CAPA – Manchete principal: *”Congresso deve barrar agendas do bolsonarismo”* EDITORIAL DA FOLHA - *”Acima do cálculo”*: Diz uma máxima da política que a oposição não vence eleições, o governo é que as perde. No contexto brasileiro, pode-se aplicar a mesma lógica a processos de impeachment: o presidente é que cria o ambiente para sua deposição, ao cometer crimes de responsabilidade e, sobretudo, ao perder a sustentação popular e congressual. A oposição a Jair Bolsonaro, conforme relato desta Folha, avalia que não dispõe hoje da segunda condição. Embora a reprovação ao chefe de Estado tenha subido de já elevados 32%, em dezembro, para 40% em janeiro, segundo o Datafolha, a parcela dos que defendem seu afastamento é de expressivos mas ainda minoritários 42%. O apoio ao mandatário no eleitorado —31% consideram sua gestão ótima ou boa e 53% se opõem ao impeachment— mostra-se grande o bastante para desencorajar a maioria do Congresso a levar adiante um processo tão traumático. Teme-se também que uma tentativa derrotada em plenário, como foram as duas contra Donald Trump nos Estados Unidos, resulte em fortalecimento de Bolsonaro e suas fantasias persecutórias. Mais ainda, o Planalto desde o ano passado emprega cargos e verbas governamentais para cooptar parlamentares de conduta fisiológica, em estratégia que teve seu maior sucesso na eleição de seus candidatos às presidências da Câmara dos Deputados e do Senado. Sua base de sustentação busca agora a prorrogação do auxílio emergencial —providência, em si, inatacável— com o objetivo de conter o desgaste do presidente e elevar suas chances em 2022, favorecidas pela fragmentação de lideranças oposicionistas. Resta um porém a impedir que se deixe de lado o debate do impeachment —trata-se da conduta insistentemente indecorosa de Bolsonaro, que emporcalha o cargo máximo da República como nenhum antecessor se atreveu a fazer. Está-se diante de um presidente que sabotou de todas as maneiras as políticas de saúde durante a pandemia; que declarou o intento de intervir em órgãos de segurança para proteger familiares; que apenas em recuo tático parou de insuflar atos contra os outros Poderes. Seus impulsos autoritários permanecem, como o demonstra mais um ataque a veículos de imprensa, entre eles este jornal, que defendeu “tirar de circulação”. É risível a ressalva de que não o faria por ser um democrata; não o fará, isso sim, porque está submetido às regras da democracia. Estas, acima de qualquer cálculo político, recomendam que o Congresso exerça o papel que lhe cabe ante os desmandos do presidente. É necessário desengavetar e examinar às claras, conforme os trâmites legais, as dezenas de pedidos de impeachment que aguardam decisão do presidente da Câmara. RUY CASTRO - *”O Brasil nas ruas”*: No fundo de uma gaveta surge de repente um objeto cheio de história: um button verde-amarelo de um comício da campanha pelas Diretas Já, em 1984. Era o comício da Candelária, aqui no Rio, no dia 10 de abril. Não me lembrava desse button e vejo agora que ele viajou comigo por apartamentos, casas e cidades nesses inacreditáveis 36 anos —em breve, 37. Pouco antes, em janeiro daquele ano, acontecera o primeiro comício pelas Diretas, o da praça da Sé, em São Paulo, que reunira 300 mil pessoas. Mas o do Rio teria 1 milhão, com a multidão entupindo a avenida Presidente Vargas, do palanque na Candelária à praça da República, e atapetando a Rio Branco, da praça Mauá à Cinelândia —uma massa humana em forma de cruz, mostrando de vez que o país estava farto dos militares. No palanque, os artistas, os famosos e os líderes Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Franco Montoro, Fernando Henrique, Miguel Arraes, Leonel Brizola, Lula. Nem todos ali se davam: Montoro não gostava de Brizola, Brizola não gostava de Lula e Lula não gostava de ninguém. Mas todos tinham um inimigo comum: o regime, que já caia de podre e respirava por aparelhos, que eram as eleições indiretas para presidente votadas por um Congresso viciado. Daí os comícios, para pressionar os políticos a aprovar uma emenda que propunha restabelecer as diretas. Duas semanas depois, em 25 de abril, o Congresso traiu como sempre a nação, derrotando a emenda. As diretas viriam, mas só dali a cinco anos, e Deus sabe quantos erros, desde então, cometeram-se em seu nome. As jornadas de 1984, no entanto, eram a prova de que existíamos ---e, não fosse pela pandemia, que nos obriga a lutar pela vida dentro de casa, o país estaria hoje de novo nas ruas, para exigir o despejo de Jair Bolsonaro. Em 1984, a ditadura tinha 20 anos. Com dois anos de Bolsonaro, o Brasil já chegou a nível equivalente de putrefação. PAINEL - *”Desarticulada, oposição disputa funções na Câmara e reforça dúvidas sobre união para 2022”*: Depois de registrar defecções e fracassar na tentativa de unir o campo para evitar a eleição de Arthur Lira (PP-AL) na Câmara, a esquerda segue desarticulada no Congresso. Uma decisão que caminhava para ser consensual descambou em nova disputa entre PT, PSOL, PC do B e PSB, desta vez pela liderança da oposição na Casa. A divergência acendeu o alerta de integrantes desses partidos, que temem sofrer os efeitos da desordem em 2022, facilitando a reeleição de Jair Bolsonaro. O PT, maior bancada da esquerda, vai comandar a minoria, mas ainda não há consenso sobre o nome a ser indicado. Já o PSB indicou Alessandro Molon (RJ) para ser líder da oposição sem o aval de todos os partidos do bloco. A decisão criou uma celeuma. Uma ala da esquerda defendia o nome de Marcelo Freixo (RJ), do PSOL, para a função. Outra resistia a promover o PSOL após a sigla rejeitar unir forças contra Lira. Uma opção para resolver o imbróglio seria deslocar Freixo para comandar a minoria no Congresso —um papel menos relevante. Nova reunião ocorrerá após o Carnaval. O desentendimento é encarado por líderes da oposição como uma antecipação da briga por protagonismo em 2022. Cresce o pessimismo sobre a possível união da esquerda para compor uma frente ampla já no primeiro turno da disputa. PAINEL - *”Governo promete ampliar Bolsa Família, mas programa deve atender menos pessoas que em 2020”*: Apesar de o Ministério da Cidadania ter liberado a entrada de 200 mil novos beneficiários, o Bolsa Família deve atender a menos pessoas do que no fim de 2020. A promessa do governo era de ampliar a cobertura social em 2021, mas os repasses do programa estão menores. A previsão é que, em fevereiro, 14,26 milhões de famílias recebam o benefício. No fim de 2020, eram 14,27 milhões. Quando o Executivo elaborou o Orçamento de 2021, previu 15,2 milhões de famílias atendidas. PAINEL - *”Aliados do governo tentam acelerar a tramitação de PECs que podem abrir espaço para auxílio”*: Aliados do governo no Congresso ainda negociam os termos das PECs Emergencial e do Pacto Federativo para tentar diminuir resistências ao texto e acelerar a tramitação dos projetos que podem abrir espaço no Orçamento para o auxílio emergencial. De acordo com articuladores do Planalto, as propostas precisam ser aprovadas por unanimidade para superar os prazos regimentais. PAINEL - *”Justiça concede liminar para suspender Carnaval digital de SP’* PAINEL - *”Comissão de combate à Covid-19 vai convidar Pazuello para prestar contas sobre pandemia”* PAINEL - *”Com julgamento marcado, cresce articulação para que STF declare inconstitucional autorização para transporte de passageiros”*: Senadores e empresários esperam que o STF atenda pedido da Anatrip (associação de empresas de transporte rodoviário) e declare inconstitucional o atual modelo de autorização para transporte interestadual de passageiros. O caso está na pauta desta quinta (18). Desde 2014, basta autorização, sem licitação, para que companhias realizem o serviço. Há dois anos, o governo Bolsonaro editou normas que facilitaram ainda mais a permissão, para abrir o mercado. Segundo uma ala de parlamentares e firmas, porém, as medidas concentraram as concessões a grupo restrito de empresas. Outra ala de congressistas avalia que não há necessidade de julgamento da medida e que uma lei aprovada no Senado no final do ano passado dá uma solução ao imbróglio. O problema do modelo anterior a 2014 é que ele favorecia um conjunto menor de companhias. Já o atual tem menos pré-requisitos e pode gerar insegurança aos usuários por não haver fiscalização ostensiva. A legislação aprovada no Senado foi feita em acordo com o Executivo e estabelece parâmetros mínimos para a permissão, sendo assim, um meio-termo entre as alternativas, advogam senadores. "O equilíbrio precisa ser estabelecido olhando tanto o lado do consumidor como o do empresário. Um [o antigo] olhava mais para o empresário do que para o consumidor. Já o atual abriu de forma tal que não dá segurança nem aos bons investimentos nem ao usuário", avalia o senador Eduardo Braga (MDB-AM). "A solução construída pelo Senado é ponderada. Estabelece critérios republicanos. Vai ajudar a população, baratear o custo do transporte e não vai deixa entregue na mão de aventureiros", conclui Braga, *”Prioridade do governo, projetos bolsonaristas devem ficar na gaveta do Congresso neste semestre”* - Enquanto a nova cúpula do Congresso Nacional abraça as prioridades do governo relativas à agenda econômica, as pautas conservadoras mais alinhadas ao presidente Jair Bolsonaro continuarão enfrentando resistência para avançar nas duas Casas. Líderes partidários dão como certo que propostas relativas a armas, a proteção de militares que matarem em operações de GLO (garantia da lei e da ordem) e a outras de forte apelo à base bolsonarista devem permanecer na gaveta no primeiro semestre do ano —ou mesmo ao longo de todo 2021. (...) ELIO GASPARI - *”Bolsonaro desafiou o 'mercado'”*: Ganha uma fritada de morcego quem souber o que é o "mercado". Bolsonaro corre atrás do novo auxílio emergencial que ampara sua popularidade e pipocam ansiedades desse ectoplasma. Outro dia ele ironizou: "Qualquer negocinho, qualquer boato na imprensa, tá aí esse mercado nosso, irritadinho, né? (...) Pessoal, vocês sabem o que é passar fome?". No dia seguinte foi a vez do vice-presidente, Hamilton Mourão: "Minha gente, a gente não pode ser escravo do mercado. (...) Nós temos aí uns 40 milhões de brasileiros que estão em uma situação difícil". Toda vez que o capitão usa diminutivos ("gripezinha" no "finzinho") algo de ruim pode acontecer e ao mencionar a neurastenia do ectoplasma, ele pode estar indicando uma nova forma de demagogia. Para quem tem um pé no irracionalismo da cloroquina e na eleição americana fraudada, é um prato cheio a ideia de um descontrole fiscal em nome dos problemas sociais. Lula cavalgou racionalmente sua plataforma social e teve em Bolsonaro um crítico. Isso para não se falar no general Mourão, reclamando da existência do 13º salário. Opondo-se ao nervosismo da turma do papelório, Bolsonaro escolhe um adversário fácil para fazer não se sabe o quê. Paul Volcker, o grande presidente do banco central americano, em suas memórias grafou "mercado" entre aspas. Conhecendo a espécie, ele sabia que nem nos Estados Unidos o ectoplasma deveria ser levado a sério. No Brasil, a figura é risível. Em geral vocaliza as opiniões de consultores ou figuras do segundo escalão da banca ou da indústria. Na hora do vamos ver, as guildas do andar de cima gostam mesmo é de ir ao Planalto para bajular o poder. (Quando não se metem em lances de privataria das vacinas.) Em tese, o "mercado" quer o equilíbrio das contas públicas. Na prática, seus personagens carimbados querem crédito oficial subsidiado e desconto nos impostos. Em tese, Bolsonaro e Paulo Guedes tinham um projeto liberal. Era uma mistura de mamão com jararaca, mas vá lá que lhe dessem esse nome. Com a pandemia e as dificuldades econômicas, o governo está sem rumo. A "gripezinha" mostrou-se um "meteoro" (figura usada por Guedes) e a única coisa que deu certo em dois anos foi a pronta distribuição do auxílio emergencial. As falas de Bolsonaro e Mourão indicam uma nova forma de demagogia. O vice-presidente disse que o governo não pode ser escravo do mercado. A frase não quer dizer nada, mas o pelotão palaciano, o general da Saúde e o almirante da Anvisa resolveram peitar os fabricantes de vacinas. Bolsonaro reescreveu a lei da oferta e da procura quando achou que seu governo tinha braço forte para negociar com os fabricantes. Deu no que deu, faltam imunizantes e sobra cloroquina. Quando Bolsonaro pergunta se "vocês sabem o que é passar fome?", esquece que seu governo tentou tungar o Benefício de Prestação Continuada, um alívio financeiro para os miseráveis que passavam fome antes mesmo da pandemia. Muitas coisas do governo de Bolsonaro nunca antes tinham sido vistas. Por exemplo: encrencar com os três maiores parceiros comerciais do Brasil (Estados Unidos, China e Argentina) sem motivo. Criar um Robin Hood sem propósito seria um novo capítulo de um mau espetáculo. *”Sob pressão, Aras lista ao Supremo nove investigações sobre Bolsonaro”* - Além de responsabilidade no agravamento da crise sanitária no Amazonas e no Pará, o procurador-geral da República, Augusto Aras, avalia se o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) cometeu crime ao incentivar apoiadores a invadir hospitais públicos para constatar o nível de ocupação dos leitos. Os dois episódios estão entre as nove apurações abertas na PGR (Procuradoria-Geral República) que envolvem o chefe do Executivo. O conjunto de procedimentos inclui ainda acusações contra o presidente por desrespeitar medidas preventivas de enfrentamento ao coronavírus, como o uso de máscara facial e evitar as aglomerações. Nas últimas semanas, Aras tem sido pressionado por parlamentares, ministros do Judiciário e colegas do MPF (Ministério Público Federal) a agir. O mandato do procurador-geral se encerra no mês de setembro. Escolhido por Bolsonaro em 2019 para o cargo fora da lista tríplice dos mais votados em processo interno do MPF, Aras poderá ser reconduzido ao posto por mais dois anos. Também é, porém, um dos cotados para ocupar a vaga que Marco Aurélio Mello deixará aberta no Supremo no segundo semestre deste ano. Uma das principais críticas à sua atuação é a de alinhamento aos interesses do presidente da República. Em um comunicado à imprensa, por exemplo, a PGR afirmou que compete ao Congresso Nacional a responsabilização de integrantes da cúpula dos Poderes por eventuais ilícitos no combate à Covid-19, o que intensificou a pressão sobre o procurador-geral. Em resposta às críticas, Aras enviou um parecer ao STF (Supremo Tribunal Federal) dizendo que passou a apurar a conduta de Bolsonaro na crise do Amazonas e do Pará e que, além desse procedimento, foram abertos mais oito até o momento. Ainda na fase inicial da pandemia, em junho do ano passado, Aras abriu uma apuração após Bolsonaro ser acusado de incitar apoiadores a entrar sem autorização em hospitais públicos para registrar imagens sobre a ocupação de leitos. “As informações que nós temos é que na totalidade ou em grande parte, ninguém perdeu a vida por falta de respirador e falta de UTI”, afirmou o presidente em uma live. “Agora, se tem um hospital de campanha perto de você, dá um jeito de entrar e filmar. Muita gente está fazendo isso, mais gente tem que fazer.” Nos dias seguintes à fala do chefe do Executivo, em diferentes regiões do país, foram registradas invasões em unidades hospitalares. Em julho, mais três casos motivaram a abertura de apurações na PGR, todas para averiguar se o ocupante do Palácio do Planalto contrariou normas da administração de Brasília de prevenção ao novo coronavírus, como o uso de máscara. Um dos procedimentos foi instaurado depois que o presidente compareceu sem a proteção facial a uma manifestação de militantes bolsonaristas na Praça dos Três Poderes, ato também apontado como um incentivo às aglomerações. Foi aberta apuração após Bolsonaro conversar com jornalistas no Palácio da Alvorada para falar que havia contraído a Covid-19. Ao final da entrevista, apesar da pouca distância que mantinha para os repórteres, ele tirou a máscara facial. Em outro caso, também ciente de que contraíra a doença, ele foi visto conversando, sem a proteção, com funcionários da limpeza no Alvorada. Na sexta-feira (12), a PGR informou que parte das apurações tramita de forma reservada e que não havia informações disponíveis a respeito delas. A Procuradoria disse que dois casos relacionados ao desrespeito às medidas preventivas contra o coronavírus foram arquivados em agosto e setembro. As apurações que envolvem Bolsonaro são realizadas por meio de um instrumento chamado de notícia de fato. Consiste em um procedimento preliminar para o levantamento de informações, incluindo pedidos de informação a órgãos públicos. Se a partir desses dados, o chefe do MPF entender que houve, por exemplo, um ato ilegal ou omissão por parte do presidente, um inquérito poderá ser requerido ao Supremo. Sobre as medidas de prevenção à Covid-19, ainda que reconhecida a transgressão, a cúpula da PGR entende que a falta deve ser penalizada com sanção administrativa por parte da administração local, sem nenhuma repercussão penal. O que não ocorre, por outro lado, nos casos das invasões a hospitais ou na crise sanitária no Norte do país. A decisão de Aras de apurar a conduta de Bolsonaro na situação do Amazonas e do Pará foi uma resposta a uma notícia-crime protocolada pelo PC do B no Supremo. A sigla afirmou que há “fortes indícios” da prática de prevaricação do chefe do Executivo e de seu auxiliar, o ministro Eduardo Pazuello, no colapso em Manaus e ressaltam que o mesmo cenário tem sido visto em municípios paraenses. “Caso, eventualmente, surjam indícios razoáveis de possíveis práticas delitivas por parte dos noticiados, será requerida a instauração de inquérito nesse Supremo Tribunal Federal”, disse Aras em manifestação enviada à corte no início de fevereiro. Ainda na manifestação feita ao Supremo, o procurador-geral disse que tem sido “zeloso na apuração de supostos ilícitos atribuídos ao chefe do Executivo”. A Folha enviou perguntas ao Palácio do Planalto, questionando se houve eventuais esclarecimentos à PGR e o que Bolsonaro tem a dizer em sua defesa. O email foi devolvido com a informação de que a reportagem deveria enviar as questões para a AGU (Advocacia-Geral da União), que, por sua vez, informou que não poderia comentar o caso por se tratar de procedimentos ainda em curso. CONRADO HÜBNER MENDES - *”Contra a soberania, armar e desmatar”* *”Com mais de um nome, PSDB define presidenciável neste ano, diz Bruno Araújo, presidente do partido”* *”Governo Bolsonaro admite ao STF paralisia da reforma agrária, com acúmulo de diferentes recordes negativos”* - A cúpula do Incra (órgão federal de reforma agrária) informou ao STF (Supremo Tribunal Federal) que o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) zerou a edição de decretos de desapropriação para reforma agrária e fez a menor aquisição de terras com essa finalidade desde 1995, o ano mais antigo usado na comparação. Além disso, nunca houve orçamento tão baixo para aquisição de terras, levando em conta um dos gráficos apresentados, com dados referentes ao período de 2011 a 2020. Sob Bolsonaro houve, ainda, menos famílias assentadas do que em dois anos de Michel Temer. E bem menos assentamentos do que nos governos Fernando Henrique, Lula e Dilma. A comparação entre governos foi feita num documento assinado pelo presidente do órgão, Geraldo Melo Filho, e pelos quatro diretores da instituição. Os gestores admitiram ao STF, com gráficos elucidativos que fazem comparações entre governos, a paralisia de desapropriações e novos assentamentos. Disseram que isso já era uma tendência nos últimos anos. O presidente e os diretores, porém, negaram que isso signifique a paralisação completa da reforma agrária. Segundo eles, o foco da atual gestão é a regularização fundiária, a titulação de terras já distribuídas e a melhoria da infraestrutura de assentamentos. Segundo o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), há hoje 80 mil famílias acampadas, sob lona preta, à espera de terra. Entre 25 mil e 30 mil delas estão no Nordeste. “Após a vacinação, a luta pela terra vai ser retomada com força, diante dessa ideia do Incra de fazer concentração de