores – entre eles o de São Paulo, João Doria (PSDB), e o do Maranhão, Flávio Dino (PCDOB) – assinaram a carta de compromisso do 1.º Encontro Internacional Governadores pelo Clima, organizado pelo Centro Brasil no Clima (CBC), uma das entidades por trás da agenda. “Não só o esvaziamento da agenda ambiental, mas o desmonte das políticas nacionais para o setor levou os entes subnacionais – Estados e Municípios – e a sociedade civil a se apropriarem dessa agenda”, afirma Ana Toni, diretora executiva do Instituto Clima e Sociedade (ICS). Essa situação provocou o aumento do interesse de candidatos pela pauta ambiental. “Este é um ano diferente. Há um interesse maior de candidatos para o tema do desenvolvimento sustentável e a mudança do clima em particular”, diz Mônica Nobre, diretora da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), que busca juntar o mundo político ao da sustentabilidade. A Raps registrou um aumento da procura de lideranças políticas pelo seu processo seletivo, que passou de 3 mil no período de 2018/2019 para 8 mil em 2019/2020. Neste ano, a Raps patrocina 187 candidatos em disputa por cargos de vereador e prefeitos no Brasil, parte dos quais tenta a reeleição. Além disso, reúne mensalmente 32 deputados federais e 7 senadores ligados à rede. Para Mônica, esse interesse é resultado de um movimento global: “A China declarou que vai ser carbono neutro até 2060 e a Europa até 2050”. Ela acrescenta que a campanha presidencial de Joe Biden, nos Estados Unidos, com sua pauta ambiental, coloca o Brasil na contramão do mundo. “Não temos feito o dever de casa em relação ao desmatamento. Há movimentação do mercado privado e dos bancos, que entenderam que essa pauta não é só ambiental, mas também econômica.”
Eleitos. Para o próximo ano, a ideia é aprofundar o trabalho com os eleitos. A Agenda Urbana do Clima inclui dez tipos de ações, que vão do saneamento básico à saúde e diminuição da poluição à geração de empregos sustentáveis e energia renovável. Para chegar às cidades menores e difundir a agenda da retomada verde, Ana Toni conta que um grupo de 50 entidades planeja criar uma plataforma de ação climática, onde será possível às prefeituras buscar consultoria e assessoria, além de divulgar ações bem sucedidas na área. Entre os financiadores do projeto está a Fundação Bloomberg. “Será uma espécie de Tinder das ações climáticas. Ali se poderá saber que organizações têm experiência com saneamento ou energias renováveis. Também onde buscar o dinheiro para financiar projetos e saber a legislação do setor”, diz Ana. Responsável pela articulação com os governadores, o diretor executivo do CBC, Guilherme Sirkis, afirmou que os Estados têm sido o mais novo caminho da retomada verde no País. “Infelizmente, o governo federal criou um extremismo, que torna difícil o diálogo.” Sirkis espera que até o fim do ano passem de 12 para 18 ou 20 o número de governadores que vão assinar a carta de compromissos com o clima. “A questão climática não é de partido nem de governo. É política pública de longo prazo e de Estado. O Brasil não pode perder a oportunidade de se tornar uma potência econômica de carbono neutro.” Para Mariana Belmont, do Instituto de Referência Negra Peregum, a pauta ambiental deve ser inserida no combate à desigualdade e ao racismo. “Essa crise que estamos vivendo nesses últimos meses com a pandemia escancarou a desigualdade no campo ambiental. Quando uma chuva alaga o Jardim Pantanal (zona leste de São Paulo), os primeiros atingidos são as populações mais vulneráveis.” Também signatário o grupo C40, que engloba 93 grandes cidades (4 delas no Basil) no mundo, defende que a solução para a retomada passa pelo combate à desigualdade. Para seu vice-diretor regional para a América Latina, Ilan Cuperstein, o mundo está buscando uma nova forma de desenvolvimento. E as eleições são o momento para se buscar produzir esse novo consenso. “Já temos quatro prefeitos (São Paulo, Salvador, Curitiba e Rio) que assumiram o compromisso de neutralidade das emissões como previsto no Acordo de Paris. Esperamos que outros prefeitos também participem dessa coalizão de municípios comprometidos com o clima.”

