domingo, 31 de janeiro de 2021

ANF – “A VITÓRIA DE KOBANE É UM LEGADO PARA O MUNDO INTEIRO E PARA A HUMANIDADE”



A Administração Autônoma do Norte e Leste da Síria emitiu uma declaração escrita pela ocasião do sexto aniversário da vitória de Kobane sobre o ISIS.



A declaração indicava o seguinte:


“As gangues ISIS se tornaram um grande perigo para o mundo inteiro e a humanidade após ocuparem vastos territórios na Síria e no Iraque e proclamarem a cidade de Raqqa como a capital de seu chamado Califado.


“PONTO DE INFLEXÃO NA LUTA”


A resistência montada contra o ISIS no norte e leste da Síria foi épica. A resistência no norte e no leste da Síria foi uma resposta às ameaças colocadas pelo ISIS contra todos os povos sírios e do mundo. A resistência de Kobane, que resultou na vitória em 26 de janeiro de 2015, foi um ponto de inflexão na luta contra o ISIS. Após esta data, o colapso do grupo terrorista começou. Os povos do norte e leste da Síria receberam força e entusiasmo pela resistência de Kobane até o fim do califado ISIS em Baghoz, em 23 de março de 2019.


O povo de Kobane apresentou o Projeto de Administração Autônoma como uma solução democrática em 27 de janeiro de 2014, e esta experiência se tornou a infra-estrutura do projeto de uma Síria Democrática.


Esta história está cheia de lembranças. Por ocasião do sexto aniversário da vitória de Kobane em 26 de janeiro de 2015 e do sétimo aniversário da declaração da Administração Autônoma de Kobane, comemoramos o heroísmo da resistência de Kobane e os sacrifícios de nossos mártires. A resistência e os sacrifícios se converteram na vontade dos povos de criar uma vida democrática e livre. Na luta contra o terrorismo ISIS, ela se tornou a base para a realização do projeto da Administração Autônoma do Norte e Leste da Síria.


A vitória de Kobane contribuiu para o enfraquecimento da Turquia e impediu seu projeto de ocupação.


A vitória de Kobane é um legado para o mundo inteiro e para a humanidade, assim como um ganho vital que contribuiu para enfraquecer a Turquia e impediu seu projeto de ocupação e extensão, baseado em apoiar o ISIS. Ficou na cultura da resistência revolucionária global como uma epopeia heroica.


A vontade revelada pela resistência de Kobane tornou-se uma esperança para derrotar o ISIS. Foi fundamental para as forças estadunidenses que lutaram contra o ISIS em Kobane. Como resultado da luta e dos sacrifícios, o 1º de outubro foi declarado como o Dia Mundial de Kobane.


APELAMOS ÀS PESSOAS DA REGIÃO


Como Administração Autônoma do Norte e Leste da Síria, enfatizamos mais uma vez que o apoio dado pelo Estado turco invasor às gangues mercenárias reaviva o ISIS e outras organizações terroristas na região. Esta situação é uma ameaça para os povos do mundo e prejudica nossas conquistas na luta contra o ISIS. Qualquer um que queira eliminar estas ameaças deve deter os crimes cometidos pelo Estado turco invasor e suas quadrilhas após a ocupação de Afrin, Serêkaniyê e Girê Spî.


A libertação de Afrin, Serêkaniyê e Girê Spî é tão importante quanto a libertação de Kobane.


Fazemos um chamado a todos os povos da região para que Afrin, Kobane e todo o norte e leste da Síria adotem a linha de resistência como base. Esta linha de resistência é a garantia da sociedade democrática do Norte e Leste da Síria e da segurança da região.


Finalmente, saudamos todos os mártires da revolução”.


Fonte: ANF espanhol

https://anfespanol.com/rojava-norte-de-siria/la-victoria-de-kobane-es-un-legado-para-todo-el-mundo-y-para-la-humanidad-25629

A Ilegitimidade da Violência e a Violência da Legitimidade

O que é violência? Quem a define? Ela tem um lugar na busca por libertação? Estas questões antigas voltaram à tona durante o movimento Occupy de 2011, nas Jornadas de Junho de 2013 e agora nos levantes contra violência policial dos EUA ao Brasil, e contra o neoliberalismo do Chile à Tunísia. Mas essa discussão nunca se dá em condições de igual para igual; enquanto alguns deslegitimam a violência, a própria linguagem da legitimidade prepara o caminho para que as autoridades façam uso de meios violentos.




“Embora linhas de policiais em cima cavalos e com cães, atravessassem a rua principal fora da delegacia policial para dispersar os manifestantes, houve vários bolsões de violência que a polícia não conseguiu alcançar.”


– The New York Times, cobrindo as manifestações de agosto de 2011 no Reino Unido


Durante o encontro da ALCA em 2011 em Quebec, um jornal destacadamente noticiou que a violência teve início quando manifestantes começaram a jogar bombas de gás de volta às linhas de policiais. Quando as autoridades são vistas como possuindo um monopólio do uso legítimo da força, “violência” é um termo frequentemente usado para denotar o uso ilegítimo da força – qualquer coisa que interrompa ou fuja do controle das autoridades. Isto transforma o termo “violência” quase em um significante flutuante, uma vez que também é entendido como significando “dano ou ameaça não consentida.”


Isto se complica ainda mais pelas formas através das quais nossa sociedade se baseia e é permeada por danos ou ameaças não consentidas. Neste sentido, não é violento viver em território colonizado, destruir ecossistemas através de nosso consumo diário e beneficiar-se de relações econômicas forçadas sobre os outros à mão armada? Não é violento que guardas armados mantenham comida e terra, um dia bens comuns compartilhados por todos, fora do alcance daqueles que mais precisam deles? É mais violento resistir à polícia que expulsa pessoas de suas casas, ou permanecer em silêncio enquanto são criados mais sem-teto? É mais violento jogar bombas de gás de volta na polícia, ou acusar aqueles que os jogam de “violentos”, dando justificativas para que a polícia faça pior?


Em um cenário desses, não existe nada que possa ser chamado de não-violência – o mais próximo que podemos chegar é negar o dano ou ameaça imposto pelos defensores da violência de-cima-pra-baixo. E quando tantas pessoas se beneficiam dos privilégios que esta violência lhes garante, é inocente pensar que poderíamos defender a nós e a outros menos favorecidos [dispossessed] sem violar os desejos de ao menos alguns banqueiros e rentistas. Então em vez de questionar se determinada ação é ou não violenta, seria melhor perguntar apenas: esta ação contrapõe-se a disparidades de poder, ou as reforça?


Esta é a pergunta anarquista fundamental. Podemos fazê-la em toda situação; toda questão posterior sobre valores, táticas e estratégia procede dela. Quando a questão pode ser colocada dessa forma, por que alguém iria querer puxar o debate de volta para a dicotomia entre violência e não-violência?


O discurso de violência e não-violência é atrativo acima de tudo pois oferece uma forma fácil de reivindicar superioridade moral. Isto torna este discurso sedutor tanto para criticar o estado e para competir por influência com outros ativistas. Mas em uma sociedade hierárquica, ganhar a superioridade moral muitas vezes reforça a própria hierarquia.


Legitimidade é uma das moedas que estão desigualmente distribuídas em nossa sociedade, e através das quais suas disparidades são mantidas. Definir pessoas ou ações como violentas é uma forma de excluí-las do discurso legítimo, de silenciar e se fechar. Isto se assemelha a e reforça outras formas de marginalização: uma pessoa branca e rica pode agir de forma “não-violenta” de formas que seriam vistas como violentas se cometidas por um indivíduo preto e pobre. Em uma sociedade desigual, a definição de “violência” não é mais neutra que qualquer outra ferramenta.


Definir pessoas ou ações como violentas também tem a consequência imediata de justificar o uso de força contra elas. Este tem sido um passo essencial em praticamente toda campanha voltada contra a comunidades marginalizadas racialmente, movimentos de protesto, e outros do lado errado do capitalismo. Se você já participou de manifestações o suficiente, você sabe que é muitas vezes possível anticipar exatamente quanta violência a polícia vai usar contra um ato pela forma que a história é apresentada nas notícias na noite anterior. Desta forma, a mídia e mesmo ativistas rivais podem participar no policiamento ao lado da polícia, determinando quem é um alvo legítimo pela forma que se constrói a narrativa dos fatos.


No aniversário de um ano do levante egípcio, o exército revogou a legislação de emergência – “exceto em casos envolvendo marginais.” A revolta popular de 2011 havia forçado as autoridades a legitimar formas anteriormente inaceitáveis de resistência: Obama chegou a caracterizar de “não-violenta” uma revolta em que milhares luteram contra a polícia e queimaram delegacias. Para re-legitimar o aparato legal da ditadura, era necessário criar uma nova distinção entre “marginais” violentos e o resto da população. Mas o fundamento desta distinção nunca foi explicitada; na prática, “marginal” é simplesmente a palavra usada para designar alguém atingido pela própria legislação de emergência. Do ponto de vista das autoridades, idealmente o próprio uso da violência seria suficiente para rotular suas vítimas como violentas, ou seja, como alvos legítimos.

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Então quando uma parcela grande o suficiente da população pratica resistência, as autoridades têm de redefini-la como não-violenta, ainda que tais ações fossem antes consideradas violentas. Não fosse assim, a dicotomia entre violência e legitimidade se desfaria – e sem tal dicotomia, seria muito mais difícil justificar o uso de força contra aqueles que ameaçam o status quo. No mesmo sentido, quanto mais abrirmos espaço na discussão sobre o que permitimos que as autoridades definam como violento, mais elas irão incluir nessa categoria, e maior será o risco que todos nós iremos correr. Uma consequência das últimas décadas de disobediência civil que se auto-denomina “não-violenta” é que algumas pessoas consideram até levantar a voz como um ato violento; isto permite retratar como “marginais violentos” aqueles que tomam as mínimas providências para se proteger da polícia.



“Os indivíduos que formaram uma corrente com seus braços e ativamente resistiram – isto por si só é um ato de violência … dar os braços uns aos outros em uma corrente humana após uma ordem de dispersão não é um protesto não-violento.”


— Capitão Margo Bennett, guarda universitário, citado no The San Francisco Chronicle, justificando o uso de força contra estudantes na Universidade da Califórnia em Berkeley


As Ferramentas do Mestre: Deslegitimação, Deturpação e Divisão

Repressão violenta é apenas uma parte da estratégia usada para suprimir movimentos sociais. Para que esta repressão tenha sucesso, é preciso dividir os movimentos em legítimos e ilegítimos, e então convencer os primeiros a repudiar os últimos – muitas vezes em troca de privilégios e concessões. Podemos ver este processo em primeira mão nos esforços de jornalistas profissionais como Chris Hedges e Rebecca Solnit em demonizar rivais no movimento Occupy.


Em seu artigo Throwing Out the Master’s Tools and Building a Better House: Thoughts on the Importance of Nonviolence in the Occupy Revolution,” (Jogando Fora as Ferramentas do Mestre e Construindo Uma Casa Melhor: Reflexões Sobre a Importância da Não-violência na Revolução do Occupy) Rebecca Solnit misturou argumentos morais e estratégicos contra “violência,” adotando uma forma de excepcionalismo estadunidense: Zapatistas podem pegar em armas e rebeldes egípcios podem por fogo em prédios, mas não podemos deixar nem uma lixeira pegar fogo nos EUA.


Solnit deveria saber que a definição de violência não é neutra: em seu artigo “The Myth of Seattle Violence,” ela narrou sua tentativa frustrada de tentar fazer com que o New York Times deixasse de representar como “violentos” os protestos contra o encontro da OMC em 1999 em Seattle. Através da repetida ênfase da violência como sua categoria central de análise, Solnit reforça a efetividade de uma das ferramentas que inevitavelmente serão utilizadas contra manifestantes – incluindo ela – sempre que servir aos interesses dos poderosos.


Solnit manifesta especial desaprovação por aqueles que defendem a diversidade de táticas como uma forma de impedir a divisão de movimentos. Vários parágrafos de seu “Throwing Out the Master’s Tools” são dedicados a criticar o panfleto “Dear Occupiers”(“Queridas Ocupantes”) do coletivo CrimethInc. Solnit considerou-o um “grito pela justificação da violência,” ou ainda “machismo vazio temperado de insultos”, e partiu para ataques ad hominem contra autoras sobre os quais ela reconhecidamente não sabia nada.

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Como qualquer um pode facilmente constatar, a maioria de “Dear Occupiers” simplesmente revisa os problemas sistêmicos com o capitalismo; a defesa da diversidade de táticas limita-se a só uns dois parágrafos. Por que uma autora premiada retratá-lo como um grito pró-violência?


Talvez seja por esta mesma razão que Solnit una-se às autoridades para deslegitimar a violência mesmo quando isto acaba por ajudar as autoridades a deslegitimar os próprios esforços de Solnit: sua influência em movimentos sociais e seus privilégios na sociedade capitalista baseiam-se ambos na distinção entre legítimo e ilegítimo. Se movimentos sociais um dia parassem de ser geridos de cima pra baixo – se eles parassem de se policiar – os Hedges e Solnits (e Villalvas, e Bonfims, e Boulos, e vários outros). do mundo ficariam literal e figurativamente desempregados. Isso explica porque eles percebem como seus piores inimigos aqueles que moderadamente aconselham contra a divisão de movimentos entre facções legítimas e ilegítimas.


É difícil imaginar que Solnit teria representado o “Dear Occupiers” como ela fez se ela esperasse que seu público lesse o texto original. Dado seu público, trata-se de uma aposta segura – Solnit é frequentemente publicada na mídia corporativa, enquanto textos da CrimethInc são distribuídos apenas por redes comunitárias [grass-roots networks]; de qualquer forma, ela nem incluiu um link. Chris Hedges agiu de forma similar em seu notório “The Cancer in Occupy”, uma série de absurdas generalizações sobre “anarquistas black blocs.” Parece que o objetivo de ambos os autores é silenciar: por que você iria querer ouvir o que essas pessoas têm a dizer? Elas são marginais violentos.


O título do artigo de Solnit faz referência ao influente texto de Audre Lorde intitulado “The Master’s Tools Will Never Dismantle the Master’s House.” seu texto não era uma apologia à não-violência; mesmo Derrick Jensen, que Hedges cita favoravelmente, já combateu tal uso incorreto desta citação. Aqui, basta repetir que a mais poderosa das ferramentas do mestre não é a violência, mas a deslegitimação e a divisão – como Lorde enfatizou em seu texto. Para defender nossos movimentos contra tais ferramentas, Lorde afirma:


“A diferença não deve ser meramente tolerada, mas vista como um fundo de polaridades necessárias entre as quais nossa criatividade pode florescer… Apenas dentro desta interdependência de diferentes forças, reconhecidas e iguais, poderá ser encontrado o poder de buscar novas formas de ser no mundo, bem como a coragem e a sustentação para agir quando não há guias.”


Se queremos sobreviver, isso significa:


“…aprender a resistir sozinho, na impopularidade e por vezes insultado, e a como encontrar causas em comum com os outros identificados como excluídos das estruturas de forma a definir e buscar um mundo em que todos possamos nos desenvolver… aprendendo como transformar nossas diferenças em forças. Pois as ferramentas do mestre jamais demolirão a casa do mestre.”


É especialmente vergonhoso que Solnit cite o argumento de Lorde contra o silenciamento de maneira descontextualizada para deslegitimar e dividir. Mas talvez nós não deveríamos nos surpreender quando profissionais de sucesso criticam [sell out] pobres anônimos: eles têm que defender seus interesses de classe, ou acabar por se juntar a nós. Pois os mecanismos que treinam pessoas para posições de influência dentro de hierarquias ativistas e da mídia liberal também não são neutros; eles recompensam a docilidade, muitas vezes apelidada de “não-violência,” invisibilizando aqueles cujos esforços realmente ameaçam o capitalismo e a hierarquia.


O Engodo da Legitimidade

Quando queremos que nos levem a sério, é tentador reivindicar legitimidade da forma que pudermos. Mas se não queremos reforçar as hierarquias de nossa sociedade, devemos ter cuidado para não validar formas de legitimidade que as perpetuam.


É fácil reconhecer como isso funciona em algumas situações: quando avaliamos pessoas com base em suas credenciais acadêmicas, por exemplo, isto prioriza conhecimento abstrato sobre experiência vivida, centralizando aqueles que têm uma chance na academia e marginalizando todas as outras. Em outros casos, isso acontece mais sutilmente. Enfatizamos nosso status como militantes sociais, deixando implícito que aquelas que não podem abrir mão do tempo ou recursos para tais ocupações têm menos qualificação para falar. Reivindicamos credibilidade como membros de longa data de uma comunidade, implicitamente deslegitimando quem não é – incluindo imigrantes que foram forçadas a morar conosco porque suas regiões de origem foram destruídas por processos que gerados, muitas vezes, em nossas regiões. Justificamos nossas dificuldades com base em papéis na sociedade capitalista – como estudantes, trabalhadores, contribuintes, cidadãos – sem nos darmos conta de quão difícil isso torna essa mesma justificação para quem é não tem emprego, moradia ou sofre outras formas de exclusão.


Com frequência nos surpreendemos com a reação contrária resultante. Políticos questionam nossos companheiros com o mesmo vocabulário que popularizamos: “Estes não são ativistas, são moradores de rua fingindo ser ativistas”. “Nós não estamos atacando comunidades negras, estamos protegendo-as dos criminosos”. Mas nós é que preparamos o caminho para isso ao fazermos uso de um discurso que torna a legitimidade algo condicional.


Quando enfatizamos que nossos movimentos são e devem ser não-violentos, estamos fazendo a mesma coisa. Isto cria um Outro que está fora da proteção de qualquer legitimidade que nós tenhamos ganhado – ou seja, um alvo legítimo da violência. Qualquer pessoa que tire suas companheiras das garras da polícia em vez de aguardar passivamente sua própria prisão – qualquer um que faz escudos para se proteger de balas de borracha para não deixar as ruas sob o controle policial – qualquer um que é acusado de desacato à autoridade ao ser agredido por uma autoridade: todos essas infelizes são jogadas aos lões como sendo as violentas, as maçãs podres. Aqueles que precisam usar máscaras mesmo em atos legais em virtude de terem um emprego precarizado ou por serem imigrantes são expostos como o câncer no movimento, traídos em troca de algumas migalhas de legitimidade dos poderes estabelecidos. Nós, Cidadãos de Bem, podemos nos dar ao luxo de sermos completamente transparentes; nós jamais cometeríamos um crime ou abrigaríamos um criminoso em potencial em meio a nós.


