sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

Análise de Mídia 04/12

 



 

CAPA – Manchete principal: *”PIB tem crescimento de 7,7%, recorde e abaixo do esperado”*

EDITORIAL DA FOLHA - *”Retomada parcial”*: Ainda que um pouco inferior ao que se projetava, o crescimento de 7,7% da economia no terceiro trimestre, ante o período imediatamente anterior, confirma a superação do pior momento da crise e a importância das medidas emergenciais que ajudaram a reduzir os impactos da pandemia de Covid-19. Em consonância com o que ocorre em outros países onde houve suporte fiscal e monetário à atividade, observou-se compensação da maior parte da queda ocasionada pelas medidas restritivas —que no caso brasileiro chegou a assustadores 9,6% no segundo trimestre. Consolidam-se, assim, estimativas de retração do Produto Interno Bruto em torno de 4,5% neste ano, resultado menos ruim do que o temido há alguns meses. Também em sintonia com o padrão mundial, a retomada foi liderada por setores menos atingidos pelas exigências de distanciamento social, como a indústria e a construção. A produção manufatureira cresceu 14,8% no trimestre e recuperou o nível pré-crise. Pelo lado da demanda, a melhora se mostrou menos intensa. O consumo privado cresceu 7,6%, insuficientes para compensar o recuo de 11,3% no segundo trimestre, mas com perspectiva de continuidade. O papel do auxílio emergencial na preservação de renda aparece com clareza. A poupança interna atingiu 17,3% no período, a maior cifra desde 2013. Desse modo, há possibilidade de que a saída do auxílio emergencial, embora dolorosa, não interrompa o crescimento.
Tudo dependerá, porém, da expansão das horas trabalhadas e do emprego, que ainda dá sinais ambíguos. Nota-se forte criação de vagas formais na medição do Caged, mas a pesquisa domiciliar do IBGE ainda aponta desemprego de 21% e o pior quadro de desalento da série histórica. Há indicações positivas para 2021, que podem levar a economia a crescer mais que os 3,5% previstos hoje. Globalmente espera-se uma forte recuperação, impulsionada pela perspectiva de vacinação em massa ao longo do primeiro semestre, algo que poderá ajudar setores ainda deprimidos, sobretudo serviços intensivos em contato social. Além disso, as condições monetárias e financeiras devem permanecer favoráveis. Os juros mundiais ficarão próximos de zero. No caso brasileiro, podem perder força pressões de preços em alimentos e itens industriais que tiveram sua oferta comprometida, ajudando o Banco Central a manter a taxa básica de juros em nível baixo. A consolidação da retomada também dependerá da disposição do governo em retomar seriamente a essencial agenda de reformas, com foco na redução das incertezas orçamentárias. Os sinais nesse sentido, porém, não são animadores.

PAINEL - *”Estados temem desorganização e 'turismo da vacina' com anúncio feito por Doria”*
PAINEL - *”Doria quer envolver prefeituras em vacinação em SP e pode usar aviões”*

PAINEL - *”Senador diz que ministro não agiu contra crise energética apesar de alerta”*: O líder do DEM no Senado, Rodrigo Pacheco (MG), culpa o ministro Bento Albuquerque (Minas e Energia) por parte da atual crise energética. Pacheco afirma que alertou o presidente, em 7 de outubro, sobre o esvaziamento da represa de Furnas, sugerindo medidas de contenção. Bolsonaro disse que daria ordem a Albuquerque. “O problema é que há ministros que acham que mandam mais que o presidente”, diz Pacheco.

PAINEL - *”PT muda orientação e aceita apoiar 'golpistas' para comandar Câmara”*: Após duas eleições para o comando do Congresso prometendo “não votar em golpista”, o PT aceita agora apoiar nomes que defenderam o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016. “Temos que recompor nossas posições”, diz Carlos Zarattini (SP). O objetivo é ocupar espaços na Mesa e em comissões.

*”STF começa a avaliar drible na Constituição para reeleição de Maia e Alcolumbre”*

ANGELA ALONSO - *”Bruno Covas, João Campos, Marília Arraes beberam todos o mesmo leite da política”*: Juventude e renovação não são a mesma coisa, embora, nesta eleição, passassem como se fossem. Os jovens encantaram com aquele seu viço, o entusiasmo, o idealismo, que na geração calejada já virou cansaço, tarimba, pragmatismo. Claro, há os “forever youngers”, que não perdem a ternura, como Erundina e Suplicy, como há casmurros de poucas velinhas, caso de Eduardo Leite. Da pouca idade não se segue muita renovação. Lideranças jovens, nas casas dos 20 aos 40, saíram das urnas fortificados, uns com mandato, outros com cacife. Seus nomes ecoam pelo país como componentes da legião dos destinados a nos governar nas próximas décadas. A classificação rotineira se orienta pela cerca ideológica, pondo os novos cada qual para dentro de uma porteira: a da esquerda, a da direita, e a sempre aberta ao centro. Este critério, porém, empana outra clivagem, a de trajetórias sociais. Arranjando os nomes da vez por este olho, a organização fica diferente. Bruno Covas, João Campos, Marília Arraes beberam todos o mesmo leite da política quando criancinhas. Nasceram em clãs de políticos profissionais. Educados para o mando, herdaram estilos, símbolos, aliados, bandeiras. Cresceram imersos em rede de parentes, amigos, padrinhos, que lhes transmitiram laços sociais, recursos financeiros e habilidades políticas. Construíram-se como personas públicas por osmose.
Nada acidental que Marília e João sejam primos. Uma enorme teia de parentela, desde os tempos do Império, ocupa os postos altos nos partidos, como no Estado. Deste ângulo, a atual floração das linhagens Covas, Campos, Arraes nasce no mesmo terreno fértil que, nos anos 1990, deu Luís Eduardo Magalhães, Fernando Collor, Aécio Neves, Roseana Sarney. Todos, então, também saudados como novidades. Quem tem este gênero de trajetória política, a dos estabelecidos, pode brigar à vontade, errar à vontade, pois contará sempre com este patrimônio inalienável: o nome. Outro tipo de trajetória é o dos que não nasceram políticos, tornaram-se. No Brasil, como na França, que nossa esquerda tanto aprecia, as escolas superiores são celeiros de políticos. Aqui, os cursos públicos de engenharia e os de humanas, desde que criados, são produtores regulares de políticos profissionais. Os líderes recentemente despontando à esquerda, Fernando Haddad, Manuela d’Ávila, Guilherme Boulos, surgiram nesse terreno, não brotaram de famílias dominantes em partidos.
Seu patrimônio é outro. Em vez do sangue, o treino. Seja o retórico, que os cursos universitários de humanas começam e o hábito de discursar todo dia, por anos, lapida. Seja o aprendizado de técnicas de mobilização social no campo movimentista, a começar pelo movimento estudantil. Nos anos de formação, em colégios particulares e em humanidades das universidades públicas, construíram teia de amigos e conhecidos, garantidora da imersão nas redes intelectuais e artísticas que dominam os meios cultos do país e que lhes valerá por toda a vida. As duas teias sociais são tão antigas quanto efetivas. De neófitos os novos líderes não têm nada. São sucedâneos jovens de provectos parecidos. Mas, por mais que, na barba e na verve, Boulos emule Lula, nem ganhou nos estratos baixos, nem veio deles. Nenhum dos líderes emergentes pode ostentar o enraizamento no subsolo da sociedade. Por mais que o PT esteja combalido, neste quesito, ninguém da nova geração se compara a seu líder, ídolo e problema. Lula veio de lá de onde nenhum dos triunfantes ou promissores é oriundo. Segue sem substituto.

*”Acordo entre Doria e Rodrigo Garcia embaralha disputa pelo Governo de SP em 2022”*
*”Prêmio 99 de Jornalismo, sobre mobilidade urbana, anuncia reportagens vencedoras”*

REINALDO AZEVEDO - *”O juiz Moro já teria mandado prender o empresário Moro”*: Segundo os critérios com que o então juiz Sergio Moro conduziu a Lava Jato —e ele a conduziu, não é mesmo?—, o agora "sócio-diretor" da Alvarez & Marsal estaria em prisão preventiva, que seria decretada no mesmo dia em que se efetuaria um espalhafatoso mandado de busca e apreensão em seus endereços, devidamente acompanhado por ao menos uma equipe de televisão, previamente avisada. Tudo combinado com os parças do MPF.
Homens de preto invadiriam a sua casa. Com algum requinte, um helicóptero sobrevoaria a residência para indicar a periculosidade da pessoa sob investigação. Ato contínuo, haveria uma entrevista dos procuradores e do delegado federal encarregados da operação. Nessa oportunidade, então, acusações novas se fariam, ausentes do despacho do juiz que autorizou o espetáculo. E pronto! A defesa não teria o que dizer porque sem acesso aos autos. No dia seguinte, um repórter farejador de procuradores e delegados vazaria uma informação exclusiva contra o preso. Moro mandaria prender Moro com base em que fundamento? "Garantia da ordem econômica e conveniência da instrução criminal", conforme estabelece o artigo 312 do Código de Processo Penal, uma vez que o suposto crime investigado é grave: corrupção passiva, segundo dispõe o artigo 317 do Código Penal. Lá está escrito: "Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena "“ reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa". Mas Moro fez isso?
"Calma, senhores!", diria o diligente juiz morista. As decisões foram tomadas "em regime de cognição sumária" apenas. É que não existe circo sem espetáculo. Como diria o ministro Luiz Fux, o amigão de Adriana Ancelmo, não podemos permitir "que a Lava Jato seja desconstruída", com o que concorda o punitivismo dedicado de Edson Fachin e Cármen Lúcia, por exemplo. Depois de ter ajudado a quebrar a indústria de construção pesada no país, inclusive a Odebrecht, Moro se torna "sócio-diretor" da empresa que comanda a recuperação judicial do grupo. A A & M já recebeu R$ 17,6 milhões pelo serviço. Fez o mesmo com a OAS e tem ainda como clientes a Queiroz Galvão e a Sete Brasil, todas elas vitimadas pela dita "maior operação de combate à corrupção da Terra". O então juiz homologou os benefícios da delação concedidos a diretores de empresas que caíram na teia da Lava Jato e gerenciou as facilidades dos acordos de leniência. Os beneficiários de sua ação são agora clientes da empresa que vai enriquecê-lo. Ganha o pão onde comeu a carne. No terreno moral, o conflito de interesses é óbvio, a menos que o observador já tenha se despedido de tais pruridos. Mas isso é pouco. É preciso que se apure a eventual ocorrência de crime de corrupção passiva.
Como repudio os métodos de Moro e do morismo, não defendo que o ex-juiz e agora empresário seja preso antes de eventual condenação, se condenado for, sempre de olho no 312 do CPP. Ele tem de ter direito àquilo que sempre negou às suas vítimas: as garantias de um Estado democrático e de Direito. Mas, para tanto, precisa ser investigado. Augusto Aras, no entanto, deve se acoelhar. Aqui e ali, os passadores de pano afirmam que a investigação constituiria uma soma de vinganças: do PT e de Bolsonaro. Assim, mais uma vez, Moro pode se colocar acima da lei e da moralidade, protegido pela mesma esfera de inimputabilidade que levou a Lava Jato a destruir o devido processo legal no país, jogando-nos no buraco do bolsonarismo. Para arrematar: o juiz Moro rejeitou relatórios da A & M, de que agora o empresário Moro é sócio, segundo os quais o tal tríplex de Guarujá pertencia à OAS, não a Lula. Até o objeto do processo que levou o ex-presidente à cadeia era fraudulento. Faz sentido. O líder petista já estava condenado antes de qualquer investigação, como deixou claro a Vaza Jato. Por ato falho ou desconhecimento da I & B (Inculta e Bela), a A&M informou nesta quarta que Moro vai se ocupar do "desenvolvimento de políticas antifraude e corrupção".
Bingo!