*”Quatro capitais prometem zerar emissões até 2050”*

*”No Rio, disputa por 2º turno se acirra”* - Em meio à impopularidade do prefeito Marcelo Crivella (Republicanos), rejeitado por 55% da população de acordo com a mais recente pesquisa Ibope, a disputa por uma vaga no segundo turno carioca se acirrou nas últimas semanas. Pelo levantamento, divulgado na última sexta-feira, Crivella tem 14% das intenções de voto, mesmo número da deputada estadual Martha Rocha, do PDT. A candidata do PT, a deputada federal Benedita da Silva, tem 9%. Como a margem de erro é de três pontos porcentuais, para mais ou para menos, Benedita está tecnicamente empatada com Crivella e Martha Rocha. Os três tentam crescer e se aproximar do ex-prefeito Eduardo Paes (DEM), com 32% – ele lidera em todos os levantamentos. O Estadão entrevistou, nas últimas semanas, os principais candidatos à Prefeitura do Rio. Crivella, no entanto, alegou mais de uma vez não ter espaço na agenda para dar entrevista, apesar de o convite ter sido feito ainda na primeira semana de outubro. O prefeito não cresceu nas pesquisas mesmo após associar com frequência sua imagem ao presidente Jair Bolsonaro. Essa tem sido a principal estratégia da campanha do mandatário, que enfrenta críticas por sua gestão. Outra bandeira de campanha tem sido a defesa da família.
Bolsonaro, inclusive, foi tema recorrente nas entrevistas. Paes, Martha e Benedita afirmaram que vão manter diálogos institucionais com o presidente, cujo reduto político é o Rio de Janeiro. Os três, contudo, têm posições diferentes quando o assunto é a nacionalização da campanha. A petista evoca o nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de quem foi ministra, antes mesmo de ser perguntada. Martha Rocha, que é delegada, elogia Ciro Gomes (PDT), mas evita dar destaque ao cenário nacional. O exprefeito, por sua vez, diz que só quer saber do Rio e que não é cabo eleitoral de ninguém. Outro tema abordado foi o uso de organizações sociais (OSS) na gestão de unidades de saúde do município. Grande parte das denúncias de corrupção que levaram ao afastamento de Wilson Witzel (PSC) do governo passa por essas instituições. Martha e Benedita defendem o fim da administração por meio de OSS. Paes diz que ainda não sabe se daria fim ao modelo, apesar de defender participação maior da empresa pública Riosaúde. O Estadão também perguntou sobre as prioridades no âmbito da pandemia. Os três são críticos do modo como a prefeitura e o governo do Estado conduziram a crise sanitária. Reclamam, principalmente, da falta de integração entre as duas esferas e de firmeza por parte dos gestores. No caso estadual, houve ainda os escândalos de corrupção. Outro personagem mencionado nas entrevistas foi o governador afastado. Em 2018, Witzel derrotou Paes na eleição para o governo do Rio de Janeiro.

*”Família de Bolsonaro mira Covas e Boulos”* - O vereador carioca Carlos Bolsonaro (Republicanos) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filhos de Jair Bolsonaro, postaram críticas diretas a adversários do apresentador Celso Russomanno (Republicanos), candidato a prefeito de São Paulo apoiado pelo presidente, nas redes sociais. O alvo principal é Guilherme Boulos (PSOL), terceiro colocado na última pesquisa Ibope/estadão/tv Globo. De acordo com o levantamento publicado no dia 30, Russomanno caiu de 25% para 20% das intenções de voto. Já Boulos subiu de 10% para 13%. O líder é o atual prefeito Bruno Covas (PSDB), que cresceu de 22%, no dia 15, para 26% agora. A 13 dias da eleição, o cenário da disputa segue incerto na capital paulista com outro postulante também no páreo: Márcio França, que subiu de 7% para 11%. De olho nas pesquisas, tanto Carlos quanto Eduardo publicaram textos no Twitter acusando Boulos de mentir sobre sua ocupação profissional. Eles repercutiram uma reportagem do jornal Folha de S.paulo do dia 29 que questionou informação supostamente incorreta de que Boulos seria professor da Escola de Sociologia e Política. A publicação de Eduardo dizia “Boulos mente”. Já o texto de Carlos questionou se o assunto seria repercutido pela “Grobo”. Boulos argumenta que lecionou na instituição até novembro do ano passado, mas não como funcionário registrado. Neste ano, o candidato não retomou o trabalho, segundo ele, por causa da pandemia. “Russomanno sentiu (o resultado das pesquisas) e está colocando o gabinete do ódio para nos atacar. Consta que nos grupos de Zap (Whatsapp), naquele submundo que eles têm utilizado, de mentiras, está a todo o vapor. Ele sabem que nossa candidatura é a única capaz de evitar o ‘Bolsodoria’ no segundo turno em São Paulo”, disse Boulos, na manhã de anteontem ao comentar as postagens.
Eduardo mantém fixada em sua página do Twitter (comando em que uma postagem é exibida sempre em primeiro lugar, antes dos textos mais recentes) uma mensagem em que vincula Bruno Covas ao antecessor João Doria (PSDB) e critica a detenção de uma mulher (feita por uma guarda municipal “do interior”, segundo o texto) em uma praça durante a pandemia. “Com a desculpa de proteger o cidadão o governador @jdoriajr e seu aliados, como @brunocovas, estão implantando uma ditadura. E os culpados são exatamente os que sempre acusaram JB (o presidente Bolsonaro) de autoritário!”, diz a postagem. “Cada um tem uma estratégia. Eu, como tem muita coisa que eu fiz pela cidade de São Paulo, prefiro ficar nas ações que a gente já desenvolveu e que a gente quer desenvolver pelos próximos quatro anos. Cada um tem sua estratégia e as pesquisas estão mostrando quem está com a estratégia certa”, afirmou Covas, ao comentar a publicação de Eduardo. O Estadão tentou contato com as assessorias do vereador do Rio e do deputado por São Paulo, mas não conseguiu localizá-las. A campanha de Russomanno afirmou que, desde o início da disputa, Boulos escolheu o deputado como alvo de seus ataques. Em nota, disse que, com a eleição se aproximando, o candidato resolveu apimentar seus ataques com ilações. “Senhor Boulos, nós sabemos nos defender e faremos isso sempre que necessário”, diz o texto. No fim da semana passada, o candidato do Republicanos se encontrou com o presidente Jair Bolsonaro, que gravou vídeo de apoio à sua candidatura para veiculação no horário eleitoral.

