DOS JORNAIS DE HOJE: As capas dos jornais apontam para temas variados: a Folha aborda a polêmica no STF sobre a soltura de um dos líderes do PCC; o Globo destaca que a onda de calor leva prejuízos para a economia e o Estadão chama atenção para a queda na inadimplência no Brasil, mesmo no período de crise. Essa variedade de pauta nas capas é sinal de que não existe no país um grande acontecimento que concentre todas as atenções. É o que mostra o comportamento dos jornais observado em 1.076 edições desta análise de mídia. Essa falta de alguma emergência nacional não é apenas em função do feriado ou da segunda-feira (dias em que os jornais costumam estar mais vazios). A “calmaria” pode ser sintoma do apoio do mercado financeiro ao governo federal mesmo diante de todo o caos. O Estadão publica reportagem sobre esse apoio e ainda avisa que nem a queda de Paulo Guedes é vista como um problema. Além disso, pode-se listar entre os sinais o sumiço das notícias sobre o Pantanal ou mesmo sobre a pressão de empresários pelo fim do desmatamento. Jair Bolsonaro talvez tenha perdido a sua rede de comunicação, mas parece estar ganhando não o apoio das grandes empresas de comunicação, mas o silêncio destas – o que já é muita coisa. É importante lembrar que a maior preocupação da imprensa comercial é com a agenda econômica e as linhas editoriais estão ligadas aos interesses financeiros dos ricos. A falta de pluralidade de discursos nos jornais tem conexão direta com as linhas editoriais. A Folha, que se autodeclara plural, não abre espaço para a esquerda. E não se trata de uma ou outra coluna fixa, mas das fontes que são consultadas pelas reportagens. Fora o fato de o jornal, costumeiramente, tentar apontar “fragilidades” e inconsistências desses grupos políticos. Até a pluralidade de ideias entre os partidos à esquerda é alvo de críticas. A Folha de hoje é um bom exemplo do que está sendo descrito nesse texto. Já o Globo ignora a esquerda quase que completamente. O Estadão – que é um dos mais conservadores – pratica um “pouquinho” a cultura de “ouvir o outro lado” nas reporta
CAPA – Manchete principal: *”Libertação de traficante abre crise no STF e debate sobre lei”*
EDITORIAL DA FOLHA - *”O Estado e o PIB”*: Contaminado por conveniências políticas e bandeiras militantes, o debate nacional em torno da despesa pública e seus limites não raro deixa de lado uma questão essencial —o gasto do governo é excessivo, adequado ou diminuto? Inexiste, claro, resposta objetiva e consensual para a questão, dado que o tamanho e o papel do Estado dependem de circunstâncias e escolhas de cada sociedade. Entretanto a experiência internacional permite identificar padrões e estabelecer bases de comparação. Nas estatísticas do Fundo Monetário Internacional (FMI), que buscam harmonizar os critérios de contabilidade, verifica-se que, entre as principais economias do mundo, o gasto governamental varia de 15% do Produto Interno Bruto, na Indonésia, a 55%, na França. A despeito de tamanha disparidade, a distribuição do indicador segue alguma lógica. Os Estados nacionais são claramente maiores na Europa, onde superam a marca de 40% do PIB, graças às redes de seguridade social. Em outras nações ricas, como EUA, Japão e Austrália, a proporção ronda os 35%. Países de renda média, em geral, contam com aparatos estatais mais modestos. Os desembolsos dos latino-americanos México, Colômbia, Chile e Peru situam-se num intervalo entre 18% e 28% do PIB. A Argentina, em desordem econômica, não tem dados disponíveis. O Brasil constitui claramente um ponto fora da curva. Após uma escalada vertiginosa ao longo de uma década, o gasto de União, estados e municípios atingiu 48,3% da renda nacional em 2019, muito acima dos demais emergentes listados. Tanto a despesa com juros (7,3%) como a primária (41%) são anômalas. Podem-se apontar desequilíbrios no Orçamento, decerto. Enquanto os encargos com funcionalismo, Previdência e dívida pública estão entre os maiores do mundo, a saúde e a infraestrutura, por exemplo, padecem de subfinanciamento. Uma reforma do Estado precisa, sim, enfrentar tais carências. Fazê-lo por meio da expansão contínua do gasto total, porém, será covardia política e suicídio econômico. O país já arca com carga tributária e endividamento quase sem paralelo no mundo emergente, ambos para sustentar o Estado inchado. As baixas taxas de crescimento econômico, particularmente trágicas nesta década, são sinais eloquentes de um custo excessivo. A reforma da Previdência começa a conter a escalada das despesas com aposentadorias; falta eliminar privilégios que inflam em demasia a folha salarial. O teto para o Orçamento federal é o instrumento necessário para conter a dívida e evitar uma alta dos juros. Driblá-lo agora, ainda que por motivos nobres, implicará sacrifícios maiores depois.