*”Regiões metropolitanas têm troca de guarda de partidos, sem hegemonia das capitais”* - Termômetro da política nos estados, o mapa partidário das cinco principais regiões metropolitanas do país após a eleição municipal deste ano mostra um cenário de descontinuidade dos partidos à frente das prefeituras em relação a 2016. Também indica uma dificuldade dos grupos políticos vencedores nas capitais em repetir o êxito na maioria das cidades vizinhas. Se comparados com quatro anos atrás, dois terços dos prefeitos eleitos agora nessas regiões metropolitanas são de outras legendas —muitas vezes, são os mesmos prefeitos reeleitos que mudaram de partido. A reportagem analisou o quadro partidário das cinco maiores regiões metropolitanas do país, de acordo com o IBGE, onde há eleições: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Fortaleza e Porto Alegre. Não há eleição municipal no Distrito Federal. Somados, são 164 municípios. São agrupamentos urbanos de alta relevância na política local, seja pelo volume de seu eleitorado ou pela tradição de formarem novas lideranças para os partidos. Só as cidades vizinhas à capital paulista possuem somadas uma população de quase 10 milhões, quantidade superior à da maioria dos 26 estados brasileiros.
O horário eleitoral gratuito na TV nas grandes cidades, que geralmente é retransmitido para localidades vizinhas sem emissoras, costumava ser considerado um fator que estimulava a difusão do partido vitorioso nas capitais por áreas próximas. “Quem governa em cidade de região metropolitana tem mais holofote sobre si”, afirma o cientista político Marco Antonio Teixeira, coordenador do curso de administração pública da FGV (Fundação Getulio Vargas). As trocas de partido, aponta, têm relação com os projetos de poder da liderança política. Teixeira cita como exemplo a segunda maior cidade de São Paulo, Guarulhos, cujo prefeito, Guti, foi eleito em 2016 pelo PSB e trocou de partido. Agora reelegeu-se pelo PSD. Em São Paulo, o PSB e o PSD têm como seus principais caciques o ex-governador Márcio França e o ex-prefeito da capital Gilberto Kassab.
Guti se filiou ao PSD, sigla mais alinhada à atual gestão estadual, depois de França perder a disputa pelo governo em 2018 para João Doria (PSDB). Acompanharam o movimento dele nove vereadores da base. “Provavelmente o Guti viu no PSD maiores possibilidades de ele ter status político na Prefeitura de Guarulhos do que aqueles que o PSB oferecia”, afirma Teixeira. “Mas, normalmente, quanto mais forte e estável o partido, maior a possibilidade de reter a liderança em seus quadros.” O PSD também foi o partido que abrigou um dos prefeitos reeleitos nessas capitais: Alexandre Kalil, que se candidatou em Belo Horizonte pelo extinto nanico PHS em 2016. Além dele, o empresário Vittorio Medioli disputou em Betim, na região metropolitana da capital mineira, pelo mesmo partido. O PHS foi incorporado pelo Podemos, mas a dupla de aliados decidiu se abrigar no PSD. Neste ano, ambos foram reeleitos em primeiro turno pela legenda. Apesar da força política que Kalil e Medioli têm na região, o PSD elegeu apenas outros sete prefeitos entre os 50 municípios do entorno de Belo Horizonte. Em 2016, seis municípios tiveram eleitos pelo partido. Há casos em que a região metropolitana é tão extensa que os problemas locais têm poucas relações com a política da capital. Sete Lagoas, que elegeu um prefeito do PMDB em 2016 e um do Patriota neste ano, fica a 75 km de Belo Horizonte.
Mesmo em metrópoles com um grupo político hegemônico mais consolidado, caso do PDT de Ciro Gomes em Fortaleza, ou dos tucanos em São Paulo, ainda assim esses partidos não formam uma maioria ampla de prefeituras no entorno das capitais. Na capital do Ceará, o eleito foi José Sarto (PDT). O candidato derrotado por ele no segundo turno, Capitão Wagner (Pros), acabou contribuindo para a vitória de um correligionário em uma cidade vizinha, Caucaia, de 365 mil habitantes. O PDT fez mais quatro prefeitos na região. O caso mais simbólico do isolamento é o da região metropolitana do Rio. O DEM, partido do prefeito eleito da capital, Eduardo Paes, conseguiu eleger apenas mais um outro prefeito nas cidades próximas, São João de Meriti, de 473 mil habitantes.
Antigo líder no ranking local de prefeitos, o MDB também encolheu na região. O partido no estado viveu seu auge nos tempos do ex-governador Sérgio Cabral e posteriormente teve seus principais líderes presos em desdobramentos da Operação Lava Jato. Agora, só governará duas cidades na região metropolitana. PL e PP administrarão quatro cada um. Também na região metropolitana de Porto Alegre é difícil apontar um partido dominante. O mais vitorioso foi o PP, com 11 dos 34 prefeitos eleitos, mas a agremiação não possui hoje uma liderança inconteste no estado, que é governado pelo PSDB. O MDB, partido do prefeito eleito de Porto Alegre, Sebastião Melo, conquistou três prefeituras próximas. O cenário também reflete a crescente pulverização do quadro partidário municipal, com uma concentração menor de prefeituras sob o comando de partidos como MDB e PSDB e o fortalecimento de forças políticas que costumavam ser coadjuvantes, caso do PSD e outros partidos do chamado centrão.
Na Grande São Paulo, o PSDB se manteve com 11 das 39 prefeituras. Em duas delas, porém, São Caetano do Sul e São Lourenço da Serra, o resultado está pendente de julgamento pela Justiça Eleitoral. Existe a possibilidade de ocorrer nova eleição. A segunda sigla com mais prefeitos eleitos é o PL, com 8. Dos 22 prefeitos que tentaram a reeleição, sem contar o tucano Bruno Covas, 14 foram reeleitos. Há cidades que fizeram caminhos parecidos com o da capital paulista. Santo André e São Bernardo do Campo, no ABC, elegeram um prefeito do PT em 2012 e, em 2016 e 2020, optaram por um tucano. A região metropolitana foi o berço, no início dos anos 1980, do PT, que chegou a governar um grupo de municípios apelidado de "cinturão vermelho". Além da capital, a sigla em 2012 triunfou em oito cidades próximas, entre elas Santo André e São Bernardo. Na eleição municipal seguinte, só venceu em uma delas e, a partir de 2021, governará Mauá e Diadema.

*”Promotores de SP pedem prioridade à categoria na vacinação contra Covid-19”*
*”Bolsonaro faz com que a sociedade aceite ataques contra mulheres, diz Manuela d'Ávila”*
*”Um em cada três prefeitos eleitos trocou de partido neste ano”*
ANÁLISE - *”De reação do centro a desalento da periferia, aumento da abstenção reflete contrastes de SP”*

*”Governo Bolsonaro deixa regularização fundiária com municípios, e procuradores veem estímulo a grilagem”* - O governo Jair Bolsonaro criou um programa que terceiriza aos municípios atribuições de regularização fundiária de áreas da União e provocou a reação de procuradores que lidam com reforma agrária e que veem a possibilidade de estímulo à grilagem. Chamado Titula Brasil, o programa foi instituído por meio de uma portaria publicada nesta quinta-feira (3) no Diário Oficial da União. Assinam a portaria o secretário especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Luiz Nabhan Garcia, e o presidente do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), Geraldo Melo Filho. Nabhan é líder ruralista e amigo do presidente da República. Dentro do Ministério da Agricultura, sempre foi visto como o número dois da pasta. A portaria cria o núcleo municipal de regularização fundiária, a quem caberá executar o programa destinado à titulação de terras. Nesse grupo atuarão servidores disponibilizados pelos municípios. Segundo a portaria, os serviços do núcleo "serão organizados e executados conforme dispuser o Incra". A implementação e a coordenação desses núcleos nas cidades são uma atribuição do instituto. A supervisão e o monitoramento dos resultados caberão à secretaria de Nabhan. A participação dos municípios será voluntária.
Procuradores da República que atuam diretamente com o assunto fundiário criticaram a decisão do governo Bolsonaro de criar um programa que terceiriza aos municípios as atribuições de regularização fundiária. "O governo quer abrir mão de exercer seu papel na reforma agrária e favorecer a chancela da ocupação ilegal de terras públicas", disse à Folha o procurador Julio Araujo Junior, coordenador do grupo de reforma agrária da PFDC (Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão), um colegiado que funciona no âmbito da PGR (Procuradoria-Geral da República). Junior vê como "absurda" a descentralização das atividades, a serem repassadas a servidores municipais. "É o aprofundamento da tentativa do governo federal de se esquivar do dever de realizar a reforma agrária por meio da desapropriação de terras que não cumprem função social ou por meio da destinação de terras públicas."
Segundo o procurador, diante do "histórico dessas terras públicas", a iniciativa favorecerá a grilagem. O procurador Raphael Bevilaqua, que atua em diversos processos por grilagem de terras públicas em Rondônia e que também integra o grupo de reforma agrária da PGR, é outro que vê o programa do governo Bolsonaro com preocupação. "É uma opção do governo por favorecer pessoas que têm ocupado irregularmente terras públicas, em vez de promover a reforma agrária, por meio da redistribuição de terras", afirmou o procurador. O integrante do MPF (Ministério Público Federal) aponta uma resistência do governo em retomar essas áreas, mesmo em casos em que já há decisões da Justiça Federal nesse sentido. "Vai haver um juízo político muito forte. É o poder local que estará lidando com a regularização. E isto terá um impacto na distribuição de terras públicas", disse Bevilaqua, para quem a iniciativa pode afrontar a Constituição.
O MPF investiga a paralisia do governo Bolsonaro em relação a projetos de reforma agrária, especialmente a interrupção da desapropriação de terras improdutivas, a ausência de projetos novos de assentamento e a resistência em efetivar a retomada de terras públicas, já determinada em diferentes decisões judiciais. À Folha Nabhan criticou o MPF e defendeu o programa instituído por meio de portaria. "Daqui a pouco, vamos precisar saber qual é a atribuição do Ministério Público. Não é mais de guardião da lei. Tudo eles invertem os valores", disse. O secretário afirmou que a lei permite parcerias e que elas se fazem necessárias diante das restrições orçamentárias do Incra e do governo. "O Incra está numa situação orçamentária extremamente complicada, o país também", disse Nabhan. Para o líder ruralista, é preciso "acabar com essa história de posseiros, de assentados". "Precisamos, sim, dar o título da terra." Nabhan afirmou que é legítimo que os prefeitos estejam interessados em regularização fundiária. "Só a esquerda, a oposição e parte do MPF não são interessados nisso", afirmou.
O secretário do Ministério da Agricultura disse que o programa vai contribuir para combater a grilagem de terra, e não o contrário. "Tem família esperando há 50 anos. Muitas vezes, não se consegue punir um grileiro porque não existe um CPF. Não existe mais lugar para a grilagem nesse país." Em setembro, Nabhan deu encaminhamento a um pedido do Incra para que policiais da Força Nacional de Segurança Pública fossem enviados a assentamentos no sul da Bahia. O Ministério da Justiça e Segurança Pública concordou com o pedido e mandou os policiais à região. O Incra e Nabhan argumentaram que integrantes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) provocavam conflitos na região, o que demandaria a presença da Força Nacional. O Governo da Bahia, administrado por Rui Costa (PT), ingressou no STF (Supremo Tribunal Federal) com uma ação contra o deslocamento da Força Nacional ao estado, sem um pedido formal por parte do governo. Primeiro, o ministro Edson Fachin concordou com o pedido e determinou a retirada dos policiais em 48 horas. Depois, a decisão foi confirmada em plenário.

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*”PIB do Brasil tem crescimento de 7,7% no 3º trimestre, abaixo da projeção do governo e do mercado”* - A economia brasileira registrou crescimento recorde de 7,7% no terceiro trimestre de 2020 na comparação com os três meses anteriores, segundo dados do PIB (Produto Interno Bruto) divulgados nesta quinta-feira (3) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O número veio abaixo das projeções do governo e do mercado. Apesar do crescimento recorde do PIB, a economia brasileira ainda não voltou ao nível pré-crise. Ainda está 4,1% abaixo do último trimestre de 2019. O resultado também se encontra 7,3% abaixo do pico registrado no início de 2014. Em relação ao mesmo período de 2019, houve queda de 3,9%. O PIB recuou 5% no acumulado do ano e 3,4% em 12 meses. Segundo o IBGE, a economia voltou ao patamar do início de 2017, quando começou a saída da recessão de 2014-2016. ​Analistas consultados pela agência Bloomberg projetavam crescimento de 8,7% na comparação com o trimestre anterior e queda de 3,6% em relação ao mesmo período do ano passado.
O Ministério da Economia projetava expansão de 8,3% no terceiro trimestre em relação ao segundo e queda de 3,9% sobre o mesmo período de 2019. Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, afirma que tanto o comércio como a indústria voltaram ao patamar pré-crise. Os serviços, setor que mais pesa no PIB, ainda estão no patamar do começo de 2017. A agropecuária continua crescendo nas taxas interanuais. Houve queda em relação ao segundo trimestre, mas por questões de safra, mas é a única atividade que cresce no acumulado do ano. “A gente ainda não voltou ao patamar pré-crise principalmente por causa dos serviços, mas não é só isso. A construção cresceu ante o trimestre anterior. A parte imobiliária se recuperou bastante, mas a parte de infraestrutura, até por causa dos gastos do governo, continua puxando para baixo também”, diz Rebeca. A taxa trimestral de crescimento é a maior registrada na série histórica do instituto, que começa em 1996, mas o dado está influenciado pela base de comparação, devido à queda recorde verificada entre abril e junho deste ano.
Reflete ainda um pacote de estímulos fiscais para enfrentar a pandemia que está entre os maiores do mundo, cerca de R$ 400 bilhões naqueles três meses (25% do PIB do trimestre), juros baixos e um cenário externo favorável para as exportações brasileiras. A tendência está em linha com o verificado em outros países. Segundo dados compilados pela OCDE, entre cerca de 30 economias que já divulgaram o resultado do terceiro trimestre, o crescimento do PIB ficou em 8,5% na média. O IBGE divulgou também a revisão de resultados anteriores do PIB. A alta de 1,1% para o ano de 2018 já havia sido revisada para 1,8%. Para 2019, a revisão foi de 1,1% para 1,4%. Para os dois primeiros trimestres de 2020, os novos números são -1,5% e -9,6%. A divulgação anterior apontou -2,2% e -9,7%.
PRÓXIMOS TRIMESTRES
Apesar do crescimento recorde do PIB, a economia brasileira ainda não voltou ao nível pré-crise e se encontra nos menores patamares dos últimos dez anos, que devem se encerrar como uma nova década perdida. A expectativa agora é de um crescimento mais lento nos últimos três meses deste ano e de retorno ao patamar de 2019 em algum momento de 2021 ou 2022.
RECESSÃO
Em junho, o Codace (Comitê de Datação de Ciclos Econômicos), órgão ligado ao Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) e formado por oito economistas de diversas instituições, definiu que o Brasil entrou em recessão no primeiro trimestre de 2020, encerrando um ciclo de fraco crescimento de três anos (2017-2019). A expectativa é que a recessão atual seja curta, mas com intensidade recorde, considerando dados dos últimos 40 anos. Não há uma definição oficial sobre o que caracteriza uma recessão. Embora alguns economistas utilizem a métrica de que esse é o período marcado por dois trimestres seguidos de queda na atividade, o Codace considera uma análise mais ampla de dados. Para o comitê, o declínio na atividade econômica de forma disseminada entre diferentes setores econômicos é denominado recessão.