E o processo de tornar alguém nesse “outro” violento, prepara o caminho para a violência contra o “outro”. Aquelas que sofrem as piores consequências desse processo não são os mimados de classe média tão xingados na internet, mas as mesmas pessoas que estão sempre do lado errado de toda outra linha divisória do capitalismo: os pobres, os marginalizados, aqueles sem credenciais, nenhuma instituição pode defendê-los, nenhum incentivo para jogar numa política desigualmente favorável às autoridades e talvez alguns ativistas oportunistas.


Simplesmente deslegitimar a violência não acabará com ela. As disparidades em nossa sociedade não seriam mantidas sem elas, e os desesperados sempre responderão assim atuando, especialmente quando sentirem que forem abandonados ao seu destino. Mas este tipo de deslegitimação pode criar um grande abismo entre os irritados e os moralmente superiores, os “irracionais” e os racionais, os violentos e os sociais. Nós vimos as consequências disto nas revoltas no Reino Unido em 2011, quando muitos dos marginalizados, cansados de tentar se melhorar por quaisquer meios legítimos, travaram uma guerra privada contra a propriedade, a polícia, e o resto da sociedade. Alguns deles já haviam tentado participar em movimentos populares, mas foram estigmatizados como baderneiros (ou hooligans); de forma nem um pouco surpreendente, seu movimento tomou um caráter antissocial, resultando em cinco mortes e uma maior alienação deles dos outros setores da população.


A responsabilidade por esta tragédia não é apenas dos próprios rebeldes, ou daqueles que impuseram sobre eles as injustiças que eles sofreram, mas também sobre os ativistas que os estigmatizaram em vez de incluí-los na criação de um movimento que poderia canalizar sua raiva. Se não há conexão entre aqueles que pretendem transformar a sociedade e aqueles dentro desta que mais sofrem, nenhuma causa comum entre os esperançosos e os enraivecidos, então quando os últimos se revoltam, os primeiros os rejeitam, e os últimos são esmagados juntos com qualquer esperança de mudança real. Nenhum esforço para negar a hierarquia pode ter sucesso ao mesmo tempo em que excluir os marginalizados, os Outros.


Qual deveria ser a base para legitimidade, então, se não nosso comprometimento com a legalidade, a não-violência, ou qualquer outro padrão que deixa de fora nossos companheiros? Como explicamos o que estamos fazendo e por que temos o direito de fazê-lo? Devemos cunhar e circular uma moeda que não é controlada por nossos governantes, que não crie Outros.


Como anarquistas, sustentamos que nossos desejos e bem-estar e aqueles de nossos pares são a única base significativa para ação. Em vez de classificar ações como violentas ou não-violentas, focamos em sua capacidade de extender ou diminuir a liberdade. Em vez de insistir que somos não-violentos, enfatizamos a necessidade de interromper a violência inerente ao governo de cima para baixo. Isto pode ser inconveniente para aqueles acostumados a buscar diálogo com os poderosos, mas é inevitável para todos que realmente queiram abolir o poder em si.


Conclusão: de Volta à Estratégia

Mas como interrompemos a violência do governo de cima para baixo? Os partidários da não-violência colocam seu argumento em termos estratégicos e morais: violência aliena as massas, impedindo que consigamos construir o “poder popular” de que precisamos para ter sucesso.


Há um pouco de verdade no fundo disso. Se a violência for compreendida como uso ilegítimo da força, tal argumento pode ser visto como uma tautologia: atos deslegitimados são impopulares.


De fato, aqueles que tomam a legitimidade da sociedade capitalista como algo dado estão fadados a ver qualquer um que toma providências materiais para contrapor suas disparidades como violento. O desafio à frente de nós, então, está em como legitimar formas concretas de resistência: não com base em sua não-violência, mas com base em seu caráter libertador, em sua capacidade de satisfazer necessidades e desejos reais.


Não é uma tarefa fácil. Mesmo quando apaixonadamente acreditamos no que estamos fazendo, se não for algo reconhecido amplamente como legítimo, tendemos a não saber nos explicar muito bem. Se ao menos pudéssemos permanecer dentro dos limites que nós são impostos dentro deste sistema enquanto tentamos derrubá-lo! O movimento Occupy foi caracterizado por tentativas de fazer justamente isso – cidadãos insistindo em seu direito de ocupar parques públicos com base em interpretações obscuras de lacunas legais, fazendo justificativas tortuosas tão pouco convincentes para passantes quanto para as autoridades. As pessoas querem remediar as injustiças ao nosso redor, mas em uma sociedade altamente regulada e controlada, há tão pouco que elas se sentem no direito de fazer.


Solnit pode estar certa ao dizer que a ênfase na não-violência foi essencial para o sucesso inicial do Occupy Wall Street: as pessoas queriam alguma garantia de que elas não teriam de deixar suas zonas de conforto, e que o que elas estavam fazendo faria sentido para todas as outras pessoas. Mas frequentemente ocorre que as pré-condições para um movimento se tornam limitações que ele precisa superar: o Occupy Oakland permaneceu vibrante após as outras ocupações se esvaziaram porque foi um movimento que abraçou uma diversidade de táticas, não apesar disto. Da mesma forma, se realmente queremos transformar nossa sociedade, não podemos permanecer sempre dentro dos estreitos limites do que as autoridades consideram legítimo: temos de estender o leque do que as pessoas se sentem no direito de fazer.



Toda a cobertura midiática do mundo não irá nos ajudar se nós falharmos em criar uma situação em que as pessoas se sentem no direito de defender a si mesmas e umas às outras.


Legitimar a resistência, expandir o que é aceitável, não serão coisas populares no começo – nunca é, precisamente por causa da tautologia explicada acima. É preciso esforço contínuo para alterar o discurso: calmamente enfrentando a indignação e recriminações, e humildemente enfatizando nossos próprios critérios de legitimidade.


Considerar que este desafio vale a pena depende de nossos objetivos de longo prazo. Como David Graeber pontou, conflitos sobre objetivos frequentemente se ocultam sob diferenças morais e estratégicas. Tornar a não-violência o principal mote de nosso movimento faz bastante sentido se nosso objetivo a longo prazo não é questionar a estrutura fundamental de nossa sociedade, mas criar um movimento de massas que pode deter a legitimidade como definida pelos poderosos – e que esteja preparado para policiar a si mesmo. Mas se realmente queremos transformar nossa sociedade, temos de transformar o discurso da legitimidade, não apenas nos posicionar bem dentro dele da forma que existe hoje. Se focarmos apenas neste último objetivo, vamos descobrir nossas bases de legitimidade fugindo de nosso controle o tempo todo, bases que muitos daqueles com os quais precisamos achar causas em comum jamais poderão compartilhar conosco.


É importante discutir estratégia: ultrapassar o discurso de não-violência não implica em apoiar cada vidraça quebrada como uma boa ideia. Mas tais debates só ficam perdidos quando dogmatistas insistem que todos os que não compartilham de seus objetivos e suposições – para não dizer seus interesses de classe! – não têm senso de estratégia. Também não é estratégico focar em deslegitimar os esforços uns dos outros em vez de coordenar ações conjuntas dentro do que temos em comum. Este é o ponto de defendeosr uma diversidade de táticas: construir um movimento que tenha espaço para todos nós, mas que não deixa espaço para dominação e silenciamento – um “poder popular” que pode tanto expandir quanto se intensificar.


“Aqueles que dizem que a revolução egípcia foi pacífica não viram os horrores que a polícia causou a nós, nem a resistência e a força que os revolucionários usaram contra a polícia para defender suas ocupações provisórias e seus espaços: pelas estimativas do próprio governo, 99 delegacias foram incendiadas, milhares de viaturas foram destruídas, e todos os escritórios do partido governante no Egito foram queimados. Barricadas foram levantadas, soldados foram agredidos e quando pessoas revidaram contra-atacando com pedras mesmo quando jogavam bombas de gás e munição letal contra nós… se o Estado tivesse desistido imediatamente, teríamos ficado muito felizes, mas à medida que eles buscavam abusar de nós, nos bater em e nos matar, sabíamos de que não haveria outra opção senão revidar.”


– Declaração de solidariedade do Cairo para Ocuppy Wall Street, 24 de outubro de 2011


Para Ler Mais

Bem-vindas às Linhas de Frente: Além da Violência e da Não-violência – por coletivo Chuang


Nenhuma Paz Vai nos Proteger - O Discurso da Não-violência no Brasil pós-2013


Como a não-violência Protege o Estado – livro de Peter Gelderloos analisando o fracasso da não-violência enquanto movimento social no mundo todo.


Debating Tactics: Remember to Ask, “What Works?”


Historicizing “Violence”: Thoughts on the Hedges/Graeber Debate


Perceba como a polícia rotineiramente acusam as pessoas detidas por qualquer tipo de violência que tenha sido usada contra elas. ↩


Ao que consta, embora Solnit alega que “não parecemos preparadas para agir”, as autoras de “Dear Occupiers” e deste texto são todos participantes veteranas de movimentos sociais, a maioria dos quais vive bem abaixo da linha de pobreza, longe das Mecas progressistas como a dela em São Francisco. Este assunto nos toca muito perto de casa: vários de nós enfrentamos acusações forjadas de motim – um por atuar como um contato público durante uma manifestação anti-gentrificação, outro por ser abordada pela polícia durante uma marcha de rua – e muitos de nós temos queridos amigos na prisão. Escolhemos escrever anonimamente em parte porque, não sendo jornalistas profissionais, não podemos contar que nossos patrões não nos demitam por nossas crenças políticas, e também porque essas crenças atraem mais atenção hostil das autoridades do que as de Solnit ou Hedges, mas acima de tudo porque não buscamos construir carreiras ou fama pessoal em nossos esforços para mudar o mundo. ↩


Fonte - https://pt.crimethinc.com/2021/01/30/a-ilegitimidade-da-violencia-e-a-violencia-da-legitimidade-1


sábado, 30 de janeiro de 2021

O nefasto jeitinho brasileiro 2.0

 


Duas semanas após dezenas de pessoas morrerem sufocadas pela falta de oxigênio em hospitais de Manaus, o ministro da Saúde brasileiro, general Eduardo Pazuello, agora alvo de um inquérito da Polícia Federal que apura sua suposta omissão na crise, mudou de discurso. Instalado na capital do Amazonas desde quarta-feira, ele fez um sombrio prognóstico para a situação sanitária: advertiu sobre a urgência da transferência dos pacientes para outros Estados e alertou que, caso isso não ocorra, é esperada uma média de 100 mortes diárias na cidade. “As UTI’s não se criam de um dia para o outro”, justificou o ministro, que tem sido cobrado por não ter se antecipado ao colapso, que já afeta Rondônia. "Esta história de querer fazer de Pazuello um bode expiatório leva a pensar se os militares não se sentirão humilhados ao ver um general da ativa investigado por crimes contra a vida", escreve o colunista Juan Arias.

Em paralelo ao colapso da saúde pública, que ultrapassa as fronteiras do Amazonas e já se espraia pela região Norte, a campanha de vacinação brasileira dá margem a diversos dilemas éticos. Sob o lema “farinha pouca, meu pirão primeiro”, os fura-filas da vacinação escancaram a versão 2.0 do jeitinho brasileiro e tiram a vacina do braço de quem precisa. Apesar de a atitude de quem tomou o imunizante antes do tempo ser moralmente reprovável, o pesquisador Lluis Montoliu defende a administração da segunda dose a essas pessoas, já que o ganho social ao vaciná-las é maior que seu egoísmo. Além disso, a recente sinalização do Governo federal ―de que não deverá apresentar objeções à compra de vacinas pela rede privada― também aprofunda o debate sobre a distribuição das doses no país, já que a concorrência com a rede privada pode aprofundar a desigualdade ao excluir populações mais vulneráveis do acesso à vacina pelo SUS.

Neste sábado, em uma final 100% brasileira, Santos e Palmeiras disputam no Maracanã a final da Copa Libertadores. A disputa do título mais cobiçado da América atravessa o Oceano Atlântico e pode consagrar a soberania dos técnicos portugueses no Novo Continente. Breiller Pires conta que a vitória do Palmeiras pode dar a Abel Ferreira seu primeiro título como treinador e, pela segunda edição seguida, brindar um técnico português com a taça da Libertadores.



Manaus pode ter 100 mortes diárias se não houver transferência de pacientes
Manaus pode ter 100 mortes diárias se não houver transferência de pacientes
Pazuello, investigado pela PF na crise da falta de oxigênio, alerta para a necessidade de deslocar 1.500 doentes para aliviar as UTIs do Amazonas
Os fura-filas da vacinação, a nefasta versão 2.0 do jeitinho brasileiro
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Fenômeno é reflexo da perda de valores sociais de coletividade e é potencializado, segundo especialistas, pela polarização política

As férias douradas de Deltan

 

Sábado, 30 de janeiro de 2021
As férias douradas de Deltan

Ele embolsou R$ 76 mil num só mês.

O procurador da República Deltan Dallagnol publicou nas redes sociais um vídeo em tom emotivo para anunciar, em setembro, passado, que estava saindo da operação Lava Jato. À época coordenador da operação no Paraná, ele explicava que iria se afastar do cargo para cuidar da filha, que segundo ele começava a apresentar sinais de regressão no desenvolvimento.

“Ela parou de falar algumas palavras que ela já falava, deixou de olhar para gente quando é chamada e parou de olhar em nossos rostos e nossos olhos”, descreveu.

Preocupado, como qualquer pai ficaria, Deltan disse que era hora mudar de foco. “Depois de anos de dedicação intensa à Lava Jato, eu acredito que agora é hora de eu me dedicar de forma especial à minha família. Aquelas horas extras que eu investia [na operação] em noites, finais de semana e feriados, eu vou precisar focar agora na minha família.”

À época, não foram poucos os analistas que viram naquela justificativa uma maneira encontrada pelo procurador para sair pela porta da frente da Lava Jato após as inúmeras suspeitas lançadas contra a operação para reportagens da série Vaza Jato, publicadas pelo Intercept e veículos parceiros. O fato é que, três meses depois de expor seu drama pessoal e familiar, Deltan parece ter mudado de ideia. 

Ele abriu mão de 20 dos 60 dias de férias anuais a que tem direito para voltar a trabalhar antes do que precisaria. Não de graça, lógico. Com isso, embolsou quase R$ 30 mil extras. Pagos com dinheiro público. 

A grana foi creditada no contracheque de novembro do procurador. Só naquele mês, Deltan recebeu mais de R$ 42 mil líquidos – referentes ao salário do mês e ao terço de férias a que trabalhadores formais têm direito. Acrescente-se a isso a pilha de gratificações e auxílios pagos a membros do Ministério Público Federal e o período de férias vendido. Ao todo, foram mais de R$ 76 mil, líquidos, num único mês. 

Vender as férias não é ilegal. Qualquer trabalhador que já passou por um aperto já fez isso. Mas a lei impede que empregados do setor privado troquem mais de dez de seus trinta dias anuais de descanso por dinheiro. Deltan não tem o perfil de quem passa necessidade: seu salário habitual é de R$ 33 mil, quase o máximo que um servidor público pode receber no Brasil. 

Em novembro, quando vendeu as férias, o procurador recebeu quase duas vezes o chamado teto constitucional. Hoje, ele é de quase R$ 39,3 mil. Acontece que auxílios não entram nessa conta, tampouco o abono pecuniário – nome formal do valor recebido pela venda de férias.

Procuradores da República são alguns dos poucos privilegiados no Brasil com 60 dias de férias por ano – juízes e promotores dos ministérios públicos estaduais também estão no grupo. É o dobro das férias de quem atua no setor privado – e olha que nem estamos falando de trabalhadores informais, a maioria no Brasil, que se pararem de trabalhar ficam sem dinheiro algum. 

As férias em dobro, aliás, foram colocadas na balança por Deltan quando ele ponderou uma candidatura ao Senado em 2018. "é uma turbulência na vida familiar, ganha menos, tem menos férias, fica tomando pedrada na vitrine num jogo de menitras, correria um risco grande ao me desligar do MPF", ele escreveu no Telegram em março de 2017 – a grafia original foi mantida. Estava respondendo a uma voluntária da campanha pelas dez medidas contra a corrupção por que não gostaria de largar o cargo de procurador e se aventurar na política eleitoral. A mensagem faz parte do arquivo da Vaza Jato. 

 

Trabalho ‘desumano’

No final de 2019, os 60 dias de férias dos procuradores viraram tema de debate. Uma proposta de emenda à Constituição que tramitava no Congresso Nacional queria cortá-los pela metade, igualando os membros do MPF aos reles mortais com as da maioria que trabalham para a iniciativa privada.

Na época, o procurador-geral da República, Augusto Aras, insurgiu-se contra a tentativa de acabar com o privilégio. Em nota divulgada em novembro de 2019, Aras disse que a carga de trabalho dos procuradores da República era “até certo ponto desumana” e, por isso, as férias de 60 dias eram justificáveis.

Aras, entretanto, demonstrou alguma preocupação com o peso que os direitos dos membros do MPF exercem sobre os cofres públicos quando determinou em portaria que todos os trabalhadores do órgão esgotassem seus bancos de horas e tirassem as férias pendentes de 2018 e 2019 logo que a pandemia os obrigou a priorizar o trabalho remoto. Isso, segundo a portaria de Aras, deveria ocorrer até o final de julho de 2020.

As férias parcialmente vendidas por Deltan eram de 2018. O procurador acertou a venda de parte delas em setembro de 2020. Mas só em novembro é que uma portaria publicada pela PGR em novembro tornou regular o atraso no cumprimento da ordem de Aras. 

"Deltan Dallagnol e os demais procuradores da força-tarefa, por diversas vezes ao longo da operação, trabalharam durante as férias formalmente usufruídas. O abono pecuniário se refere à venda de 20 dias de férias, referente a parte das férias acumuladas, direito derivado de regras legais (Lei Complementar 75/93) e institucionais aplicáveis a todos os membros do Ministério Público Federal", disse a assessoria do MPF. Só não comentou que 60 dias de férias são um privilégio de poucos no Brasil.

Assim, com metade das férias no bolso e aparentemente alheio ao avanço da pandemia no Paraná e em Santa Catarina – agravada pela inação criminosa de Jair Bolsonaro, que a Lava Jato ajudou a eleger e a governar –, Deltan encontrou tempo até para se dedicar a uma atividade que adora: surfar. No fim de semana passado, ele postou uma foto com amigos na praia. É o "time do surf", ele explicou na legenda. 

Nenhum deles usava máscara.  