CATARINA ROCHAMONTE - *”Bolsopetismo e as criaturas do pântano”*: O presidente Jair Bolsonaro e o PT uniram esforços em direção a um mesmo fim. Embora apelem para o antagonismo no nível do discurso ideológico, a necessidade de desmontar a Operação Lava Jato igualou-os como criaturas de um mesmo pântano. Como o discurso que sustentam é falso, traem-se a todo instante, deixando clara a falta de compromisso com a ética, com o estado de direito, com o espírito republicano, com a justiça ou com a própria visão de mundo que diziam defender. Não é de estranhar, pois, o ato falho do ex-presidente Lula que, em entrevista ao jornal El País, afirmou que não irá “enganar o povo mais uma vez”; ou a cínica declaração de Bolsonaro de que teria acabado com a Lava Jato por não haver mais corrupção no seu governo. O que causou alguma estranheza foi ver jornalistas antes críticos do que chamavam de imprensa “chapa branca” se prestarem a tratar a referida declaração como sendo uma refinada ironia, como se não houvesse fatos evidenciando o acordo de Bolsonaro com as criaturas mais pantanosas da política no sentido de fragilizar o combate à corrupção. Tais fatos foram didaticamente expostos por Renan Calheiros em entrevista à CNN, na qual defendeu o “grande legado” que Bolsonaro pode deixar para o Brasil: o desmonte da Lava Jato, que teria montado um “estado policialesco”. O senador Calheiros lembrou que o presidente “encadeou várias medidas”, como a questão do Coaf, da Receita, a nomeação de Aras, a demissão de Moro, e, por fim, “a nomeação do Kassio”. O entusiasmo com essa indicação ao STF foi tão generalizado entre as “criaturas do pântano” da política quanto o foi a decepção entre aqueles que almejavam uma indicação séria e republicana. Irritado com as cobranças, o presidente xingou até seus próprios seguidores, chamando os apoiadores que o criticaram de “direita burra”. A direita inteligente, presume-se, seria aquela que se cala diante do clamoroso estelionato eleitoral protagonizado pelo mito. Catarina Rochamonte - Doutora em filosofia, autora do livro 'Um olhar liberal conservador sobre os dias atuais' e presidente do Instituto Liberal do Nordeste (ILIN).
PAINEL - *”Ministros do STF criticam Fux mas desaprovam ato de Marco Aurélio de soltar chefe do PCC”*: Ainda que discordem da forma como Luiz Fux tenha suspendido a validade da liminar de Marco Aurélio Mello, colegas do STF concordaram que o chefe do PCC não deveria ter sido solto e, de uma forma pragmática, acabaram se alinhando a Fux. Foi lembrado que, no fim do ano passado, Marco Aurélio mandou soltar todos os que haviam sido presos em segunda instância, em obediência à interpretação do STF. Dias Toffoli, então presidente, sustou a liminar. “Posar de bom moço é bom, né? Mas eu não jogo para a turba”, afirmou Marco Aurélio ao Painel, criticando a decisão de Fux deste sábado (10). “O ministro Fux não é censor de quem quer que seja, muito menos de colegas. Ele pode suspender liminar de outros órgãos, mas não do Supremo”. Esta é a segunda decisão do presidente do Supremo que poda o projeto anticrime, que embora tenha sido proposto por Sergio Moro acabou criticado pelos lavajatistas. A primeira foi a suspensão do juiz de garantias. O projeto anticrime tramitou no Congresso, no ano passado, em um contexto de revisão crítica da Lava Jato. Parlamentares fixaram normas para dar limites à prisão preventiva, da qual tinham sido alvos Eduardo Cunha, Marcelo Odebrecht e Michel Temer, este último preso por crime cometido anos antes.
PAINEL - *”Para Moro, revisão de prisão preventiva gera sobrecarga para juízes”* +++ Os critérios para a escolha das fontes são incompreensíveis. Qual o poder que Sérgio Moro acumula hoje? Qual o valor da sua opinião dentro do meio jurídico?
PAINEL - *”Auxiliares de Bolsonaro veem ministério de Paulo Guedes excessivamente grande”*: Ainda que a divisão do Ministério da Economia seja considerada pouco provável por auxiliares de Jair Bolsonaro, a avaliação dessas pessoas e até de integrantes da equipe econômica é que a pasta de Paulo Guedes ficou excessivamente grande, tornando-se disfuncional. Separá-la, por essa avaliação, seria uma forma de melhorar a gestão.