terra”, afirma Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST. A reforma agrária é uma previsão constitucional. O artigo 184 da Constituição Federal diz que “compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante indenização”. Já o artigo 188 prevê a destinação de terras públicas para o plano nacional de reforma. A inação do governo é listada por críticos e especialistas como crime de responsabilidade, passível de impeachment. Há mais de 60 pedidos de impedimento protocolados, mas, até agora, não houve autorização dos presidentes da Câmara do período —Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Arthur Lira (PP-AL)— para que qualquer um deles tramite. O documento do Incra foi concluído no último dia 9. A peça foi protocolada no curso de uma ação proposta no STF por entidades sindicais do campo, que questionam a paralisia deliberada da reforma agrária pelo governo Bolsonaro. Um documento do próprio Incra, de outubro, já registrava a paralisia de 413 processos de reforma agrária, com interrupção de vistorias e análises sobre desapropriação de imóveis rurais, como a Folha mostrou em 9 de dezembro. Contag e Contraf (Confederações Nacionais dos Trabalhadores na Agricultura e na Agricultura Familiar) usaram esse dado na ação movida no STF. Agora, o Incra abriu ao relator da ação no STF, ministro Marco Aurélio Mello, novas informações sobre o desempenho da reforma agrária no governo Bolsonaro. Um gráfico sobre decretos de desapropriação nos últimos 25 anos mostra a curva no zero em 2019 e em 2020. A cúpula do Incra não informa no gráfico o número de decretos. A Folha consultou todos os decretos editados por Bolsonaro em 2019, 2020 e 2021 e não encontrou nenhum destinado à desapropriação de imóveis com finalidade de reforma agrária. “A diminuição da incorporação de novos imóveis para a reforma agrária pela via onerosa já vinha de longa data, passando por vários governos”, afirma a diretoria do Incra no documento. Sob Bolsonaro, o Incra incorporou apenas 1,5 mil hectares de terras em 2019 e 1,4 mil em 2020 para o programa nacional de reforma agrária, totalizando 2,9 mil. Em dois anos e meio de Temer, foram 664 mil hectares. Em cinco anos de Dilma, 3,1 milhões. Em oito de Lula, 47,6 milhões. E em oito de Fernando Henrique, 20,8 milhões. A comparação é da própria diretoria do Incra. O governo Bolsonaro também vem assentando menos famílias sem-terra. Em dois anos, foram 9,2 mil famílias. Nos governos anteriores, conforme a comparação feita no documento do Incra, foram esses os números informados: 540,7 mil (Fernando Henrique), 614 mil (Lula), 133,6 mil (Dilma) e 11,8 mil (Temer). “A partir dos governos Dilma e Temer, passou-se a adotar uma política mais preocupada com qualidade dos assentamentos da reforma agrária e condições de vida das famílias beneficiárias”, argumentaram os gestores do Incra. O governo Bolsonaro destinou apenas R$ 12,2 milhões para a aquisição de terras em 2020. Em 2011, eram R$ 930 milhões, ou R$ 1,6 bilhão, quando corrigidos pela inflação. “O termo ‘reforma agrária’ não pode ser resumido à aquisição e destinação de terras por meio da criação de projetos de assentamento, sendo possível estarem inseridas formas complementares de destinação das terras agricultáveis do país, a exemplo da regularização fundiária”, afirma o Incra, no documento ao STF. “A regularização fundiária pode ser enquadrada como uma das formas de se alcançar a reforma agrária, dentro de um contexto de complementação de políticas públicas”, completa. Segundo o Incra, a reforma agrária dispõe no Brasil de 87,5 milhões de hectares de terras, distribuídos em 9,4 mil projetos de assentamento, onde vivem 967 mil famílias. As áreas equivalem aos tamanhos de Espanha e Alemanha somados, ou 10,3% do território brasileiro, conforme comparação feita pelo Incra. O órgão afirma existirem 203 imóveis rurais com ações de desapropriação ajuizadas na Justiça, e com valores de indenizações já depositados em juízo. “Circunstâncias não controladas pela autarquia, na maior parte das vezes decorrentes de discussões judiciais no âmbito das ações de desapropriação, levam a que não seja deferida a imissão provisória na posse”, diz. O valor “imobilizado”, já depositado, é de quase R$ 1 bilhão, segundo o órgão. “Ações tramitam na Justiça há vários anos, algumas delas há mais de duas décadas.” O Incra diz fazer uma inspeção por “lotes vagos” em assentamentos, além de ações de regularização fundiária na Amazônia. Outra frente é a entrega de títulos aos ocupantes dos imóveis. No governo Bolsonaro, segundo o Incra, foram 119,9 mil titulações. Para Fabiana Scoleso, doutora em História Social e professora da UFT (Universidade Federal do Tocantins), o foco atual nas titulações destoa da política dos assentamentos rurais de priorizar a titulação às mulheres das famílias e significa um “deslocamento do eixo” da agricultura familiar para o agronegócio. “É inegável que houve uma redução drástica do programa de reforma agrária, que existe uma paralisia. É importante criar outras possibilidades de reforma agrária, mas os interesses desse governo são antagônicos a uma reforma. Tanto que temos visto uma série de reintegrações de posse no país”, diz Scoleso. *”Disputa de terras é estopim da principal operação sobre suspeita de vendas de decisões judiciais do Brasil”* - Com a primeira fase deflagrada há menos de um ano e meio, uma operação relacionada a uma disputa de terras na divisa da Bahia com o Piauí e o Tocantins se tornou a principal investigação sobre suspeita de venda de decisões judiciais do Brasil. Intitulada Operação Faroeste, a apuração se expandiu nos últimos meses com a ajuda de delações premiadas e, além de magistrados, tem investido sobre advogados que atuavam intermediando a venda de despachos, além de outras figuras do poder público suspeitas de participar de irregularidades. Até fevereiro de 2021, oito desembargadores já haviam sido afastados do Tribunal de Justiça da Bahia por decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça), além de outros três juízes. Três desembargadoras estão presas preventivamente, e uma quarta está em prisão domiciliar. Ao menos uma desembargadora, Sandra Inês Rusciolelli, a que está em casa, é apontada por outras partes nas investigações como tendo proposto delação premiada ao Ministério Público Federal. O processo está em sigilo, e seu advogado, Pedro Henrique Duarte, não nega nem confirma a delação. Na Operação Faroeste, segundo as apurações do Ministério Público, advogados intermediavam os interesses de pessoas que precisavam de decisões judiciais em seu favor e estavam dispostas a subornar magistrados. Em alguns casos, os rascunhos de despachos apresentados por algum juiz ou desembargador eram elaborados por esses advogados, de acordo com a investigação. A operação também já avançou sobre o Executivo e sobre o Ministério Público da Bahia, e há processos ligados a envolvidos em outros estados. O ponto de partida para a Faroeste foram suspeitas de grilagem em uma área de 366 mil hectares no extremo oeste da Bahia, próximo à divisa com o Piauí —por isso o nome da operação. O terreno tem cinco vezes o tamanho de Salvador. Depois, descobriu-se que a área objeto de decisões supostamente compradas era próxima de 800 mil hectares. Como desde o início envolveu suspeita sobre desembargadores, que têm foro especial, a operação tramita no STJ, sob a relatoria do ministro Og Fernandes. Em um dos despachos sobre o caso, o ministro descreve que foi descoberta "uma teia de corrupção, com organização criminosa formada por desembargadores, magistrados e servidores do TJ-BA [Tribunal de Justiça da Bahia], bem como por advogados, produtores rurais e outros atores do referido estado”. Já o Ministério Público Federal diz que as investigações revelaram "a existência de um modelo judicial criminoso no seio do Tribunal de Justiça baiano, em que várias organizações criminosas operavam sozinhas ou associadas, tendo julgadores, advogados e servidores, no seu corpo de funcionários e a venda de decisões como mercadoria para enriquecimento de todos em escalada geométrica". Até agora, foram apresentadas seis denúncias assinadas pela subprocuradora-geral Lindôra Araújo, e as delações premiadas e materiais encontrados em buscas e apreensões têm fornecido subsídios para a expansão das investigações. Um dos personagens-chave do caso é o empresário Adailton Maturino, que se apresentava como cônsul honorário da Guiné-Bissau, embora não tivesse autorização do Itamaraty para representar o país no Brasil. Adailton era conhecido pelo seu bom trânsito na alta cúpula dos Poderes da Bahia e do Piauí. De acordo com as investigações, ele pagou para obter decisões favoráveis de desembargadores em benefício de José Valter Dias —na descrição do Ministério Público, um homem que era um borracheiro e virou um latifundiário. Com as decisões, Dias pôde se tornar o dono de 360 mil hectares da Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto, região de cerrado baiano na divisa com o Piauí. A defesa de Maturino, comandada pelo ex-ministro José Eduardo Cardozo, diz que representações como a de "falso cônsul" e "borracheiro" são preconceituosas. No local, havia aproximadamente 300 agricultores originários do Paraná que ocuparam a região nos anos 1980, sob incentivo de um programa agrícola do governo brasileiro em parceria com o japonês. Dias alegava que tinha comprado os direitos sucessórios de herdeiros de antigos donos das terras, com base em um inventário de 1915. Obteve decisões a seu favor e conseguiu um acordo com os fazendeiros. O dinheiro desse acordo ia para uma empresa que ele constituiu com Maturino e com a esposa dele, a advogada Geciane Maturino. Com o uso de relatórios de inteligência financeiros e quebras de sigilos telefônicos, o Ministério Público e a Polícia Federal conduziram as primeiras fases da operação e prenderam alvos sob suspeita de ligação com o esquema atribuído a Adailton Maturino, como o próprio empresário, Geciane e José Valter Dias. Inicialmente, o então presidente do TJ-BA, desembargador Gesivaldo Britto, e outros magistrados foram afastados do cargo. Dez dias depois, a