***

Deltan não está sozinho: na segunda, a gente te conta qual foi o jeitinho que promotores e procuradores encontraram para engordar seus contracheques no MP da Bahia. 😉

Vinicius Konchinski
Repórter 

Análise de Mídia - 30/01/2021

 

DOS JORNAIS DE HOJE: A Folha de S. Paulo destaca em sua capa a data do início da vacinação de idosos em São Paulo. Já O Globo e Estadão abordam a promessa de Jair Bolsonaro de recriar ministérios para acomodar mais nomes do Centrão em seu governo. O fato é que o Centrão vem ganhando espaço, mas os jornais colocam em dúvida se esse avanço aumenta o poder de Jair Bolsonaro ou se o torna mais refém das exigências do Centrão. Ao mesmo tempo, a forma como o presidente anunciou a sua mudança de posição sobre a necessidade imperiosa de enxugar violentamente o número de ministérios é um tanto impressionante. A inversão de sinal deixa claro que Jair Bolsonaro não tem compromisso com seu próprio discurso, mas não necessariamente seus eleitores e apoiadores percebem dessa forma. Talvez falte um “empurrãozinho”.
A Folha de S. Paulo aborda também a situação um tanto complicada no STF. O presidente da Corte teria traído o grupo de Toffoli, Gilmar e Lewandowski quando votou contra a permissão para que Davi Alcolumbre e Rodrigo Maia concorressem a reeleição no Senado e na Câmara, agora, o grupo pode inviabilizar os objetivos de Fux na presidência do STF. O jornal informa também que apesar da mudança do governo nos EUA e da dependência enorme que o Brasil tem da China, Ernesto Araújo decidiu manter a postura crítica aos chineses e estaria tentando envolver o novo governo dos EUA no que chamou de combate ao “tecno-totalitarismo”. Ainda sobre a relação China/Brasil, a Folha ainda publica reportagem sobre o fim da restrição à Huawei pelo governo de Jair Bolsonaro. No entanto, o presidente estaria impondo algumas condições. E em função do dia da visibilidade Trans, a Folha publica algumas reportagens sobre a violência contra transsexuais.
O jornal O Globo informa que a Caixa Econômica Federal está abrindo mais agências para cumprir um papel social que o governo deseja. O Estadão, por sua vez, foi o único dos jornais que reproduziu algum trecho das mensagens comprometedoras entre Deltan Dallagnol e Sergio Moro. O jornal mostra também que a China estaria retardando a vacinação de toda a sua população para exportar para outros países, comportamento que vai na contra mão da União Europeia e dos EUA. O Estadão informa também que o governo corre para aprovar o “novo Bolsa Família”.

 

CAPA – Manchete principal: *”SP anuncia que começará a vacinar os idosos no dia 8”*

EDITORIAL DA FOLHA - *”Vacina informativa”*: Depois de terem se unido para divulgar estatísticas diárias acerca da evolução da pandemia no país, veículos da imprensa se mobilizam para fornecer informações sistemáticas sobre a vacinação contra a Covid-19 e promover uma campanha sobre a importância dos imunizantes para superar a grave crise sanitária e econômica em curso. Diante da omissão funesta da Presidência da República, que descumpre reiteradamente o dever de liderar essas iniciativas e não cessa de vilipendiar a mídia, o consórcio formado por Folha, UOL, O Estado de S. Paulo, O Globo, G1 e Extra se vê mais uma vez instado a se contrapor à irresponsabilidade da administração federal. A divulgação de balanços sobre a aplicação da vacina em todo o país já está sendo realizada com o concurso de profissionais dedicados a apurar os dados mais confiáveis possíveis para acompanhar o desempenho das autoridades de saúde e dos governantes. Ainda há, contudo, obstáculos para obter informações junto a algumas unidades federativas. É do interesse do país que venham o quanto antes a ser superados.
São conhecidas as restrições enfrentadas pelo Brasil e por outros países para obter as quantidades suficientes de doses para cumprir o cronograma de imunização. Tais carências, no entanto, se revelariam menos dramáticas se o governo federal se comprometesse em atuar com um mínimo de eficiência no combate à Covid-19. Não foi o que se viu. Pelo contrário, o presidente Jair Bolsonaro empenhou-se numa sórdida batalha de desinformação a favor do vírus, na qual promove, com o aplauso e a colaboração de uma claque radical e inconsequente, o descrédito de medidas básicas para conter a disseminação da doença. Bastaria citar a investida contra a atuação técnica do Ministério da Saúde —que culminou com a nomeação de um general servil e inepto para a pasta— para atestar o descaso do mandatário, que se traduz em milhares de mortes potencialmente evitáveis. Outras sandices continuam a ser cometidas —e embasam justificadas acusações de crime de responsabilidade. Bolsonaro detesta a crítica, o debate, a prestação de contas e, portanto, a imprensa —como manifestou mais uma vez nesta semana, diante de uma plateia de acólitos, com requintes de vulgaridade. A imprensa profissional, com as diferenças que guarda entre seus veículos, as divergências que naturalmente suscita no debate público e mesmo suas falhas, tem na informação sua missão basilar. A gritaria obscena do presidente apenas escancara sua preferência pela ignorância e pelo autoritarismo.

PAINEL - *”Câmara vai permitir que deputados levem celular para cabine e sigilo da eleição fica em xeque”*: Há uma grande chance de o sigilo da votação na eleição da Câmara ser quebrado na próxima segunda-feira (1°). Alguns parlamentares dizem que vão querer filmar seus votos para prestar contas a eleitores. Diante das negociações de cargos e emendas nos bastidores durante a campanha, integrantes da oposição dizem temer que o bloco governista use o recurso como ferramenta para pressionar deputados. Arthur Lira (PP-AL) diz que não há chance de cobrar gravações de votos. Não há controle no momento da entrada do parlamentar na urna, nem vedação sobre os itens que pode portar. Há uma orientação geral para que não levem celulares, mas sem nenhum tipo de fiscalização. Bia Kicis (PSL-DF) é uma das deputadas que disseram ao Painel que vão filmar para postar nas redes sociais. Apoiadora de Lira, afirma que não recebeu nenhum pedido para fazer isso, mas que decidiu por conta própria. Embora não haja nenhuma suspeita sobre o sistema eletrônico da Câmara, Bia diz que pretende gravar o voto também por uma questão de segurança da eleição. Assim como nas três eleições de Rodrigo Maia (DEM-RJ) para o comando da Câmara, os principais partidos de oposição têm prometido apoio robusto a ele. O PT, que tem a maior bancada na Casa, deve levar, em troca, a indicação do bloco de Baleia Rossi (MDB-SP) para disputar o cargo mais importante da Mesa Diretora a que tiver direito. Além da presidência, estarão em disputa outros seis postos, duas vice-presidências e quatro secretários. Os principais candidatos a esses postos são indicados pelos blocos de acordo com o tamanho de cada um deles. Se o de Baleia for o maior, mas perder a eleição pra Lira, o candidato de Bolsonaro poderá ter como vice um parlamentar do PT, arquirrival do bolsonarismo. Líderes do PT dizem que, apesar de a votação ser secreta, não há chance de votos para Arthur Lira. O mesmo não se pode dizer em relação à deputada Luiza Erundina (PSOL-SP), candidata nanica que deve ter o voto de pelo menos três petistas: Natália Bonavides (RN), Marcon (RS) e Henrique Fontana (RS).

PAINEL - *”Cabo eleitoral do MDB fixa ponto no aeroporto de Brasília para convencer parlamentares a votar em Baleia”*

PAINEL - *”Ex-alunos do Colégio Santa Cruz enviam carta a Maia pedindo abertura de impeachment de Bolsonaro”*: Ex-alunos do Colégio Santa Cruz, de São Paulo, enviaram uma carta ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pedindo a apreciação dos pedidos de impeachment do presidente Jair Bolsonaro por crimes de responsabilidade durante a pandemia. A iniciativa se junta ao coro de outros grupos de estudantes de instituições de ensino da capital, como o Centro Acadêmico de Direito e a Escola Politécnica da USP.

PAINEL - *”Tribunal de Justiça de SP começará a pagar auxílio-saúde para seus magistrados a partir de fevereiro”*

*”Bolsonaro admite recriar 3 ministérios com eleição de aliados para comando da Câmara e do Senado”*: Em evento com esportistas fechado à imprensa mas transmitido por seus filhos em redes sociais, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse nesta sexta-feira (29) que pretende recriar os Ministérios da Cultura, o do Esporte e o da Pesca, que hoje tem status de secretarias de seu governo. O presidente condicionou a reacriação das pastas à eventual vitória de seus aliados na disputas pelos comandos da Câmara e do Senado, em eleições marcadas para esta segunda-feira (1º). Hoje o governo Bolsonaro tem 23 ministérios, 8 a mais do que os 15 prometidos durante a campanha eleitoral —sob a gestão de Michel Temer (MDB), seu antecessor, eram 29 ministérios. Nesta sexta-feira, o presidente também voltou a demonstrar seu interesse em disputar a reeleição e só deixar a Presidência em 1º de janeiro de 2027, após um eventual segundo mandato no cargo. "Pouca gente resiste ou resistiu dois meses de ataques que nós temos resistindo há dois anos. E isso eu tenho um sentimento, só um, que é entregar o Brasil em 2023 ou 2027, não sei, melhor do que eu recebi", afirmou. O evento não consta da agenda oficial do presidente e aconteceu em uma sala fechada apenas com convidados —a maioria deles sem máscara, ignorando as regras contra o coronavírus. "Eu queria que hoje eu tivesse sido eleito presidente porque algumas coisas a mais eu faria, outras eu não faria. Como, por exemplo, eu tenho três secretários que, seu eu soubesse do potencial de vocês e tivesse mais conhecimento com profundidade da importância, seria um ministério", disse Bolsonaro em seu discurso. O presidente citou os atuais secretários Jorge Seif (Pesca), Mário Frias (Cultura) e Marcelo Magalhães (Esporte).
Mais adiante, em sua fala, Bolsonaro retomou o assunto e afirmou que a recriação dos ministérios pode ser viabilizada com a eleição de seus candidatos às presidências da Câmara e do Senado, respectivamente Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG). "Se tiver um clima no Parlamento, pelo o que tudo indica as duas pessoas que nós temos simpatia devem se eleger, não vamos ter mais uma pauta travada, a gente pode levar muita coisa avante, quem sabe até ressurgir os ministérios, esses ministérios"​, declarou. O presidente reconheceu que pode ser alvo de críticas ao ampliar o número de pastas dos atuais 23 ministérios. "Alguém pode falar: 'Ah, quer criar ministério de novo'. O tamanho do Brasil, pessoal, só o Brasil é maior que toda a Europa Ocidental", afirmou. A eleição dos novos presidentes da Câmara e do Senado é tida como a senha para mais mudanças na Esplanada dos Ministérios. As alterações em discussão envolvem até mesmo a chamada cozinha do Planalto, pastas que despacham na sede administrativa do governo. Uma delas é a transferência da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, para a Secretaria de Governo, pasta responsável pela articulação política. Bolsonaro avalia que a ministra teve um desempenho positivo nas negociações com a China e a Índia para a liberação de insumos e vacinas para o Brasil e considera também como necessária a reaproximação do governo com a bancada ruralista do Congresso. Apesar de ser um dos pilares de sustentação da atual gestão, a frente parlamentar distanciou-se do Planalto durante a crise sanitária do coronavírus e parcela dela chegou a anunciar apoio a Baleia Rossi (MDB-SP) na disputa pela Câmara, o que irritou o presidente. A ideia de Bolsonaro é indicar um dos nomes da bancada, que seja filiado a uma sigla do chamado bloco do centrão, para substituir Tereza Cristina na Agricultura.
Além da Secretaria de Governo, o presidente considera remanejar o ministro Onyx Lorenzoni da Cidadania para a Secretaria-Geral da Presidência, abrindo mais espaço para o centrão. Caso Onyx assuma essa pasta, que despacha no Planalto, a ideia é retirar dela a SAJ (Subchefia para Assuntos Jurídicos) e vinculá-la à Casa Civil ou diretamente à Presidência. Bolsonaro ainda avalia se entregará o Ministério da Cidadania, cobiçado devido à atribuição de coordenar programas sociais, para o Republicanos ou para o PSC, partidos que têm forte relação com igrejas evangélicas. Para acomodar as duas siglas, o Planalto considera novamente desmembrar da Economia e recriar a pasta de Indústria e Comércio. Caso ele leve adiante a proposta, mesmo a contragosto do ministro Paulo Guedes, a ideia é de que ela seja entregue ao presidente nacional do Republicanos, deputado Marcos Pereira (SP). Bolsonaro também tem avaliado como contemplar o atual presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que não conseguiu disputar a reeleição ao cargo. Uma das hipóteses em avaliação é a pasta do Desenvolvimento Regional. Apesar da pressão pelas saídas de Eduardo Pazuello (Saúde) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores), o presidente tem sinalizado que não fará mudanças por ora. Bolsonaro, contudo, não descarta trocá-los a qualquer momento caso o desgaste de ambos se agrave.
Para a Saúde, é defendido desde o ano passado o nome do líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), que foi ministro da pasta durante o governo de Michel Temer (MDB). O nome dele chegou a ser citado inclusive em reunião promovida na Casa Civil. Para o Itamaraty, três nomes são avaliados, sendo o de dois embaixadores: André Corrêa do Lago, hoje na Índia, e Nestor Forster, nos EUA. O primeiro é neto do diplomata Oswaldo Aranha e ajudou a destravar o transporte das vacinas da Índia. O segundo conta com o apoio do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Com a indicação, além de nomear alguém de sua confiança para o cargo de ministro, o presidente sinalizaria ao governo do novo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, uma mudança de postura ao escolher um novo embaixador. Uma terceira opção em análise é o nome do atual secretário de Assuntos Estratégicos, almirante Flávio Rocha. Além de falar cinco idiomas, o militar já foi enviado pelo presidente para missões diplomáticas no Líbano e na Argentina. A indicação de Rocha para o Itamaraty ainda abriria a possibilidade de Bolsonaro acomodar Ramos na Secretaria de Assuntos Estratégicos caso ele decida deslocar Tereza para a Secretaria de Governo.
+++ É impressionante como Jair Bolsonaro muda seu discurso sem qualquer constrangimento. O número de ministérios sempre foi tratado como sinal do “Estado inchado” que precisaria cortar o número de ministérios. Agora, ele simplesmente diz que o Brasil é maior do que a Europa e, por isso, precisa de mais ministérios. A reportagem chega a mencionar a mudança no discurso, mas coloca “pouco peso” na questão.

*”Troca de mensagens imprudente, diz Mourão após demitir assessor que conspirou contra Bolsonaro”*
*”Para evitar vexame, Maia tenta segurar apoio de DEM e Solidariedade em eleição na Câmara”*
*”Na reta final da campanha na Câmara, ministros de Bolsonaro tentam interferir no DEM em prol de Lira”*
*”Abandonada na disputa pelo Senado, Tebet afirma que parte do MDB cedeu ao 'toma lá dá cá' e ataca governo”*

*”Pai de Baleia Rossi apresentou Temer a Joesley e é alvo de delações”*
*”Na TV, jovem apresentador Baleia Rossi pescava, fazia 'merchan' e entregava flores”*
DEMÉTRIO MAGNOLI - *”Manaus é a prova de que já não dispomos de um governo funcional”*

*”Lava Jato em xeque e escalada em rachas internos devem marcar julgamentos deste ano no Supremo”* - A ida das ações da Lava Jato para o plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) e a reviravolta no julgamento sobre a reeleição no Congresso Nacional indicam um cenário para 2021 em que os embates internos devem se intensificar na corte. O tribunal retomará os trabalhos nesta segunda-feira (1) com uma sessão protocolar de abertura do ano e, na quarta-feira (3), será a primeira reunião do plenário da corte. Depois de experimentar um período de união interna para responder aos ataques do presidente Jair Bolsonaro, a expectativa nos bastidores é a de que o tribunal volte a viver enfrentamentos entre seus integrantes neste ano. O aumento na análise de processos criminais de políticos, que costuma dividir os ministros, tem potencial de expor ainda mais o racha no Supremo. A ala composta pelos ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli ganhou o reforço do primeiro indicado do chefe do Executivo, Kassio Nunes Marques, em posicionamentos contra a Lava Jato. O presidente do STF, ministro Luiz Fux, acompanhado do relator da operação, Edson Fachin, e do ministro Luís Roberto Barroso, por sua vez, apostam nos julgamentos públicos para pressionar os magistrados sem posição pré-definida e forçar uma maioria a favor das condenações.
Somada à esperada divisão nas pautas criminais, há a indisposição criada com a ação que impediu Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP) de disputarem a recondução nas presidências da Câmara e do Senado, respectivamente. A ala contrária à Lava Jato apoiava a reeleição de ambos e se sentiu traída pelos votos de Fux e Barroso, que teriam se comprometido em votar a favor, mas acabaram se opondo à medida. Como reação, os ministros que ficaram vencidos no julgamento ameaçam “inviabilizar o plenário” e atrapalhar os planos de Fux para sua gestão à frente do STF, que vai até 2022. Um dos empecilhos deve ser em relação a uma das principais bandeiras de Fux: mudar o regimento para tornar automático o julgamento das decisões individuais liminares (provisórias) pelo plenário. O presidente tem dito que a remessa obrigatória ao plenário irá acabar com a monocratização do STF e, com isso, deixará a presidência tendo conseguido reinstitucionalizar a corte. Fux afirmou a interlocutores que tinha maioria para aprovar a medida, mas buscava consenso em relação à redação da proposta e à regra de transição para nova norma. No começo de sua gestão, disse em conversas reservadas que a mudança seria aprovada ainda em 2020. Na verdade, porém, enfrentou dificuldades, e isso deve se acentuar neste ano.
Outra ideia de Fux, que foi posta em prática logo que assumiu a presidência, mas que depende dos colegas para ter êxito, foi a retirada da Lava Jato da Segunda Turma, onde a operação costuma sofrer derrotas. A pretensão do presidente era usar o plenário virtual para analisar boa parte das ações e dos recursos a elas interpostos. Assim, planejava deixar o comando da corte com números significativos em relação ao andamento da operação no Supremo. Nos julgamentos online, porém, qualquer ministro pode pedir destaque para que o caso seja remetido à sessão presencial, atualmente realizada por videoconferência. Inicialmente, a ala contrária à Lava Jato pretendia retirar do virtual apenas os casos mais importantes. Depois da reviravolta no julgamento da reeleição no Congresso, porém, os ministros passaram a afirmar em conversas reservadas que a prática deve ser ampliada. Como as sessões presenciais ocorrem apenas duas vezes por semana e geralmente também têm outros temas sensíveis a enfrentar, a previsão é que Fux tenha dificuldade em destravar o andamento das investigações na corte. Na última semana de trabalho do Supremo em 2020, Fux anunciou uma previsão de pauta para o primeiro semestre de 2021.
O chefe da corte pediu para os colegas indicarem processos que gostariam de ver priorizados na pauta do plenário físico e boa parte dos pedidos foi atendido, principalmente como forma de distensionar a divisão interna acentuada pela reviravolta na análise da reeleição no Congresso. Na lista de julgamentos, não consta nenhuma ação da Lava Jato. Isso, porém, não quer dizer que os processos relacionados ao tema não serão julgados, uma vez que as ações criminais têm um rito diferente e só podem ser pautadas quando estiverem liberadas pelo relator e pelo revisor dos casos. Na previsão divulgada, o ano começará em 3 de fevereiro com a análise do processo do direito ao esquecimento, tema muito aguardado pelo mundo jurídico porque estabelecerá precedente para casos similares. O caso concreto a ser analisado é um recurso movido por irmãos de Aida Curi, assassinada em 1958 no Rio de Janeiro e retratada em programa da Rede Globo em 2004. A controvérsia é se pessoas ou familiares podem exigir que seus nomes sejam omitidos de documentos, textos ou reportagens sobre fatos antigos. Na última sessão do mês, em 24 de fevereiro, os ministros irão decidir se o presidente Jair Bolsonaro pode depor por escrito ou se deve ser ouvido presencialmente pelos investigadores no inquérito que apura as acusações feitas pelo ex-ministro Sergio Moro ao pedir demissão do governo.
Fux também pautou uma série de julgamentos tributários com impacto financeiro. Para 7 de abril, por exemplo, está previsto o julgamento da ação que discute lei do Espírito Santo que reduziu o ICMS de mercadorias importadas. O processo é importante porque pode definir limites à guerra fiscal que ocorre entre estados em busca de investimentos. A previsão de pauta, porém, dificilmente irá se realizar devido à demora para conclusão de julgamento e também por causa de assuntos urgentes que geralmente vão parar no Supremo durante o ano. O julgamento sobre a soltura de André de Oliveira Macedo, o André do Rap, um dos líderes do PCC (Primeiro Comando da Capital), por exemplo, foi um dos temas pautados com urgência no último semestre e alterou os planos de Fux para a pauta da corte. O professor e doutor em direito constitucional Ademar Borges, que advoga no STF e estuda o comportamento da corte, diz acreditar que as ações da Lava Jato terão prioridade na pauta. Para ele, contudo, Fux tentará evitar as disputas no plenário. “Embora os casos criminais costumem dividir o tribunal, o ministro Fux tem indicado a necessidade de construir uma jurisprudência mais estável sobre os mais diversos aspectos da operação”, aposta. O professor também afirma que a pauta anunciada por Fux indica que temas econômicos terão prioridade. Borges também prevê que discussões sobre a pandemia e sobre o conflito de competências da União, estados e municípios no combate ao novo coronavírus devem ter novos capítulos em 2021.