*”Em livro, Temer revela contato com militares”* - Diante do cerco que se formou contra sua Presidência, Michel Temer (MDB) tomou uma decisão: passou a gravar entrevistas com o professor de filosofia Denis Lerrer Rosenfield para contar a quente sua versão da história. Ali os delatores são comparados a Joaquim Silvério dos Reis e a Judas, o presidente se vê como o personagem da série de TV Designated Survivor e faz revelações, como o contato mantido com os chefes militares antes do impeachment. Também conta como decidia, com quem se consultava e diz acreditar que seu governo será reconhecido pela moderação e pelas reformas que promoveu. É essa a imagem do ex-presidente em seu livro A Escolha, Como um Presidente Conseguiu Superar Grave Crise e Apresentar uma Agenda Para o Brasil. O encadeamento das entrevistas faz da obra quase um livro de memórias. Conduzido pelo filósofo, de quem é amigo, Temer logo aborda os encontros com o então comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, e o chefe do Estadomaior da Força, general Sérgio Etchegoyen, entre 2015 e 2016, antes do impeachment da presidente Dilma Rousseff. Segundo Rosenfield, a história desses contatos revela o desgaste da relação do PT com os militares em razão da Comissão Nacional da Verdade, do receio de que Dilma tentasse mudar a Lei de Anistia e de outros temas que constavam do Programa Nacional de Direitos Humanos-3, de 2009. Os militares temiam ainda que o PT buscasse mudar a forma de acesso de oficiais ao generalato e a formação dos militares nas academias. Queriam, por isso, ouvir o então vice para saber, nas palavras de Rosenfield, com quais cenários deviam trabalhar. “Não foi uma vez. Foram vários encontros”, afirma Rosenfield. O relato feito por Temer busca retirar os encontros do campo da conspiração política para colocá-los dentro da institucionalidade do contato entre o vicepresidente e os chefes do Exército. Após o impeachment de Dilma, Villas Bôas seria mantido no cargo e Etchegoyen seria nomeado ministro do novo Gabinete de Segurança Institucional (GSI), recriado por Temer.
Divisão. O relato aborda sua trajetória da infância à Presidência. Temer responde à acusação feita pela oposição de que teria conspirado contra Dilma. Ele credita o impeachment da presidente à iniciativa do então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (MDB), em razão de o PT ter lhe negado o apoio. “O que aconteceu é que o PT agrediu muito o presidente da Câmara e, em face dessa agressão, ele não teve outra alternativa”, diz. O ex-presidente reafirma ter ficado distante de Brasília e não ter cobiçado o cargo de Dilma. Lamentou que, mesmo assim, tenha sido chamado de golpista. “Golpista... O tempo todo. É um movimento político que mostra como temos pouco apreço pela institucionalidade”, diz Temer, argumentando que sua posse significou apenas o respeito à Constituição. No governo, Temer afirma ter buscado a conciliação nacional, diante de um País polarizado. É quando lhe surge a ideia do semipresidencialismo. “Chamei os partidos logo que as coisas aconteceram e disse: ‘Vocês me indiquem nomes que eu vou examinálos para verificar se os aprovo ou não.’ Pretendo formar uma espécie de quase semipresidencialismo”. Temer diz ler os jornais cedo antes de se consultar com amigos para decidir. Em meio ao terremoto da Lava Jato, via-se como o personagem da série Designated Survivor, que conta a história de um secretário americano que se descobre presidente dos EUA depois que a cúpula do governo morre numa explosão. O ex-presidente se defende das acusações do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. “Delatores... me permita! Delator foi Joaquim Silvério dos Reis, foi Judas, não é? Esses foram delatores”, diz, referindo-se aos irmãos Joesley e Wesley Batista, da JBS. Ele se despediu da Presidência votando em Jair Bolsonaro. “Não tenho a menor dúvida de que, quando chegar o julgamento – sem ideologia e sem oportunismo –, Temer será classificado como um presidente inovador e reformista”, escreveu o economista Delfim Netto no prefácio do livro. É este o balanço que A Escolha procura afirmar.