desembargadora Maria do Socorro Santiago foi presa, por supostamente ter descumprido ordem judicial e ter feito contato com seu gabinete tentando destruir provas de um celular. A defesa dela nega e diz que a perícia não constatou nenhuma conversa que a comprometesse. Atualmente, Maria do Socorro continua presa e é ré sob acusação de lavagem de dinheiro e de participar de organização criminosa. Ela também é ex-presidente do TJ-BA. Além delas, estão presas preventivamente em Brasília outras duas desembargadoras. O caso se expandiu e, após a quinta fase da operação, o Ministério Público chegou a um outro lado das acusações: pediu buscas e apreensões também em suspeitos de atuarem contra Adailton Maturino. Desembargadores eram pagos, segundo as denúncias, por representantes de produtores agropecuários que estavam na disputa judicial contra o "falso-cônsul". Esse ramo da investigação foi desvendado com ajuda de um delator que é ex-assessor do Judiciário baiano e passou a atuar como advogado em uma banca que seria especializada em intermediar a venda de decisões. Também é delator Nelson Vigolo, representante da Bom Jesus Agropecuária, que admitiu ter bancado advogados com a finalidade de pagar propinas em troca de decisões favoráveis. Em dezembro, uma nova fase da Faroeste revelou que a operação também investigava suspeitas no Governo da Bahia e no Ministério Público da Bahia. Um dos alvos foi o então secretário da Segurança Pública Maurício Teles Barbosa, que é delegado da Polícia Federal e atuou de 2011 a 2020 nos governos dos petistas Jaques Wagner e Rui Costa. Ele foi afastado do cargo de secretário por decisão judicial e, depois, exonerado. Barbosa, segundo as investigações, mantinha contato com Adailton Maturino e é suspeito de frustrar investigações que envolviam o empresário e os desembargadores ligados a ele. Também é alvo de investigação a ex-procuradora-geral de Justiça Ediene Lousado. Em uma conversa gravada, a desembargadora Sandra Inês afirma que Ediene atuou para impedir a apresentação de uma denúncia que o Ministério Público baiano tinha preparado contra Barbosa. INVESTIGADOS NEGAM IRREGULARIDADES O Tribunal de Justiça da Bahia não se manifestou sobre a situação da corte, e o seu atual presidente, Lourival Almeida Trindade, afirmou que não pode se posicionar sobre processos pendentes de julgamento. O advogado do desembargador Gesivaldo Britto, Adriano Figueiredo, diz que não foram identificados elementos que apontem que o magistrado ostente padrão de vida incompatível com sua renda e que ele não participou de nenhum julgamento em processos que dissessem respeito ao objeto apurado. “O MPF se apega a frágeis suposições para mantê-lo, a fórceps, no polo passivo da demanda criminal”, diz. Os advogados de Maurício Teles Barbosa, Sérgio Habib e Thales Habib, afirmam que não há nos autos nenhuma prova de que ele tenha frustrado investigações ou favorecido Adailton Maturino, "desafiando a que se prove qual a sua conduta que o favoreceu". Também afirma que não procede a acusação de que ele tenha sido favorecido por Ediene, porque foi alvo de uma representação do Ministério Público que acabou arquivada após um habeas corpus no TJ-BA. A defesa de Ediene também nega irregularidades. Os advogados de José Valter Dias, Maurício Vasconcelos e Aloísio Freire, afirmam que a empresa criada com Maturino "foi realizada às claras e à luz da legislação pertinente". A movimentação financeira, diz a defesa, é "absolutamente compatível com a natureza dos negócios jurídicos ao redor dos imóveis que integraliza, em preço de mercado cambial de soja, conforme reconhece o próprio Ministério Público Federal". Também afirma que a família acredita ser titular do direito sobre as terras. Os advogados de Adailton Maturino reiteram que todas as movimentações financeiras feitas pelo seu cliente são regulares. O advogado de Maria do Socorro, Bruno Espiñeira Lemos, argumenta que não há participação da magistrada em qualquer ato de lavagem de dinheiro ou em uma eventual organização criminosa. Afirma que não houve interceptação do telefone dela com qualquer dos investigados e que não há motivo para mantê-la presa. "O que estão fazendo hoje, no caso, é tentar tirar qualquer oxigênio de vida e que ela resolva tentar delatar. De preferência, que faça como a maioria, que invente, que deixe muito colorido além do normal", afirma. "Eles criaram uma pirotecnia, um espetáculo para dar uma dimensão e fortalecer a narrativa do Ministério Público." A defesa de Nelson Vigolo “reafirma que o agricultor foi vítima de um poderoso esquema de extorsão que vem sendo revelado a cada etapa da Operação Faroeste”. *”Villas Bôas ironiza crítica de Fachin; Gilmar vê 'deboche' e diz 'ditadura nunca mais'”* - O ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas ironizou nesta terça-feira (16) uma crítica aos militares feita um dia antes pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF). Sem citar o general, Gilmar Mendes reagiu. A reprimenda de Fachin foi uma resposta à revelação de que a cúpula do Exército, então comandado por Villas Bôas, articulou um tuíte de alerta ao Supremo antes do julgamento de um habeas corpus que poderia beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2018. Lula acabou tendo o pedido negado pelo plenário do Supremo e, no dia 7 de abril daquele ano, foi preso e levado para Curitiba. Deixou a cadeia 580 dias depois, após o STF derrubar a regra que permitia prisão a partir da condenação em segunda instância. Nesta terça-feira (16), Villas Bôas comentou a notícia sobre as críticas de Fachin: "Três anos depois". O general sofre de esclerose lateral amiotrófica. Ele usa aparelhos de informática para se comunicar. O militar está em uma cadeira de rodas. Fachin é o relator da Operação Lava Jato no Supremo. Após a publicação de Villas Bôas, uma manifestação partiu de um ministro da ala mais garantista da corte. Gilmar já fez críticas à extinta força-tarefa de Curitiba. No Twitter, sem citar o nome do general, Gilmar afirmou que "a harmonia institucional e o respeito à separação dos Poderes são valores fundamentais da nossa república". "Ao deboche daqueles que deveriam dar o exemplo responda-se com firmeza e senso histórico: Ditadura nunca mais!", escreveu. A postagem de Villas Bôas é um comentário à postagem de Antonio Lorenzo, que já foi chefe de comunicação da Aeronáutica. Lorenzo publicou três emojis com expressão de sono e escreveu: "Três anos depois...". Em livro-depoimento recém-publicado pela Fundação Getulio Vargas, segundo Villas Bôas, o texto do tuíte de 2018 foi escrito por "integrantes do Alto Comando". "A declaração de tal intuito, se confirmado, é gravíssima e atenta contra a ordem constitucional. E ao Supremo Tribunal Federal compete a guarda da Constituição", disse Fachin, em nota divulgada por seu gabinete, que fez referência a reportagem da Folha sobre o tema publicada no domingo (14). Segundo mostrou a reportagem, a postagem do então comandante do Exército tinha um teor bastante mais incendiário do que o publicado. Além disso, segundo o relato no livro-depoimento feito pelo general, que comandou o Exército de 2014 a 2019, ao menos três ministros do governo Bolsonaro e o atual chefe da Força souberam da nota. A postagem de Villas Bôas acabou atenuada por ação do então ministro da Defesa, general da reserva Joaquim Silva e Luna, hoje diretor-geral de Itaipu, em um episódio até aqui inédito que foi relatado à Folha por integrantes do governo Michel Temer (MDB). "Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?", dizia a primeira postagem de Villas Bôas, feita no dia 3 de abril de 2018. "Asseguro à nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais", completava o general. Nesta segunda-feira, Fachin citou trecho da Constituição que define o papel das Forças Armadas. "As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República." Em abril de 2018, após o tuíte de Villas Bôas, Fachin não se manifestou publicamente. No dia seguinte, o plenário do STF negou habeas corpus a Lula. Ao votar pelo indeferimento do pedido do ex-presidente, o ministro também não fez comentário sobre o texto do general. Em seu voto, Fachin ressaltou que deveria haver estabilidade e respeito ao entendimento dos tribunais sobre a execução provisória da pena. De acordo com o ministro, não havia até aquele momento revisão da jurisprudência, do próprio Supremo, que previa a execução provisória da pena após condenação em segunda instância, entendimento aplicado no caso de Lula. Celso de Mello, então decano do Supremo, por sua vez, abordou a mensagem de Villas Bôas, sem citá-lo por nome. Ao iniciar a leitura de seu voto, o então decano afirmou que um comentário realizado por "altíssima fonte" foi "infringente ao princípio da separação de Poderes" e alertou contra "práticas estranhas e lesivas à ortodoxia constitucional". Celso afirmou que intervenções militares restringem a liberdade e limitam o espaço do dissenso e, portanto, são inaceitáveis. "O respeito indeclinável à Constituição e às leis da República representa o limite intransponível a que se deve submeter os agentes do Estado, quaisquer que sejam os estamentos a que eles pertencem", disse. *”Brasil busca vaga no Conselho de Segurança da ONU sob desgaste de Bolsonaro no exterior”* *”Haitianos retidos na fronteira do Acre rompem barreira e entram no Peru”* *”Militares de Mianmar repetem promessa de novas eleições, e líder civil deposta enfrenta mais acusações”* TODA MÍDIA - *”África do Sul tenta devolver as vacinas da AstraZeneca”* *”Onda de frio deixa ao menos 20 mortos e 5 milhões sem energia nos EUA”* *”Nevasca interrompe vacinação contra a Covid-19 na Grécia”* *”Seul acusa Coreia do Norte de hackear Pfizer para ter acesso a vacinas de Covid-19”* *”Com sucesso na vacinação, Israel vai reabrir lojas, academias e sinagogas”* *”Ditadura da Belarus faz blitz contra entidades de jornalismo e direitos humanos”* *”Metade das empresas brasileiras começam 2021 com queda no lucro, diz FGV”* *”Brasileiro renegocia empréstimos para melhorar perfil da dívida na pandemia”* *”Bitcoin vai acima de US$ 50 mil pela primeira vez”* PAINEL