*”Brasil e EUA precisam barrar 'tecno-totalitarismo', diz Ernesto Araújo em referência à China”* - O Brasil de Jair Bolsonaro quer uma aliança com os Estados Unidos e "outros parceiros democráticos" para barrar a ascensão do "tecno-totalitarismo" de países com "diferentes modelos de sociedade" —ou seja, a China. A afirmação foi feita durante um painel virtual de debate do Fórum Econômico Mundial pelo chanceler brasileiro, Ernesto Araújo. Ele fez questão de não nominar "nenhum país ou companhia específicos", mas todas suas intervenções foram voltadas a fustigar a China, maior parceiro comercial brasileiro e no centro da chamada guerra da vacina, por ser o principal produtor de insumos dos imunizantes a serem feitos no Brasil. Ernesto estava acompanhado da chanceler espanhola, Arancha González, e do ministro canadense François-Philippe Champagne (ex-Relações Exteriores, agora Inovação), numa conversa mediada pelo presidente do fórum, Borge Brende.
A ideia era debater o conceito de cooperação internacional ante a realidade da pandemia da Covid-19 e da mudança climática —temas nos quais o negacionismo do governo Bolsonaro, alimentado pela ala ideológica da qual Ernesto faz parte, é notório. Enquanto os colegas debatiam a necessidade de garantir vacinação equânime e enfrentar os desafios da demanda de imunizantes, Ernesto preferiu falar na necessidade de manter valores como a liberdade nas relações internacionais. "Qualquer mudança nos EUA é imensa para nós", disse o chanceler, um fã declarado do antecessor do presidente Joe Biden, Donald Trump. "Se o foco é em mudança climática, OK, mas queremos fundamentar relação em liberdades", disse. Foi uma referência enviesada ao pacote de US$ 2 trilhões na área do clima anunciado pelo democrata, que assumiu na semana passada. "Um desafio é emergência do tecno-totalitarismo. Não se trata da questão de EUA contra China, mas é uma questão de diferentes modelos de sociedade. Novas tecnologias podem ser ótimas para a democracia, mas podem fornecer meios para um Estado totalitário, e não queremos isso."
"Queremos tratar desse tema com os Estados Unidos e parceiros democráticos", disse, excluindo a ditadura comunista da equação. "Quem controla o discurso tem um tremendo poder. Não podemos deixar isso na mão de atores, e não falo aqui de países ou companhias específicas, que não são comprometidos com a liberdade", disse o chanceler. Se não foi um ataque direto à China, como já fez no passado ao lado de expoentes do bolsonarismo com os filhos do presidente, foi uma pouco disfarçada declaração de princípios —ainda que tenha poupado os participantes da maquinações sobre o globalismo maléfico que permeiam suas falas. "Quando olhamos para os anos 1990 e 2000, a ideia era de que a China iria se tornar parecida com o Ocidente. Isso não aconteceu. O Ocidente se tornou mais parecido com a China. Nós não temos de mudar nossa sociedade", afirmou. Sobre mudança climática, que Ernesto já chamou de ideologia, ou Covid-19, cuja trapalhada na compra de doses de vacina da Índia custou pressão sobre seu cargo, nenhuma elaboração foi feita. Seus colegas foram mais cautelosos quando questionados sobre os efeitos da separação ("decoupling", no jargão internacional em inglês) dos modelos tecnológicos dos países encarnada na disputa pela implementação das redes 5G —a chamada internet das coisas.
Como se sabe, a China oferece um produto mais barato e eficaz, mas que é acusado no Ocidente de embutir elementos de espionagem ou roubo de dados. A discussão está viva no Brasil, que teoricamente decide neste ano quem vai poder fornecer equipamentos e operar o 5G no país. "Não podemos permitir a separação [nas relações internacionais] quando o assunto é a mudança climática. Temos de evitar a todo custo o confronto [entre China e EUA]", disse González ao comentar a posição europeia ante a briga dos gigantes. Champagne concordou com Ernesto acerca da necessidade de promover a governança democrática, mas disse que a relação com a China é "algo complexo". Para Ernesto, a única forma de lidar com a questão é deixar as pendências para serem resolvidas em entidades como a Organização Mundial do Comércio, desde que reformuladas —o Brasil compartilha a visão americana de que a China não joga pelas regras ali. "O sistema internacional tem de premiar a democracia", disse o brasileiro. Reticente acerca de Biden, afirmou que o Brasil quer trabalhar com o novo presidente americano "dentro desse arcabouço de liberdade" e que é a favor do que o democrata chamou de "aliança de democracias". Aproveitou e repetiu a narrativa usual do bolsonarismo de que o Brasil vinha "de uma situação em que estávamos longe das democracias", em relação à política Sul-Sul da era Lula, que já havia sido parcialmente revertida nas gestões Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB).
+++ Ernesto Araújo é um “homenzinho” medíocre.

*”Japão defende aliança com EUA, Austrália e Índia contra a China”*
TODA MÍDIA - *”Índia se abre para os EUA e tem alívio até na cobertura”*
*”Parlamento de Portugal aprova lei que autoriza eutanásia com várias restrições”*
*”Bruxelas escolhe mulher para substituir rei em 'feminização' da cidade”*

*”Poloneses protestam contra proibição ao aborto em dezenas de cidades”*
*”Alemanha e França barram entrada de quem esteve no Brasil, contra variantes de coronavírus”*
*”Itália prende médico suspeito de matar pacientes com Covid para liberar leitos”*
*”Após 3 dias, presidente da Itália encerra negociações inclinado a reviver coalizão”*

*”Em quatro décadas, Brasil reduz de 55% para 5% capacidade de produção de insumos farmacêuticos”* - Nos anos 1980, o Brasil produzia 55% dos insumos farmacêuticos consumidos no país. Hoje, esse percentual caiu para 5%, segundo dados da Abiquifi (Associação Brasileira da Indústria de Insumos Farmacêuticos). O tema ganhou destaque nas últimas semanas diante da necessidade de importação de insumos para a produção da vacina contra a Covid-19. A dependência da China e da Índia, sobretudo, para o fornecimento desses produtos é um dos problemas que têm atrasado o cronograma de vacinação do país. O cenário era bem diferente há 40 anos, quando o Brasil se aproximou da autossuficiência na fabricação de medicamentos, segundo a Abiquifi. Segundo o presidente-executivo da associação, Norberto Prestes, até a década de 1980, o país produzia metade dos insumos consumidos internamente, incluindo antibióticos, por uma questão de soberania nacional.
Nos anos 1990, porém, a indústria nacional sofreu um baque com a abertura comercial, que, ao reduzir tarifas, barateou os importados na comparação com o produto brasileiro. De acordo com o professor de economia da USP (Universidade de São Paulo) Paulo Feldmann, inicialmente, a indústria brasileira tentou acompanhar o preço da produção estrangeira, mas muitas empresas não conseguiram e quebraram, e os preços voltaram a subir. "Esse movimento de abertura comercial ocorreu em toda a América do Sul, mas não ocorreu na Ásia. Em um primeiro momento, o fabricante brasileiro teve que baixar o preço para competir, mas isso não se sustentou. Como consequência, houve aumento da nossa dependência do setor externo", afirma. Naquela época, também foram extintas medidas de proteção à produção interna de IFA (ingrediente farmacêutico ativo), utilizado na produção de vacinas. Atualmente, a China e a Índia são responsáveis por 74% da importação de IFA necessário para a fabricação da CoronaVac, desenvolvida pelo Instituto Butantan, e da Oxford/AstraZeneca, fabricada pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz). O restante é importado, principalmente, de Alemanha, Itália, Estados Unidos e Suíça, segundo a associação do setor.
“O Brasil não produz mais nenhum antibiótico. O que estamos vivendo na ciência, com essa dificuldade de insumos, não é uma questão pontual. O Brasil nunca trabalhou na vanguarda, sempre menosprezou a própria capacidade tecnológica", critica Prestes. De acordo com o diretor da faculdade de economia da PUC-SP, Antônio Corrêa de Lacerda, um processo de abertura comercial bem conduzido tende a estimular a produtividade e a competitividade da economia. No caso do Brasil, no entanto, houve aumento de desemprego e falência de empresas, diz o economista. “Tivemos um conjunto de erros. Houve concorrência enviesada que propiciou um aumento de produtos importados de forma insustentável. Com a mudança tarifária, ficou mais barato importar um produto final em vez de obter insumos para a produção. Como resultado, o país teve aumento de dependência de importação e um processo de desindustrialização”, afirma.
Segundo o economista-chefe do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), Rafael Cagnin, a dependência de insumos importados na indústria farmacêutica não é uma questão restrita ao Brasil. “Há dependência de insumos da China e da Índia também em outros países, mas a pandemia trouxe um alerta às cadeias globais de que é possível haver rupturas de fornecimentos em quadros excepcionais não somente na pandemia, mas em outros eventos que podem se tornar mais frequentes, como desastres ambientais”, disse. Para Renato Kfouri, diretor da Sbim (Sociedade Brasileira de Imunizações), embora o Brasil seja referência no Programa Nacional de Imunização, faltou ao país uma visão de longo prazo para situações emergenciais . Segundo Kfouri, vacinas de alta tecnologia demandam investimentos contínuos e de longo prazo em equipamentos, laboratórios de biossegurança, pesquisa e desenvolvimento, capacitação e produção de insumos e matérias-primas. “Ao mesmo tempo que a gente tem grandes laboratórios, técnicos bem formados e capacitados, não há um grande investimento. Acabamos ficando muito dependentes do mercado internacional, que normalmente tem preços muito baratos”, disse. Apesar do benefício no curto prazo, com a importação de produtos mais baratos do que o Brasil é capaz de produzir, Kfouri ressalva que, em situações emergenciais de saúde pública, como a pandemia do coronavírus, o país acaba ficando para trás na fila dos insumos, tornando-se incapaz de produzir a vacina.
Prestes, da Abiquifi, também destaca a falta de investimento em inovação como um dos principais problemas do Brasil. Ele critica, por exemplo, o foco em medicamentos genéricos da indústria farmacêutica nacional, produtos que em sua visão são, na prática, cópias de outros já desenvolvidos. “A gente não tem uma política pública de incentivo à produção nacional, não tem premiação para isso. O governo poderia incentivar: ‘quanto mais pesquisa você fizer, mais eu vou premiar, eu compro de você o que for inédito, eu ajudo você a investir'”, afirma. A falta da tecnologia necessária para a produção de testes da vacina obrigou a Farmacore a fazer uma parceria com uma empresa americana. A startup brasileira, com sede em Ribeirão Preto (SP), está desenvolvendo um imunizante brasileiro contra o coronavírus. “Nosso maior entrave foi na hora de produzir o lote piloto da vacina, porque o Brasil não tem capacidade instalada para produzir os testes em fase 1. Como o país não tem essa tradição, tivemos que fazer essa produção nos Estados Unidos”, afirma Helena Faccioli, presidente da Farmacore. “A intenção agora é trazer essa tecnologia para o Brasil por meio de processo de transferência e produzir nacionalmente todos os insumos”, diz.
Um movimento nessa direção foi a criação, pelo MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações), da Rede Vírus. O projeto envolve unidades de pesquisa, institutos de ciência e tecnologia e laboratórios que, em conjunto, atuam na produção de conhecimento sobre o coronavírus. Segundo Prestes, o grupo apoia iniciativas de vacinas que estão sendo desenvolvidas pela academia e por startups, mas falta ao grupo a participação estratégica da indústria. “É uma pena que a indústria não esteja nesse processo de inovação. Ela não liderou isso. Ela não viu isso como uma maneira de ganhar visibilidade, de promover a própria marca no mundo”, afirma. O Instituto Butantan está construindo desde novembro um laboratório especializado para a produção do IFA. De acordo com o gerente de Parcerias Estratégicas e Novos Negócios do instituto, Tiago Rocca, as obras devem ser concluídas no fim de setembro. “Depois dessa obra, com equipamentos instalados e a planta em operação, vamos precisar de uma certificação da Anvisa. A partir daí, vamos poder executar a transferência de tecnologia e produzir nacionalmente o IFA”, explica.
Em nota, a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) afirmou que aguarda a chegada do primeiro lote de IFA importado da China para iniciar a produção nacional de doses da vacina Oxford/AstraZeneca. Não há previsão de chegada ao país. A instituição espera a emissão da licença de exportação, a conclusão de procedimentos alfandegários e afirma que mantém o cronograma de entrega de 210,4 milhões de vacinas em 2021. “A Fiocruz está com todas as suas instalações prontas para iniciar a produção, mas ainda depende da chegada do IFA”, afirma. Além da compra de insumos da China, a instituição negocia com o Instituto Serum, da Índia, a importação de doses adicionais de vacinas prontas.
+++ Não surpreende, mas sempre impressiona a forma como a Folha ignora o que foi feito nos governos liderados pelo Partido dos Trabalhadores. A política de expansão e desenvolvimento da indústria farmacêutica que foi cortada por Michel Temer e Jair Bolsonaro.

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CIFRAS & LETRAS - *”Livro propõe abandonar dogma da austeridade e derrubar teto de gastos”* - A política fiscal deve ter como objetivo garantir o atendimento das demandas sociais, e não perseguir exclusivamente um déficit orçamentário zero. Essa é uma das ideias centrais do livro "Economia Pós-Pandemia: Desmontando os Mitos da Austeridade Fiscal e Construindo um Novo Paradigma Econômico", lançado em 2020. A publicação traz uma visão heterodoxa sobre o debate fiscal brasileiro, segundo os próprios organizadores do trabalho, os economistas Ana Luiza Matos de Oliveira, professora visitante da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), Pedro Rossi, professor do Instituto de Economia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), e Esther Dweck, professora do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e ex-secretária de Orçamento no governo Dilma Rousseff. Para os organizadores, o equilíbrio orçamentário se tornou uma finalidade em si, o que faz com que os direitos sociais tenham de se adequar às regras fiscais. Para eles, essa relação deve ser invertida: a política fiscal deve ser pensada de "baixo para cima". "Se a finalidade da política fiscal é promover o bem-estar social, é garantir direitos, então a responsabilidade fiscal deve levar isso em conta", dizem os organizadores na introdução do livro. "A finalidade fundamental da política fiscal deve ser a garantia dos direitos sociais e do bem-estar da população. É a garantia desses direitos que deve pautar o Orçamento, e não o Orçamento que deve condicionar a garantia dos direitos."
Em relação ao avanço da dívida pública para o patamar recorde próximo a 90% do PIB (Produto Interno Bruto), eles defendem que o crescimento econômico, e não o corte de gastos, é o fator essencial para que essa trajetória de crescimento da dívida seja estabilizada. "Propõe-se abandonar os dogmas da austeridade fiscal, as crenças de que o desenvolvimento será resultado natural do recuo das fronteiras do Estado e da eficiência do mercado e construir um novo paradigma de política fiscal e de desenvolvimento econômico, social e ambiental para o Brasil", dizem. "O crescimento econômico é essencial para que a trajetória da dívida pública em relação ao PIB seja estabilizada." Para os organizadores, o debate econômico brasileiro tem sido dominado por dogmas e por um "terrorismo fiscal". A publicação fala ainda que é necessário derrubar o teto de gastos da Constituição e trata da reforma administrativa no capítulo "Desmascarando fake news sobre o emprego público no Brasil". "Este livro busca desmontar esses argumentos e mostrar como a agenda da austeridade fiscal é anacrônica do ponto de vista macroeconômico e cruel do ponto de vista social", dizem. O livro é divido em 20 capítulos, escritos por cerca de 30 autores, individualmente ou em conjunto. A Folha conversou com os organizadores Ana Luiza Matos de Oliveira e Pedro Rossi.
Entrevista: Ana Luiza Matos de Oliveira
O objetivo do livro é questionar essa ideia da austeridade fiscal, que está interditando o debate. É um novo produto de um processo de debate com entidades, com economistas e não economistas, que a gente está fazendo desde 2015 [início do segundo mandato de Dilma, quando foi apresentado um plano de ajuste fiscal]. A gente costuma falar que não existe espaço para outro tipo de visão, e a gente mostra que diversos dogmas que estão amparando o debate público não se sustentam na experiência histórica. Uma coisa que a gente fala bastante no livro, desde o primeiro capítulo, é essa ideia de que, em vez de olhar qual o Orçamento que a gente tem e o que cabe dentro do Orçamento, pensar em qual país a gente quer e, a partir disso, como a gente financia. É um pouco inverter essa lógica.
Dívida pública
A gente tem batido bastante na tecla de que essa política que a gente vem adotando, principalmente desde 2015, é como se fosse um tiro no pé. A gente está cortando cada vez mais os gastos do setor público e cortando muitos gastos com multiplicador muito alto, ou seja, que teriam capacidade de gerar atividade econômica e arrecadação. Você corta gastos para tentar reduzir a dívida, mas a dívida e o déficit vão aumentando, porque a nossa receita também está caindo.
Teto de gastos
A ideia é focar projetos e propostas que façam o Brasil voltar a crescer. Para fazer isso, precisa de outro arcabouço fiscal. Com a emenda 95 [teto de gastos], isso não é possível.
Gasto social
Uma das coisas que a gente coloca como central é essa questão da importância do gasto social na redução das desigualdades. A gente teve várias reformas no Brasil nos últimos anos e estamos voltados agora para uma possível reforma administrativa. No livro a gente mostra que o gasto social beneficia muito mais as camadas mais pobres, principalmente saúde e educação. Eu assino o capítulo sobre gênero e o capítulo final, que é mais propositivo. A gente tem alguns dados sobre Orçamento mostrando como algumas políticas que foram muito importantes para combate à violência de gênero e autonomia das mulheres perderam 80% dos recursos de 2015 para cá.

