quinta-feira, 16 de abril de 2020

Mandetta: ‘Fico até encontrarem uma pessoa‘


O ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta pegou de surpresa a todos, ontem à tarde, quando apareceu às 17h, no Palácio do Planalto, para comandar a coletiva diária sobre o novo coronavírus acompanhado de seus dois principais assessores — os secretários João Gabbardo e Wanderson Oliveira. A notícia de que Oliveira se demitira havia circulado horas antes e o dia inteiro foi marcado por especulações sobre quem substituirá Mandetta. “Hoje teve muito ruído por conta do Wanderson”, afirmou o ministro. “Já falei que não aceito, Wanderson continua. Vamos trabalhar juntos até o momento de sairmos juntos do ministério.” O tom geral da coletiva foi um de quem se despede. “O importante é que, seja lá quem o presidente colocar no Ministério da Saúde, que ele confie e que ele dê as condições para que a pessoa possa trabalhar baseada na ciência, nos números, na transparência dos casos.” Mandetta falou abertamente sobre o conflito com o presidente Jair Bolsonaro. “Existem pessoas que acreditam, criam essas teorias de negócio vertical, oblíquo, horizontal. Não sei de onde vêm essas angulações, mas acreditam fielmente”, comentou. “Nós temos um conjunto de informações que nos levam a ter essa conduta de cautela. Parece que eu sou contra o presidente, o presidente é contra mim. Não. São visões diferentes do mesmo problema. Se tivesse uma visão única, seria muito fácil solucionar." Assista. (G1)

Nas horas seguintes, Mandetta concedeu uma entrevista à Veja. “Fico até encontrarem uma pessoa para assumir meu lugar. São 60 dias nessa batalha. Isso cansa. Sessenta dias tendo de medir palavras. Você conversa hoje, a pessoa entende, diz que concorda, depois muda de ideia e fala tudo diferente. Você vai, conversa, parece que está tudo acertado e, em seguida, o camarada muda o discurso de novo. Já chega, né? Já ajudamos bastante. O vírus se impõe. A população se impõe. O vírus não negocia com ninguém. Não negociou com o Trump, não vai negociar com nenhum governo.” (Veja)

Igor Gielow: “A mudança no Ministério da Saúde é considerada por aliados mais moderados de Bolsonaro um ponto de inflexão para o governo. Para um deles, a crise do coronavírus ameaça existencialmente o presidente, mas pode ser uma oportunidade. Primeiro, escolher um substituto para Mandetta que evite as críticas que uma escolha ideológica traria. Daí a especulação sobre nomes de médicos estrelados de São Paulo. Os círculos mais moderados em torno do presidente sabem que tolerância à defesa da hidroxicloroquina feita por Bolsonaro é pré-requisito. Mas, argumentam, bastaria ao escolhido adotar o discurso de que a droga está em testes e tocar o trabalho para o chefe não reclamar. Sobre isolamento social, rompido por Bolsonaro sempre que possível, a solução seria vender a ideia de que o governo quer uma ‘saída controlada’ das quarentenas. Como se vê, está longe de ser um trabalho simples. O isolamento político de Bolsonaro instilou a certeza entre aliados de que é preciso alguma ordem unida ante os arroubos da família do presidente. Os fardados ora de terno vivem à turras com os filhos presidenciais, em especial o vereador carioca Carlos, que comanda a guerrilha digital do pai. Na avaliação deles, amparada em pesquisas qualitativas feitas por governistas, as bravatas do presidente não seriam um problema quando feitas nas ruas ou redes sociais. O nó, com a crise do coronavírus, é que elas foram incorporadas à figura presidencial em pronunciamentos de TV, o que levou ao enquadramento parcial de Bolsonaro nas duas últimas semanas.” (Folha)

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