ENTREVISTA - *”Acertar o PIB em cima é sorte; competência é errar pouco, diz FGV”*
*”Guedes diz que economia volta em V e equipe espera avanço do PIB sem auxílio emergencial em 2021”*

*”'Dados são realmente fantásticos', diz Bolsonaro sobre PIB com resultado abaixo da projeção do mercado”* - Mesmo com um resultado inferior à previsão feita pelo mercado, o presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta quinta-feira (3) que o crescimento de 7,7% do PIB (Produto Interno Bruto) no terceiro trimestre deste ano é fantástico. Em live semanal, o presidente repetiu discurso do ministro da Economia, Paulo Guedes, e disse que a economia brasileira está crescendo em V. O crescimento de 7,7% foi um ponto percentual abaixo da projeção de mercado. "A economia está crescendo em V. E os dados são realmente fantásticos", afirmou Bolsonaro. O resultado é atribuído pela maioria dos economistas à revisão feita pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nos dados a partir de 2018, que jogaram os números desde aquele ano para cima. Apesar do crescimento recorde do PIB, a economia brasileira ainda não voltou ao nível pré-crise. Ainda está 4,1% abaixo do último trimestre de 2019. O resultado também se encontra 7,3% abaixo do pico registrado no início de 2014. Em relação ao mesmo período de 2019, houve queda de 3,9%. O PIB recuou 5% no acumulado do ano e 3,4% em 12 meses.​ Segundo o IBGE, a economia voltou ao patamar do início de 2017, quando começou a saída da recessão de 2014-2016. Nesta quinta-feira (3), Guedes afirmou que espera novos avanços da atividade econômica em 2021 sem novos auxílios emergenciais por conta da pandemia do novo coronavírus.

OPINIÃO - *”Pior momento da crise ficou para trás, mas uma retomada forte do PIB não está garantida”*
PAINEL S.A. - *”Liberação de verba para obras pode ampliar pressão sobre teto de gastos”*
PAINEL S.A. - *”Atacadistas e distribuidores recuperam fôlego com retomada no varejo, diz pesquisa”*
PAINEL S.A. - *”Pedidos de recuperação judicial cresceram 20% neste ano, diz birô de crédito”*
PAINEL S.A. - *”Porto de Santos encomenda estudos para túnel até o Guarujá”*

*”Pandemia segura recuperação do setor de serviços, aponta IBGE”*
ANÁLISE - *”Retomada dos serviços pode gerar alta da desigualdade e inflação”*
ANÁLISE - *”Brasileiro poupa, guarda gordura para 2021 e PIB anda menos do que se esperava”*
ANÁLISE - *”PIB do agro perde força, e incertezas para 2021 aumentam”*
OPINIÃO - *”Dados mostram que auxílio era necessário para arrefecer recessão”*

*”Indústria e comércio voltam ao nível pré-crise com auxílio e crédito”*
ANÁLISE - *”Taxa de investimentos brasileira, em 16,2%, segue anêmica”*
VINICIUS TORRES FREIRE - *”A receita para combinar mais miséria com um PIB melhor em 2021”*
*”Após planejar manter meta flexível, Guedes recua e vai alterar proposta para 2021”*

*”Estamos em uma fase de desentendimento político, diz Guedes sobre reformas”*
*”Dólar cai quase 2% e vai a R$ 5,14, menor valor desde julho”*

NELSON BARBOSA - *”O V imperfeito do PIB”*: Saiu a primeira estimativa oficial do PIB no terceiro trimestre de 2020. Digo estimativa, pois o número provavelmente será revisado, como tem sido praxe nos últimos anos. Para dar um exemplo, o IBGE inicialmente estimou que o PIB tivesse crescido 1,1% em 2018. Passados dois anos e com informações mais detalhadas, o IBGE revisou o crescimento de 2018 para 1,8%, o que gerou autocongratulação por parte de alguns ex-membros do governo Temer, esquecendo que eles mesmos haviam prometido expansão de 3% ou mais para aquele ano... mas estou divagando. A primeira estimativa do IBGE para o PIB é geralmente conservadora. O número definitivo só sai depois de dois anos, ou seja, conheceremos melhor o PIB de 2020 no fim de 2022. Isso também acontece em outros países, mas um pouco de apoio (orçamento) ao IBGE diminuiria o tempo de revisão... estou novamente divagando. Aos números! Há duas maneiras de ler o PIB. A primeira é calcular o crescimento em relação ao período imediatamente anterior. Como a atividade econômica tem flutuações periódicas (devido ao clima, número de feriados e outros fatores), é preciso fazer ajuste sazonal nesse tipo de cálculo.
No terceiro trimestre de 2020, o PIB com ajuste sazonal teve crescimento de 7,7% em relação ao período anterior. A recuperação parece forte, mas, dado que houve queda de 9,6% do mesmo indicador no segundo trimestre, a recuperação foi incompleta, um “V” imperfeito, como vem acontecendo em vários países do mundo. A outra forma de ler o resultado é comparar PIB do terceiro trimestre de 2020 com o terceiro trimestre de 2019. Nesse caso houve queda, de 3,9%, a terceira redução consecutiva por esse critério, pois a economia brasileira já estava fraca antes da pandemia, e a Covid-19 derrubou o nível de atividade a partir de março. Seja qual for a métrica escolhida, o choque da pandemia só não foi maior porque o governo, empurrado pelo Congresso, adotou medidas fortemente expansionistas contra a crise. A principal foi o auxílio emergencial, com previsão de injeção de R$ 374 bilhões na renda das famílias ao longo deste ano. Em segundo lugar veio a ajuda temporária a estados e municípios, que deve atingir R$ 79 bilhões em 2020. Diante de tamanho estímulo fiscal, alguns especialistas em prever o passado já decretaram que o Brasil gastou demais contra a Covid-19. Trata-se daquele tipo de pessoa que, da segurança de seu escritório na Faria Lima, pontifica o que fazer com a renda dos mais pobres, mas pouco fala da renda dos mais ricos.
O estímulo fiscal foi excessivo? Talvez sim, mas, durante o auge da crise, vários economistas (de Prêmios Nobel ao FMI, incluindo a heterodoxia nacional) recomendaram arriscar errar para mais em vez de para menos. Por que seria menos grave errar para mais? Porque isso salvaria mais vidas e empregos e, passada a tempestade, seria menos difícil corrigir um excesso do que uma insuficiência de estímulo fiscal. Agora a discussão passa para 2021 e, mesmo com expectativa de crescimento de 3,5% no próximo ano (média das expectativas mais recentes do mercado), não voltaremos rapidamente ao nível de renda pré pandemia. Com base nos resultados do terceiro trimestre, espera-se queda de 4,5% do PIB em 2020, e, portanto, será necessário crescimento de 4,7% em 2021 para voltarmos ao nível de renda de 2019. É possível? Sim, mas isso requer mudança de estratégia fiscal, novamente arriscando errar para mais em medidas de reconstrução econômica, como se discute no resto do mundo e até no FMI, mas ainda não em Brasília

*”Fila do Bolsa Família volta a 1 milhão após redução do auxílio emergencial”* - Com a redução no valor do auxílio emergencial, a fila de espera para entrar no Bolsa Família subiu. No fim de setembro, ela alcançou o patamar de 1 milhão de cadastros. A lista, portanto, voltou ao que foi registrado no fim do ano passado, quando, após sucessivos cortes da cobertura e congelamento do ingresso ao programa, o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) deixou 1 milhão de famílias à espera de assistência social. O Ministério da Cidadania havia suspendido a análise dos requerimentos para acesso ao Bolsa Família durante o pagamento do auxílio emergencial no valor de R$ 600 por pessoa. O motivo é que a distribuição do benefício emergencial atendeu a mais pessoas que o programa social. No fim de setembro, o governo passou a cortar o auxílio emergencial para o valor de R$ 300. O ministério voltou a avaliar cadastros no Bolsa Família.
Segundo dados obtidos pela Folha, chegou a 999.673 o número de famílias que preencheram os requisitos, mas ainda aguardam para entrar no programa. A tendência, porém, é a fila subir ainda com o fim do auxílio, previsto para janeiro do próximo ano. A avaliação é de técnicos do governo. A crise econômica provocada pelo novo coronavírus e a possibilidade de uma segunda onda na pandemia, segundo eles, devem aumentar a pobreza no país. O orçamento do Bolsa Família foi reforçado para o próximo ano. Os recursos passaram de R$ 32,5 bilhões em 2020 para R$ 34,9 bilhões. Mesmo com o aumento, o programa deve começar 2021 já pressionado. Atualmente, são atendidas 14,28 milhões de famílias. A verba prevista para o próximo ano é suficiente para transferir renda para 15,2 milhões de famílias.
Com isso, a fila de 1 milhão de lares, registrada no fim de setembro, já ocupa o espaço a ser aberto pela ampliação do orçamento no próximo ano. Os cadastros aprovados após setembro, então, impactam o Bolsa Família. Procurado, o Ministério da Cidadania não se manifestou sobre os questionamentos da reportagem. O programa atende famílias com filhos de 0 a 17 anos e que vivem em situação de extrema pobreza, com renda per capita de até R$ 89 mensais, e pobreza, com renda de R$ 89,01 a R$ 178. O benefício médio foi de R$ 191,86 até março. A partir de abril, quando foi criado o auxílio emergencial, o valor recebido pelas famílias passou a ser o mais favorável a elas —benefício do Bolsa Família ou o do auxílio. De junho a agosto, o governo decidiu não selecionar pedidos de ingresso ao Bolsa Família, segundo resposta encaminhado pelo Ministério da Cidadania ao deputado Ivan Valente (PSOL-SP). O governo tem argumentado que todas as pessoas que estão na fila de espera recebem o auxílio emergencial. No entanto, dados obtidos pela Folha, em junho, revelam que, na fila de 522,6 mil famílias registrada no mês, 49 mil não estavam cadastradas para receber o auxílio emergencial. Portanto, apesar de estarem em situação de pobreza ou extrema pobreza, não recebiam, na época, nenhum benefício.
O Bolsa Família é o carro-chefe dos programas sociais do governo e foi criado em gestão do PT. Ele transfere renda diretamente para os mais pobres. O auxílio emergencial tem caráter provisório e deve acabar em dezembro. A fila de espera do Bolsa Família se forma quando cadastros já aprovados pelo governo ficam mais de 45 dias sem uma resposta definitiva, ou seja, sem entrar efetivamente no programa. O prazo vinha sendo cumprido desde agosto de 2017, durante a gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB). Porém, por falta de recursos, o programa não consegue cobrir a todos desde junho do ano passado. Apesar de alertas internos, o governo Bolsonaro rejeitou, no ano passado, ampliar o orçamento do Bolsa Família para atender os mais pobres. A disposição de investir na área social, no entanto, mudou nos últimos meses. A motivação é essencialmente política. Ao ver sua popularidade subir com o pagamento do auxílio emergencial na pandemia, Bolsonaro —com apoio da ala política do governo— intensificou as articulações para uma reformulação do Bolsa Família, que estenderia o programa e, até mesmo, trocaria o nome.
O plano, contudo, esbarrou na dificuldade de construir um consenso para cortar despesas no Orçamento de 2021 e, assim, encontrar dinheiro para bancar um programa social criado por Bolsonaro. Técnicos do Ministério da Economia chegaram a prever que, em setembro, o novo programa já estaria rodando. Esse é o jargão para dizer que a iniciativa já estaria em vigor. Dessa forma, mais pessoas estariam sendo atendidas pelo Bolsa Família turbinado. O auxílio emergencial não precisaria ser prorrogado. Sem avanço, o governo e o Congresso admitem que 2021 irá começar sem mudanças —retomando o funcionamento do Bolsa Família, sem recursos do auxílio emergencial.