*”Eleição pressiona política ambiental do Brasil e governo modera apoio a Trump”* - A vantagem de Joe Biden na reta final da eleição dos EUA põe em xeque a política ambiental do governo brasileiro. Sem esconder a predileção por Donald Trump, auxiliares diretos do presidente Jair Bolsonaro temem que um revés do republicano isole ainda mais o Brasil e amplie as pressões internacionais contra o desmatamento na Amazônia. O Itamaraty já se movimenta de forma discreta para se mostrar disponível à negociação em caso de mudança de comando na Casa Branca. É consenso entre diplomatas que Biden manterá a pressão pública pela preservação da floresta se vencer a disputa presidencial. A volta dos democratas ao poder poderia forçar a gestão Bolsonaro a rever uma política ambiental contestada no exterior. Este cenário evidenciaria o esvaziamento político do grupo “trumpista” do governo brasileiro, especialmente do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles – que propôs passar a “boiada” para flexibilizar a legislação ambiental –, e do titular das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. A lista inclui ainda o ministrochefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno – que já fez uma série de discursos sobre a Amazônia considerados do tempo da Guerra Fria. Na sua principal referência ao Brasil na campanha, Biden propôs – durante debate com Trump, em setembro – impor sanções econômicas ao Brasil e prometeu angariar US$ 20 bilhões entre países estrangeiros para oferecer ao Planalto, em troca de preservação. “As florestas tropicais do Brasil estão sendo destruídas. Aqui estão US$ 20 bilhões. Parem de destruir a floresta! Se não, vocês terão consequências econômicas significativas”, disse o democrata no debate transmitido pela TV americana. Bolsonaro reagiu imediatamente. Afirmou que a declaração era “desastrosa” e indicava o fim da convivência “cordial e profícua”. “Nossa soberania é inegociável. Lamentável, sr. Joe Biden, sob todos os aspectos, lamentável”, escreveu o presidente no Twitter. O chanceler Araújo já chamou Trump de “Salvador do Ocidente”. Agora, o esforço é para calibrar o tom. Nas últimas semanas, o ministro disse que a relação se “reorganizará” se o democrata vencer. A rotina no Itamaraty mudou. Araújo deixou de convidar blogueiros pró-trump para seminários virtuais promovidos pela pasta. Diplomatas de carreira passaram a ocupar o espaço dos extremistas.
Num dos encontros, o embaixador Pedro Miguel da Costa e Silva, secretário de Negociações Regionais e Bilaterais nas Américas, minimizou prejuízos diante de uma troca de governo. “A agenda que estamos construindo é de interesse para os dois países”, disse ele. Essa agenda, segundo o diplomata, tem como base interesses “muito concretos” na área comercial e é cobrada pelos setores produtivos dos dois países. Ricardo Salles, por sua vez, virou um peso para um governo em busca de moderação e até para o setor exportador do agronegócio. Vive agora atacando o vice-presidente Hamilton Mourão, os ministros Paulo Guedes (Economia) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Embora assessores observem que uma reforma ministerial depende mais da vontade de Bolsonaro do que de alterações de cenários internacionais, a eventual vitória de Biden tende a causar impacto na equipe brasileira. A preocupação do candidato democrata com o clima agrada a uma ala do seu partido, que abriga distintos grupos liberais de centro e de esquerda críticos do governo brasileiro. Biden já anunciou que vai voltar ao Acordo de Paris – tratado no âmbito das Nações Unidas que rege medidas de redução de emissão de gases efeito estufa. A vice na chapa de Biden, Kamala Harris, já havia previsto o tom da campanha democrata no ano passado, no auge das queimadas amazônicas. Ela sinalizou o bloqueio de acordos em negócios – como o almejado e ainda distante livre-comércio, barrado pela bancada democrata na Câmara. “Enquanto a Amazônia queima, o presidente do Brasil, que copia Trump, permitiu que madeireiros e garimpeiros destruíssem o território e não está agindo”, disse ela.
Condições. Na semana passada, o colombiano Juan Sebastián González, conselheiro de Biden para a América Latina, enumerou os aspectos fundamentais da diplomacia num futuro governo democrata: a política climática, o respeito aos princípios democráticos e aos direitos humanos. “Qualquer pessoa, no Brasil ou em qualquer outro lugar, que pensa que pode promover um relacionamento ambicioso com os EUA enquanto ignora questões importantes, como mudança climática, democracia e direitos humanos, claramente não tem ouvido Joe Biden durante sua campanha”, vaticinou González, ao comentar a relação com Bolsonaro. Um importante secretário do Itamaraty disse ao Estadão que as relações de Bolsonaro com um governo democrata dependem de um contexto mais amplo. A ameaça chinesa aos negócios americanos no continente é uma aposta do lado brasileiro na moderação por parte de Biden. A relação ocorrerá, segundo ele, também num cenário de disputas dos EUA com a Europa, o que poderia significar uma possibilidade para o Brasil se reequilibrar. A opinião é compartilhada pelo embaixador Everton Vargas, que serviu nas Nações Unidas e se dedica a tema ambientais. “Biden não vai denunciar acordos celebrados. Os Estados Unidos têm todo o interesse em penetrar o máximo possível na América Latina, para evitar o avanço dos chineses”, disse o diplomata, que atuou em negociações bilaterais com os americanos e coordenou a Cúpula das Américas.

*”Cobrança internacional impulsionou criação do Ibama na gestão Sarney”* - Uma possível mudança na rota da política ambiental não seria a primeira motivada por pressão internacional. Ex-secretário de Assuntos Estratégicos de Bolsonaro, o general da reserva do Exército Maynard Marques de Santa Rosa lembra que o governo de José Sarney (1985-1990) teve de responder a cobranças por queimadas e pelo assassinato do líder seringueiro Chico Mendes, em dezembro de 1988. Menos de dois meses depois da morte de Mendes no Acre, Sarney anunciou a criação do Ibama e medidas para conter o desmatamento. Em jogo estavam investimentos de organismos internacionais e as negociações da dívida. Santa Rosa disse que, embora a iniciativa fosse brasileira, o principal órgão ambiental do País foi criado por pressão internacional. “Se o Brasil não cedesse, não teria a dívida renegociada”, contou.
Na época, o governo do republicano Ronald Reagan era o credor de empréstimos do País. Editoriais do New York Times contestavam o governo brasileiro por causa dos incêndios e do crime. Naquele período, Santa Rosa cursava pósdoutorado em Política e Estratégia na Escola de Guerra do Exército dos Estados Unidos, na Pensilvânia. ‘Consumo interno’. Para o general, presidentes americanos conduzem suas políticas guiados mais pelo humor interno do que pela necessidade de relacionamento internacional. “O discurso de Biden é para consumo interno do eleitorado. Ele fala para obter voto. Depois que assumir, se a opinião pública dominante for contra o Brasil, como aconteceu em 1988 e 1989, aí vamos ter uma nova onda de pressão ambiental, principalmente nos assuntos amazônicos”, avaliou. “Se a opinião pública estiver de cabeça feita em prevenção, aí devemos nos preocupar e investir em propaganda dentro dos Estados Unidos.” Isolamento. Oficiais-generais das Forças Armadas observam, por sua vez, que uma derrota de Trump representará um revés político pessoal para Bolsonaro e sua família. Todo o relacionamento atual entre os países é creditado pela chancelaria a uma amizade e confiança. O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, chegou a ser recebido fora da agenda por Trump e chamado de “jovem excepcional” pelo americano. Na política externa, o presidente brasileiro já “perdeu” em dois países vizinhos e estratégicos na América do Sul, com as vitórias do kirchenerista Alberto Fernández, na Argentina, e do socialista Luis Arce, na Bolívia.