Entrevista: Pedro Rossi
A gente trouxe para o livro uma visão diferente de política fiscal, uma visão orientada por direitos. Os direitos sociais, os direitos humanos deveriam ser uma finalidade da política fiscal. É uma visão heterodoxa sobre o debate fiscal. É uma forma que inverte a hierarquia que está no debate público hoje. A hierarquia que está na emenda constitucional 95 [teto de gastos], por exemplo, é que você define por cima o limite e, por baixo, tem de ajustar tudo. São os direitos se ajustando ao teto, ao Orçamento. Do ponto de vista da Constituição, e a gente não está inventando nada, é o contrário. A política fiscal é um instrumento, um meio, não uma finalidade. O teto não deveria constranger a realização de direitos. As demandas da sociedade deveriam moldar o Orçamento.
Responsabilidade fiscal
A responsabilidade fiscal não pode ser exclusivamente uma política de perseguir um deficit orçamentário zero, o equilíbrio orçamentário. Se a finalidade da política fiscal é promover o bem-estar social, é garantir direitos, então a responsabilidade fiscal deve levar isso em conta. Os direitos deveriam condicionar a política fiscal, inclusive o direto ao trabalho. A política fiscal deveria perseguir o pleno emprego.
Gasto público
Nós desmontamos a ideia de que o crescimento do gasto público é o grande problema brasileiro. O gasto público não é o grande responsável pelo aumento da dívida. O período em que a dívida mais aumenta é justamente aquele em que o crescimento do gasto é mais baixo. A gente não crava uma regra fiscal específica, porque a gente acha que isso tem de ser construído de baixo para cima. Ou seja, quais as necessidades nos campos sociais e, a partir disso, essa necessidade de financiamento se materializa em uma regra fiscal.
Insolvência
Não existe a ideia de que estamos à beira da insolvência. Isso a gente aponta como terrorismo fiscal. Não pode pensar em um país à beira da insolvência com a menor taxa de juros da história. Não tem problema financiar recuperação com dívida. Nossa ideia é ver o crescimento da dívida não como problema a ser atacado em si, mas como algo que vai ser estabilizado pelo crescimento. A gente vive em um mundo de juros que devem continuar baixos por um longo tempo. Com isso, o custo da dívida é baixo. Isso implica que a gente precisa de um crescimento que não é tão alto para estabilizar a dívida pública. Ela será estabilizada com a retomada do crescimento e do emprego. Cortar gastos para gerar redução da dívida pode ser contraproducente.

*”Divididos, caminhoneiros tentam fazer nova greve na semana que vem”*
*”Dívida pública bate recorde e termina o ano em 89,3% do PIB, diz BC”*
*”Guedes cancela em cima da hora participação em evento do Fórum Econômico Mundial”*
*”Mercado livre de energia reduziria em até 30% custo para consumidor, diz associação”*

*”Dólar sobe 5,53% em janeiro, maior alta mensal desde o início da pandemia”*
OPINIÃO - *”Ao copiar GameStop, brasileiros montam armadilha e testam CVM”*

*”Para liberar Huawei, Bolsonaro obriga teles a construírem uma rede de telefonia só para o governo”* - O Ministério das Comunicações publicou, nesta sexta-feira (29), portaria impondo às operadoras que vencerem o leilão 5G a obrigação de construir uma rede privativa (fixa e móvel) para o governo de Jair Bolsonaro, em Brasília. A medida foi entendida pelo setor como uma sinalização de que o presidente não vetará a contratação da chinesa Huawei pelas operadoras de telefonia, que participarão do certame. Uma proibição à empresa chinesa obrigaria as operadoras a investir em uma custosa substituição de suas redes 3G e 4G —grande parte dessa infraestrutura foi construída com equipamentos da Huawei, que não conversam com os de 5G dos demais fornecedores. Apesar disso, a minuta da portaria, à qual a Folha teve acesso, não garante a plena isonomia da gigante chinesa nas redes 5G. Também não deixa explícito que os equipamentos da Huawei não poderão ser usados nessa rede considerada de “segurança nacional”. Representantes das operadoras, no entanto, afirmam que esse foi o entendimento depois de conversas com assessores de Bolsonaro. Pessoas que participaram das discussões afirmam que essa obrigação também foi incluída no edital do 5G. O relatório com as regras do certame deve ser votado pelo conselho diretor da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), nesta segunda-feira (1).
A construção de uma rede privada para o governo foi considerada contrapartida de investimento para as operadoras que arrematarem os blocos de frequências no certame. Há diversas obrigações dessa natureza previstas no edital, como a construção de antenas de celular em quase 50 mil km de rodovias federais e levar internet à região Norte. No leilão serão vendidas faixas de frequências --avenidas no ar por onde as teles fazem trafegar seus sinais-- e quanto mais contrapartidas de investimento impostas para cada faixa, menor será o lance a ser pago no ato ao governo. Assessores do Planalto afirmam que essa foi a saída para permitir que a ala ideológica do governo, liderada pelo GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, não saíssem desacreditados do embate que travaram contra a China e a Huawei, especificamente, lançando dúvidas sobre a segurança de seus equipamentos. Esse grupo encampou, sem apresentar provas, o discurso dos EUA de que havia risco de vazamento e roubos de dados e até espionagem entre governos. Inicialmente, o Palácio do Planalto queria que a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) impusesse restrições à Huawei no edital do 5G.
No entanto, essa diretriz não foi acatada e, como revelou a Folha, as regras do edital devem ser votadas pelo conselho diretor da agência, nesta segunda-feira (1), sem qualquer tipo de barreira contra a Huawei ou qualquer outra fornecedora. A crise deflagrada pela importação da China de insumos para a fabricação da vacina contra a Covid-19 acabou colaborando em favor da Huawei. As relações com a China, que estavam comprometidas pelo chanceler Ernesto Araújo, estão sendo retomadas e a primeira carga do princípio ativo do imunizante já chegou ao país. O endurecimento com a China, principal parceiro comercial do Brasil, levou o presidente a sofrer uma derrota política para o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que deu início à vacinação no estado antes do governo federal por ter negociado com a China com antecedência. Apesar da sinalização em favor da Huawei, técnicos do governo afirmam que o presidente tem a prerrogativa de assinar um decreto restringindo a fabricante caso, futuramente, alguma suspeita contra seus equipamentos seja confirmada.

MARCOS MENDES - *”Solidariedade social”*
*”OAB pede apuração imediata à ANPD sobre megavazamento de dados”*
*”WhatsApp amplia segurança para versão web com bloqueio biométrico”*

*”SP começa a vacinar idosos em 8 de fevereiro, anuncia Doria”*

*”Sem respaldo federal, SP desiste de usar todas as doses disponíveis da Coronavac para a 1ª dose”*
*”Doria decide cancelar feriados de Carnaval em SP”*
*”Gestão Bruno Covas decide cancelar ponto facultativo do Carnaval para conter pandemia de Covid-19”*
*”Vacina da Janssen de dose única é eficaz contra a Covid, mas proteção contra novas variantes preocupa”*
*”Fiocruz pede registro definitivo de vacina de Oxford na Anvisa”*

*”Tribunal derruba liminar que impedia reabertura das escolas em SP”*

*”Médico citado em liminar contra aulas diz que só defendeu a vacinação de professores”*
*”Butantan negocia exportação de Coronavac com países sul-americanos”*
OSCAR VILHENA VIEIRA - *”A troca da guarda”*
*”Casos de traumas crescem com maior circulação e disputam vagas com Covid nos hospitais”*

*”Transferência de 1.500 pacientes é única solução para evitar mortes no AM, diz Pazuello”*

*”Países da América Latina e Ásia autorizam compra de vacina contra Covid-19 por empresas, mas falta estoque”*
*”Matrícula em creche pública tem a 1ª queda em 20 anos”*
*”Com pichação como moldura, mural é investigado em inquérito policial em BH”*

*”Assassinatos de transexuais crescem 41% no país e chegam a 175 em 2020, diz relatório’* - O ano de 2021 começou com o assassinato de Keron Ravach no Ceará. Aos 13 anos, a adolescente transexual foi morta com socos, pedradas, pauladas, facadas, teve os olhos perfurados e a roupa introduzida no ânus. Crimes contra pessoas transgênero, com extrema violência como o de Keron, estão em alta no país. Em 2020, ao menos 175 mulheres transexuais foram assassinadas em 2020, de acordo com relatório da Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil) e do IBTE (Instituto Brasileiro Trans de Educação). Em 2019, o país havia registrado ao menos 124 mortes —como se trata de dados subnotificados, estima-se que o número seja maior. Com isso, o aumento das mortes neste ano em relação ao ano passado foi de 41%. Nesta sexta-feira (19), o país comemora o Dia da Visibilidade Trans, população alvo de crimes de ódio e violência crônica no país. As mortes no ano passado estão acima da média registrada desde 2008, de 122,5 assassinatos por ano. "O ano de 2020 revelou aumento de 201% em relação a 2008, o ano que apresentou o número mais baixo de casos relatados, saindo de 58 assassinatos em 2008 para 175 em 2020. Mesmo durante a pandemia, os casos tiveram aumento significativo de acordo com o publicado nos boletins bimestrais ao longo de 2020", diz o documento da Antra. No período monitorado pelo estudo, apenas em 2017 houve mais mortes que no ano passado, um total de 179.
O estado de São Paulo lidera as mortes, com 29 casos e um aumento de 38% em relação a 2019. Trata-se do segundo aumento consecutivo –no ano passado já havia tido uma alta de 50%. Atrás de São Paulo vêm Ceará (22), Bahia (19), Minas (17) e Rio de Janeiro (10). "São Paulo, Ceará, Bahia e Rio de Janeiro aparecem entre os cinco primeiros estados com mais assassinatos de pessoas trans desde 2017. Durante o ano de 2020, o Ceará chamou a atenção das mídias pelos recorrentes casos entre julho e agosto, somando nove assassinatos somente nesses dois meses", afirma o relatório. Apesar da liderença de São Paulo em mortes, por região é o Nordeste que concentra o maior número de casos —43%, ou 75 assassinatos. Em seguida, vêm Sudeste (59), Sul (14) e Norte (13). A maior parte das vítimas tem entre 15 e 29 anos, é negra, pobre e expressa o gênero feminino. Segundo o relatório, a prostituição é a fonte de renda mais frequente e os crimes ocorrem em vias públicas desertas, durante a noite. Os casos acontecem com violência excessiva e são praticados, na maioria das vezes, por pessoas sem relação direta ou afetiva com as vítimas. "É constante a ausência, a precariedade e a deficiência de dados, muitas vezes intencionalmente, usados para ocultar ou manipular a ideia de uma diminuição dos casos em determinada região", diz o documento. A falta de padronização dos dados leva a uma maior subnotificação dos crimes. "Isso faz aumentar ainda mais a dificuldade na busca desses dados, além de invisibilizar a motivação do caso e aumentar a subnotificação", afirma o relatório. Segundo o documento, há inclusive colaboração da mídia para essa invisibilidade da população transexual, uma vez que há notícias reportando mortes de travestis como "homens vestidos de mulher" ou também de homens trans como lésbicas. O documento da Antra é assinado por Bruna G. Benevides e Sayonara Naider Bonfim Nogueira.

*”43% da população trans de SP sofre violência nas ruas e escolas, aponta mapeamento inédito”* - Apesar de o STF (Supremo Tribunal Federal) ter reconhecido a homofobia e a transfobia como crimes de racismo, a população trans paulistana continua sendo vítima da violência física e verbal. É o que mostra o resultado do primeiro mapeamento da população trans realizado na cidade de São Paulo e divulgado nesta sexta-feira (29), quando é celebrado o dia da visibilidade trans. Dentre as 1.650 pessoas transgênero entrevistadas, 43% declararam já ter sido vítima de violência física devido à sua identidade de gênero. A frequência de violência física é ainda maior contra travestis (58%) e mulheres trans (45%). Cerca de 80% das pessoas trans entrevistadas também relataram que são alvos fáceis de violência verbal, com insultos e xingamentos. Ambos os tipos de violência —física e verbal— ocorrem principalmente nas ruas e nas escolas, dois ambientes fundamentais para o convívio social e o exercício da cidadania.
Segundo a pesquisa, a adolescência é vista como um momento crucial para as pessoas trans. É nesta fase da vida que a grande maioria adquire a percepção de que o seu sexo biológico não coincide com a sua identidade de gênero. "Esse sentimento acarreta no afastamento precoce do ambiente familiar que, em grande parte, ocorre por volta dos 20 anos de idade. Em geral, este afastamento é acompanhado de brigas, rompimentos familiares e, até mesmo, de expulsão de casa", de acordo com trecho de relatório da pesquisa. O mapeamento da população trans —iniciativa inédita no Brasil— está sob o guarda-chuva da secretaria de Direitos Humanos da gestão Bruno Covas (PSDB), e foi financiado a partir de emenda parlamentar do vereador Eduardo Suplicy (PT). De janeiro a outubro de 2020, em plena pandemia de Covid-19, ao menos 30 pesquisadores, sendo a metade deles transgênero, percorreram ruas, avenidas, pontos com grande concentração de moradores de rua, centros de saúde e projetos que buscam inserir a população T (travestis, homens e mulheres trans) no mercado de trabalho. Parte das entrevistas, compostas por 53 perguntas, também foram realizadas por telefone. O Cedec (Centro de Estudos de Cultura Contemporânea) foi o instituto contratado para elaborar o levantamento. Além da violência, a pesquisa radiografou as condições sociais pelas quais estão submetidas essa população, como renda, escolaridade e empregabilidade.
A pesquisa mostrou que sete em cada dez pessoas entrevistadas são mulheres (trans e travestis) com idade até 35 anos. Quase 60% disseram ser pretas e pardas; metade das respondentes afirmaram ter escolaridade média. Mas quando se destrincha os resultados, os indicadores sociais ligados às travestis são os que mais preocupam. Elas possuem o menor nível de escolaridade —29% disseram ter só o ensino médio contra 41% dos entrevistados não binários. Apenas 7% das travestis concluíram um curso superior. Na cidade de São Paulo, cerca de 27% dos moradores têm ensino superior completo, segundo dados do IBGE de 2019. O mapeamento também mostrou que as travestis são mais expulsas de casa (24%) e muito dependentes da prostituição, com 46% das entrevistadas nesta atividade. A prostituição é o meio de sobrevivência mais viável porque a maioria disse não ter uma formação técnica ou experiência para trabalhar numa área específica do mercado de trabalho. Outras 34% das mulheres trans também sobrevivem da prostituição. "Essa situação está diretamente relacionada ao preconceito que a população trans enfrenta em diversas esferas da vida social, como na família, na escola, além das barreiras existentes no mercado de trabalho", analisa o relatório do levantamento.
No caso de homens trans e pessoas não binárias, os dados indicam que o trabalho sexual é menos frequente. Ambos conseguem mais empregos formais no comércio, em posições como atendente de loja, telemarketing e vendedor ambulante. Quando se analisa a renda, as travestis também são as mais prejudicadas, com 72% delas fazendo bicos. Já metade (49%) dos homens trans que responderam a pesquisa têm emprego formal com carteira assinada. Antes da pandemia, 62% das pessoas trans não eram beneficiárias de programas sociais. Após a crise sanitária, a situação se inverteu e metade das pessoas (50%) alcançadas pelo questionário recorreram a algum benefício, com destaque para o auxílio emergencial. O levantamento conclui que é dever do Estado criar políticas públicas para diminuir o abismo social em que estão os trans. Entre as ações, estão a capacitação de servidores que lidam diretamente com essa população; a criação de bolsas de estudo e trabalho; a ampliação de representantes trans nos conselhos e nos órgãos públicos; e dotação orçamentária clara para o cumprimento das ações de inclusão.
MODELO URUGUAIO
O projeto paulistano baseia-se na experiência uruguaia. Em 2016, o país vizinho contou 853 pessoas trans no seu censo para pessoas T, das quais 90% eram mulheres e viviam da prostituição. Na cidade de São Paulo, com 12,3 milhões de habitantes (população três vezes e meia maior do que a do Uruguai), a expectativa era localizar ao menos 3.000 pessoas transgênero. Mas com uma diferença: em São Paulo foi realizado um levantamento e não um censo. O Uruguai já possuía um banco de dados prévio, que deu respaldo ao censo trans. Por aqui, só existem estimativas sobre esse público. A maioria das estatísticas brasileiras referentes à população trans são fornecidas por entidades. Segundo a Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), a expectativa de vida de uma pessoa trans no Brasil é de 35 anos. Em 2020, 175 pessoas trans foram assassinadas. A estimativa da Antra é que 1,9% dos brasileiros e das brasileiras sejam trans.