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*”Pazuello gasta R$ 88 mi em propagandas de Covid-19 que ignoram prevenção e exaltam o agro”* - Desde que assumiu o Ministério da Saúde, há mais de seis meses, o general Eduardo Pazuello gastou ao menos R$ 88 milhões em propagandas ligadas à Covid-19. Mas em vez de informações sobre distanciamento social e ventilação em locais fechados, as mensagens exaltam os feitos do governo, a reabertura do comércio e até a força do agronegócio. "O que temos visto nas propagandas é assustador. É o negacionismo como política pública, porque diminui o tamanho do problema. Não deixa claro para a população que estamos em uma pandemia e que isso é grave”, afirma o médico José David Urbaez, da Sociedade Brasileira de Infectologia. “Se a informação não é clara, a população fica perdida e acha que não vai pegar a doença”, diz a médica Gulnar Azevedo e Silva, presidente da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva).
A verba gasta em publicidade por Pazuello –suficiente para pagar uma parcela de auxílio de R$ 300 a 293 mil pessoas– é mais alta do que a gasta pelos seus antecessores, Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich. No total, o ministério já gastou R$ 162,4 milhões em publicidade sobre a pandemia. Um terço dos R$ 88 milhões gastos por Pazuello –ou R$ 30 milhões – foi dedicado à campanha sobre o agronegócio e à reabertura dos comércios, segundo apurou a Repórter Brasil e confirmou o ministério. O comercial foi veiculado em rádio, TV, internet e locais como unidades de saúde em julho e agosto, quando mais de mil pessoas morriam por dia de Covid-19. “Em meio à mais grave crise da história, um setor foi fundamental para o país. Enquanto muitos tiveram que parar, o agro brasileiro continuou trabalhando”, diz o narrador da propaganda, que traz também o depoimento de uma caminhoneira. “Vamos voltar, gente, vamos seguir em frente. Só que um cuidando do outro.” Embora as pessoas retratadas usem máscaras, não há informações sobre cuidados que poderiam ser adotados para o retorno seguro das atividades.
Questionado, o Ministério da Saúde disse que a campanha “refere-se ao processo de retomada das atividades no Brasil e que, sendo o agronegócio um setor de grande importância para a população, foi demonstrado que não houve a interrupção das atividades”. A pasta afirmou que os vídeos demonstram cuidados efetivos, “como uso de máscaras, luvas, aparelhos de medição de temperatura e álcool em gel”. Para a pesquisadora Janara Sousa, do Laboratório de Educação, Informação e Comunicação em Saúde da UnB, abordar o agro foge da pauta do ministério, que deveria focar em saúde. "Que tipo de informação o ministério pode promover sobre o agro?". Para Nadja Piauitinga, do grupo de comunicação e saúde da Abrasco, a pasta pode até ser questionada pelos órgãos de controle por executar campanha sem perfil de utilidade pública. O Tribunal de Contas da União está de olho nas ações de comunicação do ministério. Em outubro, o ministro Benjamin Zymler determinou à pasta a elaboração de um plano de comunicação, já que “o controle da doença depende em grande medida das condutas dos indivíduos”. A Saúde informou que o documento está em atualização.
UTILIDADE PÚBLICA
Campanhas como as citadas acima são exemplo de mau uso do dinheiro público, segundo especialistas ouvidos pela Repórter Brasil. Isso porque o orçamento para comunicação do Ministério da Saúde, um dos maiores do governo, deve ser usado em propagandas de utilidade pública, segundo instrução normativa da Secom, para “alertar a população para a adoção de comportamentos que gerem benefícios individuais e/ou coletivos”. No entanto, em outra campanha da gestão Pazuello –batizada de “O cuidado continua” e que consumiu ao menos R$ 35 milhões–, o governo faz apenas autopromoção, ao destacar a distribuição de verbas, medicamentos e ventiladores em diferentes estados. “Dizer que está mandando dinheiro não é utilidade pública, é propaganda institucional, e não ajuda em nada no combate à pandemia”, critica Piauitinga.
Outro problema das propagandas é, segundo Piauitinga, o fato de elas "defenderem, nas entrelinhas, a cloroquina" –mesmo com pesquisas apontando que seu uso pode causar danos à saúde. Em maio, o ministério incluiu a medicação no protocolo do SUS para casos leves. Com a "agenda cloroquina" de Pazuello, medidas como o distanciamento, que apareciam com frequência nas gestões de Mandetta e Teich, ficaram em segundo plano. Na campanha “Coronavírus, tratamento precoce”, o ministério orienta os cidadãos a começar rapidamente o tratamento.
Para Urbaez, a mensagem faz as pessoas acreditarem na ilusão de que existem remédios contra a Covid-19. Ele diz que a campanha deveria orientar cidadãos com suspeita ou diagnóstico positivo a se isolarem. "Ninguém com sintomas deveria sair de casa, porque esse é um elemento importante de disseminação.” O Ministério da Saúde disse que o objetivo da campanha é “salvar vidas até a chegada da vacina”. “Os pacientes devem procurar um serviço de saúde assim que sentirem os primeiros sintomas.” Questionada sobre a falta de mensagens a respeito do distanciamento social, a pasta disse que “os estados e os municípios são os entes com competência e autonomia para definir medidas de distanciamento social desde abril, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal”. "No caso de uma pandemia, informação significa vida ou morte. Mas o país se perdeu na falta de uma liderança”, diz Suylan Midlej, professora de políticas públicas da UnB. A comunicação é um dos pilares para o controle da pandemia, avalia Urbaez. "É tão importante quanto o isolamento e a testagem."

*”Pazuello diz a ministros da Saúde do Mercosul que tratamento precoce 'fez e faz a diferença' para Covid”*
JULIOA BRAMCZYK - *”Pandemia e distanciamento social”*

*”FGV lança protocolo para atendimento policial em casos de LGBTFobia”* - Um protocolo com objetivo de orientar as polícias para atuação em casos de homotransfobia será lançado nesta quinta-feira (3). As diretrizes vão desde a abordagem até o registro de ocorrências e o acolhimento das vítimas. No país, só o Distrito Federal tem um regulamento do tipo. O documento foi elaborado pela Clínica de Políticas de Diversidade da FGV (Fundação Getulio Vargas) Direito de São Paulo, em parceria com a Renosp-LGBT (policiais LGBTs), a ABGLT (Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos) e a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais). Desde junho de 2019, homofobia e transfobia são enquadrados como crimes de racismo. O STF (Supremo Tribunal Federal) considerou que houve omissão legislativa a respeito do tema e determinou que os crimes fossem equiparados até que seja promulgada uma lei específica para criminalização desta conduta pelo Congresso Nacional.
Além disso, a Corte determinou que, em casos de homicídio doloso, a identificação de LGBTfobia deve ser considerada circunstância qualificadora do crime, por configurar motivo torpe. O comportamento LGBTfóbico é aquele que hostiliza, rejeita, discrimina, age com ódio ou violência contra gays, lésbicas, bisexuais, travestis e transexuais. É enumerando essa série de terminologias que o protocolo começa. Já que, se elas forem entendidas, podem evitar que os agentes violentem ainda mais as vítimas. Um exemplo é a diferença entre sexo biológico, identidade de gênero e orientação sexual. O protocolo prevê, que, em uma situação de abordagem, caso haja o uso de vestimentas e acessórios femininos, o policial precisa se referir a travestis e mulheres transsexuais com termos femininos.
Comentários ofensivos quanto ao nome, uso de palavras pejorativas e piadas que possam constranger não são permitidos. Travestis e transexuais, mesmo sem o nome alterado no registro civil, possuem o direito de serem chamados pelos seus nomes sociais. Em relação à pessoa transgênero, o mais adequado é evitar perguntas a respeito da realização ou não de cirurgias de mudança de sexo. Em travestis e mulheres transexuais, a busca pessoal deve ser feita por uma profissional de segurança mulher. Em homens transexuais, o abordado deve ser consultado sobre a forma de revista mais adequada. A revista de pertences também deve ser realizada de forma discreta. Ainda segundo o protocolo, quando uma pessoa LGBTQIA+ for à delegacia fazer uma denúncia, o policial deve mostrar interesse na ocorrência e incentiva-la a proceder com o registro. O agente não deve repetir o nome de registro da pessoa em voz alta caso seja diferente de seu nome social —é recomendado que a delegacia utilize um modelo padrão com campo específico de registro referente à identidade de gênero, orientação sexual, nome social, motivação LGBTfóbica, faixa etária, raça/cor e outros. É fundamental promover um atendimento humanizado, considerando a palavra da vítima, em um ambiente que assegure a privacidade do depoimento, e sem julgamentos. A partir da análise de cada caso, o policial poderá encaminhar a vítima para ser acolhida por outros serviços como centros de referência, assistência social e saúde.
Já quando a pessoa LGBTQIA+ for levada à delegacia como suspeita por um crime, a revista íntima jamais pode ser vexatória ou abusiva, deve priorizar o scanner corporal ou ser feita por policial do mesmo gênero, observado o gênero autodeclarado em detrimento do biológico. Em caso de ocorrências com pessoas transgênero, ela deve ser detida provisoriamente na delegacia apenas em cela individual. Caso não haja, o recolhimento deve ser providenciado pela Divisão de Controle e Custódia de Presos. Para Anderson Cavichioli, delegado de Polícia Civil e presidente da Rede Nacional de Operadores de Segurança Pública LGBTI+, a desconfiança das pessoas desse grupo em relação à atividade policial é histórica e explica os elevados índices de subnotificação das violências que as acometem. "As polícias, como a concretização do uso monopolizado da força pelo Estado, sempre foram usadas para a perseguição dessa parcela da população", escreveu ele, que vê pouca efetividade na aplicação da decisão do STF, mais de um ano depois do julgamento.
Em 2020, pela primeira vez, o Atlas da Violência compilou números sobre a população LGBTQI+, que costumam ser escassos. Vários estados sequer produzem dados do tipo. Segundo o Disque 100, o sistema de denúncias do governo federal, em 2018 foram feitas 1.685 queixas de violência contra essa população. Também foram registradas 138 denúncias de homicídio e 49 de tentativa de homicídio pelo telefone. Nos dados do Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), os pesquisadores viram uma tendência de redução dos homicídios deste grupo na transição de 2017 para 2018 —seguindo a tendência de queda dos homicídios no país. Por outro lado, houve aumento de 19,8% nos casos de violência contra os LGBTQI+ no mesmo período. Cresceu em 10,9% a violência física, em 7,4% a psicológica e em 76,8% outros tipos de violência, como a sexual. Houve queda de 7,6% nos registros de tortura. "Temos que ver esse número como a ponta do iceberg. Os dados são só uma parte, o que a gente consegue olhar", disse à época Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que elabora o estudo junto com o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

*”Fundação Palmares exclui 27 negros de lista de personalidades homenageadas”*
*”No dia da pessoa com deficiência, secretária surda é barrada no Planalto”*
*”Homem negro é identificado como autor de ofensa racista à prefeita eleita de Bauru”*
*”'Me remeteu a George Floyd, ao Beto', diz único condenado na Aldeia Maracanã, negro”*
*”Falta de água no Rio já dura 20 dias e deve persistir até 20 de dezembro”*