S.A. - *”Órgão da Justiça Militar vai pagar curso de italiano para cargos que ganham mais de R$ 37 mil”*: Os membros do MPM (Ministério Público Militar), que chegam a ter remuneração acima de R$ 37 mil, poderão ganhar bolsas de estudos de idiomas com recurso público. No momento de aperto das contas do governo e do debate sobre a falta de dinheiro para bancar o auxílio emergencial, o procurador-geral de Justiça Militar, Antônio Pereira Duarte, lançou neste ano o programa de estudos para subsidiar cursos de inglês, espanhol, francês e italiano aos servidores e membros do órgão. Procurado pela coluna, o MPM afirma que a iniciativa foi prevista no plano estratégico de 2016. Diz também que a capacitação é necessária por causa do aumento de sua atuação internacional nas cooperações jurídicas e relações institucionais com órgãos do sistema de Justiça Militar de nações amigas. "A atribuição para apurar crimes militares cometidos no exterior, ainda que apenas em parte, é do MPM. Um exemplo é o caso do sargento detido na Espanha, denunciado pelo MPM por tráfico internacional de drogas. As missões de paz da ONU com tropas brasileiras são acompanhadas pelo MPM que, caso necessário, como no Haiti, tem que se deslocar para acompanhar as investigações. Também estamos em tratativas com a Procuradoria-Geral de Justiça Militar da Itália para celebrar acordo de cooperação", diz em nota. O órgão diz que está estudando o modelo econômico mais viável para formar as turmas de idiomas. "Predominantemente, serão ofertadas turmas fechadas, com instrutor único e em regime de educação à distância, o que reduzirá custos para a administração. O MPM busca convênios com outras instituições públicas e no meio universitário para reduzir gastos", afirma em nota. Além da remuneração pelo cargo efetivo no MPM, há outros ganhos eventuais como a gratificação natalina, que pode chegar R$ 19,6 mil. Em janeiro, houve casos de rendimento líquido total acima de R$ 65 mil entre as funções de procuradores e promotores, segundo dados do órgão. PAINEL S.A. - *”Pubs britânicos continuam fechados sem perspectiva de reabrir até com mesa em área externa”* PAINEL S.A. - *”Bauru vira palco de conflito entre Bolsonaro e Doria”* PAINEL S.A. - *”Procon-SP entra em investigação sobre vazamento de dados de mais de 100 milhões de contas de celular”* PAINEL S.A. - *”Representantes empresariais pressionam por mudanças no Marco das Startups”* *”Regras do auxílio emergencial podem congelar salários de servidores por 3 anos”* - A concessão de um auxílio emergencial com regras amplas poderia levar a um congelamento dos salários no serviço público federal por três anos para compensar o impacto do programa nas contas públicas. Apesar de ainda não estar fechada, a alternativa é comentada nas conversas entre Executivo e Congresso —conforme pessoas com conhecimento do assunto relataram à Folha. Para evitar a necessidade de compensar grandes volumes, defende-se no governo um programa com custos mais contidos do que em 2020. Influencia nas visões sobre o programa o aumento no endividamento do país. A dívida bruta chegou ao fim do ano passado em 89,3% do PIB (Produto Interno Bruto) e deve subir novamente com a expectativa de mais um déficit nas contas públicas em 2021. É defendida entre membros do Executivo a necessidade de filtrar os beneficiários do auxílio emergencial em relação aos recebedores de 2020 para direcionar o programa aos mais pobres e manter o custo do programa sob controle. Além disso, a ideia é restringir a duração dos pagamentos por três ou quatro meses. Esse prazo se baseia na premissa de que, dentro do período, haverá vacinação em massa da população idosa e queda no número de hospitalizações. Também é defendido um valor entre R$ 200 e R$ 250 mensais por beneficiário. O valor é menor do que os R$ 600 mensais concedidos em 2020 nas cinco primeiras parcelas e do que os R$ 300 dos últimos quatro pagamentos. O valor das parcelas em um patamar menor do que em 2020 é visto como forma de deixar o valor mais próximo ao do Bolsa Família. O programa de transferência de renda concede, em média, um valor aproximado de R$ 200 por cartão. A visão entre integrantes do Executivo é que, quanto mais restritivas as regras do auxílio emergencial, menor seria o custo da medida e, portanto, menor a necessidade de medidas compensatórias. Por outro lado, o entendimento é que, quanto mais amplas forem as regras, maior a demanda por cortes de outras despesas. O Ministério da Economia vem expressando reiteradas vezes a necessidade de contrapartidas fiscais para a concessão do auxílio emergencial e para a liberação de gastos para combater os efeitos da pandemia. A visão é que liberar mais gastos para enfrentar a Covid-19 não pode significar um novo cheque em branco, por causa do menor espaço fiscal do país após o rombo recorde de R$ 740 bilhões nas contas primárias em 2020. Conforme mostrou a Folha nesta semana, a recriação do auxílio emergencial vai atender mais pessoas do que o inicialmente previsto e chegar a mais de 40 milhões de beneficiários em 2021. Isso por si só já representa uma pressão sobre o custo. Mesmo assim, o auxílio deve contemplar uma população menor do que a de 2020 (mais de 60 milhões). O objetivo é fazer uma filtragem e deixar o programa mais focado, direcionando recursos apenas à população mais pobre. Mesmo com a perspectiva de liberação de novos gastos públicos neste ano para combater as consequências econômicas da pandemia, o ministro Paulo Guedes (Economia) planeja amenizar o impacto das medidas nas contas públicas. Conforme mostrou a Folha também nesta semana, a equipe econômica desenha iniciativas em 2021 com uma engenharia financeira que gere efeitos similares aos observados no ano passado, mas que reduza ou até mesmo descarte a necessidade de recursos do Tesouro Nacional dependendo do caso. No caso do programa de manutenção do emprego, Guedes tem dito a interlocutores que pretende eliminar o uso do caixa do Tesouro. A volta da medida que evita demissões já é uma certeza no Ministério da Economia para 2021. O programa criado no ano passado, visto por governo e especialistas como fundamental para a preservação de postos formais em 2020, permitia a suspensão de contratos de trabalho ou reduções de 25%, 50% ou 70% nas jornadas, com corte proporcional de salário. Como compensação, o trabalhador afetado recebia do Tesouro um valor proporcional ao seguro-desemprego. Agora, o ministro estuda usar recursos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), responsável pelo custeio do seguro-desemprego e do abono salarial, para antecipar recursos ao trabalhador empregado. No ano passado, foram usados R$ 51,5 bilhões da União para compensar trabalhadores pela redução de salário ou suspensão dos contratos. O chamado BEM (Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda) foi o terceiro programa que mais recebeu recursos do Tesouro em 2020 (atrás do auxílio emergencial e dos repasses a estados e municípios). Outro exemplo são os programas de empréstimos. As linhas de crédito criadas em 2020 para socorrer empresários usaram em grande parte recursos da União, que garantiu o risco de até 100% de cada operação. Neste ano, técnicos discutem um meio de os empréstimos dependerem menos de recursos públicos e terem uma parcela maior do risco assumido pelos próprios bancos. VINICIUS TORRES FREIRE - *”Com a corda no pescoço, general Pesadello tenta provar que vai trazer vacina”* *”Bolsonaro reclama por não receber fotos no Facebook, mas usa configuração que impede”* AGROFOLHA - *”Mato Grosso transforma seu destino com boom movido por China, fé e Bolsonaro”*: Rodrigo Pozzobon sorri como se não conseguisse acreditar completamente em sua boa sorte. É o sorriso dentuço e atordoado de um homem que acaba de encontrar um tesouro. De certa forma, ele o fez. Mais de 1.000 km a oeste dos grandes estados costeiros do Brasil –e mais perto, em linha reta, do Oceano Pacífico do que do Rio de Janeiro–, o agricultor está desfrutando de um boom que atraiu pouca atenção entre seus concidadãos e menos ainda no mundo mais amplo. Pozzobon, 35, é um dos reis da soja no Brasil. Calçando mocassins de camurça e vestindo uma camiseta alinhada, ele passaria facilmente por integrante da turma da Faria Lima –a elite de São Paulo, que vive, trabalha e se diverte em torno do distrito financeiro da cidade. Mas Pozzobon nasceu e se criou no estado de Mato Groso, no extremo oeste do Brasil, e tem raízes profundas por lá. Seu pai trabalhava a terra para uma cooperativa na década de 1980, antes de estabelecer uma fazenda própria. Hoje, Pozzobon filho tem duas fazendas e duas casas. São Paulo só lhe é útil para ocasionais viagens de fim de semana. “Não consigo me imaginar vivendo em qualquer outro lugar”, ele diz em inglês, antes de começar a falar em português, quando seu entusiasmo excede seu conhecimento do idioma. “Os lucros aqui são bons demais”. Nos últimos 20 anos, Mato Grosso, um estado com área quase duas vezes maior que a da Espanha, se tornou um dos maiores produtores mundiais de uma safra tão lucrativa que os moradores locais a chamam de “ouro verde”. É um boom estimulado por mudanças geopolíticas, da ascensão da China, com sua demanda insaciável por produtos alimentícios, à chegada de líderes populistas como o presidente Jair Bolsonaro, que é ídolo para muita gente no Mato Grosso. O boom também foi alimentado pelo tipo de destruição ambiental e pela extração descontrolada de recursos que vêm maculando a imagem internacional do Brasil nos últimos anos. Mato Grosso agora é dominado por plantações agrícolas vastas e planas, que lembram a região meio-oeste dos Estados Unidos. Em sua porção norte, onde essa paisagem se encontra com a floresta amazônica, o estado se tornou um dos pontos focais do desflorestamento ilegal. Mas esses não são assuntos que pesem demais nos pensamentos de Pozzobon. Riqueza e progresso são as palavras de ordem, e ele se sente otimista. “Poderíamos esbofetear a China e ela ainda viria comprar nossa soja, porque não tem outra opção”, ele diz. “Não há outro lugar de que comprar”. Estados litorâneos como o Rio de