*”Entenda por que hoje é o dia da visibilidade trans no Brasil”*

*”Governo Doria será obrigado a incluir identidade de gênero e orientação sexual em BOs, diz Justiça”* - Uma liminar obtida pela Defensoria Pública de São Paulo obriga o governo João Doria (PSDB) a incluir os campos identidade de gênero e orientação sexual nos boletins de ocorrência. A decisão saiu no dia 21, com prazo de 60 dias para cumprimento. A medida tem, entre outros, o objetivo de possibilitar o mapeamento dos casos de violência contra a população LGBT, incluindo a população trans.
Nesta sexta (29), comemora-se o dia da Visibilidade Trans, data que, entre outros temas, discute-se a questão do alto índice de violência contra essa população. Só nesta semana a vereadora Erika Hilton (PSOL), que é trans, registrou boletim de ocorrência por ameaça. Além dela, Carolina Iara, 28 anos, integrante de mandato coletivo do PSOL na Câmara Municipal de São Paulo, teve a casa atingida por disparos. "Atualmente no boletim de ocorrência só consta sexo. Então, por exemplo, quando uma mulher trans vai registrar um boletim de ocorrência, seja violência sexual ou doméstica, ela vai obrigatoriamente ter de se identificar com o sexo masculino. Já é um constrangimento, uma violação, mas, para além disso, tem também a questão de política criminal e tentar criar estatísticas mais reais da violência que a população trans, LGBT sofre", diz a defensora pública Yasmin Pestana. Para ela, "hoje o que a gente tem é uma invisibilização da violência que essas pessoas sofrem. Quando se tenta ter dados, colher informações sobre quantas mulheres trans sofrem violência sexual, violência doméstica, a gente não consegue".
De acordo com Pestana, desde 2015 já existe uma resolução da Presidência da República que determina a inclusão dos campos. "Desde essa resolução, a defensoria vem solicitando que o estado faça essas alterações nos boletins de ocorrência, mas há muita resistência", diz. O estado incluiu nos boletins o nome social das vítimas. Mas, segundo a defensoria, o próprio governo admite que esse campo vem sendo utilizado de maneira errada pelos policiais, adicionando apelidos de pessoas cisgênero, o que impede que a informação seja usada para mensurar a violência contra a população transgênero. Pela decisão, no momento do boletim, a vítima poderá dizer se é homossexual ou transgênero. Mas isso não será obrigatório, explica a defensora. "Na liminar do juiz, ele não coloca a obrigatoriedade da pessoa declarar a orientação sexual. O que é obrigatório é que questionem se quer declarar identidade de gênero e sexual. O preenchimento é obrigatório nos sistemas, mas opcional aos entrevistados, respeitando a autodeclaração das pessoas."
Enquanto orientação sexual trata da sexualidade (se é hétero ou homossexual, por exemplo), a identidade de gênero trata do gênero com o qual a pessoa se identifica (mulher ou homem trans, por exemplo). O juiz responsável pela decisão, Enio Jose Hauff, da 15ª Vara da Fazenda Pública, ressaltou a violência sofrida pela população trans. "Como bem apontado na inicial e na manifestação do representante do Ministério Público, o Brasil é o país no mundo em que mais se mata transexuais e travestis, com 179 registros, só no ano de 2017. A ONG Transgender Europe (TGEu) coloca o nosso país no primeiro lugar em registro de homicídios de pessoas transgêneras, com o triplo do México, segundo colocado, em números absolutos", afirmou. "A Defensoria Pública demonstrou claramente que a inserção dos campos 'identidade de gênero' e 'orientação sexual' nos sistemas RDO, Boletins de Ocorrência e Infocrim permitirá dimensionar corretamente o grau de violência que a população LGBTI sofre, especialmente no que se refere aos chamados crimes de ódio, o que contribuirá decisivamente no desenvolvimento de estratégias para melhor garantir a segurança e a vida digna e livre de discriminação e violência ao grupo", afirma o juiz.
Em respostas à defensoria às quais a Folha teve acesso, a Polícia Civil aconselha a fazer a busca pelo campo "nome social" e pesquisas manuais. Além disso, afirma que "o valor a ser dispendido pelo estado e aplicabilidade das mudanças, por ora, encontram-se incompatíveis, verificando-se, no entanto, que o direitos das minorias tratadas neste expediente vêm sendo atendidas pela Polícia Civil". O estado afirmou no processo que o Conselho Estadual LGBT, vinculado à Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania auxilia o Poder Executivo no desenvolvimento de ações afirmativas e no combate a condutas homofobias ou transfóbicas. Segundo a decisão judicial, o estado afirmou ainda que "a redução da violência física e moral contra essa parcela da população não ocorrerá com a simples inclusão de campos para preenchimento em um boletim de ocorrência". À Folha a Secretaria da Segurança Pública afirmou que trabalha para "para aprimorar o atendimento, garantir os direitos e a proteção da comunidade LGBTQIA+". "Desde 2015, é possível incluir o nome social e a indicação de "homofobia/transfobia" no registro da ocorrência." Segundo a pasta, após o decreto estabelecer mudanças no atendimento das Delegacias da Mulher neste ano, "as vítimas são acolhidas por gênero feminino, não mais sexo biológico, estimulando as mulheres cis, trans e travestis vítimas de violência doméstica a também procurarem as DDM". O comunicado diz ainda que "permanentemente, avalia a viabilidade e aplicabilidade da inserção de novos campos no sistema RDO".
VIOLÊNCIA
De acordo com dados da Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), em 2020, a entidade contou 175 assassinatos de pessoas trans pelo Brasil. Na quarta-feira (27), Carolina Iara, 28 anos, integrante de mandato coletivo do PSOL na Câmara Municipal de São Paulo, afirmou que sua casa, na região de Itaquera (zona leste da capital paulista), foi alvo de ao menos dois tiros, quando ela se preparava para dormir. A covereadora, primeira pessoa intersexo eleita no país, integra a Bancada Feminista, composta por seis pessoas, eleita em novembro do ano passado, a partir dos 46.267 votos recebidos por Silvia Andrea Ferraro, de acordo com o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo. No mesmo dia, a vereadora de São Paulo Erika Hilton (PSOL) abriu um boletim de ocorrência relatando uma visita feita ao seu gabinete por um homem que se identificou como "garçom reaça". Por causa do estado de agitação do homem, funcionários do gabinete não permitiram que tivesse contato com Hilton. Ele, então, deixou uma carta na qual dizia querer se desculpar por ter ofendido a vereadora nas redes sociais. Nesta sexta (29), Hilton irá se reunir com membros da gestão Bruno Covas (PSDB) para tratar do programa Transcidadania (de inclusão de pessoas trans no mercado) e também de reforço de segurança às vereadoras e demais mulheres negras eleitas para a Câmara.

*”Pandemia de Covid-19 derruba crimes no Rio em 2020, e PM comemora”*

MÔNICA BERGAMO - *”Depois de explosão, ocupação de UTIs tem queda pela primeira vez desde dezembro em SP”*
MÔNICA BERGAMO - *”Projeto de lei prevê inclusão de comerciários na fila de prioridades para vacinação”*
MÔNICA BERGAMO - *”Pesquisadores brasileiros reconstruíram ambiente antártico do período cetáceo”*
MÔNICA BERGAMO - *”Professor Silvio Alemida conversa com a economista Laura Carvalho sobre o Brasil contemporâneo”*

MÔNICA BERGAMO - *”Prefeitura de SP autoriza entidade que teve contas reprovadas a se inscrever em cadastro para futuras parcerias”*
MÔNICA BERGAMO - *”Filme de Anna Muylaert é selecionado para mercado de incentivo a coproduções internacionais de cinema”*
MÔNICA BERGAMO - *”Claudia Costin será diretora de educação da TV Escola”*

CAPA – Manchete principal: *”Bolsonaro promete recriar ministérios, e Centrão cobra pastras mais ricas”*

EDITORIAL DO GLOBO - *”Eleição de Lira deverá sair caro para Bolsonaro”*: Não deverá sair barato para Bolsonaro se Arthur Lira (PP-AL), líder do Centrão, vier a ser mesmo eleito presidente da Câmara na segunda-feira. Os partidos que formam a coalizão que apoia a candidatura dele são conhecidos pela avidez com que perseguem seus objetivos fisiológicos, sempre interessados em cargos que administrem grandes orçamentos. Caso Lira seja eleito para substituir Rodrigo Maia (DEM-RJ), a reforma ministerial prevista para depois da eleição no Congresso servirá de instrumento para atender os interesses desses partidos. Reformas ministeriais podem ser feitas por motivos políticos, para a rearrumação de forças no Legislativo, fato comum no Parlamentarismo. A que se aproxima, para depois do dia 1º de fevereiro, dia da eleição das Mesas do Senado e da Câmara, tem todo o jeitão do velho toma lá dá cá. Nesse mercado de escambo, as moedas correntes costumam ser cargos e verbas em troca de apoio. O que muda são os critérios na distribuição — ora mais técnicos, ora mais políticos. Desta vez, os parlamentares do Centrão estão mais fortes na mesa de negociação. O Congresso aprovou recentemente o “Orçamento impositivo”, estabelecendo que as emendas aprovadas na Câmara e no Senado que estipulem despesas nas bases dos parlamentares sejam de fato pagas pelo Tesouro. Com isso, o Executivo perdeu parte da margem de manobra para gerenciar politicamente a liberação do dinheiro. Agora, a caneta do presidente só pode jogar com o calendário: libera emendas dos aliados antes de atender os opositores. Em dezembro, depois das eleições municipais, o Planalto liberou R$ 550 milhões em emendas individuais.
Lira também demonstra força por dispor de uma mercadoria essencial a Bolsonaro: a garantia de que pedidos de impeachment continuarão a ter como destino as gavetas do gabinete do presidente da Câmara, onde têm se acumulado às dezenas. Por tudo isso, o Centrão está diante da reforma ministerial como um time que joga em casa estaria na frente do gol. Alguns objetos de desejo do bloco são pastas ocupadas por militares perto do presidente. Apresentando-se como defensor da “desmilitarização do governo” e da presença de mais políticos no centro do poder, o Centrão ambiciona nada menos que a Casa Civil e a Secretaria de Governo, hoje ocupadas por Braga Netto e Luiz Eduardo Ramos, respectivamente. Em nome da tal “nova política”, Bolsonaro dizia prescindir de base parlamentar. Projetos seriam negociados um a um no Legislativo. Pois bem: a ilusão foi dissipada, e ele aderiu ao fisiologismo mais extremo. Fala-se em Brasília até na extinção do Ministério da Economia, com a recriação daquelas pastas tradicionalmente ambicionadas pelos políticos interessados em seus incontáveis cargos e orçamentos generosos, caso de Planejamento e Indústria e Comércio. Nas mudanças, o maior risco é a reforma atingir o que ainda resta da linha liberal na condução da política econômica.

*”Abrindo espaço – Bolsonaro já admite recriar três ministérios, mas Centrão quer pastas com Orçamento maior”*
*”Em crise com o presidente, Mourão tenta virar a página”*
*”Acúmulo de partidos aliados gera disputa por cargos na Mesa”*
*”MP já recebeu 321 denúncias de fura-fila da vacina contra Covid-19”*

*”Nova arma contra Covid – J&J lança vacina com eficácia global de 66%, dose única e testada no país”*
*”Ministério confirma compra extra de CoronaVac”*
*”Pazuello defende remoção de pacientes em Manaus”*

*”Ajuda da caixa – Com abertura de agências, banco reforça estratégia social do governo”* - A Caixa vai abrir mais 75 unidades no país, entre 55 agências e 20 filiais especializadas em agronegócio, informou o banco. É movimento na direção contrária do Banco do Brasil, que chegou a divulgar o plano de fechar 361 filiais neste primeiro semestre, além de programas de demissão voluntária, o que quase resultou na demissão do presidente da instituição, André Brandão neste mês. A expansão da Caixa, descrita pelo banco como a maior dos últimos anos, mira principalmente nas regiões Norte e Nordeste do país. Ao todo, deve gerar mais de 1.500 empregos no país ao longo de 2021, começando pela contratação imediata de 566 profissionais para reforçarem a operação. “Além de reforçar o time de atendimento, o banco fomenta a economia, gerando emprego e renda a centenas de famílias”, diz Pedro Guimarães, presidente da Caixa em comunicado. Antes do anúncio oficial feito pelo banco nesta sexta-feira, a abertura das unidades já havia sido comentada na live semanal do presidente Jair Bolsonaro, da qual Guimarães participou. Na transmissão, Bolsonaro elogiou a atuação da instituição financeira.
— É a Caixa Econômica se expandindo, né? E atendendo o social. Então, em cidades acima de 40 mil habitantes que, porventura, ainda não tenham agência da Caixa, a partir agora até o final desse semestre, a Caixa terá uma agência em cada um desses municípios — afirmou o presidente.
A Caixa tem se firmado como o braço de interlocução do governo com a população de baixa renda, com a imagem de um banco social. Foi por meio da Caixa que o governo distribuiu a injeção de R$ 55 bilhões mensais em recursos no auxílio emergencial, criado para ajudar os trabalhadores informais a atravessarem a crise. Além da participação na noite desta quinta-feira, Guimarães já apareceu outras vezes ao lado de Bolsonaro em transmissões semanais por rede social. As medidas anunciadas no começo do mês pelo BB previam o fechamento de 112 agências, dentre as 361 unidades, com a estimativa de desligar 5 mil funcionários por meio dos programas de demissão voluntária.
Após a turbulência, os planos de cortar despesas em R$ 353 milhões este ano e de até R$ 2,7 bilhões até 2025 foram mantidos, embora mudanças tenham sido cogitadas após o episódio. A pandemia acelerou o movimento de digitalização dos bancos, com mais e mais brasileiros recorrendo a serviços pela internet para transações financeiras. O enxugamento de quadros e o fechamento de agências se tornaram uma realidade no setor. Em 2012, a categoria de bancários tinha 513 mil trabalhadores. Atualmente são menos de 450 mil, segundo números da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT). Para o analista de renda variável e especialista em sistema financeiro da consultoria Eleven Financial, Carlos Daltozo, a Caixa vai na direção oposta ao mercado não só brasileiro, mas mundial. Cada vez mais os bancos investem em suas operações digitais e, na pandemia, a utilização desses canais eletrônicos cresceu ainda mais. Por isso, fecham agências, que têm estrutura de custos elevada, e reduzem seus quadros de funcionários, explica ele:
— A Caixa tem "licença poética" para abrir agências, na contramão do movimento do mercado mundial, porque é um banco 100% público. Diferente do Banco do Brasil, que é uma companhia de economia mista, com ações na Bolsa, mas controlada pelo governo, a Caixa tem a liberdade para fazer esse tipo de investimento — diz o especialista.
Daltoso ressalta, entretanto, que a instituição tem uma atuação ainda incipiente no crédito rural e ao abrir filiais especializadas em agronegócio reforça sua presença nesse segmento.
— É um segmento que ainda exige muito o presencial — afirma.
Na pandemia, continua o analista, a Caixa criou o maior banco digital do país, com mais de cem milhões de contas abertas, através do aplicativo Caixa Tem, utilizado pelo governo para pagar o auxílio emergencial. Muitos brasileiros desbancarizados entraram no sistema financeiro através do aplicativo da Caixa. O presidente da instituição, Pedro Guimarães, afirmou recentemente que será possível trazer novos investidores e produtos para a base da instituição da empresa. A ideia é oferecer produtos como microcrédito para pessoas de baixa renda. Guimarães também levantou a hipótese de abrir o capital do braço digital da Caixa na Bolsa de Valores, o chamado IPO (na sigla em inglês Oferta Pública Inicial), lançando ações do Caixa Tem. A Caixa afirma que, com as inaugurações, o banco estará presente em todos os municípios do país com mais de 40 mil habitantes. Das 75 unidades anunciadas, 36 ficarão em estados do Nordeste, sendo 16 no Maranhão. No Norte, serão abertas 19 filiais; no Centro-Oeste, uma dezena. Haverá outras sete no Sudeste e duas no Sul.
Unidades em barcos e caminhões
No Norte, haverá ainda reforço na operação com agências-barco, com mais duas no Amazonas e na Ilha de Marajó, onde a cobertura sobe de dez para 14 municípios. Outra unidade marítima vai de seis para 15 municípios no Rio Solimões e chegando, agora, ao Rio Negro. No total, a cobertura no Amazonas sobe de 39% para 70% dos municípios. Haverá ainda 12 agências-caminhão percorrendo o país. Ao todo, serão 4.200 agências, alcançando mais de 26 mil postos de atendimento, considerando postos, correspondentes bancários, casas lotéricas e outros. Após assumir a gestão dos recursos e pagamento de indenizações do Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre (DPVAT), a Caixa informou que lançará em breve o App DPVAT, que vai permitir envio de documentos pelos usuários e o acompanhamento dos pedidos de indenização.

*”Afastamento por transtorno mental dispara na pandemia”*

 

CAPA – Manchete principal: *”Bolsonaro fala em criar ministérios se vencer eleições no Congresso”*

EDITORIAL DO ESTADÃO - *”A época da patifaria”*: Em abril do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro, durante um dos tantos protestos golpistas que estimulou, esbravejou contra o Congresso: “Nós não queremos negociar nada. Nós queremos é ação pelo Brasil. O que tinha de velho ficou para trás, nós temos um novo Brasil pela frente. Acabou a época da patifaria!”. Pouco menos de um ano depois, Bolsonaro partiu para a compra explícita de apoio de parlamentares e partidos fisiológicos. Isso nem velha política é, pois no passado, mesmo que a negociação de votos fosse a norma, ainda havia eventualmente algum acordo em torno de projetos em comum. Hoje não mais: o que há é a entrega do governo para a deglutição do Centrão, que se banqueteará de cargos, verbas e poder. Poucas situações representam a época da patifaria como essa. Repórteres do Estado tiveram acesso a uma planilha de negociação do governo com deputados para angariar apoio à eleição, para as presidências da Câmara e do Senado, dos candidatos apadrinhados pelo presidente Bolsonaro. A reportagem mostra que aquela planilha representa a distribuição de cerca de R$ 3 bilhões para 250 deputados e 35 senadores usarem em obras em seus redutos eleitorais. Mas esse é seguramente apenas um fragmento da história. Outras fontes garantem que o total de recursos liberados é de cerca de R$ 16,5 bilhões. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, falou em R$ 20 bilhões. Em qualquer dessas contas, o valor destinado aos parlamentares supera, em vários casos, o limite a que cada um deles tem direito a destinar em emendas ao Orçamento.
A reportagem mostra que o gabinete do ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, tornou-se o quartel-general das candidaturas apoiadas por Bolsonaro. Segundo parlamentares ouvidos pelo Estado, o candidato governista à presidência da Câmara, deputado Arthur Lira (Progressistas-al), orienta os deputados a ir ao gabinete do ministro Ramos e acompanha todas as etapas do processo, negociando conforme seus interesses e envolvendo seus apadrinhados, que já estão em vários postos importantes do Ministério de Desenvolvimento Regional, pasta de onde sai o dinheiro. Parlamentares dizem que, a portas fechadas, o ministro Ramos sonda a disposição do deputado de votar em Arthur Lira em troca de verbas; se o deputado indica que votará em Lira, seu nome é incluído imediatamente na planilha. Não há outro critério para a liberação da verba – nem técnico, nem ético, nem de interesse público. Ademais, o mecanismo de liberação dos recursos prima pela falta de transparência – é dinheiro “extraorçamentário”, destinado a obras e convênios cujos contratos, em alguns casos, foram assinados às pressas. Mas a época da patifaria não se limita à transformação do Palácio do Planalto em bodega – onde não se discutem princípios, apenas preços. Bolsonaro está disposto a entregar o próprio governo ao Centrão – e a eleição de Arthur Lira, que na condição de presidente da Câmara terá poder de decidir sobre processos de impeachment e sobre a agenda legislativa, é apenas o primeiro passo dessa rendição.
Bolsonaro em pessoa confirmou essa intenção. Segundo ele, se seus candidatos forem eleitos, “a gente pode levar muita coisa adiante”, inclusive, “quem sabe, até ressurgir Ministérios”. O presidente que se elegeu prometendo acabar com o loteamento da máquina pública para ter apoio parlamentar agora acha absolutamente normal e até positivo recriar Ministérios e entregá-los aos partidos que colonizam seu governo. E ainda festejou que Arthur Lira – que só assumiu o mandato de deputado em 2018 por força de liminar judicial, depois de condenações em processo por improbidade administrativa, e ainda enfrenta acusações de corrupção – vai se tornar “o segundo homem na linha hierárquica do Brasil”. Ou seja, Bolsonaro já dispensa o vice-presidente Hamilton Mourão sem a menor cerimônia. A ânsia de Bolsonaro de se manter no poder e de proteger seus filhos encrencados na Justiça já fez muito mal ao País, mas ainda pode fazer muito mais: além de conspurcar o exercício da Presidência e dar o governo ao Centrão, pode ressuscitar a oposição destrutiva, liderada pelo lulopetismo – que sempre floresce no caos. A patifaria, como as desgraças, nunca vem sozinha.