*”Morador pede na Justiça apagamento de mural com referências afro e indígenas em BH”* - Em novembro de 2018, um grupo de moradores do edifício Chiquito Lopes, no Centro de Belo Horizonte, se reuniu em uma assembleia extraordinária para discutir o mural que estava sendo pintado em uma empena do prédio de 14 andares, voltada para a rua dos Caetés. A intervenção da artista mineira Criola, parte do festival Cura (Circuito Urbano de Arte de Belo Horizonte), já havia sido iniciada, mas causou insatisfação em um dos moradores que exigiu que o trabalho fosse suspenso. “Não é uma simples pintura, é uma decoração de gosto duvidoso”, escreveu ele em uma mensagem enviada pelo WhatsApp ao síndico. Um dia antes da assembleia, o homem entrou na Justiça com uma petição inicial para que a obra fosse embargada e que o condomínio e o síndico desfizessem a “pintura irregular” —o juiz negou o pedido.
Dois anos depois, o caso segue na 22ª Vara Cível de BH; recentemente o Cura pediu para ser incluído como parte interessada no caso. Na última segunda-feira (30), questionado sobre o caso no programa Roda Viva da TV Cultura, o prefeito Alexandre Kalil (PSD), comentou dizendo: "Eu tenho dó desse boçal. Não passa de um boçaloide". A obra de Criola, “Híbrida Astral - Guardiã Brasileira”, é um mural de cores fortes e vivas, ocupando 1.365 metros quadrados, com uma mulher negra no centro e referências afro, indígenas e ao universo feminino. Criola diz ter querido aliar, no desenho, o tema dos povos que foram massacrados por um sistema racista e a questão da violência de gênero. “O feminicídio está associado a destruição da natureza, então quis abordar todos esses pontos. Porque, como mulher preta brasileira, são temas que me afetam e me causam preocupação enquanto uma cidadã artivista”, explica ela. Além de avaliar a obra como sendo de “gosto duvidoso”, o morador argumentou que ela poderia causar danos irreversíveis ao edifício.
A petição cita a lei 4.591 de 1964 e diz que a alteração não poderia acontecer sem aprovação unânime dos moradores. O condomínio porém afirma que o Código Civil em 2002 e a aprovação da maioria, em uma obra que não acarretou gastos, permitem isso. A Folha tentou contato com os advogados do morador, mas não obteve resposta até o encerramento deste texto. Na assembleia realizada com cerca de 55 moradores há dois anos, o homem foi o único contrário à obra. O prédio tem 167 apartamentos de um e dois quartos e cerca de 400 moradores, entre eles, idosos que moram sozinhos e estudantes vindos do interior. A reunião, lembra Jana Macruz, uma das idealizadoras e curadoras do Cura, também virou uma discussão sobre arte. Ela lembra que uma das moradoras disse que o mural faria do edifício uma referência geográfica —com seus tons de cinza, o prédio, que pertenceu à Vale e teve seu uso adaptado para fins residenciais por uma construtora, não tem nada que faça com que se destaque na paisagem. “A partir do momento que ele viu que a artista era negra e que seria desenhado o corpo de uma mulher negra com símbolos de matriz africana, acho que está explícito esse racismo”, diz Macruz. “O poder Judiciário está com uma questão forte nas mãos."
Neivaldo Ramos, 55, o síndico, que trabalhou na parte jurídica no Palácio das Artes e na Fundação Municipal de Cultura por anos, disse na assembleia não ser entendedor de arte, mas que o fato de gostar ou não da obra não faria dela menos artística. “Continuo compreendendo que a arte não é para ser entendida. Mesmo que se passe a vida tentando interpretar, sempre haverá perspectivas diferentes”, disse ele à Folha. A defesa de Neivaldo e do condomínio diz na contestação apresentada à Justiça que a postura do autor da petição é incompreensível e levantou a hipótese de que seu inconformismo denotaria racismo de sua parte. Por padrão do festival, a obra não é revelada previamente. Para instalar o mural no Chiquito Lopes, o Cura, que tem 18 obras em fachadas e empenas da capital mineira, bancou a reforma da superfície, reparando o revestimento e tapando buracos da parede, danificada pela exposição às intempéries. “Era um serviço que teria um custo elevado para a gente”, avalia o síndico. Segundo notas apresentadas pela defesa dele à Justiça, os reparos custaram em torno de R$ 105 mil. Jana Macruz diz que o festival tem realizado reparos desse tipo, a fim de garantir a durabilidade das obras.
Alguns murais da primeira edição, de 2017, que não passaram pelo preparo, já estão descascando. O acordo diz que o prédio pode apagar a obra depois de cinco anos. “Uma decisão do Poder Judiciário determinando o apagamento da obra agora vai corroborar o racismo estrutural”, diz o advogado que representa o síndico e o condomínio, Joviano Maia Mayer. Segundo o Cura, ainda que não tenham chegado à Justiça, outras duas obras enfrentaram episódios de preconceito. Um turbante e uma vela fizeram com que um mural de Luna Bastos, em 2019, fosse trocado do local originalmente planejado para ele. Neste ano, serpentes gigantes do artista indígena Jaider Esbell foram alvo, em redes sociais, de críticas de cunho religioso e xenófobo, associando à obra a cultura chinesa. Criola, que abriu com o Cura um abaixo-assinado contra o apagamento do mural, diz que não é a primeira vez que enfrenta racismo no seu trabalho. Em São Paulo, um prédio rejeitou ter um mural seu em uma empena porque um dos conselheiros teria dito que não aceitaria nenhuma arte que tratasse de minorias, raça, credo e afins. A artista, que assina com Diego Moura um painel com o retrato de Nelson Mandela no Minhocão, está tendo dificuldade de achar um novo espaço para a obra.

*”Suspeitos de participar de assalto a banco em Criciúma (SC) são presos”*
MÔNICA BERGAMO - *”'Desejo dias melhores para nossos heróis', diz Danilo Gentili após críticas por piada com enfermeiras”*

MÔNICA BERGAMO - *”OEA faz audiência com MST sobre paralisação da reforma agrária no país”*: As bandas de rock Pearl Jam e Queens of the Stone Age estão no topo da lista de artistas mais ouvidos pelo prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), neste ano. Na sequência, aparecem os grupos Red Hot Chili Peppers, Rage Against the Machine e Franz Ferdinand —todos variáveis do mesmo gênero musical. O ranking é feito pelo aplicativo de streaming Spotify e foi compartilhado por Covas nas redes sociais.

MÔNICA BERGAMO - *”Pearl Jam e Queens of the Stone Age foram os artistas mais ouvidos por Covas em 2020”*
MÔNICA BERGAMO - *”Festa do Imigrante venderá quitutes de diferentes países pela internet”*
MÔNICA BERGAMO - *”Deputada quer sustar portaria sobre lista de personalidades negras da Fundação”*

MÔNICA BERGAMO - *”Palmares Marcio Pochmann e Jurema Werneck participam de livro sobre direitos humanos no Brasil”*: A Rede Social de Justiça e Direitos Humanos lança nesta sexta (4) o livro “Direitos Humanos no Brasil 2020”, que reúne 38 artigos sobre o tema e o papel de movimentos sociais na defesa do acesso à saúde pública, educação, terra, alimentação, entre outros. O economista Marcio Pochmann, a diretora-executiva da Anistia Internacional no Brasil, Jurema Werneck, e o padre Ricardo Rezende estão entre os autores da obra. O lançamento será transmitido pela Rede TVT, às 20h15.

CAPA – Manchete principal: *”Economia reage, mas avanço do vírus gera incertezas”*

*”Início de votação – Gilmar e Toffoli dão aval à reeleição de Alcolumbre a Maia no Congresso”*
*”Governo avalia oferecer ministérios em troca de apoio a Lira na Câmara”*
*”Aras diz ao STF que Bolsonaro pode não depor”*
*”Metade dos prefeitos eleitos teve doação de empresários”*

*”Macapá: Josiel Alcolumbre lidera com 28%, diz Ibope”*
*”Após vitória, 2022 ronda prefeitos de Rio, SP e BH”*
*”Na reta final – Governo de São Paulo promete dar início à vacinação em janeiro”*
*”Senado confirma quase R$ 2 bi para vacina de Oxford”*
*”Especialistas defendem compra de ‘superfreezers’”*

*”Clínicas privadas esperam vacina só na segunda metade de 2021”*
*”Alta da Covid não fará Rio retomar restrições, e especialistas criticam”*
*”Estado tem maior taxa de mortalidade do país”*

*”País cresce 7,7% no terceiro tri, mas incerteza pesa sobre retomada”*
*”Guedes vê rápida recuperação – Governo avalia que caminho está aberto para fim do auxílio”*

 

CAPA – Manchete principal: *”Apoiada pelo Planalto, rede de ódio lucra com canais antidemocracia”*

EDITORIAL DO ESTADÃO - *”Um governo cruel”*: Comandado por um presidente que tem evidente dificuldade para demonstrar empatia autêntica por qualquer um que não leve seu sobrenome, o governo federal é a expressão viva da indiferença que marca a triste passagem de Jair Bolsonaro pelo poder. A ministros sem currículo e sem o mínimo cabedal para as nobres tarefas que lhes foram concedidas pela irresponsabilidade bolsonarista, só resta empenhar-se em agradar ao chefe – e o fazem emulando fielmente a truculência tão característica de Bolsonaro. Tome-se o exemplo do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Como se fosse titular do Ministério da Doença, o sr. Pazuello, inspirado no presidente, parece trabalhar em favor do coronavírus, facilitando-lhe a dispersão entre os brasileiros e agravando a pandemia. Na quarta-feira passada, contra todas as evidências, o ministro disse que a recém-encerrada campanha eleitoral, com suas aglomerações, “não trouxe nenhum tipo de incremento ou aumento de contaminação”, razão pela qual “não podemos mais falar em lockdown nem nada”. Ora, o que aconteceu, segundo as informações disponíveis, foi o exato oposto. Tanto é assim que vários governos decidiram reforçar algumas das restrições que haviam sido abrandadas. Ao desestimular o isolamento social e fazer crer que as contaminações estão diminuindo, o ministro semeia confusão e colabora para desmoralizar os esforços de quem demonstra preocupação com o vírus.
Enquanto isso, o secretário executivo do Ministério da Saúde, Élcio Franco, a propósito das recomendações para os brasileiros nas festas de fim de ano, menosprezou o isolamento social, pois segundo ele “não tem eficácia”, malgrado seja preconizado pela comunidade científica mundial para reduzir a pandemia. Já em caso de suspeita de contaminação, Élcio Franco defendeu o “tratamento precoce”, que não existe senão no discurso dos xamãs bolsonaristas. Sabe-se lá quantos brasileiros mais ficarão doentes, correndo risco de morte, como resultado do conflito de mensagens estimulado pelo governo. Para os propósitos de Bolsonaro, como se sabe, isso não tem a menor importância, já que, em suas inolvidáveis palavras, “todos vamos morrer um dia”. A única coisa que importa é livrar-se da responsabilidade pelas consequências da pandemia. Assim, não surpreende que o governo tenha demorado tanto para formular um plano de vacinação e, também, que esse plano, afinal apresentado na terça-feira passada, seja tão aquém do necessário. A vacinação não somente se estenderá por um ano ou talvez até mais, como será destinada a uma parcela muito pequena da população. Sem jamais ter sido prioridade do governo – ao contrário, o próprio presidente disse e repetiu em voz alta que a vacinação não seria obrigatória, como se a vacina fosse uma aspirina que se escolhe tomar ou não –, a imunização dos brasileiros contra o coronavírus entrará para a já extensa e variada lista das obrigações que Bolsonaro, como presidente da República, está deixando de cumprir. E neste caso colocando em risco a saúde de todos.
À inépcia junta-se o autoritarismo explícito, única promessa de campanha que Bolsonaro cumpre à risca. Uma portaria do Ministério da Educação publicada na quarta-feira determinava o retorno às aulas presenciais nas universidades federais e nas faculdades particulares a partir de janeiro. De uma tacada só, a ordem violava a autonomia universitária e, sem qualquer consulta aos gestores universitários, atropelava os esforços para reduzir o contágio entre estudantes e professores. O ministro da Educação, Milton Ribeiro, expressou surpresa com a repercussão negativa. Ou seja, foi simplesmente incapaz de perceber a violência da medida, evidente por si mesma. É, portanto, muito pior do que a simples incompetência: trata-se de um governo sem qualquer sensibilidade, movido exclusivamente pelos delírios bolsonaristas de poder, nos quais o presidente e alguns de seus principais ministros não demonstram compaixão pelos pobres e os doentes. Com um presidente que é fã declarado de torturadores, quem haverá de se dizer surpreso, afinal?

*”Inquérito vê elo de grupos antidemocracia no Planalto”* - O inquérito sigiloso aberto em abril para apurar a organização e o financiamento de manifestações contra a democracia revela que um negócio muito lucrativo estava por trás dos protestos contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso. A investigação descobriu que informações usadas por uma rede de canais no YouTube, incentivando esses atos no País, saíram de dentro do Palácio do Planalto. Essa rede do ódio, alimentada por servidores que atuam ao lado do presidente Jair Bolsonaro, registrou faturamento em torno de R$ 100 mil mensais, chegando até a R$ 1,7 milhão, num período de dez meses. A conclusão consta de inquérito com 1.152 páginas, ao qual o Estadão teve acesso. Após quase oito meses de diligências, as apurações mostram os elos e a convivência harmoniosa da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom) com os youtubers do “gabinete do ódio”, núcleo palaciano que adota um estilo beligerante nas redes sociais. A existência do grupo, com essa denominação, foi revelada pelo Estadão, em setembro de 2019. A poucos metros do gabinete de Bolsonaro, o assessor especial da Presidência Tércio Arnaud Tomaz e o Coronel Mauro Cesar Barbosa Cid, ajudante de ordens, são os interlocutores do blogueiro Allan dos Santos, dono do canal Terça Livre, dentro do Planalto. Tércio é apontado no inquérito como elo entre o governo e os youtubers, que possuem acesso privilegiado a Bolsonaro e informaram faturamento de mais de R$ 100 mil por mês. Integrante do “gabinete do ódio”, Tércio repassa vídeos do presidente e participa de grupo de WhatsApp com os blogueiros para “discutir questões do governo”, segundo disse em depoimento à Polícia Federal. Cid, por sua vez, admitiu que, como “mensageiro” de Bolsonaro, leva e traz recados de Allan. O blogueiro atua como uma espécie de representante das demandas dos demais canais.
A investigação feita pela Polícia Federal em inquérito conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF, ainda não terminou, mas já atormenta Bolsonaro por fechar o cerco sobre a militância digital bolsonarista. Até agora, foram ouvidas mais de 30 pessoas, entre as quais o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), apontado como comandante do “gabinete do ódio”, e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filhos do presidente. “A propaganda de conteúdo extremista no campo digital culmina, de fato, em ações subsequentes: as manifestações reais contra o Estado Democrático de Direito, criando um ciclo que se realimenta, com a difusão das manifestações pelos canais de internet dos produtores, que, por sua vez, são alardeados e replicados em perfis pessoais de redes sociais de agentes do Estado”, constatou a Polícia Federal, em relatório de 9 de julho. Não passou despercebido dos investigadores que, no período dos protestos antidemocráticos, alguns deles pregando intervenção militar, com a presença de Bolsonaro, vídeos com títulos apelativos pipocaram nas redes sociais. Nessa lista estavam “Bolsonaro rebate conspiradores”, “Bolsonaro dá ultimato para sabotadores e intromissões”, “Bolsonaro invade STF”, “A Força de Bolsonaro é maior que Congresso e STF”, “Bolsonaro e Forças Armadas fechados em um acordo para o Brasil”, como registrou a Procuradoria-Geral da República (PGR).
“Com o objetivo de lucrar, estes canais, que alcançam um universo de milhões de pessoas, potencializam ao máximo a retórica da distinção amigo-inimigo, dando impulso, assim, a insurgências que acabam efetivamente se materializando na vida real, e alimentando novamente toda a cadeia de mensagens e obtenção de recursos financeiros”, disse o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques, em manifestação ao STF. Levantamento do Estadão identificou que o número de inscritos de onze canais sob investigação aumentou 27% no total, de 6,7 milhões para 8,5 milhões, entre 1º de março e 30 de junho. O período coincide com o das manifestações antidemocráticas. De julho até o fim do mês passado, quando já não havia mais protestos, os canais cresceram apenas 6%. Nos interrogatórios, a PF tem questionado se os donos de canais são “laranjas” de terceiros. Foi o que ocorreu no depoimento prestado por Anderson Azevedo Rossi. O criador do canal Foco do Brasil respondeu que não repassa dinheiro recebido de monetização do Youtube a outros. Rossi afirmou, porém, que recebe ajuda de Tércio Tomaz para abastecer a sua página. Por meio do WhatsApp, disse ele, o assessor envia vídeos de Bolsonaro. Tércio está sempre ao lado do presidente. Filma suas conversas de forma imperceptível e procura flagrar situações que possam constranger quem o incomoda.
Guinada. Com 2,3 milhões de seguidores no Youtube, Rossi teve uma guinada na carreira desde a ascensão de Bolsonaro. Recebia um salário de R$ 3,5 mil como técnico de informática em sua cidade, Canela, no Rio Grande do Sul. Agora, com os recursos da monetização – a remuneração que o YouTube paga por anúncios publicitários nos canais – faturou com o Foco do Brasil US$ 330.887,08 entre março de 2019 e maio de 2020, o equivalente a R$ 1,7 milhão na cotação atual de câmbio. Em depoimento à PF, Tércio negou dar tratamento diferenciado aos donos de canais no Youtube que orbitam em torno de Bolsonaro. Admitiu, porém, ter participado de grupo de WhatsApp com Allan dos Santos para discutir questões de governo. Allan disse que recebe R$ 12 mil por mês, também obtidos por meio de monetização, segundo depoimento prestado à PF, na condição de “sócio” do Terça Livre. Os canais Terça Livre, Foco do Brasil eVlog do Lisbo também veicularam propaganda da reforma da Previdência, paga pela Secom. A lista de canais que difunde o discurso do “gabinete do ódio” inclui, ainda, a Folha Política, de Ernani Fernandes Barbosa e Thaís Raposo, que informaram rendimento no YouTube de R$ 50 mil a 100 mil por mês. Desde a última sexta-feira, 27, o Estadão tem pedido uma manifestação da Secom. A reportagem perguntou também se os assessores Tercio Tomaz, José Matheus Sales Gomes, Mauro Cesar Barbosa Cid e Mateus Diniz gostariam de se manifestar, já que são citados no inquérito do STF. Três e-mails foram enviados à Secom, mas não houve resposta.