Janeiro e a Bahia dominaram o Brasil por séculos. No século 20, a ascensão de São Paulo, um polo industrial, e a construção de Brasília como centro político transferiram para o interior o foco da maior nação da América Latina. Agora ele está mudando de novo, para áreas no passado vistas como inacessíveis. Bem distante da depressão econômica que solapou a vitalidade de lugares como o Rio de Janeiro e São Paulo, Mato Grosso representa um território de fronteira em expansão, que vem desempenhando papel crucial na determinação do futuro do país. Sua ascensão também está mudando a ideia central sobre o Brasil. A euforia da primeira década do milênio –quando o crescimento descontrolado das commodities fez do país o queridinho dos investidores internacionais– passou há muito tempo. O crime e a pobreza dispararam. A corrupção continua enraizada e as instituições democráticas são frágeis. Bolsonaro –capitão reformado do exército e dado a ocasionais vulgaridades– conta com muito apoio no Brasil, mas sua retórica quanto ao meio ambiente e os direitos humanos está fazendo do país, aos poucos mas constantemente, um pária na comunidade internacional. Com o Brasil prejudicado por uma crise de identidade, aqueles que vivem e trabalham em Mato Grosso propõem uma narrativa diferente. Sua terra de fronteira oferece uma história de esperança e oportunidade. Trata-se de, como afirma Francisco Olavo Pugliesi de Castro, da Famato, uma associação que representa os produtores agrícolas do estado, “um novo Brasil que nem mesmo os brasileiros conhecem”. A rodovia BR-163 atravessa o Brasil, com poucas interrupções, do sul ao norte. Dentro do Mato Grosso, o trajeto da estrada é reto, e dirigir deveria ser tarefa simples. Não é. Um fluxo ininterrupto de carretas disputa a supremacia automotiva contra uma frota de picapes brancas –um símbolo de sucesso para os ricos proprietários rurais da região. Os motoristas estão cientes da localização das poucas câmeras de controle de velocidade na região e, nos intervalos entre elas, não existem regras. Imagine uma espécie de "Mad Max" agrícola. O surpreendente é que o ruído desaparece, a alguns minutos de distância da rodovia. Se você virar para o leste ou para o oeste, se verá embrenhado em terra arável ininterrupta, uma planície que se estende por centenas de quilômetros. Nos quadrantes remotos do estado vivem comunidades indígenas, em terras demarcadas que são cobiçadas por aqueles que os indígenas denominam “kajaiba” [homens brancos]. A rodovia é uma peça de infraestrutura vital –se bem que precária– que permite que os reis da soja brasileiros levem seu produto ao mundo externo. Ela conecta as cidades de rápido crescimento em Mato Grosso, como Sinop, Sorriso e Nova Mutum, a Cuiabá, no sul, e às artérias fluviais da Amazônia, 1.000 quilômetros mais ao norte. Encontrei-me com Pozzobon em Lucas do Rio Verde, uma cidade em expansão e planejada cuidadosamente, que está classificada entre os municípios mais desenvolvidos do Brasil. Lucas, como a cidade é conhecida pelos moradores locais, conseguiu que seu crescimento acelerado dos últimos anos resultasse em investimento na educação e nos serviços municipais. O desafio, para as autoridades locais, é gastar o dinheiro arrecadado em impostos com suficiente rapidez para acompanhar a disparada na população. “É outro Brasil, aqui”, diz Pozzobon, que me conta que o Mato Grosso é o único estado que cresceu durante a pandemia do coronavírus (na verdade, as projeções são de que sua economia tenha se contraído em cerca de 1% no ano passado, mas esse continua a ser um dos melhores desempenhos entre os 27 estados brasileiros.) O motivo é simples, ele diz: “Na pandemia, as pessoas pararam de fazer muitas coisas, mas não pararam de comer”. Respondendo por 22% do PIB (Produto Interno Bruto), o sucesso da agricultura é um dos raros pontos positivos em um país cujos setores de serviços e industrial continuam a encontrar problemas para se recuperar da recessão devastadora que surgiu cinco anos atrás. Fernando Tadeu de Miranda Borges, professor de Economia na UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso), não vê sinais de desaceleração. “Mato Grosso propelirá o desenvolvimento econômico brasileiro”, ele diz, ainda que advirta que o sucesso depende de manter relações diplomáticas e comerciais, especialmente com Pequim, que Bolsonaro critica e insulta constantemente. Booms agrícolas são um traço característico da economia brasileira desde a chegada dos primeiros exploradores portugueses, em 1500. Primeiro veio o açúcar, depois o café e o cacau. Também houve uma corrida do ouro no estado de Minas Gerais, para onde o influxo de mineradores foi tão grande, em dado momento, que causou uma onda de fome que resultou na morte dos garimpeiros recém-chegados. No entanto, esses booms em geral ocorreram em terras fartas, já ideais para o cultivo, e em áreas relativamente próximas à costa do país, e dotadas de acesso à navegação e logística. No Mato Grosso, nada disso está disponível. Até o final do século 20, a vasta savana do Cerrado, que domina a maior parte do território de Mato Grosso, formando quase que um perímetro meridional para a floresta amazônica, era considerada bruta demais para a agricultura. Isso mudou com avanços tecnológicos como a modificação genética de safras e novos métodos de fertilização de solo, que abriram a terra para a produção de milho, algodão e soja. Esse processo foi, por sua vez, propelido pela ascensão da China. Com a alta da demanda por carne na segunda maior economia do planeta, subiu também a demanda por matérias-primas como a soja, necessária para alimentar os animais antes do abate. Nos últimos dez anos, o Brasil elevou sua produção de soja –usada também na produção de óleo– de 75 milhões para mais de 130 milhões de toneladas, em 2020. O país superou os Estados Unidos e se tornou o maior produtor mundial da commodity. A produção de milho quase dobrou, para 105 milhões de toneladas. Mas para os moradores das grandes cidades brasileiras, o Mato Grosso continua a ser uma ideia distante, e é mais conhecido por seu calor escaldante do que como propulsor da economia nacional. Depois de um anúncio recente da montadora Ford de que deixaria de produzir veículos no país, o governador da Bahia lamentou o declínio da indústria, declarando que “o Brasil está determinado a se tornar uma grande fazenda”. Para alguns moradores locais de Mato Grosso, há um sentimento de indignação por seu estado de 3,5 milhões de habitantes não ser reconhecido por suas realizações. “Já somos maiores do que São Paulo em termos de PIB agrícola”, diz Mauro Mendes, o governador do estado, de seu gabinete na capital, Cuiabá. Além disso, ele acrescenta, “existem novas fronteiras a explorar”. Duas horas ao norte de Lucas, na BR-163, fica a cidade de Sinop. Com população de mais de 150 mil habitantes, e crescendo, Sinop é o polo do desenvolvimento urbano na região, com avenidas largas e praças bem cuidadas. “Ainda não temos o que vocês têm em São Paulo, em termos de teatros e entretenimento, mas estamos contentes em ver progresso e desenvolvimento”, diz Angelo Carlos Maronezzi, que dirige um centro de pesquisa agrícola na cidade. “Viver aqui é muito gratificante porque existem muitas oportunidades –de trabalhar, de crescer, de desenvolver ideias”. Cinquenta anos atrás, essa porção do Mato Grosso era dominada por uma mistura de floresta e de vegetação rasteira, e quase desabitada. Encorajadas pelos governos militares, obcecados com o desenvolvimento dos territórios remotos do país, ondas sucessivas de migrantes vindos do sul do Brasil começaram a chegar, nas décadas de 1970 e 1980. Muitas vezes descendentes de imigrantes italianos, alemães e do leste europeu para o Brasil, a chegada deles alterou rapidamente a composição étnica da população da região, indígena e de raça mista. Essa história é promovida com insistência em Sinop. Na prefeitura existem retratos dos “colonos” da década de 1970, ao lado de imagens em branco e preto de escavadeiras derrubando a floresta nativa. Se reproduzidas hoje, essas cenas causariam furor. “Tomamos um estado que nada valia, uma terra sem valor, e a domamos com tecnologia e com novos métodos de fertilização”, disse Maronezzi, que se mudou do sul do Brasil para o Mato Grosso em 1992. A positividade é frequente entre os moradores com quem conversei em minhas viagens pelo estado, especialmente em Sinop e Sorriso, onde as ruas são dominadas por grandes casas com portões, que evocam mais Miami que o meio do nada no Brasil. As queixas são bastante raras, ainda que, pressionado, o vereador Ícaro Francio Severo, de Sinop, tenha dito que o município sofre problemas em seus sistemas de esgoto, bem como pelo excesso de burocracia. Poucos vereadores em outras partes do Brasil considerariam que essas questões são problemas. “Quando chegamos, tudo estava acontecendo, tudo estava crescendo. Ficamos encantados, diz Glaucia Regina Santos, proprietária de um restaurante de beira de estrada frequentado por caminhoneiros, na BR-163. À primeira vista, Santos não parece ser uma porta-voz representativa desse novo Brasil. Quando conversamos, em seu empoeirado estabelecimento, ela estava acomodada diante de um enorme ventilador e mal se mexia, tentando se refrescar ante uma temperatura de quase 40 graus. Dois empregados ali perto também estavam imóveis, e só se mexiam para receber pagamentos dos poucos caminhoneiros de passagem, pelos cafés e cigarros que compravam. Mas Santos mostra muito mais vivacidade, quando questionada sobre o Mato Grosso. “Mato Grosso quer dizer sucesso”, ela diz, destacando as oportunidades de trabalho e estudo que os jovens têm nas numerosas universidades da região (há sete delas em Sinop). “Quem quiser trabalhar, ganhará dinheiro”, diz Santos. “Quem chegar aqui com coragem, ganhará dinheiro”. É um otimismo surpreendente, especialmente para os visitantes, como eu, mais familiarizados com os problemas dos estados costeiros do Brasil. O Rio, por exemplo, está falido há anos –e o declínio fica evidente nas fachadas corroídas de seus edifícios “art déco” um dia reluzentes. A despeito de sua