*”Bolsonaro vincula recriar pastas à vitória de aliados”*
*”Parlamentares tentam emplacar CPI da saúde”*

*”Planilha mostra repasses a líderes e a Alcolumbre”* - O governo do presidente Jair Bolsonaro inovou na prática de trocar verbas por votos no Congresso. Enquanto seus antecessores direcionavam esforços para cooptar o chamado baixo clero, o atual governo privilegiou “caciques” na Câmara e no Senado, dando ainda mais poder a esses políticos. É o que mostra uma planilha de controle de recursos do Ministério do Desenvolvimento Regional, revelada anteontem pelo Estadão, que beneficiou 285 congressistas com R$ 3 bilhões de dinheiro extra, além dos recursos a que eles já têm direito para direcionar por meio de emendas. Até mesmo quem não tem mandato, como o presidente do PSD, Gilberto Kassab, pôde indicar valores para obras. Um dos nomes fortes do Centrão, Kassab se tornou um conselheiro de Bolsonaro, mesmo tendo sido secretário da Casa Civil – pasta da qual permaneceu praticamente todo o tempo licenciado – do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), arqui-inimigo do presidente da República.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), é quem recebeu a maior fatia do dinheiro “extra” destinado a redutos eleitorais por indicação política. No comando da Congresso, Alcolumbre se tornou um fiel escudeiro do presidente e evitou que o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-rj) fosse alvo do Conselho de Ética após ser acusado de comandar um esquema de rachadinha quando era deputado estadual no Rio. A divisão da bolada tem sido negociada pelo ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos. A planilha, informal e sem timbre, inclui repasses de recursos do Orçamento que não são rastreáveis por mecanismos públicos de transparência. A “caixinha” paralela das obras do Ministério do Desenvolvimento Regional soma R$ 3 bilhões e, de acordo com a planilha, embora atenda a indicações de 285 parlamentares, há uma concentração de R$ 1,77 bilhão apenas entre dez senadores e 15 deputados. Ramos negou que as planilhas reveladas pelo Estadão sejam da Secretaria de Governo. “Seria até ofensivo, de minha parte, negociar voto em troca de cargos e emendas”, disse ele.
Na condição de líder do Progressistas, Arthur Lira (AL), candidato de Bolsonaro na Câmara, aparece como tendo indicado R$ 109,6 milhões para obras em São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraná. No topo da lista, Alcolumbre teve aprovadas 44 indicações de repasses do governo federal em valores que totalizam R$ 329 milhões, considerando apenas as verbas extras do Desenvolvimento Regional. Numa comparação, o montante supera, com folga, os R$ 289 milhões que o governo reservou para o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos em 2021. Presidente do PSD, Kassab pôde direcionar R$ 25 milhões para três obras. Uma parte desse valor (R$ 10 milhões) aparece na lista como tendo sido indicada por ele em conjunto com o deputado Domingos Neto (PSD-CE), relator do Orçamento no ano passado. Kassab consta na planilha a que o Estadão teve acesso como “deputado”, cargo que não ocupa mais desde 2005. Ele e parlamentares do PSD destinaram ao todo R$ 608 milhões da planilha.
Fiador. Até parlamentares que não têm proximidade com o governo foram beneficiados após encontrarem um “fiador”. E o maior deles é o presidente do Senado. Das verbas cujo destino ele pôde apontar, oito transferências, com valores somados de R$ 51,6 milhões, são listadas como de Alcolumbre ao lado de algum senador de oposição – a lista inclui nomes do PT e do PDT. O Estadão apurou que o valor corresponde a um acerto do próprio Alcolumbre com líderes do Senado feito no meio de 2020. Mesmo na oposição a Bolsonaro, as duas siglas anunciaram apoio a Pacheco na disputa no Senado.

*”Liberar verba ‘sensibiliza’, diz líder do governo”* - Líder do governo no Congresso, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO) admitiu que a liberação de verbas é um atrativo para sensibilizar parlamentares a apoiar o governo. “Tem uma sensibilização porque, se o parlamentar tem mais acesso, acaba sendo atendido. É evidente que, quando o governo tem essa sintonia e trabalha com municípios e Estados, tem uma tendência de que fique com o governo. Isso sempre foi assim mesmo em outros governos”, afirmou. Questionado sobre a falta de transparência quanto à autoria da indicação para os repasses, o líder do governo disse que é possível obter essas informações olhando as notícias e as postagens nas redes sociais. No entanto, ele reconheceu que seria conveniente “uma dinâmica mais clara” na divulgação. O deputado João Carlos Bacelar (PL-BA), que conseguiu R$ 70 milhões, afirmou ter buscado o governo e deixou claro que a liberação acontece somente após as negociações com o Planalto. Ele detalhou o “balcão de negócios” dizendo que chegou a procurar a Secretaria de Defesa Civil na busca de recursos contra a seca. “O secretário me disse que o recurso ‘aqui’ é zero. Então perguntei: ‘para que serve a secretaria?’ Ele me disse: ‘aqui só tem recurso se vier (com indicação) do palácio’.” O deputado Altineu Cortês (PL-RJ) negou qualquer influência política nos repasses – que, conforme determina a legislação, devem ser feitos por critérios técnicos. O senador Nelsinho Trad (PSD-MS) também disse não ter tratado de repasses com o governo. Em nota, Kassab declarou que “as bancadas do partido têm autonomia para a discussão junto ao governo”. Ele não respondeu sobre o dinheiro atrelado a seu nome. Os demais citados foram procurados, mas não se manifestaram até a conclusão desta edição.

*”PF abre inquérito para investigar atuação de Pazuello”*

*”Lula tem acesso a mensagens de Moro obtidas por hackers”* - A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado na Lava Jato, conseguiu acesso a novas mensagens obtidas na Operação Spoofing – investigação que mirou um grupo de hackers que invadiu celulares de autoridades como o ex-juiz e ex-ministro da Justiça Sérgio Moro e procuradores da forçatarefa da Lava Jato em Curitiba. O conteúdo das conversas foi revelado pela revista Veja. Em dezembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski mandou a Justiça do Distrito Federal compartilhar com Lula as mensagens da Spoofing. O petista pretende usá-las para reforçar a tese de que Moro foi parcial ao condená-lo a nove anos e meio de prisão na ação do triplex do Guarujá. Em uma das conversas, em 16 de fevereiro de 2016, o então juiz Moro pergunta se os procuradores têm uma “denúncia sólida o suficiente”. Ex-coordenador da força-tarefa em Curitiba, Deltan Dallagnol responde que acredita que o material está “suficientemente forte”. “Na parte do crime antecedente, colocaremos que o esquema Petrobrás era um esquema partidário de compra de apoio parlamentar, como no mensalão, mas mediante indicações políticas para arrecadar propina para enriquecimento ilícito e financiamento de campanhas”, diz.
Em outra mensagem, de 6 de setembro de 2016, Deltan pede que, ao tomar o depoimento do empreiteiro Leo Pinheiro, exexecutivo da OAS, Moro “impeça” relatos sobre “fatos alheios” ao objeto do processo. “Talvez seja o caso de impedir Leo Pinheiro de depor sobre fatos alheios ao seu caso. Estamos suspeitando de que ele poderá querer forçar uma colaboração sem acordo, ainda que fajuta, e buscar diminuição da pena na cadeia recursal”, escreve. Moro responde: “Ah sim, só sobre o objeto da acusação”. Em 18 de outubro de 2016, um dia antes da prisão do expresidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ), Deltan procura Moro para combinar uma conversa sobre “apreensão dos celulares”. Na mesma conversa, passa informações sobre uma reunião com suíços e americanos para “negociar percentuais da divisão do dinheiro”. “Estamos em prévia com os suíços que nos ajudarão a dar menos para os americanos”, afirma.
Julgamento. A defesa de Lula pediu ao ministro do STF Gilmar Mendes, presidente da Segunda Turma, “prioridade” no julgamento sobre a suspeição de Moro. Em dezembro de 2018, Gilmar pediu vista, depois que dois ministros já tinham votado contra as pretensões do petista. O relator da Lava Jato, Edson Fachin, e Cármen Lúcia rejeitaram o habeas corpus. Faltam os votos de Gilmar, Lewandowski e Nunes Marques. As mensagens obtidas pelos hackers foram divulgadas pelo site The Intercept Brasil meses após o início do julgamento na Corte. Procurado, Moro não quis se manifestar. Os advogados que representam os procuradores no Paraná não comentaram.

*”Congressistas republicanos mantêm relação próxima com grupos radicais”* - Congressistas americanos estão sendo investigados por suas ligações com grupos e movimentos extremistas que participaram da invasão ao Capitólio, sede do Congresso americano, no dia 6, quando o Senado se preparava para certificar a vitória de Joe Biden nas eleições de novembro. Quase 150 deputados republicanos defenderam as acusações infundadas do presidente Donald Trump segundo as quais a eleição teria sido roubada. Mas se descobriu que congressistas como o deputado republicano Paul Gosar, do Arizona, e vários outros tinham elos mais profundos com grupos extremistas que promovem ideias violentas e teorias da conspiração, e cujos integrantes se destacaram entre aqueles que invadiram o Congresso. Entre eles estava o deputado Andy Biggs, do Arizona, que, como Gosar, estava ligado à campanha “Stop the Steal” (parem o roubo) em favor das tentativas de Trump de reverter o resultado da eleição. A deputada Lauren Boebert, do Colorado, tem laços próximos com grupos milicianos, incluindo os chamados Three Percenters, um subgrupo extremista do movimento em defesa do direito de portar armas que teve pelo menos um membro entre os invasores do Capitólio do dia 6 de janeiro. A deputada Marjorie Taylor Greene, da Geórgia, promoveu a teoria da conspiração Qanon, cujos adeptos estavam entre os mais destacados invasores do edifício, e apareceu em um comício com grupos milicianos. Antes de ser eleita para o Congresso no ano passado, ela usou as redes sociais em 2019 para defender a execução de importantes democratas.
O deputado Matt Gaetz, da Flórida, frequentou no ano passado um evento onde estavam presentes os Proud Boys, outra organização extremista cujo papel no ataque do dia 6 está sob investigação do FBI, como ocorre com os Oath Keepers e os Three Percenters. Poucos republicanos estão mais ligados ao extremismo do que Gosar. “Ele se envolveu com grupos antimuçulmanos e grupos de ódio”, disse o irmão dele, o advogado Dave Gosar, do Wyoming. “Fez comentários antissemitas. Está totalmente metido com os Oath Keepers.” Dave e outros irmãos de Gosar veicularam campanhas denunciando o político como um extremista perigoso quando ele se candidatou em 2018. Agora, apelam ao Congresso para que ele seja expulso. “Alertamos a todos quanto ao perigo que ele representa”, disse Dave. Alguns anos atrás Gosar visitou a divisão no Arizona da milícia de direita Oath Keepers, cujos membros estão ligados a grupos extremistas de todo o país envolvidos no ataque ao Capitólio. Jim Arroyo, um dos líderes do Oath Keeper, acredita que os EUA já vivem uma guerra civil: “Já estamos nela. Só falta começar a atirar uns nos outros”.
Não se sabe ao certo se os congressistas desempenharam um papel facilitando diretamente o ataque ao Capitólio, além de ajudar a incitar a violência com declarações falsas a respeito de uma fraude no resultado da eleição. As autoridades disseram que estão investigando denúncias dos democratas segundo as quais alguns republicanos teriam agido como guias do Capitólio e divulgado outras informações aos invasores. Um exame de muitos dos mais destacados republicanos eleitos com elos com grupos de direita também mostra como várias seitas extremistas se reuniram para investir contra o Capitólio. Em julho, Gosar posou para uma foto com um integrante dos Proud Boys. Dois anos antes, ele falou em um comício em defesa de um líder de um grupo extremista anti-imigração de Londres, descrevendo os imigrantes muçulmanos como um “flagelo". E, em 2014, ele viajou a Nevada para defender a resistência armada do rancheiro Cliven Bundy (que se recusava a respeitar os limites das terras federais) contra agentes do governo.
Biggs, presidente da bancada direitista House Freedom Caucus, foi visto como inspiração pelos líderes do movimento Stop the Steal, e falou em eventos promovidos por extremistas, em um dos quais um dos fundadores dos Oath Keepers defendeu que o senador John Mccain fosse enforcado. Marjorie fomenta há anos teorias da conspiração, expressando seu apoio ao Qanon e fazendo comentários ofensivos a respeito dos negros, judeus e muçulmanos. Apareceu também ao lado de membros dos Three Percenters em um evento de campanha. Biggs negou qualquer associação com os organizadores do movimento Stop the Steal e condenou a violência “de todo o tipo”. Um porta-voz de Marjorie disse que ela agora rejeita as alegações do Qanon e tentou distanciá-la dos integrantes das milícias. Até certo ponto, os deputados refletiram sinais emitidos por Trump, que descreveu os seguidores do Qanon – vários dos quais foram acusados de assassinato, terrorismo doméstico, conspiração para cometer sequestro e, mais recentemente, invadir o Capitólio – como “gente que ama o nosso país", acrescentando que “dizem que gostam de mim”.

*”Líder do ProudBoys foi informante do FBI e da polícia da Flórida”* - Enrique Tarrio, líder do grupo de extrema direita Proud Boys, tem um passado como informante do FBI e da polícia da Flórida. Em diversas ocasiões, ele fez o trabalho de investigação mesmo depois de ser preso em 2012. É o que mostra um processo judicial federal de 2014 obtido pela agência Reuters. A informação também foi confirmada por uma promotora que atuou no caso. Tarrio lidera desde 2018 o Proud Boys, que participou da invasão do Capitólio em 6 de janeiro, instigada pelo então presidente Donald Trump para tentar barrar a homologação da vitória de Joe Biden pelo Congresso. Pelo menos cinco integrantes do grupo são processados pelo ataque. Tarrio não está entre eles, pois havia sido preso dois dias antes pela polícia de Washington, acusado de destruir uma faixa do movimento Black Lives Matter. Ele teve de deixar a cidade e aguarda uma audiência judicial em junho. Em uma audiência judicial realizada em Miami em 2014, uma promotora federal, um agente do FBI e o próprio advogado de Tarrio falaram da atuação dele como informante. Eles disseram que Tarrio ajudou as autoridades a processar 13 pessoas em casos sobre drogas, jogos e contrabando de pessoas. À Reuters, na terça-feira, Tarrio negou ter trabalhado disfarçado ou cooperado em processos contra terceiros. “Não sei de nada disso. Não me lembro de nada disso”, disse, quando questionado sobre o processo.
Em uma declaração à Reuters, a promotora federal que atuou no caso de Tarrio, Vanessa Singh Johannes, confirmou que “ele cooperou com as forças de segurança locais e federais”. O processo traz uma nova luz sobre as conexões anteriores de Tarrio com a polícia. Durante a audiência, a promotora e o advogado de defesa de Tarrio pediram a um juiz que reduzisse a pena de prisão dele e de dois outros réus. Eles haviam se declarado culpados em um caso de fraude relacionado à venda de kits de teste de diabetes roubados. A juíza do caso, Joan A. Lenard, disse que Tarrio “prestou assistência substancial na investigação e processo contra outras pessoas”. O então advogado de Tarrio, Jeffrey Feiler, disse que não se lembrava de detalhes do caso, mas os dados que ele repassou à Justiça “foram com base nas informações fornecidas a mim pelas autoridades policiais e pela promotora”. Por sua vez, Tarrio disse que só investigou o seu caso e, por isso, conseguiu reduzir sua pena de prisão de 30 para 16 meses de prisão. Fundado em 2016, o Proud Boys começou como um movimento de protesto contra o politicamente correto e o que considera “restrições à masculinidade”.

*”Telegram é tomado por extremistas banidos das redes”* - Quando protestos começaram recentemente na Bielo-rússia e em Hong Kong, o Telegram foi a ferramenta que manteve os movimentos pela democracia unidos diante dos ataques de serviços de segurança. Mas, nos últimos dias, o aplicativo vem se tornando um refúgio online para um diferente tipo de resistência. Defensores de teorias da conspiração de extrema direita e racistas têm se juntado no Telegram nas últimas semanas, após terem sido banidos por parte das grandes companhias americanas de redes sociais. Principalmente Twitter e Facebook bloquearam várias contas de extremistas após a invasão ao prédio do Capitólio, no dia 6, entre elas as do então presidente Donald Trump, acusado de ter incitado o ataque ao Congresso. Nos dias seguintes após as plataformas expurgarem usuários que consideravam responsáveis por incitar a violência ou espalhar desinformação, 25 milhões de novos usuários acessaram o Telegram. O fundador da plataforma, Pavel Durov, chamou este movimento de a “maior migração digital da história da humanidade”. A cascata de novos usuários apresenta uma nova complicação para Durov, que se posiciona como um aliado das ruas e da liberdade de expressão. Ele promoveu o Telegram, que combina características do Facebook e do Twitter com mensagens criptografadas e uma filosofia de moderação sem intervenção, como um refúgio dos oprimidos.
Com Washington e o restante dos Estados Unidos em alerta máximo depois da violência no Capitólio, alguns temem que os recursos que fazem o Telegram uma ferramenta popular para organizar a resistência contra regimes autoritários possam ser usados pela extrema direita e os partidários de Trump para causar mais caos. O FBI já alertou aos chefes de polícia dos EUA para ficarem atentos a potenciais ataques de milícias armadas e extremistas racistas. “Há uma queda de braço entre as pessoas que estão usando o Telegram e outras plataformas, para o bem, e as pessoas que os usam para prejudicar a democracia. Vemos a mesma abertura e senso de conexão que é usado por ativistas democráticos explorados de forma oportunista por extremistas”, destaca Nina Jankowick, uma analista de desinformação do Wilson Center, um centro de pesquisas de Washington. Durov, inicialmente, recebeu bem o fluxo de usuários e criticou as gigantes do setor pela expulsão, sugerindo que elas faziam um esforço para limitar o discurso livre. Mas depois anunciou que sua equipe bloqueou centenas de posts que convocavam atos de violência antes da posse de Joe Biden.