*”Para analistas, vitória de Biden isolaria o País”*

*”Planalto faz planos para o caso de Biden vencer”* - Na reta final das eleições nos EUA, o presidente Jair Bolsonaro tenta abrir canais de aproximação com o democrata Joe Biden, na frente nas pesquisas, e avalia como reagir à declaração do resultado oficial. A diplomacia brasileira se divide nas duas tarefas e apresentará ao presidente recomendações sobre como agir em todos os cenários. Um deles é visto no Palácio do Planalto como de “considerável probabilidade”: a contestação do resultado por parte do aliado, Donald Trump, em caso de derrota por margem apertada. Neste caso, Bolsonaro seria aconselhado a silenciar. Nos últimos meses, o presidente americano tem pavimentado o caminho para a judicialização da eleição, com acusações de que o voto pelo correio permite fraudes. No entanto, pelo menos dois colaboradores da equipe brasileira, diretamente envolvidos no monitoramento das eleições e com acesso às campanhas, sugerem comedimento. Ouvidos reservadamente, um deles disse que será necessário “esperar a poeira baixar”, em caso de judicialização. O outro afirma que a hipótese, já aventada por Trump, “exigirá cautela do nosso lado, para não se precipitar na comunicação”. Nenhum deles garante que Bolsonaro, cujo estilo é agir por impulso, seguirá a recomendação. Bolsonaro recebe informações e análises constantes sobre o andamento da campanha. Ao longo deste mês, os republicanos travaram diálogo diário com o Planalto. As avaliações foram levadas ao conhecimento do presidente e dos ministros. Amanhã é o prazo final para que Bolsonaro defina sua estratégia diplomática na noite da eleição e nos dias seguintes de apuração. Nos bastidores, o governo reconhece a dianteira de Biden nas pesquisas, embora seja proibido falar antecipadamente sobre possível derrota de Trump. O cenário “otimista” para o Planalto seria uma reviravolta nas projeções e a vitória de Trump, mas a margem deve ser mais apertada do que há quatro anos. Não se descarta também a possibilidade de que a diferença no colégio eleitoral seja mínima, ainda que a favor de Biden. Se a vitória de Biden for folgada, o governo brasileiro deve reconhecer a vitória. Dos dois lados, não há interesse em ruptura, por razões geopolíticas, o que fortaleceria a expansão chinesa nas Américas, objetivo declarado do presidente chinês Xi Jinping.
Neste caso, devem entrar em campo o embaixador do Brasil em Washington, Nestor Forster, e o chanceler, Ernesto Araújo, além do assessor internacional Filipe Martins. Os dois últimos trabalham para não cair em desprestígio no governo e perder a pecha de “olavistas”, dada aos bolsonaristas influenciados pelo escritor Olavo de Carvalho. Araújo, no entanto, é frequentemente lembrado por democratas em Washington pela autoria de um texto em que classificou Trump como o “salvador do Ocidente”. Houve tentativas de contatos com nomes próximos a Biden, por meio de intermediários, conselheiros e assessores. Até o momento, no entanto, uma reunião oficial com a equipe democrata foi vetada, pois a campanha não aceita relações formais com governos estrangeiros. A interferência da Rússia na campanha de 2016 fez Trump e seu time de segurança nacional serem investigados. Os democratas querem evitar acusações de interferência externa, segundo fontes dos dois lados. Os brasileiros querem mostrar aos democratas que estão abertos a dialogar e trabalhar em conjunto. É um discurso-padrão da chancelaria há alguns meses. Embora credite os avanços em acordos de defesa, tecnologia e comércio à amizade entre Trump e Bolsonaro, Araújo já afirmou que a relação se reorganizará, mas não será afetada. Um assessor da campanha democrata disse entender que é difícil controlar as falas de Bolsonaro, afirmou que há pessoas tentando regularizar a situação, mas “o presidente ainda é o presidente”. A saída para avançar em uma agenda bilateral, segundo envolvidos, deve exigir que os países retirem o foco da relação pessoal entre os líderes. Algo improvável de ser reeditado. Isso porque o imagem de Bolsonaro dentro do Partido Democrata é muito ruim e qualquer movimento de aproximação de Biden com o presidente brasileiro deve criar atritos com a ala mais progressista da legenda.
Nos últimos dois anos, Trump e Bolsonaro trocaram elogios em quatro encontros – três nos EUA e um no Japão. A boa vontade, não foi suficiente para que os EUA atendessem a boa parte das pautas do Brasil, mas abriu caminho para o diálogo. Com Biden, assessores apostam que a relação será oposta. Diplomatas continuarão o trabalho em silêncio e as fotos amistosas devem desaparecer. No Itamaraty, a aposta é por uma relação mais formal, um “esfriamento e desaceleração” da agenda entre os dois países. Diplomatas experientes avaliam que Biden tentará conduzir uma política externa com abordagem multilateral, envolvendo diversos países, enquanto Trump valoriza mais o nacionalismo. Biden quer ser o primeiro presidente a colocar a pauta climática no centro da política externa americana e já prometeu “reunir o mundo” para proteger a Floresta Amazônica. Ele afirma que vai retornar ao Acordo de Paris. Trump e Bolsonaro, por sua vez, são vistos nos fóruns internacionais como “negacionistas climáticos”. O Brasil sabe que isso pode colocar Planalto e Casa Branca em choque, mas tenta sinalizar aos americanos que o caminho para a proteção ambiental é o de cooperação e isolar o governo brasileiro seria ineficiente. Do outro lado, o time de Biden vê com bons olhos algumas ações do governo brasileiro, como o combate às queimadas coordenado pelos militares e o engajamento do vice-presidente Hamilton Mourão. A campanha de Biden espera um primeiro sinal formal de disposição ao diálogo vindo de Bolsonaro, mas o problema estará nas duas pontas: a figura do presidente brasileiro e a esquerda do Partido Democrata, que vai exigir que parte do trabalho seja feita nos bastidores. Se perder a eleição, Trump deixará o cargo sem cumprir uma promessa pessoal feita a Bolsonaro: uma visita ao Brasil – ao menos como presidente.