abundância de recursos naturais, Minas Gerais também está falido. Existe riqueza em São Paulo, mas sua distribuição é desigual, entre a cidade moderna e desenvolvida e o vasto anel de favelas em sua periferia. A maioria dos economistas aponta que o crescimento no Brasil acontece em ciclos, historicamente. Observado de mais perto, ele também é agudamente geográfico. No sublime romance “Gabriela, Cravo e Canela”, de Jorge Amado, o progresso é o lema para os personagens que dirigem plantações de cacau na Bahia da década de 1920. Hoje, o estado é um dos mais pobres do Brasil. O Rio de Janeiro, enquanto isso, aproveitou a onda das commodities da década passada. Mas desde seu colapso, o estado vem buscando outro propulsor econômico que não o turismo, que foi severamente prejudicado pelas duas epidemias da cidade: a Covid-19 e o crime. Mesmo São Paulo –polo industrial e de produção– luta para acompanhar o ritmo dos concorrentes mundiais. Simplesmente não existe investimento suficiente. Santos, que se transferiu de São Paulo ao Mato Grosso mais de uma década atrás, diz não ter planos de retornar. “É uma vergonha eu não ter vindo [para cá] quando era mais jovem”, ela diz. O orgulho local não é a única coisa que une os batalhadores das terras fronteiriças brasileiras. Eles também acreditam em Bolsonaro. O presidente conquistou sua vitória eleitoral em 2018 aproveitando uma onda de insatisfação popular com a corrupção. Desde então, seu governo vem sendo caracterizado por tentativas intermitentes de reforma econômica, constantes disputas políticas internas e controvérsias internacionais, especialmente quanto à destruição da floresta amazônica. Para observadores externos, Bolsonaro se assemelha a Donald Trump em seu uso da política populista e de uma linguagem inflamatória. Mas enquanto a mensagem de Trump ecoava principalmente nas regiões economicamente marginalizadas dos Estados Unidos, a de Bolsonaro encontra simpatia entre os produtores e comunidades mais endinheirados, que aplaudem sua abordagem de não interferência com os negócios, depois de anos de governança esquerdista. Bolsonaro obteve 66% dos votos em Mato Grosso na eleição presidencial de 2018. Mas seu apoio no cinturão agrícola que floresce ao norte da capital, Cuiabá, é ainda mais alto. Mais de 77% dos moradores de Sinop votaram no homem que chamam de “mito”. Sorriso, uma cidade que se define como “a capital da agricultura brasileira”, registrou resultados semelhantes. O rosto do presidente é onipresente em outdoors na região, erigidos por grupos dedicados de seguidores locais. Em uma visita recente a Sinop e Sorriso, ele foi cercado por uma multidão de fãs. “Você precisava tê-lo visto no evento aqui. Entrou no meio da multidão para abraçar as pessoas. Ele é assim, bem populista”, disse Severo, o vereador de Sinop. “E dá valor ao agribusiness. Eliminou muita burocracia, acelerou os investimentos e direcionou dinheiro ao agribusiness. Também atrai os agricultores por defendê-los quanto às questões ambientais, protegendo-os daqueles na esquerda que dizem que estão destruindo a Amazônia." Não é só financeiramente que Bolsonaro tem conexões com os moradores da região; ele também compartilha de sua fé. Como a maior parte do Brasil rural, o Mato Grosso continua a ser profundamente religioso, mas a composição de seus fiéis vem mudando. Nas duas últimas décadas –em paralelo com o renascimento econômico da região–, o estado está na vanguarda de um fenômeno que varreu o Brasil: a expansão das igrejas evangélicas. Bolsonaro continua oficialmente a se declarar católico, mas conquistou o apoio do movimento evangélico ao ser batizado por um pastor no rio Jordão, Israel, dois anos antes de disputar a presidência. Foi uma jogada astuta. Se as tendências atuais persistirem, em 2030 a maioria dos brasileiros devem se identificar como cristãos evangélicos. As mudanças já são abundantemente claras no Mato Grosso. Em 2000, os evangélicos representavam 16% da população do estado –número que saltou para 25% em 2010. O recenseamento de 2020 foi adiado por conta da pandemia, mas pesquisas regionais indicam que consideravelmente mais de 30% dos mato-grossenses se declaram evangélicos, agora. “O que faz com que Sorriso prospere é a religião. Noventa por cento da prosperidade vem dela”, diz Cristiane Silva Paulino Rodrigues, moradora da cidade, ecoando o “evangelho da prosperidade” que ressoa em todo o Brasil. De acordo com essa interpretação da Bíblia, os fiéis devem destinar um dízimo de seus ganhos à igreja, e em retorno Deus lhes dará riqueza material. Bruno Mendes dos Santos, pastor das Igreja Mundial do Poder de Deus, em Sorriso, diz que as igrejas são importantes para manter um senso de comunidade e responsabilidade, nessas cidades fronteiriças. “Religião é o traço de união”, ele diz, quando lhe pergunto sobre o papel da fé em lugares como Sorriso. “Ajuda em tudo”. Se a classe média urbana das grandes cidades brasileiras enfrenta dificuldade para entender por que Bolsonaro continua tão popular, os moradores dessa região agrícola do país não conseguem compreender por que ele é tão odiado em outras áreas. “Só gosto do jeito dele”, diz Madalena Euclides dos Santos, que vende roupas religiosas em uma loja em Sinop. “Ele é um político que fala as coisas como são. Os brasileiros estão acostumados com as mentiras doces. Mas ele não esconde quando é preciso nos dizer verdades duras”. Bolsonaro também conquistou simpatia na região por se concentrar naquilo que ela mais precisa do governo federal: investimento em infraestrutura. No ano passado, seu governo conseguiu asfaltar a BR-163 até o porto amazônico de Miritituba, o que significa que os agricultores do Mato Grosso podem usar os caudalosos rios da selva para transportar seus produtos ao mundo. Ele também advoga a construção de conexões ferroviárias que cruzariam o Mato Grosso de norte a sul e de leste a oeste. Os planos enfrentam oposição de organizações indígenas, que devem perder partes de suas terras supostamente protegidas para que os projetos sejam realizados. Mas para os agricultores da região, esse é o próximo passo inevitável de desenvolvimento. Apesar de toda a importância da BR-163, as distâncias no Brasil são grandes demais para que o transporte rodoviário faça sentido econômico ou ambiental. É mais barato para os exportadores enviar seus produtos dos portos brasileiros à China do que de estados no interior, como Mato Grosso, aos portos. “Uma vez visitei um agricultor americano em Iowa e ele estava zangado por precisar transportar sua soja por 25 quilômetros até o trem mais próximo”, diz Pozzobon. “E eu lhe contei que gostaria de me zangar por um motivo assim –nós levamos nosso produto de caminhão por 2.100 km até o porto mais próximo [o de Paranaguá]”. A população mundial deve chegar aos 10 bilhões de pessoas nos próximos 30 anos, e os agricultores de Mato Grosso terão ainda mais a ganhar. Mas a proliferação de superfazendas no Brasil tem um preço. Entre 2009 e 2019, quase 14 mil km2 de floresta nativa foram destruídos em Mato Grosso –uma área comparável à do estado americano do Connecticut e o segundo maior ritmo de desflorestamento no Brasil, atrás apenas do estado amazônico do Pará. “O estado de Mato Grosso assumiu compromissos de redução do desflorestamento, em Paris [na conferência sobre a mudança do clima de 2015]... e o governo estadual aumentou o número de inspeções e a fiscalização dos embargos, o que é positivo, disse Cristiane Mazzetti, da Greenpeace no Brasil. Mas mesmo assim, o desflorestamento em Mato Grosso voltou a crescer em 2020. “O governo federal sinaliza rotineiramente que crimes ambientais serão tolerados. E para agravar as coisas, o governo prevê cortes significativos este ano no orçamento de inspeções e combate a incêndios florestais e desflorestamento”, ela diz. O desmatamento do estado começou há décadas, quando a política de “desenvolvimentismo” adotada pelo governo militar buscou unir o Brasil por meio da construção de cidades e estradas, entre as quais a BR-163. Mas a destruição continua, sob Bolsonaro, cuja retórica em favor de agricultores, garimpeiros e madeireiras é interpretada como uma luz verde para a destruição de florestas. Para os defensores do setor agrícola, as organizações ambientais interpretam a situação erroneamente. “Se não fosse por nós, como o mundo se alimentaria?”, argumenta Francisco Olavo Pugliesi de Castro, da Famato. “Quantos dias o mundo aguenta sem alimentos brasileiros? No dia em que o resto do mundo começar a ver o Brasil como aliado, como o país que produz alimentos para o mundo, tudo mudará. Cada país tem sua vocação. A China é o centro industrial. Os Estados Unidos comandam o mundo capitalista e democrático. E a vocação do Brasil é produzir comida." Renato Farias, diretor do Instituto Centro de Vida, uma organização sediada na fímbria amazônica do norte de Mato Grosso e que promove a sustentabilidade, diz que a discussão sobre desflorestamento ilegal é delicada –é como “ir contra a própria herança”. Farias abraça uma ideia que vem ganhando favor entre os políticos e os agricultores do Brasil, que afirmam que, com novas tecnologias e técnicas sustentáveis, o Brasil pode dobrar o rendimento de sua produção agrícola sem ter de desmatar novas áreas. Mas apesar dos atrativos da ideia, por enquanto a destruição do meio ambiente continua. Em longo prazo, as questões ambientais podem ser o fator que travará o crescimento do Mato Grosso. A volatilidade do clima já começou a impactar as safras. Além disso, cientistas acreditam que se o desflorestamento da Amazônia continuar até que ultrapasse um dado “ponto de inflexão”, os padrões climáticos que sustentam a agricultura –e a indústria– da América do Sul mudarão súbita e dramaticamente. Do lado político o Mato Grosso também enfrenta riscos. Por enquanto seu espírito de velho oeste e de fronteira vem sendo protegido e até estimulado por Bolsonaro. Mas o presidente populista disputará a reeleição no ano que vem e - enquanto a pandemia do coronavírus grassa –não existe certeza de que ele não venha a ser derrotado e substituído por um Joe Biden brasileiro, mais preocupado