*”Lira faturava R$ 500 mil com desvios, afirma PGR”* - O esquema de “rachadinha” na Assembleia Legislativa de Alagoas propiciou ao deputado Arthur Lira (Progressistas-AL) um rendimento mensal de R$ 500 mil, segundo denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Como revelou ontem o Estadão, o parlamentar é apontado como o líder de um esquema responsável por desviar R$ 254 milhões dos cofres públicos entre 2001 e 2007. Documentos sigilosos da investigação indicam que parte do dinheiro foi usado por ele para aumentar o próprio patrimônio. Na época, seu salário como deputado estadual era de R$ 9,5 mil. Líder do Centrão e candidato do Palácio do Planalto para comandar a Câmara nos próximos dois anos, Lira responde a uma ação penal que ainda tramita na Justiça estadual de Alagoas. Ele já foi condenado pelo caso em segunda instância na esfera cível, por improbidade administrativa, e só conseguiu concorrer em 2018, quando se elegeu deputado federal, após obter uma liminar do Tribunal de Justiça alagoano.
Na denúncia apresentada contra o deputado, a PGR incluiu documentos apreendidos em sua casa e em uma de suas empresas que indicam como era feita a distribuição do dinheiro desviado da Assembleia. Em um deles, encontrou anotações à mão descrevendo valores e siglas, como “500 meu/mês” e “500 AL”. Para os investigadores, “tais documentos eram utilizados como forma de controlar os pagamentos e desvios realizados”. Nos seis anos em que esteve à frente do esquema, de acordo com o Ministério Público Federal, Lira movimentou R$ 9,5 milhões em sua conta. Desta quantia, R$ 1 milhão foi depositado diretamente a ele por três servidores da Assembleia Legislativa apontados como operadores financeiros do grupo criminoso. Mas essa não era a única forma de o dinheiro chegar ao bolso do parlamentar, segundo relata a denúncia. Outra maneira era a utilização de empresas para simular negócios. Um laudo da Polícia Federal identificou transações com quatro companhias diferentes. Somente uma delas recebeu 120 cheques emitidos pela Assembleia, que somam R$ 249 mil. A análise da movimentação nas contas de Lira revelou que a mulher do dono da empresa repassou “de volta” R$ 210 mil ao deputado. Para os investigadores, foi a forma encontrada pelo grupo para “lavar” o dinheiro desviado.
Patrimônio. A denúncia apontou ainda que recursos desviados da Assembleia foram utilizados para a compra de carros, apartamentos e terrenos. Em 2006, quando se reelegeu como deputado estadual, Lira declarou à Justiça Eleitoral R$ 695,9 mil em bens. Quatro anos mais tarde, ao disputar a Câmara, o parlamentar informou, em valores nominais, patrimônio três vezes maior, de R$ 2,08 milhões. No ano passado, a ex-mulher de Lira, Jullyene Cristine Lins Rocha, acusou o parlamentar de ocultar das autoridades imóveis de sua propriedade. Segundo ela, que discute a partilha de bens em processos na Justiça, Lira acumula mais de R$ 11 milhões em patrimônio. Em 2018, quando se candidatou novamente, Lira disse ter R$ 1,7 milhão entre terrenos, casas e veículos. A denúncia de Jullyene motivou a abertura de uma investigação no Ministério Público Federal de Alagoas no início deste ano.
Defesa. Questionado sobre as acusações da PGR, Lira afirmou já ter dado as explicações necessárias à Justiça, esclarecendo qualquer dúvida sobre a “lisura de suas ações”. “Lira confia na Justiça e tem certeza de sua total e plena absolvição. Não há condenação contra o deputado”, diz nota enviada por sua assessoria de imprensa. O parlamentar já foi condenado pelo caso na esfera administrativa.
‘Nada a ver’. Ao chegar na Câmara ontem, Maia se limitou a dizer “não ter nada a ver” com a situação envolvendo o adversário político. Questionado sobre o caso, o líder do Novo, Paulo Ganime (RJ), disse esperar que o próximo presidente da Câmara seja alguém comprometido com o combate à corrupção.

*”Incra vai terceirizar vistoria de terras”* - O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) decidiu terceirizar o trabalho de vistoria local e de checagem de dados com a justificativa de que isso pode acelerar o processo de regularização de terras. O objetivo é firmar acordos com municípios de todo o País, que ficarão responsáveis por indicar técnicos que poderão executar o trabalho. O funcionário de cada município passará por um treinamento online dado pelo Incra, para ser credenciado como representante do órgão vinculado ao Ministério da Agricultura. Ele poderá ser servidor do município ou até mesmo contratado externamente pela prefeitura, que deverá arcar com seus custos. Uma vez habilitado, ele passa a atuar como funcionário terceirizado do Incra, fazendo vistorias locais a imóveis, checando informações e enviando dados à central do Incra, em Brasília. Confirmada a regularidade da terra, o imóvel vai receber a escritura. “Sabemos das limitações de infraestrutura, de pessoal e de orçamento que o Incra vive. Por outro lado, o governo e as prefeituras têm todo o interesse em resolver as situações fundiárias. Então, com esse funcionário credenciado, a gente vai regionalizar a atuação”, disse o secretário especial de assuntos fundiários do ministério, Luiz Antonio Nabhan Garcia. O Incra já realiza parcerias com municípios, mas, segundo Nabhan, o processo atual é burocrático e lento, porque exige que seja aberto um processo para cada município que adere à iniciativa. “Agora é um processo nacional, para todos. Vamos publicar um edital de chamamento para todos, para que os municípios interessados possam aderir”, disse. O programa “Titula Brasil” teve a sua portaria publicada ontem no Diário Oficial da União. A proposta prevê a criação do Núcleo Municipal de Regularização Fundiária (NMRF), que vai integrar terceirizados contratados aos servidores do Incra, em Brasília e regionais.
Nos próximos dias, deve ser publicado o chamamento público aos municípios interessados. Em até 60 dias, será divulgado o “Regulamento Operacional e o Manual de Planejamento e Fiscalização” do programa. No alvo da medida estão regularizações que se enquadrem nos parâmetros definidos pela Lei da Terra Legal. Trata-se da Lei 11.952, que foi editada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2009 e prevê a regularização de unidades de até 2.500 hectares, com necessidade de vistoria local no processo. A mesma lei permite que propriedades menores, de até quatro módulos fiscais (aproximadamente, 280 hectares), possam ser regularizadas por meio de sensoriamento remoto, com checagem à distância. “Com esse programa, um técnico do Incra de Manaus, por exemplo, não vai mais precisar fazer uma viagem de mais de 2 mil quilômetros para chegar no município de Boca do Acre, porque terá um funcionário credenciado do Incra por lá”, disse Nabhan. O secretário descartou a ideia de transformar o Incra em uma agência, como chegou a ser apontado em estudos realizados pela equipe do vicepresidente Hamilton Mourão. “O Incra é uma autarquia e continuará a ser, como já afirmou o presidente Bolsonaro.”
Grilagem. Para a Confederação Nacional das Associações dos Servidores do Incra (Cnasi), a decisão deixa de lado a necessidade de se estruturar a autarquia, além de ter potencial de pressionar terras indígenas e quilombolas em processo de demarcação nos municípios. “Com essa decisão, toda a grilagem de terras do Brasil vai ser regularizada em pouco tempo. Isso vai impedir novos projetos de assentamento da reforma agrária, novas regularização de territórios quilombolas, novas áreas indígenas e novas áreas de preservação ambiental”, disse o diretor da Cnasi, Reginaldo Marcos Félix de Aguiar. “É uma decisão inconsequente e desastrosa para democratização de acesso à terra e para o meio ambiente”, afirmou. Ele lembra que o Incra, órgão que completou 50 anos em julho, teve, este ano, 66,6% do valor que recebeu em 2000. O repasse foi reduzido de R$ 1,09 bilhão para R$ 725,6 milhões, sem considerar a correção inflacionária do período. Se considerada, os recursos para 2020 chegariam a R$ 3,6 bilhões, cinco vezes o orçamento deste ano. Para Aguiar, a terceirização também pode encontrar impedimentos legais. “Vejo que há problemas de legalidade na decisão, pois retira atribuições constitucionais do Incra e repassa às prefeituras, que certamente não tem pessoal, instrumentos, orçamentos e gestão qualificada pra fazer regularização fundiária”, disse. “Com isso, vai ocorrer é regularização de grilagem, beneficiando os mais ricos do município.”

*”Toffoli manda PF ouvir ministro da Educação”* - O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli determinou que a Polícia Federal marque o depoimento do ministro da Educação, Milton Ribeiro, sobre suposta prática do crime de homofobia. Em entrevista ao Estadão, publicada em setembro, Ribeiro disse que o “homossexualismo (sic)” é resultado de “famílias desajustadas”. A declaração levou a Procuradoria-Geral da República (PGR) a pedir a abertura de um inquérito, mas Toffoli, relator do caso na Corte, decidiu que o ministro fosse ouvido antes da instauração do procedimento. No despacho, Toffoli diz que a data e a hora devem ser acertadas com o ministro. A decisão ocorre uma semana depois de Ribeiro rejeitar o acordo oferecido PGR que poderia livrá-lo da abertura de inquérito por homofobia. Para isso, o ministro teria de admitir que cometeu crime preconceituoso contra homossexuais, o que poderia ser interpretado como um sinal contraditório do próprio governo Bolsonaro, que tenta no STF justamente “relativizar” o conceito de homofobia. No mesmo despacho, o ministro do STF também negou o pedido do Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH) para participar do depoimento do ministro. “Não são possíveis tais intervenções nessa fase prematura de investigação”, relatou Toffoli.
Contexto. Pastor presbiteriano, Milton Ribeiro assumiu o MEC em julho, substituindo Abraham Weintraub e prometendo ter um estilo mais moderado. Na entrevista ao Estadão, publicada em 23 de setembro, o ministro defendeu mudanças em relação à educação sexual. Segundo ele, muitas vezes a disciplina é usada para incentivar discussões de gênero. “E não é normal. A opção que você tem como adulto, de ser um homossexual, eu respeito, não concordo”, afirmou ele na ocasião. “Acho que o adolescente que muitas vezes opta por andar no caminho do homossexualismo (sic) tem um contexto familiar muito próximo, basta fazer uma pesquisa. São famílias desajustadas, algumas. Falta atenção do pai, falta atenção da mãe. Vejo menino de 12, 13 anos optando por ser gay, nunca esteve com uma mulher de fato, com um homem de fato, e caminhar por aí. São questões de valores e princípios”, disse. Após o pedido de abertura de inquérito contra Ribeiro, a AGU pediu ao Supremo, no dia 14 de outubro, que reconheça uma série de “excludentes de ilicitude” em casos de homofobia e transfobia. O objetivo é que a Corte esclareça que “não só a liberdade religiosa, mas a própria liberdade de expressão, (englobando a manifestação artística, científica ou profissional), respalda a possibilidade de manifestação não aviltante a propósito da moralidade sexual”. Ao pedir abertura da investigação contra o ministro, logo após a entrevista, o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques, considerou as declarações de Ribeiro “depreciativas a pessoas com orientação sexual homoafetiva” e “ofensivas à dignidade do apontado grupo social”.