*”Pandemia atropela desejo de Trump de mudar a Saúde”*
*”Conspirações da web tomam campanha”*

*”Morte de idosos por covid-19 empobrece famílias”* - Foi com a renda da mãe, de 67 anos, que Daniela Soares Barreto conseguiu bancar seus dois filhos mais velhos nos últimos cinco anos. As crianças foram praticamente adotadas pela avó, com quem passaram a morar. No último dia 23 de agosto, porém, a história de dona Leovany foi interrompida. Diagnosticada com covid-19, a trabalhadora que se aposentaria dentro de um ano foi internada e, em pouco mais de 24 horas, faleceu, deixando para trás uma família chocada com o efeito devastador da doença. “Tudo foi muito rápido. Estávamos esperançosos de que ela sairia do hospital logo”, afirmou Daniela, que rapidamente teve de arrumar forças para lidar com a falta de recursos para criar os filhos. Daniela mora numa casa menor com o marido e a filha, de 4 anos, que tem paralisia cerebral. Com a morte da mãe, os dois filhos – de 18 e 14 anos – voltaram a morar com ela, que ganha R$ 1.179 por mês. Boa parte desse valor é gasto com fraldas e remédios para a filha menor. A renda do marido, quase igual à de Daniela, paga o aluguel e as contas da casa. A situação de Daniela é semelhante à de outras famílias brasileiras que contavam com ajuda dos idosos para fechar as contas no fim do mês. Com a covid-19, além do trauma de perder entes queridos, muitas pessoas também passaram a conviver com um grau maior de pobreza. Segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a morte de idosos na pandemia pode provocar uma queda média de 20% na renda dos domicílios. Até o dia 27 de outubro, a redução somava R$ 245 milhões. De acordo com o estudo, 74% das mortes por covid são de pessoas com 60 anos ou mais – ou seja, cerca de 113 mil pessoas. “Em alguns casos, essa perda pode chegar a 100%, já que o idoso era o único provedor da casa”, diz a pesquisadora Ana Amélia Camarano, autora do estudo Os dependentes da renda dos idosos e o coronavírus: órfãos ou novos pobres? Segundo o trabalho, 35% dos domicílios brasileiros têm pelo menos um idoso e, em 18,1%, eles eram os únicos provedores de renda da família, com um ganho médio de R$ 1.666,80. Nesse grupo estão 24 milhões de pessoas, sendo 19,5 milhões de idosos e quase 5 milhões de crianças e adultos. E esses números vêm subindo rapidamente nos últimos anos. Levantamento feito pela consultoria idados, a pedido do Estadão, mostra que, enquanto o número de domicílios chefiados por idosos com dependentes cresceu 34% desde 2012, o total de domicílios no País avançou 19% no mesmo período. “O Brasil está passando por um envelhecimento populacional importante. Por isso, veremos cada vez mais idosos como provedores de suas famílias”, diz o pesquisador do idados, Bruno Ottoni.
Emprego. Além da questão populacional, esse fenômeno também está associado ao aumento do desemprego, que alcançou 14,4% em setembro. Antes disso, entre o primeiro e o segundo trimestre de 2020, quando o índice subiu de 11,6% para 13,8%, o número de residências chefiadas por idosos com dependentes aumentou em 541 mil, segundo o idados. No mesmo período de 2019, houve uma redução do número de domicílios chefiados por idosos. “Sem emprego, familiares passam a depender dos mais velhos, muitos deles aposentados”, diz a professora e coordenadora de economia do Insper, Juliana Inhaz. Quem mora junto com os pais retarda a saída. E aqueles que já eram independentes, ao se deparar com o desemprego, voltam ao lar parental. Quando há o enriquecimento das famílias, ocorre o contrário. Os adultos se separam dos pais, diz o economista Daniel Duque, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (IBRE/FGV). “Hoje vivemos o inverso. Há um empobrecimento, e os filhos voltam a morar com os pais.” Mas, na avaliação de Juliana, hoje os idosos estão mais vulneráveis. Mesmo aqueles que sobrevivem à covid passam a gastar uma parcela maior da renda com remédios e outros cuidados médicos. Nessa situação, a família é obrigada a enxugar o orçamento, sobretudo se há algum desempregado em casa. Isso significa um número maior de gente na pobreza. Para Ana Amélia, os idosos são vítima duas vezes nessa pandemia: são mais discriminados no mercado de trabalho e são os mais atingidos pelo coronavírus. “Podemos dizer que, quando morre um idoso, uma família entra na pobreza.”