*”Ao exportar doses, China atrasa sua vacinação”* - A China foi o primeiro país atingido pelo coronavírus, ficou entre os primeiros a se recuperar e foi o mais rápido a lançar vacinas. No entanto, seu foco na exportação de doses – em parte por causa de sua eficácia como moeda de troca diplomática – pode impedir o país de alcançar imunidade coletiva neste ano. A abordagem da China contrasta com a dos EUA e outras nações ocidentais que planejam vacinar 70% das suas populações e alcançar a “imunidade de rebanho”. Os EUA pretendem alcançar a marca até setembro. Nesta semana, o presidente Joe Biden anunciou a compra de mais 200 milhões de doses, num total de 600 milhões.
A União Europeia também pretende obter imunidade coletiva antes de setembro. Após os atrasos no fornecimento da Astrazeneca, a UE ameaçou controlar exportação se a empresa não priorizar as entregas para o bloco. De acordo com as previsões oficiais, a China produzirá doses suficientes até o final do ano para cobrir 70% de seus 1,4 bilhão de habitantes. Atingir esse patamar neste ano exigiria manter quase todas as suas projeções de 2 bilhões de doses dentro do país. Até quarta-feira, cerca de 23 milhões de chineses tinham recebido as doses, segundo a Comissão Nacional de Saúde. O presidente da Associação da Indústria de Vacinas da China, Feng Duojia, disse à agência estatal Xinhua que esperava que a produção total de vacinas da China ultrapassasse 1,8 bilhão de doses até o final deste ano. Com duas doses por pessoa, isso cobriria quase 1 bilhão de pessoas. Mas o país se comprometeu a entregar 500 milhões de doses a outros países, de acordo com a mídia estatal. Parte disso já foi enviada nas últimas semanas para Turquia, Chile, Sérvia e Brasil. Não está claro qual proporção das doses prometidas por Pequim chegará neste ano às nações que fecharam acordo de compra – o Chile, por exemplo, firmou termo em que são prometidas 60 milhões de doses da Coronavac.
Zhang Yuntao, executivo sênior da Sinopharm, um dos dois maiores fabricantes de vacinas da China, disse à mídia estatal que provavelmente levará “um ou dois anos” para vacinar 500 milhões de pessoas no país – algo em torno de 36% da meta. As autoridades de Pequim se recusaram a dizer quando a China alcançará a imunidade coletiva e que proporção de suas doses de vacina será vendida no exterior. “Ao mesmo tempo em que atende à demanda doméstica, a China vai, dentro do escopo de nossas potências, desenvolver cooperação internacional em vacinas de diferentes maneiras com outros países, especialmente nações em desenvolvimento”, disse o Ministério das Relações Exteriores da China em um comunicado ao Washington Post. A Comissão Nacional de Saúde da China e o Centro Chinês para Controle e Prevenção de Doenças não responderam aos questionamentos. O fato de a China estar ficando para trás na vacinação doméstica parece agora contraditório, dada a sua vantagem sobre o Ocidente. Centenas de milhares de chineses haviam recebido vacinas até setembro, enquanto nos Estados Unidos e no Reino Unido a campanha só começou em dezembro. Desde então, a China ficou atrás de EUA, Reino Unido e grande parte da Europa na média per capita. A meta de vacinar 50 milhões de trabalhadores essenciais até meados de fevereiro cobriria menos de 4% da população. A essa altura, o Reino Unido pretende ter vacinado 15 milhões de pessoas vacinas com ao menos, por volta de 22% de sua população.
Boa vizinhança. Com uma “diplomacia da vacina”, Pequim afirma que age de forma humanitária ao não acumular doses como as nações mais ricas. “É a coisa certa a fazer”, disse Victor Gao, um ex-funcionário do Ministério das Relações Exteriores da China, sobre a estratégia de Pequim. “O lema é não deixar ninguém para trás.” Na China, tem havido pouca resistência pública sobre o atraso na distribuição à população em geral ou a venda de vacinas para outros países. Pequim, novamente, controlou a narrativa com a prisão de críticos do governo que atacaram a resposta do governo à pandemia. O desafio chinês é agravado ainda pela menor eficácia de suas vacinas. Os imunizantes da Pfizer-biontech e da Moderna têm taxas de eficácia de cerca de 95%, enquanto as da Sinopharm são de 79% e as da Sinovac mal ultrapassaram 50% em seu maior ensaio clínico no Brasil. Isso significa que uma proporção maior da população precisará ser vacinada para obter imunidade coletiva. Ih-jen Su, ex-diretor-geral dos Centros de Controle de Doenças de Taiwan, disse que é difícil avaliar de fora quantas doses de vacina a China realmente possui. “O que sabemos é limitado principalmente porque eles não lidaram com isso de forma aberta e transparente”, disse. “O quanto eles podem realmente produzir não está claro.”

*”União Europeia aprova uso de vacina da AstraZeneca”*
*”Putin sanciona projeto de lei que renova pacto nuclear com EUA”*

*”TJ derruba liminar e volta às aulas presenciais em SP ocorre a partir de 2ª”*

*”Governo corre para comprar a Sputnik V”* - Pressionado a abastecer o País com vacinas contra a covid-19 e pela dependência da Coronavac, que já foi chamada no passado pelo presidente Jair Bolsonaro de a “vacina de João Doria”, o governo federal tenta avançar na compra de outros imunizantes. A Sputnik V, da Rússia, é vista como uma das mais promissoras por interlocutores do presidente e do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, mas ainda esbarra na falta de dados para a aprovação na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Nos bastidores, defensores dizem que a Sputnik poderia se tornar “a vacina de Bolsonaro”. No Brasil, ela será produzida pela farmacêutica União Química, que planeja trazer ao País 10 milhões de doses prontas até março. Além disso, programa produzir outras 150 milhões em 2021 – e espera fabricar o insumo farmacêutico ativo no País. Bolsonaro reuniu-se na quarta-feira com o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, e um d os temas tratados, segundo apurou o Estadão, foi a aprovação da Sputnik V. Como mostrou a Coluna do Estadão, o Ministério da Saúde disse à União Química que está “disposto a formalizar as tratativas comerciais para eventual aquisição dos lotes do imunizante”, caso a empresa receba aval para o estudo de fase 3 e peça o uso emergencial à Anvisa. A discussão ocorreu no momento em que o governo de São Paulo e o Ministério da Saúde travavam novo duelo pela Coronavac. A gestão Doria afirmava que, sem manifestação rápida da pasta, poderia até exportar as 56 milhões de doses da vacina que o Butantan deve produzir a partir de maio. O governo – que já comprou 46 milhões de unidades – entendia que podia responder sobre a compra dos lotes restantes até 30 de maio – mas, com a pressão, o contrato será assinado na terça. O secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, chegou a dizer anteontem, à Rádio CBN, que não descartava abrir mão da segunda compra da Coronavac, caso tivesse outras opções.
Outras vacinas. Além da Sputnik V, o ministério também trata como promissora a Covaxin, desenvolvida pelo laboratório indiano Bharat Biotech. Mas, até agora, só foram publicados dados da primeira fase de pesquisa do imunizante. O governo ainda negocia a importação de mais 10 milhões de doses prontas da vacina de Oxford/astrazeneca da Índia e conta com a produção de imunizantes pela Fiocruz e pelo Butantan. O Instituto Gamaleya, de Moscou, que desenvolveu a Sputnik V, divulgou que sua taxa de eficácia é de 91,4%, mas ainda não publicou em artigo científico os detalhes do ensaio clínico. Ainda não está claro, por exemplo, quanto tempo a proteção da vacina pode durar. A distribuição da Sputnik V, porém, ainda esbarra no aval da Anvisa, que aponta falta de dados básicos para poder liberar o uso emergencial do imunizante. Faltam também pesquisas de fase 3 do produto no Brasil. Em conversas entre Planalto e Ministério da Saúde não é descartado um drible na agência sanitária, mas há resistência. Dispensar a análise da Anvisa bateria de frente com o discurso do presidente de que apenas vacinas seguras e eficazes, certificadas pelo órgão, serão distribuídas. Foi o argumento usado para atrasar a compra da Coronavac e da vacina da Pfizer.
Ainda assim, uma ideia por enquanto remota é permitir que vacinas aprovadas na agência sanitária da Rússia pudessem receber autorização excepcional para importação e distribuição no Brasil. Esse aval chegou a ser colocado em minuta da Medida Provisória 1.026/2021, que liberou a compra de imunizantes sem registro da Anvisa, mas foi excluído do texto final. Pela MP atual, só produtos registrados em EUA, União Europeia, Reino Unido, Japão e China entram na regra. Outro caminho seria imitar a decisão da Argentina, que deu o aval para o uso emergencial, com uma recomendação pouco aprofundada de sua agência reguladora. A Anvisa detalhou ao STF a falta de dados da Sputnik, em ofício de 22 de janeiro, onde ressaltou que sequer informações exigidas para realizar a pesquisa no País foram apresentadas. Faltam ainda dados de eficácia e segurança do produto, entre eles, os de “toxicidade reprodutiva”, que mostram que a vacina não leva à infertilidade ou prejudica o desenvolvimento de um embrião, feto ou recém-nascido. O pedido foi devolvido pela agência à empresa. A União Química não informou ao Estadão quando enviará os dados cobrados, mas interlocutores da empresa afirmam que as exigências serão cumpridas e esperam receber o aval para os estudos em breve.

*”Presidente da União Química já foi candidato a senador”*

*”Por caminhoneiros, governo pode cortar benefício para pessoas com deficiência”* - A equipe econômica estuda limitar a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de carros com valor mais alto, como SUVS, para pessoas com deficiência e acabar com renúncias tributárias para o setor petroquímico. As duas medidas podem garantir receita de R$ 2 bilhões aos cofres públicos e compensar a perda na arrecadação com eventual redução do Pis/cofins sobre o diesel, como forma de atenuar efeitos do aumento no preço do combustível no bolso dos caminhoneiros. Nos últimos dias, parte dos caminhoneiros intensificou as ameaças de paralisação a partir de segunda-feira. O Palácio do Planalto tem urgência para atender à demanda da categoria e reduzir a tributação do diesel. Para isso, a equipe econômica está debruçada em atacar isenções tributárias que poderiam ser retiradas sem a necessidade de esperar o ano seguinte para entrar em vigor, como prevê a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A ideia é estipular um limite para o valor do carro na compra com isenção do IPI, igual ao que ocorre com o ICMS. Para o tributo estadual, a isenção só vale para veículos de até R$ 70 mil. Para o IPI, não há limite de valor. Na avaliação do governo, há uma “indústria” especializada em burlar as regras para garantir a compra de carros mais caros com o benefício.
Na soma dos incentivos, um carro para PCD pode ter desconto de 20% a 30% no preço de tabela, dependendo do modelo e da categoria. O dado mais recente da Anfavea (a associação das montadoras) indica que a venda de carros para esse público representa 8% do total de veículos vendidos no País e vem crescendo nos últimos cinco anos. Procurada, a entidade não se pronunciou sobre o estudo do governo. Segundo dados do IBGE, um quarto dos brasileiros tem algum tipo de deficiência que pode servir como justificativa para a isenção de impostos na compra do automóvel. São quase 70 doenças elegíveis para o direito à isenção, como hérnia de disco, hepatite, osteoporose, diabetes, artrose, AVC e LER. Em São Paulo, já houve tentativa de limitar esse benefício. Decreto que entrou em vigor no início do ano restringia a isenção de pagamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) às pessoas com deficiências severas, que exijam adaptações nos veículos. Na última semana, porém, a Justiça paulista concedeu liminar ao Ministério Público de São Paulo, que questionava a mudança.
Químicas. Outra medida é acabar com o regime Especial da Indústria Química (Reiq), que garante incentivos para a indústria petroquímica. O governo já tentou no passado acabar com o incentivo, mas não conseguiu barrar o lobby contrário no Congresso. O Reiq foi criado em 2013 com o objetivo de auferir maior competitividade ao setor químico por meio da desoneração das alíquotas de Pis/cofins sobre a compra de matérias-primas petroquímicas básicas. A Abiquim (que representa a indústria química) informa que estudo feito há dois anos pela entidade e a consultoria LCA indicou que o fim do benefício representaria alta de custo para toda a cadeia e poderia gerar retração de demanda de R$ 2,2 bilhões, recuo de R$ 7,5 bilhões de produção, de R$ 2,5 bilhões de valor adicionado e de 60 mil empregos. A entidade ressalta que a medida ocorreria num momento em que o setor opera com 72% de sua capacidade e alta nos preços de produtos importados “Em termos práticos, existe o risco de fechamento de inúmeras plantas fabris, desestímulo à continuidade das operações e impacto direto na manutenção de empregos e na competitividade da indústria”, diz. O presidente Jair Bolsonaro tem nos caminhoneiros importante grupo de apoio e tem se mostrado sensível às demandas da categoria. Na semana passada, a seu pedido, a Câmara de Comércio Exterior (Camex) zerou o imposto de importação de pneus para veículos de carga. A categoria ainda foi incluída no grupo prioritário de vacinação contra a covid. Nesta semana, a Petrobrás reajustou o diesel em 4,4%, ou R$ 0,09 a mais por litro, o que aumentou as ameaças de greve. Bolsonaro fez apelo aos caminhoneiros para que desistam da paralisação. Ele confirmou a intenção de reduzir tributos, mas ressaltou que “não é uma conta fácil de ser feita”. Uma redução do Pis/cofins teria impacto de R$ 800 milhões nos cofres públicos.

*”Bar e restaurante podem obter crédito subsidiadio”*

*”Governo quer acelerar novo Bolsa Família”* - O Ministério da Cidadania quer acelerar a reformulação do programa Bolsa Família para ganhar tempo e tentar aplacar a pressão por uma nova rodada do auxílio emergencial. Enquanto isso, o Ministério da Economia reúne sugestões de especialistas e de outros setores do governo para reformular as regras do benefício, criado para ajudar as famílias na pandemia de covid-19. O objetivo é focalizar a concessão do auxílio e, consequentemente, reduzir o seu custo. O movimento coordenado sinaliza que a área econômica não pretende ceder à pressão pela renovação imediata do auxílio. A discussão sobre uma nova rodada do benefício permeou, por exemplo, a campanha dos principais candidatos à presidência da Câmara e do Senado – inclusive, daqueles apoiados pelo Palácio do Planalto: Arthur Lira (PP-AL), na Câmara, e Rodrigo Pacheco (DEMMG) no Senado. A eleição acontece na segunda-feira. Na área econômica, a avaliação do “grupo fiscalista” de assessores do ministro Paulo Guedes é de que é preciso esperar um pouco mais para conceder o auxílio. A renovação é dada como praticamente certa, diante do agravamento dos efeitos da doença, embora na quinta-feira o presidente Jair Bolsonaro tenha dito que uma nova rodada do auxílio “quebraria” o Brasil.
Uma fonte da área econômica disse, sob a condição de anonimato, que o mercado financeiro, resistente a que o governo se endivide ainda mais para bancar a ajuda adicional, está assimilando a nova rodada do benefício. A questão agora, porém, é o governo ter as “rédeas” do processo e evitar que o Congresso faça uma concessão ainda maior, ampliando o risco fiscal. O ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, disse na quarta-feira passada em entrevista à Rádio Bandeirantes que o novo desenho do Bolsa Família está pronto e deve ser lançado já na próxima semana. Após ter trabalhado na reformulação, Onyx pode em breve deixar a pasta para dar lugar a um nome indicado pelo Centrão. O atual ministro migraria para uma cadeira dentro do Palácio do Planalto na reforma ministerial que Bolsonaro deve fazer para acomodar os recentes acordos políticos.
Alcance. A estratégia de usar a reformulação do Bolsa Família para aplacar o apetite por um reforço nas políticas sociais não é unânime. Dentro do governo também há o temor de que a divulgação do novo desenho do programa dê errado, aumentando o desgaste e o mau humor dos congressistas com a demora do governo para agir, já que a remodelagem não é de grande alcance. Como mostrou o Estadão/broadcast, o novo desenho do Bolsa Família deve elevar o valor médio do benefício dos atuais R$ 190 para R$ 200. Haverá ainda um ajuste no critério de renda para ingressar no programa, que vai permitir a inclusão de cerca de 300 mil famílias. A situação de extrema pobreza, atualmente reconhecida quando a renda é de até R$ 89 por pessoa, subirá a cerca de R$ 92 por pessoa. Já a situação de pobreza, quando a renda é de até R$ 178 por pessoa, será alterada para aproximadamente R$ 192 por pessoa. O governo também quer criar três bolsas por mérito: escolar, esportivo e científico. A ideia é premiar estudantes de famílias do Bolsa por seus desempenhos nessas áreas. A reformulação do programa deve ser feita por meio de medida provisória, que tem vigência imediata, mas precisa ser chancelada pelo Congresso Nacional em até 120 dias – período em que pode sofrer mudanças. Detalhes do texto foram discutidos nesta semana em reunião entre Onyx, Guedes e suas respectivas equipes.
Outras medidas também estão em avaliação, como o fortalecimento do microcrédito para beneficiários do Bolsa Família. O governo quer que essas famílias consigam tomar dinheiro emprestado para usar como capital de giro ou na aquisição de equipamentos e eletrodomésticos para seus pequenos negócios. Hoje, essas operações têm um custo elevado, por causa do risco de inadimplência e da dificuldade de obter informações da família, além da necessidade de visitas presenciais. A intenção é baratear o custo por meio de assistência técnica, fundos garantidores e mecanismos de aval solidário, em que todos os beneficiários respondem pelos compromissos do grupo, estimulando o pagamento em dia.

*”Relator defende auxílio de R$ 300 por três meses”*
*”’Ação do País na Amazônia é pobre’, diz Bracher”*