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*”PIB cresce 7,7%, mas não repõe perdas; crescimento em 2021 depende de vacina”* - A continuidade da reabertura das atividades, depois do auge da pandemia, e o impulso do auxílio emergencial no consumo fizeram a economia registrar no terceiro trimestre o maior crescimento em duas décadas. O Produto Interno Bruto (PIB, o valor de tudo o que é produzido na economia) saltou 7,7% ante o segundo trimestre, maior alta da série histórica, iniciada em 1996, informou ontem o IBGE. Mesmo recorde, o avanço foi insuficiente para recuperar as perdas do primeiro semestre. No terceiro trimestre, o nível de atividade ainda estava 4,1% abaixo do fim de 2019, segundo o IBGE. O ritmo da retomada será ditado pelo sucesso das vacinas contra a covid-19, disseram economistas. A alta ficou abaixo das projeções de analistas, que esperavam salto de 8,8%, conforme o Projeções Broadcast. Em relação ao terceiro trimestre de 2019, o PIB caiu 3,9%. Para 2020 fechado, economistas esperam retração de 4,5%, conforme levantamento do Projeções Broadcast concluído na tarde de ontem. Se confirmada, será a maior retração anual da história. Além de insuficiente para recuperar as perdas acumuladas, a retomada ainda enfrenta a incerteza sobre a pandemia. O avanço da economia em todo o mundo no ano que vem está diretamente ligado à vacina contra a covid-19.
“A lição que ficou do que estamos vendo na Europa é que o risco de um ‘lockdown’ horizontal é menor e, ao mesmo tempo, as campanhas de vacinação no mundo estão andando rápido”, disse Guilherme Loureiro, economista-chefe da Trafalgar Investimentos. Embora os planos de vacinação estejam avançando em países como a Inglaterra, está pouco claro quando isso se dará no Brasil. Mais casos e mortes, com novas restrições ao contato social, podem prejudicar a retomada. Por ora, economistas ainda veem como pequeno o impacto das novas restrições em São Paulo e no Paraná. “No curtíssimo prazo, vai haver arrefecimento da mobilidade, de dados de alta frequência, queda marginal da confiança, do consumo e da produção, mas muito diferente do começo da pandemia. A questão da vacina altera a perspectiva dessa desaceleração, coloca um teto nas incertezas”, disse a economista-chefe do Credit Suisse no Brasil, Solange Srour. A composição da retomada do terceiro trimestre serviu como lembrete da incerteza atrelada à doença. Impulsionado pelo auxílio emergencial para trabalhadores informais, o consumo das famílias avançou 7,6% sobre o segundo trimestre, puxando a retomada, mas ainda de forma desorganizada.

*”Consumo, auxílio emergencial e crédito puxam PIB”*
*”PIB veio abaixo do esperado, diz Guedes”*

*”Articulação tenta tornar perene aumento de gastos”* - A ala política do governo e o Congresso articulam usar a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que autorizou um “vazamento” maior de gastos de 2020 para 2021 como precedente para adotar a prática também em anos seguintes, segundo apurou o ‘Estadão/Broadcast’. A ideia é mudar a proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2021, que ainda está em discussão no Congresso, para autorizar o empenho de um gasto que só será executado no futuro. Dessa forma, seria possível usar o Orçamento de 2021 para assegurar espaço para despesas que só serão executadas em 2022, ano de eleições presidenciais. O empenho é a primeira fase do gasto, quando o governo se compromete com determinada obra ou serviço. Caso a negociação avance, o risco, segundo técnicos ouvidos pela reportagem, é haver um aumento nos chamados “restos a pagar”, despesas que são “herdadas” de exercícios anteriores. A medida iria na direção contrária de recomendações do próprio TCU para que esse estoque de pendências seja reduzido gradualmente.
Embora essas despesas precisem respeitar o teto de gastos, regra que limita o avanço das despesas à inflação, a avaliação é que o crescimento dos restos a pagar cria um fator adicional de pressão contra o teto. Para serem executados, eles concorrem com as despesas programadas para o ano em curso. Será preciso escolher o que pagar. Há quem veja nessa estratégia uma forma de reforçar a narrativa de que é preciso flexibilizar o limite de despesas – algo que o Ministério da Economia descarta de forma veemente. O TCU autorizou uma flexibilização temporária que permite apenas o uso do Orçamento deste ano para gastos executados até 31 de dezembro de 2021. A decisão foi tomada a pedido do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), que já tem protagonizado embates com a equipe econômica por elevação de gastos, mas pode beneficiar outras pastas e resultar numa espécie de “orçamento paralelo” de R$ 40 bilhões em despesas transferidas para o ano que vem. O desejo de parte do governo e do Congresso é estender a possibilidade de rolagem dos gastos para os anos seguintes. O pedido original do MDR era, inclusive, que a “transição” vigorasse até 2022. Segundo uma fonte que participa das discussões, “agora há respaldo que antes não havia” para tornar a prática recorrente. O argumento é justamente o precedente aberto pela corte de contas.
Votação. De acordo com uma liderança parlamentar, “o Congresso seguirá a orientação do TCU”, e tanto a LDO quanto o Orçamento de 2021 serão votados com esse dispositivo que permite que o gasto transborde de um ano para outro. A votação da LDO está prevista para o próximo dia 16 de dezembro, direto no plenário. Pelo princípio da anualidade orçamentária, prevista da Lei de Finanças, implementada em 1964 e em vigor até hoje, os órgãos só poderiam empenhar os gastos com execução programada para o próprio exercício. Em caso de algum imprevisto, aí sim eles ficariam para o ano seguinte por meio dos chamados “restos a pagar”. Diversos órgãos, porém, já tinham uma interpretação flexível do princípio da anualidade orçamentária e acabavam usando o orçamento em andamento para empenhar gastos futuros de forma corriqueira. Mesmo que a obra demore a ser executada, o compromisso do governo já carrega consigo uma simbologia forte e é usado como troféu por parlamentares para exibir conquistas em suas bases eleitorais. Técnicos ouvidos pela reportagem alertam que a decisão do TCU manteve intacto o princípio de respeito ao gasto dentro do próprio ano e fez uma flexibilização apenas pontual, sob o argumento de que a pandemia trouxe dificuldades operacionais aos ministérios. Essas fontes, porém, reconhecem que o veredicto do plenário abriu um “precedente ruim”. Os críticos argumentam que essas despesas seriam na verdade “restos a fazer”, diante de tantas pendências para o início da execução. É diferente de empenhar uma despesa que seria realizada este ano, mas acabou atrasando devido a algum tipo de imprevisto – neste caso, um “restos a pagar legítimo”.

*”Guedes diz que apresentará meta fiscal como quer o TCU”*

ENTREVISTA: FELIPE SALTO, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente - *”Perdemos a capacidade de planejamento”*: Diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, o economista Felipe Salto sugere a criação de um “teto de gastos 2.0” combinado com medidas de aumento de receitas. Décimo e último entrevistado da série do Estadão que discute saídas para a crise fiscal, Salto diz que o governo precisa colocar na mesa medidas para voltar ao azul, com superávits primários nas suas contas. O economista defende uma ponte de transição na regra para financiar os gastos adicionais que devem surgir com uma eventual necessidade de prorrogação do auxílio emergencial em 2021 e o pagamento das vacinas para acabar com a pandemia da covid-19. “O teto não é um FLA x FLU. A regra foi positiva e teve o seu valor, mas, para que ela não seja abandonada, terá de ser adaptada. Apenas corrigir pela inflação, não vai funcionar”, diz. Para ele, é possível ser feito um regime temporário, mantendo o teto e abrindo espaço para os gastos que vão ser necessários. A palavra chave, diz ele, é transparência. “Por isso, a meta de resultado primário das contas públicas passa a ter uma importância muito grande.”
• O sr. já disse que o teto de gastos não é a Santa Sé. O que significa isso?
- Estamos vivendo no Brasil um momento de muita polarização. Quando ela está fundamentada em questões técnicas e avaliações, até pode ajudar a explicitar o que as pessoas pensam e seus diferentes pontos de vista. Mas esta polarização danosa que estamos vendo acaba apenas turvando o debate e prejudicando a discussão das questões fundamentais, como é o caso das regras fiscais e do teto de gastos (regra que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação), particularmente.

• Como assim?
- Tem o grupo dos que são a favor do teto e não abrem mão; e tem aqueles que dizem que se deve abandonar o teto, pois seria muito ruim. Na verdade, o que precisamos é encontrar o caminho do meio. Quando eu disse que o teto não é a Santa Sé quis dizer que aprimorar as regras fiscais é positivo. Se for possível regulamentar os gatilhos (medidas de contenção de gastos, focadas principalmente nas despesas com servidores públicos) ou pensar numa combinação de resultado primário que envolva o lado das receitas, isso seria salutar. Não adianta dizer que é a favor do teto, como o governo tem feito, se os números não fecham. Quem faz um mínimo de contas e planilhas vê que no próximo projeto de Orçamento tem uma despesa discricionária (aquelas que não são obrigatórias e incluem, por exemplo, investimentos) de R$ 108,4 bilhões. Destes, R$ 16,3 bilhões são emendas parlamentares. Se tirar essa parte, sobra algo como R$ 92,1 bilhões, que é um nível extremamente baixo. O governo precisa mostrar que esse nível é suficiente para não parar a máquina pública e paralisar as políticas que estão lá. E mais do que isso: como vai incorporar os gastos quase certos, como algum auxílio para as pessoas mais pobres e compra de vacinas.

• Esses gastos adicionais são certos?
- Vão ter de acontecer. E qual o espaço orçamentário? Não existe.

• Vai faltar dinheiro no orçamento para pagar vacina?
- Tem alguns caminhos. Se ele (o governo) não colocar no Orçamento agora, pode fazer crédito extraordinário no ano que vem.

• Mas a necessidade de vacinas era previsível desde sempre. Se encaixa em crédito extraordinário para despesas imprevisíveis e urgentes?
- Como não é uma despesa imprevisível, o ideal seria contemplar no Orçamento. Para resolver, o governo deveria abrir espaço orçamentário este ano seja pelo lado da receita ou da despesa.

• Como sair do impasse que é vivido há meses?
- No grosso das despesas obrigatórias tem pouco espaço para cortar. Teria os subsídios creditícios que têm previsão de R$ 14 bilhões em 2021. Mas aí também tem programas tradicionalmente importantes, no agronegócio, por exemplo. Não tem saída fácil. A primeira coisa que o governo precisa fazer é calcular quais são as despesas extras. Nós, da IFI, fizemos uma simulação e calculamos que, se o auxílio de R$ 300 for estendido por quatro meses para um contingente de 25 milhões, o gasto seria de R$ 15,3 bilhões. Seria um pecado mortal compensar com aumento de arrecadação? Não seria. Precisa é comunicar direito.

• O Congresso precisaria aprovar uma PEC?
- Eu fico um pouco pessimista porque é um assunto um pouco complexo para ser resolvido em poucos dias. A saída é claramente o governo dar uma interpretação para o acionamento dos gatilhos ou avançar na PEC emergencial (proposta em que estão previstas as medidas de contenção de gastos). Isso construiria uma ponte para ganhar tempo para discutir a questão do indexador do teto. O governo deveria dar uma solução ainda que fosse temporária para que, ao longo do próximo ano, pudesse discutir a mudança do indexador do teto (hoje, o teto é corrigido pela inflação acumulada em 12 meses até junho do ano anterior ao da vigência).

• Nesse caso, o que pode acontecer?
- O projeto de Orçamento está completamente descolado da realidade. Vai chegar em janeiro e será preciso, necessariamente, fazer o auxílio. Vai ser uma espécie de gestão de risco. Quando chegar em 31 de dezembro, e para janeiro não tem mais auxílio, decidese fazer mais um mês. Qual a saída? Crédito extraordinário e, aí, precisa combinar com os russos. Precisa ver como o TCU vai encarar essa realização de crédito extraordinário, sendo que há alguns meses já se sabe que possivelmente esse gasto seria necessário e o governo vai argumentar que não, que estava esperando ter mais certeza sobre essa necessidade.

• A discussão de regras orçamentárias não está se sobrepondo à realidade do País?
- Perdemos a capacidade de planejamento. É urgente ter um plano fiscal.