*”Aposentadoria garante renda regular”* - Os idosos, sobretudo os aposentados e pensionistas, são considerados uma elite no País do ponto de vista de ter uma renda fixa regular. Quase 63% da renda dos idosos vem de pensões e aposentadorias, o que garante a regularidade do ganho e estabilidade das famílias. Por conta do peso dessa renda é que a morte dos entes queridos por causa da covid-19 leva ao empobrecimento das famílias. Segundo estudo da FGV Social, os idosos são 17,44% dos 5% mais ricos do Brasil e 1,67% dos 5% mais pobres. “Os idosos têm uma função de bons provedores na sociedade brasileira”, diz o economista Marcelo Neri, diretor da FGV Social, destacando que a família de quem mora com pessoas com mais de 60 anos é pequena. Em média, tem 2,68 pessoas por domicílio. Outro dado que demonstra como a renda dos idosos ganhou peso na sociedade brasileira vem da Serasa Experian. Com mais estabilidade nos ganhos, os aposentados passaram a ter mais acesso ao crédito – muitas vezes para atender às necessidades dos filhos. O resultado disso foi o avanço da inadimplência entre os mais velhos. Segundo o economista da Serasa, Luiz Rabi, o idoso tem uma taxa de inadimplência menor, mas é a que mais cresce entre todas as faixas etárias. Em 2018, 32% dos idosos acima de 60 anos estavam inadimplentes. Hoje, esse número está em 37%. Enquanto isso, na faixa etária entre 41 e 60 anos, essa fatia subiu de 40% para 42%; e na de 26 a 40 anos, ficou em 45%.
Dependência. Thaynnara Valetim Batista e o irmão moravam com o pai, de 56 anos, até o fim de abril, quando ele morreu de coronavírus. Segurança, Francisco Alberto Batista trabalhou vários dias sem saber que havia contraído a doença. Achava que estava apenas cansado, mas os sintomas pioraram e ele teve de ser internado e entubado. Resistiu apenas poucas horas. Desempregados na época, Thaynnara, 25 anos, e o irmão, de 27 anos, dependiam financeiramente do pai. Com a morte, ficaram sem nenhuma renda. “Não conseguimos o auxílio do governo e acabamos sendo socorridos pela Cufa (Central Única das Favelas), que nos ofereceu cestas básicas por mais de dois meses”, diz ela. Além disso, eles ganharam R$ 120 por mês do movimento Mães da Favela para pagarem algumas despesas. Hoje, Thaynnara está trabalhando e ganha um salário mínimo por mês. “Estou tentando colocar as contas acumuladas ao longo dos meses em dia, mas ainda não consegui.” A preocupação é ter água e luz cortadas por falta de pagamento. “Devo ter umas oito faturas vencidas em casa”, diz ela.
Ajuda. A situação de Claudia Corrêa, de 45 anos, é parecida. Sua mãe, Eneide Corrêa, de 79 anos, era o alicerce financeiro da família. A idosa morava com Claudia e um neto, de 24 anos. A renda de cerca de R$ 3 mil, como pensionista, garantia o aluguel do apartamento, o pagamento da energia elétrica e parte da alimentação da casa. Com sua morte, em março, em função das complicações do novo coronavírus, Cláudia tem se desdobrado para dar conta das despesas mensais, sem a ajuda do salário da mãe. Ela chegou a receber o salário de abril, já que a mãe faleceu no fim do mês anterior. “O último salário foi para pagar parte das despesas com os medicamentos e o aluguel de casa. A renda era mais do que uma contribuição no orçamento, ela supria quase metade das despesas de casa”, disse. Para driblar a falta do salário da mãe, Claudia mudou-se de casa e hoje vive com a ajuda do filho e as encomendas de doces e salgados. “Estou sem trabalhar com carteira assinada. A pandemia também fez eu fechar a minha loja de roupas e agora faço bolos, tortas e comidas sob encomenda para ajudar nas contas de casa. Por outro lado, meu filho se formou em julho e parei de pagar a faculdade dele. É uma despesa a menos.”