com o meio ambiente. O relacionamento hostil de Bolsonaro com a China também representa um perigo claro e imediato. Pequim já sinalizou desprazer com o governo em Brasília, e poucos duvidam de que os chineses retaliem economicamente se seus interesses –ou a honra da China– forem prejudicados. Por enquanto, porém, no escritório que tem no piso superior de sua casa, o vereador Severo, em Sinop, está curtindo seu novo grande projeto, que define como “quase concluído”. A cidade quer construir um shopping center, que atrairia marcas importantes para a comunidade agrícola. Isso também significaria que Sinop atingiu um novo estágio em seu desenvolvimento, tornando-a ainda mais atraente para migrantes vindos das cidades costeiras brasileiras. “Temos de fazer muitas coisas para sermos melhores, para transformar a cidade em uma cidade grande, em uma cidade mais organizada”, ele diz. “Mas se você comparasse a uma foto de cinco anos atrás, não conseguiria acreditar em quanto a cidade está diferente. O crescimento é grande demais. Não para”. HELIO BELTRÃO - *”Os riscos da autonomia”* *”Em leilão para teles, TVs e indústria entram na disputa de interesses pelo 5G”* *”Operadoras de telefonia têm 15 dias para explicar vazamento de dados ao Ministério da Justiça”* *”Adidas anuncia que vai vender a Reebok”* *”Aplicativos ampliam serviços na corrida para virarem superapp”* *”Empreendedora de 26 anos salvou Waze da aviação sem nunca ter andado de avião”* BOM PRA CACHORRO - *”Cadela herda mais de R$ 26 milhões após morte de tutor”* *”Fiscalizar posse legal de armas ficará mais difícil, alertam especialistas”* - O governo federal não pode garantir que o acúmulo de armas possibilitado por decretos do presidente Jair Bolsonaro, os últimos deles tendo sido publicados na sexta (12), permaneçam no mercado legal, dizem criminalistas e representantes de instituições que estudam fenômenos ligados à violência. Eles temem que a flexibilização para aquisição de grandes lotes de pistolas e fuzis, bem como a falta de investimento em fiscalização, acabe gerando desvios da posse legal para a comercialização e a posse ilegais, principalmente pelo tráfico e as milícias. Com a série de decretos editados desde 2019, agora com quatro novos textos publicados na sexta pré-Carnaval, cidadãos autorizados podem adquirir até seis armas, sendo que algumas categorias específicas, como policiais, podem adquirir até oito. O governo também estabeleceu a permissão para que atiradores adquiram até 60 armas, e caçadores, 30, só sendo exigida autorização do Exército quando as coleções superarem essas quantidades. Expandiu-se ainda o volume de munição que os chamados CACs (caçadores, atiradores e colecionadores) podem comprar. Antes, eram, por ano, até mil munições para cada arma de uso restrito e 5.000 munições para cada arma de uso permitido. Agora, inclui-se, por ano, insumos para recarga de até 2.000 projéteis nas armas de uso restrito. Com permissão do comando do Exército, caçadores podem extrapolar em duas vezes esse limite. Atiradores, em cinco. “O presidente da República, no afã de regulamentar de forma sistemática os dispositivos do Estatuto do Armamento acerca do porte de arma de fogo, extrapolou os limites constitucionais do poder regulamentar; a desenfreada edição de decretos sob a suposta ideia de apenas regulamentar a lei, acaba por dissentir do espírito inicial do texto da lei”, diz o advogado constitucionalista e criminalista Adib Abdouni. O advogado se refere à “exclusão de itens da lista de produtos controlados pelo Exército, como projéteis, máquinas e prensas para recarga de munições, carregadores e miras telescópicas”, além da permissão de compra para atiradores e caçadores. “Nada, técnica ou juridicamente, justifica a ampliação da flexibilização da norma restritiva, senão o populismo político, em detrimento do amadurecimento e aperfeiçoamento do Sistema Nacional de Armas”, completa. O número chama a atenção de Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, pois, entre 2014 e 2018, o registro de CACs no exército subiu quase 880%. “Ou seja, muito mais pessoas têm se registrado como CACs”, diz. Para ela, “está acontecendo uma facilitação de ser um CAC e assim conseguir mais armas”. “Existe o entendimento de que pessoas que estão querendo obter armas, inclusive para defesa pessoal, estão se registrando nessas categorias”, afirma. Para ser um CAC, é preciso obtenção de um certificado com validade de dez anos, como regras como ser filiado a um clube de tiro, fazer prova de capacitação técnica e avaliação psicológica, sendo negado registro para quem responde por inquérito criminal. Para Carolina há um “risco real” na medida, contudo. “São armas de alto potencial, sem que haja investimento na capacidade do governo de fiscalizar essas armas”, diz. Ela diz que “não se investe na capacidade do Exército e da Polícia Federal de fiscalizar. E esses são acervos enormes em casa de pessoas, em locais sem segurança. Eles podem muito facilmente serem desviados para o mercado ilegal. Quanto mais armas legais em circulação, mais chances de elas serem desviadas para o mercado ilegal”, prossegue. Desde 2017, quando o país viu a quantidade de homicídios atingir os 60 mil por ano, tornando-se a nação com o maior número absoluto de assassinatos, a redução desse patamar se tornou premente tanto para o governo como para as instituições ligadas a pesquisas sobre violência. Em 2018, houve redução para 51 mil homicídios. Em 2019, foram 45 mil assassinatos. Mas a taxa voltou a subir em 5% em 2020, mesmo com as medidas de isolamento social contra a Covid-19. “Um dos aspectos importantes para essa redução é a diminuição da violência armada por grupos criminosos, desde os que se dedicam ao comércio e ao tráfico de drogas, até os grupos paramilitares, que vêm surgindo como uma força importante na cena criminal do país, principalmente no Rio de Janeiro”, diz Bruno Paes Manso, do Núcleo de Estudos da Violência da USP. Ele cita o Rio de Janeiro como estado que não consegue tirar fuzis ilegais de circulação. “E você tem as polícias fugindo do controle dos governadores, a partir do momento em que, em vez de atuar para reduzir o crime, passam a ser protagonista de atividades criminosas”, ressalta. “Quando você vê o governo atuar no sentido de fragilizar tanto o controle das armas e das munições, ele atua no sentido de produzir um retrocesso civilizatório, com medidas que fragilizam as instituições frente a essas tiranias territoriais armadas.” O Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FSBP) também se manifestou sobre os decretos, por meio de nota. “O fato se torna mais assombroso se relembrarmos que Bolsonaro comentou, no ano passado, diante de ministros, que a medida [os decretos, à época] serviria para evitar que a população fosse escravizada por uma ditadura.” Para o FBSP “as novas regras parecem estar sendo criadas para constranger opositores do atual governo e estimular a população a uma insurreição armada contra quem ouse defender a já fragilizada democracia brasileira”. *”Congresso tem ao menos 15 propostas para derrubar decretos pró-armas de Bolsonaro”* *”Em lockdown, Araraquara tem fila de pacientes à espera de internação”* *”Prefeitura de SP vai contratar 5.000 mães de alunos para as escolas”* *”Escolas do estado já registraram 741 casos de Covid desde janeiro”* *”Foliões planejam ir à forra com Carnaval do 'Fim do Mundo', em 2022”* OUTROS CARNAVAIS - *”O verdadeiro Carnaval”* *”Governador da Bahia decreta toque de recolher entre 22h e 5h”* *”Rio tem aglomeração em bares e festa eletrônica lotada em favela”* *”Droga tocilizumabe reduz mortes por Covid e ventilação invasiva, aponta estudo”* *”Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles tem resultado positivo para Covid-19”* *”Saúde assina contrato para compra de mais 54 milhões de doses da Coronavac”* ESPER KALLÁS - *”Vacinas e as variantes do novo coronavírus”* *”Lobby pró-Sputnik trava, e União Química enfrenta resistência a uso emergencial e produção de vacina”* MÔNICA BERGAMO - *”Governo Bolsonaro arquiva projeto de peça sobre ditadura na Rouanet”*: Um projeto da companhia teatral BR116 para encenar a peça “O Santo Inquérito”, de Dias Gomes, que buscava aprovação na Lei de Incentivo à Cultura, o novo nome da Lei Rouanet, foi arquivado pela Secretaria Especial da Cultura do governo federal. Segundo a companhia, não houve qualquer justificativa pela decisão. O grupo, que atua há dez anos, nunca tinha tido problema com aprovação de projetos na Rouanet. O texto da peça trata de uma metáfora das torturas do regime militar no Brasil a partir de um episódio histórico: o de Branca Dias, que foi condenada pela Inquisição por salvar um padre do afogamento. Procurada, a secretaria não respondeu. Esse não é o primeiro caso de rejeição da Rouanet que chama a atenção da classe artística nos últimos dias. Na semana passada, a coluna antecipou que o Instituto Vladimir Herzog teve seu projeto de plano anual para 2021 reprovado pelo governo federal —a primeira rejeição em dez anos. A entidade afirmou que o projeto foi indeferido sem a apresentação de qualquer parecer que demonstrasse fundamentação legal. Nas redes sociais, o secretário Mario Frias (Cultura) rebateu a informação e disse que “esta é a primeira vez, em dez anos, que se aplica a legislação de forma correta”. O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho de Jair Bolsonaro, reforçou o coro. Ele afirmou que o governo é técnico e disse que “se fossem dar Rouanet para um Instituto de nome Brilhante Ustra diriam é ideologização”. MÔNICA BERGAMO - *”Deputado do PSOL pede na Justiça suspensão de decretos que facilitam acesso a armas e munições”* MÔNICA BERGAMO - *”Estudo diz que vacinação em SP pode ser mais eficiente com recorte regional”* MÔNICA BERGAMO - *”Associação de cineastas quer elaborar propostas de ações afirmativas para o audiovisual”* MÔNICA BERGAMO - *”Jazz Sinfônica se apresentará em concerto que celebra 120 anos do Instituto Butantan”* MÔNICA BERGAMO - *”Zeca Baleiro, Tuia e Guarabyra lançam música inspirada na década de 1970”* |
Nenhum comentário:
Postar um comentário