• O que é um plano fiscal na sua avaliação?
- Não importa se é receita ou despesa. É preciso recuperar os resultados primários. É uma questão de expectativas, precisa mostrar um plano de aumento de receita e corte de gastos. Por isso, a meta de resultado primário das contas públicas passa a ter uma importância muito grande. Esse plano deveria comportar uma conta de cálculo da sustentabilidade da dívida, que é o que mais importa, anunciando as medidas do lado das receitas e despesas, que num conjunto possa produzir um superávit (quando as receitas superam as receitas). É fácil? Não é, mas, sem abandonar esse teto, modernizando, caminhar para um teto 2.0 e combinar isso com medidas do lado das receitas.

• O que é um teto 2.0?
- Olhar para as regras fiscais, como o FMI manda fazer, e observar que uma regra que não tem válvula de escape e não permita certa flexibilidade em períodos de exceção não é a melhor. Precisamos sofisticar. O teto não é um FLA x FLU. A regra foi positiva e teve o seu valor, mas, para que não seja abandonada, terá de ser adaptada. Apenas corrigir pela inflação, não vai funcionar. Essa modernização poderia envolver a questão do indexador. Existem outras propostas como a do Fabio Giambiagi e do Guilherme Tinoco de discutir a questão dos investimentos (para criar uma espécie de “subteto” para os investimentos). Não cabe a IFI dar recomendação. Mas, quando calculamos os números, está muito claro que está impossível cumprir o teto por muito mais tempo. Talvez o governo consiga cortar a despesa discricionária por mais tempo. Não dá para imaginar que, neste contexto pandêmico, o Brasil não possa desviar um milímetro do que foi pensado em 2016.

• O que deveria ser feito?
- Criar uma transição. Estou chamando de ponte. Comprar tempo, alterar as regras, temporariamente, para que a gente possa discutir um aprimoramento do teto.

• Uma pinguela?
- Eu li recentemente um artigo do Gustavo Loyola (ex-presidente do BC) que disse que já está meio precificado que o teto não será cumprido em 2021. Resta saber o que vai ser o contorno que vão fazer na regra.

• É preciso esse contorno?
- Entra a questão da economia política. Não podemos dar um cavalo de pau. De repente, o teto, que era uma âncora, vai ser jogado fora. Não. Tem de ter cuidado. O momento é delicado. É possível ter um regime temporário, mantendo o teto e abrindo espaço para os gastos que vão ser necessários. A palavra chave é transparência.

• O FMI fala da retirada gradual dos estímulos?
- Sim, Não é razoável fazer R$ 600 bilhões (a estimativa de gastos para o combate à pandemia neste ano) e, no ano seguinte, zero. Até porque vai ter muita gente à margem do mercado de trabalho. Alguma ajuda terá de ser feita.

• Como fica o dinheiro para o pagamento das vacinas?
- O governo terá de dizer se vai colocar dinheiro na vacina ou deixar tudo na mão dos Estados, como também o auxílio. Como financia essa ajuda? Falta essa diretriz. Estamos a ver navios. Não tem uma proposta. Estamos em dezembro. Não adianta mandar propostas complexas e falar que a bola está com o Congresso. Tem de sentar, negociar. Política é isso.

• A meta fiscal pode ser flexível, como foi proposto pelo governo?
- A Lei de Responsabilidade Fiscal é claríssima. Meta tem de ser calculada e fixada como um compromisso a ser perseguido, a partir do esforço combinado do lado da receita e da despesa. Não pode “flutuar”.

• Já está em curso uma transição de política econômica?
- Não vejo isso. O governo, na verdade, está perdido. O Paulo Guedes (ministro da Economia) é um economista que tem formação, que deve ser respeitado. Mas o que vemos, por exemplo, quando é questionado sobre a reforma? Ele volta a falar de CPMF , desoneração (redução dos encargos que as empresas pagam sobre o salários dos funcionários), coisas fora da pauta. Esse é o plano? Como vai ser feito? O Congresso já aceitou? Do lado dos gastos, ele falou em unificar os programas sociais; até agora, nada.

 

CAPA – Manchete principal: *”Surgem na bolsa primeiros ganhadores do efeito vacina”*

*”Vacinação em SP contra covid começa no mês que vem, afirma Doria”* - Governo paulista divulgará detalhes de programa estadual na próxima segunda-feira

Análise: *”Promessa do governador tem mais vontade que realismo”* - Estratégia do governador é fazer pressão pelo registro da vacina via opinião pública

*”Média semanal de novos casos é a maior desde agosto”* - País ultrapassa 175 mil mortes por covid-19, aponta consórcio

*”A visão espanhola do acordo UE-Mercosul”* - Madri quer ratificar o tratado, inclusive por motivos ambientais

*”PIB tem alta recorde, mas quadro à frente é nebuloso”* - Economia cresce 7,7% no 3º tri e deixa recessão para trás

*”PIB per capita deve levar dez anos para voltar ao nível de 2013”* - Renda por habitante do país deverá terminar o ano em R$ 33,3 mil, a mais baixa desde 2009

*”Avanço é apenas o 25º maior entre economias globais”* - Eslovênia, Alemanha e Turquia, que tiveram desempenho próximo ao brasileiro no 2º tri, cresceram mais nos três meses seguintes

*”Crescimento da construção civil decepciona no 3º tri”* - Setor que tem se beneficiado dos juros mais baixos, a construção registrou crescimento no terceiro trimestre de 5,6% em relação ao segundo. Mas o resultado decepcionou. A alta foi considerada tímida depois do recuo no primeiro semestre e, principalmente, dos fortes dados de produção de insumos típicos da construção e vendas de materiais entre julho e setembro. O PIB da construção caiu 1,7% no primeiro e 8,1% no segundo trimestre. Na comparação com o mesmo período do ano passado, a queda de 7,9% de julho a setembro foi menor que a de 13,6% de abril a junho. O número morno da construção no lado da oferta também pode ter contribuído para a alta menor que a esperada no investimento, de 11%. O setor representa quase metade desse componente da demanda. “Esperava um número mais vigoroso no terceiro trimestre. Os dados da indústria de materiais de construção vieram muito fortes no período, embora não o suficiente para recuperar as quedas anteriores”, afirma Ana Maria Castelo, coordenadora de projetos da construção do Instituto Brasileiro Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). Ela cita em especial a produção e a venda de cimento, que têm crescido tanto por causa do setor formal, das construtoras, quanto do informal, de consumidores que constroem e reformam suas casas.
Ela observa que na sondagem mensal realizada pelo Ibre/FGV, o indicador de nível de atividade mostra queda de 2% no ano, contra recuo de quase 8% no PIB. Para o Banco Safra, o desempenho da construção civil foi a principal surpresa negativa no PIB do terceiro trimestre divulgado ontem pelo IBGE. O resultado do setor contribuiu para a diferença de -0,5 ponto percentual da estimativa do PIB do Safra, de queda de 3,4%, para o realizado, de recuo de 3,9%, na comparação com o mesmo período do ano passado. O que pode estar por trás da frustração das expectativas é o indicador de emprego na construção na Pnad Contínua, levado em conta no cálculo do PIB. “Os números ensaiaram uma melhora nos últimos meses, mas ainda está muito negativo”, diz Ana Castelo. Nesse sentido, o PIB do setor poderia não estar captando muito bem a recuperação da atividade no terceiro trimestre. Olhando à frente, a economista diz que há uma clara perspectiva positiva na construção, que tem sido puxada pelo mercado imobiliário. Como este é um segmento de ciclo longo, haveria um crescimento contratado pelos negócios já fechados nos meses anteriores, diz Ana. O Safra avalia que, apesar do resultado menor que o esperado, o setor é muito sensível à taxa de juros, que deve seguir baixa, e “deve impulsionar o crescimento econômico nos próximos trimestres”.
Já a sondagem de novembro mostra queda na confiança do setor, após seis altas consecutivas, provocada pelo arrefecimento das expectativas. “Há preocupações com a evolução da covid e há muita incerteza no cenário macroeconômico, com a questão fiscal. Mas há um ciclo que está contratado, não vejo isso enfraquecendo”, afirma Ana, para quem as expectativas, por enquanto, mostram que o ambiente de negócios ficou mais incerto. É preciso ver como o cenário vai evoluir. Na infraestrutura, onde o emprego melhorou ao longo do segundo semestre, sobre uma base muito deprimida, o cenário segue à espera de uma melhora nessas condições macroeconômicas. “Qualquer movimento positivo, seja na infraestrutura, seja no segmento imobiliário não continuará à revelia da economia”, afirma.

*”Setor fraco e revisões explicam alta menor do investimento”* - Elevação de 11% da Formação Bruta de Capital Fixo foi menor que os 18,3% esperados por analistas

*”Para Guedes, quem não vê recuperação em ‘V’ é ‘negacionista’”* - Sachsida diz que crescimento permanecerá no ano que vem mesmo com fim do auxílio emergencial

*”Setor externo tem impacto positivo no PIB”* - Segmento vai contribuir com 1,7 ponto percentual no resultado deste ano, de acordo com Ibre

*”Dado prévio costuma ser subestimado, diz Braulio Borges”* - Para economista, “viés” é corrigido para cima em 0,3 ponto percentual em média dois anos depois

*”Guedes admite rever meta fiscal ‘flexível’ para 2021”* - Ministro nega atrito com TCU e diz que fim do período de incerteza permite definição mais exata

*”Parceria entre UE e EUA coloca mais pressão sobre Bolsonaro”* - Proposta europeia de agenda sustentável pode mudar cenário global

*”Com prazo apertado, reforma tributária pode ficar para 2021”* - Relator negocia com senadores; governo evita fazer propostas

*”Oposição não descarta apoio a Lira”* - O líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL), é o candidato do governo para presidir a Câmara, o que afasta os partidos de esquerda da sua candidatura, mas uma aliança com ele não está completamente descartada, segundo deputados de oposição ouvidos pelo Valor. Ele será recebido pelas bancadas e é defendido como alternativa por alguns. A estratégia dos que sugerem manter aberta a possibilidade de aliança com ele é estabelecer pontes para torná-lo mais independente em relação ao governo, caso verifiquem que é o candidato mais forte. É melhor fazer isso, sugere um deputado, do que jogá-lo no colo do Bolsonaro e fechar as portas se ele vencer. O caminho natural da oposição, dizem, é se aliar ao grupo do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que se declara independente e é formado por DEM, MDB, PSDB, Cidadania, com 100 votos. Eles tentam agregar PSL e Republicanos para chegar a cerca de 200 deputados.
Mas grande parte da oposição ainda desconfia se Maia, caso não concorra à reeleição, será capaz de manter esse grupo unido. Há cinco nomes querendo a vaga: os presidentes do MDB, Baleia Rossi (SP), do Republicanos, Marcos Pereira (SP), e do PSL, Luciano Bivar (PE), além dos deputados Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Elmar Nascimento (DEM-BA). O deputado Marcelo Ramos (PL-AM) também fazia parte do grupo, mas seu partido indicou que se aliará com Lira e, portanto, ele desistiu de participar do bloco. Se o grupo desagregar, perdendo o Republicanos ou PSL para outra candidatura, diminui a força desse candidato. Nesse caso, defendem parlamentares dos partidos de esquerda, é preciso ter construído um discurso capaz de permitir o apoio a Lira e manter o espaço nas discussões. Maia, por exemplo, segurou a pauta de costumes do governo, entregou relatorias importantes para a oposição, criticou Bolsonaro sobre as ações de combate a pandemia e o meio ambiente e ajudou a derrubar medidas provisórias como a mudança nos reitores de universidades federais.
Os que defendem Lira dizem que ele, obviamente, não reproduziria as críticas diárias ao governo. Mas seria possível um acordo para manter travada ou pelo menos influenciar a pauta de costumes, garantir relatorias de projetos importantes e espaço para fazer oposição sem serem atropelados pelos governistas. O líder do PP, dizem, é conhecido por manter a palavra e cumprir os acordos que negocia. Um dos poucos que defendem abertamente a possibilidade é o líder da oposição na Câmara, André Figueiredo (PDT-CE). “Lira e Maia são do mesmo campo político. E, pelo perfil, Lira nunca será subserviente ao governo, terá sua independência, assim como o Rodrigo tem”, disse. Bancadas como PT, PSB, PDT e PCdoB , que somam quase 130 votos, já informaram que convidarão o parlamentar para conversar. O grande entrave para a aliança, dizem os oposicionistas contrários a esse apoio, é Lira estar carimbado como o candidato do governo, pelo qual Bolsonaro e ministros têm trabalhado. Seria preciso ouvir até que ponto ele está compromissado com as pautas do Executivo e construir um discurso que permitisse explicar para a sociedade essa aliança. Acham difícil isso ocorrer.
Os documentos revelados pelo jornal “O Estado de S. Paulo” ontem, de que Lira teria participado de um esquema de “rachadinha” com salários de funcionários e verbas da Assembleia Legislativa de Alagoas, são outro possível entrave, mas afetaram mais o campo bolsonarista, que voltou a pressionar para que Bolsonaro lance como candidata a ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Nos demais partidos, o discurso nos bastidores é que Lira já responde a outras denúncias, como na operação Lava-Jato, e essas acusações só reforçariam esse problema da candidatura, mas sozinhas não teriam força para mudar o quadro. O Ministério Público o acusa de receber R$ 9,5 milhões nesse esquema, em processo que aguarda julgamento. Ele foi condenado por improbidade administrativa, mas diz a aliados que o processo, que corre em sigilo de justiça, está suspenso.

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