*”Desconto em conta de luz chega a mais 2 milhões de famílias”* - O total de famílias de baixa renda com descontos na conta de luz aumentou em mais de 2 milhões neste ano. Em janeiro, antes da pandemia, 9,1 milhões de famílias se enquadravam nos critérios do programa Tarifa Social, que concede descontos de até 65% nas tarifas. Nove meses depois, a base de beneficiários era de 11,3 milhões, segundo números da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que aponta ainda alguma subnotificação. O alcance do programa pode chegar a 16,6 milhões, considerando dados do Cadastro Único do governo. A Aneel monitora de perto esses dados, pois o programa é bancado por valores a mais cobrados na conta de luz dos demais consumidores. Em 2020, o custo do Tarifa Social será de R$ 2,6 bilhões, valor que subirá para R$ 3,24 bilhões no ano que vem. Se todos os potenciais beneficiários acessarem o benefício, a conta subirá para R$ 4,76 bilhões.
Para ter acesso à Tarifa Social, é preciso estar inscrito no Cadastro Único, com dados atualizados, e comprovar renda per capita de até meio salário mínimo. O desconto, no entanto, não é automático. O interessado precisa fazer a solicitação para a prefeitura do município em que vive e, depois, para a distribuidora, que repassa os dados à Aneel. Diretor da Aneel, Sandoval de Araújo Feitosa aponta duas razões para o crescimento de famílias cadastradas neste ano. Uma delas é a recessão causada pelo novo coronavírus, que aumentou o número de desempregados e derrubou a renda de milhões de brasileiros. Outra é uma iniciativa da própria agência reguladora, que começou uma campanha para ampliar o número de beneficiários com as distribuidoras. De acordo com Feitosa, na média nacional, 68% das famílias aptas à Tarifa Social efetivamente recebem o benefício. Enquanto esse índice é de mais de 90% em Estados como Paraíba e Sergipe, a adesão é inferior a 45% no Amazonas, Roraima, Amapá, Santa Catarina e Distrito Federal. Para ele, a burocracia e a falta de informações exclui muitos consumidores. O trabalho da Aneel começou nos Estados do Maranhão e Piauí, onde o índice de desenvolvimento humano (IDH) está entre os mais baixos do País. Em pouco mais de um ano, o Maranhão elevou o número de famílias cadastradas de 450 mil para quase 1 milhão. Já o Piauí atingiu o maior nível de aderência ao programa: 97% das famílias elegíveis recebem o benefício.
Impacto. Um relatório de avaliação do programa realizado pela Controladoria-geral da União (CGU) e concluído neste ano apontou que o programa tem pouco espaço para desvios, além de sair barato em relação ao benefício que representa para as famílias. Cada R$ 1 bilhão em subsídios tem impacto médio de 0,6% nas tarifas dos demais consumidores. Para as distribuidoras de energia, aumentar o número de famílias de baixa renda cadastradas no programa ajuda a reduzir a inadimplência. É também uma maneira de cumprir práticas ambientais, sociais e de governança, uma cobrança cada vez maior por parte dos acionistas. O diretor de relações institucionais da Equatorial Energia Maranhão, José Jorge Leite Soares, disse que, para ampliar o total de beneficiários do Tarifa Social, a empresa capacitou seus funcionários para identificar o público-alvo do programa nos municípios em que atua e incluiu a informação sobre o desconto em peças publicitárias. Segundo o executivo, concessionárias de outros Estados e grupos econômicos também procuraram a empresa para obter informações sobre como aumentar a base de cadastrados.

*”Pecuária busca novo pacto agroambiental”* - Um novo pacto agro ambiental para a cadeia de carne bovina – é o que propõe o presidente do Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável (GTPS), Caio Penido. Os principais pontos desse acordo, que envolveria produtores, indústria, varejo e organizações não governamentais (ONGS), entre outros, compreendem a efetiva implementação do Código Florestal e pagamento por serviços ambientais (PSA) ao pecuarista que aderir ao desmatamento zero, política adotada hoje por frigoríficos e varejo. A proposta, que começa a ganhar adesões como a da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil(CNA) e da Sociedade Rural Brasileira(SRB), foi discutida na semana passada pelo GTPS, fórum sobre pecuária sustentável que reúne pecuaristas, instituições financeiras, indústrias frigoríficas, sociedade civil, ONGS, setor de insumos e serviços, varejo, restaurantes e ensino e pesquisa. Também se faz necessária, diz Penido, a regularização fundiária, ainda um entrave para solucionar problemas ambientais.
Ele conta que, na reunião, apresentou a proposta de deixar de lado o que chama de “slogan do desmatamento zero” puro e simples e substituir por uma política que reconheça que a pecuária, cumprindo a lei ambiental do País, amplamente discutida e aprovada pela sociedade, pode ser sustentável. E, também, ao garantir a biodiversidade, deve ser recompensada. “Em vez de ser calcinado no exterior como desmatador, o País deve figurar como exemplo de produção de alimentos aliada à proteção da natureza e à baixa emissão de gases do efeito estufa”, afirma. Além de grandes frigoríficos, participaram do encontro a CNA, a SRB e as ONGS Ipam, WWF e NWF, todos membros do GPTS, além da Imaflora. Penido lembra também do estudo da Nasa, agência espacial dos EUA, que mostra que o País tem 65% do território coberto com vegetação nativa. “Nós já preservamos e, na minha opinião, o fato de o mundo não conseguir ver o Brasil como campeão da biodiversidade é consequência direta dessa estratégia adotada lá atrás, de desmatamento zero e de criminalização do setor agropecuário.” Durante a reunião, o dirigente disse que foi sugerido às ONGS, que são internacionais, mostrar lá fora também o lado positivo do setor, e não só o negativo. “Se elas apresentassem o índice de preservação florestal do Brasil no exterior, 80% dos nossos problemas estariam resolvidos”, avalia Penido, que também é pecuarista e um dos fundadores da Liga do Araguaia, em Mato Grosso, que desenvolve projetos ambientais.
Desmatamento zero. O pecuarista questiona quem teria interesse na pauta do desmatamento zero. “Essa estratégia se sobrepõe até mesmo ao Código Florestal”, observa, já que a lei brasileira permite a retirada de mata nativa em determinadas proporções, conforme o bioma. “O interesse pelo desmatamento zero aqui é dos verdadeiros culpados pelas grandes emissões de gases do efeito estufa no planeta, como os Estados Unidos e a União Europeia”, diz. “Temos interesse em desmatamento ilegal zero, e, se quiserem desmatamento zero de fato, este deve vir atrelado a uma estratégia de pagamento por serviços ambientais.” Em parceria com ONGS, além do setor produtivo, indústria e varejo, Penido pretende “cortar de vez” a estratégia de explodir a imagem do agro brasileiro lá fora como uma forma de colocar a cadeia produtiva sob pressão pela preservação e também pela regularização fundiária. A solução, de acordo com ele, será o amplo diálogo, “colocando de lado o ódio e a polarização”, enumera.

Nenhum comentário:

Postar um comentário