PAINEL - *”Russomanno avança entre eleitores mais jovens, Covas vai de 20% para 14%”*: Celso Russomanno (Republicanos) ganhou cinco pontos entre os eleitores mais jovens (16 a 24 anos) na última pesquisa Datafolha. Ele tem 35%. É mais do que o dobro do segundo pelotão nessa faixa etária. Guilherme Boulos (PSOL) tem 17% da preferência deste eleitorado. Tinha 10% na pesquisa anterior. Bruno Covas (PSDB), por sua vez, oscilou de 20% para 14% entre os mais jovens. Nessa faixa etária, 41% dos eleitores dizem conhecer o atual prefeito muito bem, ante 58% entre os com mais de 60 anos. Os jovens são, entretanto, uma parcela menor no grupo dos que declaram voto em Covas. Eles são 8% do total de eleitores do prefeito. Russomanno tem 15% de eleitores nessa faixa etária, Boulos, 16%, e Arthur do Val (Patriota), 43%. O tucano tem, por outro lado, 31% de eleitores com 60 anos ou mais, ante 23% de Russomanno e somente 11% de Boulos.
PAINEL - *”Ministério da Economia vê problemas legais em concurso da PF”*: A mais recente rodada de negociações entre o Ministério da Economia e a Polícia Federal, na semana passada, não eliminou problemas legais que técnicos estão vendo na abertura do concurso para 2.000 policiais, propagandeado pelo presidente Jair Bolsonaro em suas redes sociais. A equipe econômica alega que o pedido inicial da PF foi por 1.000 vagas, e que a segunda leva, motivada pelas declarações do presidente, chegou fora do prazo legal, que era até 31 de maio, e acima do que é considerado contratação apenas para reposição. Lei aprovada por iniciativa de Paulo Guedes (Economia) proíbe a abertura de novas vagas até o fim de 2021. Pelas contas da Economia, a PF teria 760 vagas a preencher de agentes. Requisitou inicialmente 550 e agora quer chamar 1.016. Há também pedidos para delegados, escrivães e peritos.
*”Ataque de Boulos a França escancara guerra por eleitorado feminino na disputa em SP”* - Um embate entre Guilherme Boulos (PSOL) e Márcio França (PSB) no início da corrida à Prefeitura de São Paulo chamou a atenção para uma fatia do eleitorado que ainda está majoritariamente indecisa e sempre é cobiçada por candidatos: as mulheres. Segundo o Datafolha, mais da metade (55%) do eleitorado feminino na capital paulista ainda não sabe em quem votar, quando a pergunta é feita na pesquisa sem mostrar ao entrevistado uma cartela de respostas. O índice cai para 42% no universo masculino. Durante o debate da Band, no último dia 1º, Boulos recuperou uma fala de 2018 do então governador França em que ele defendeu a tese que a Polícia Militar poderia ser mais eficiente se não tivesse que atender a tantas brigas domésticas. O candidato do PSOL questionou se o rival aprovava "lavar as mãos" diante da violência contra a mulher e sugeriu que espectadores buscassem na internet o nome do político do PSB mais a expressão feminicídio, o que fez reportagem da Folha sobre a afirmação da época virar a mais lida do site do jornal. França reforçou as explicações dadas em 2018 sobre a controvérsia, mas o estrago estava feito. Nos bastidores, assessores consideraram a resposta pouco enfática e avaliaram que, por nervosismo, o ex-governador perdeu uma chance de deixar clara a posição de respeito à igualdade de gênero. Àquela altura, os dois postulantes estavam colados um no outro nas intenções de voto medidas pelo Datafolha (Boulos com 9% e França com 8%, empatados na margem de erro). Na pesquisa mais recente, feita após o debate, o nome do PSOL saltou para 12%, enquanto o do PSB manteve os 8%. O primeiro tem o mesmo percentual (12%) entre homens e entre mulheres; o segundo chega a 10% entre homens, mas cai para 7% entre mulheres. Membros da campanha de Boulos dizem que o ataque embutia a intenção de mostrar que França não é tão de esquerda assim, em uma tentativa de conquistar apoios em um campo ideológico no qual os dois disputam votos. O representante do PSOL tem lembrado que o adversário foi vice do governador Geraldo Alckmin (PSDB) e ajudou a articular a campanha de João Doria (PSDB) a prefeito em 2016. "Ele não é o progressista que está tentando vender na campanha", diz o marqueteiro de Boulos, Chico Malfitani. "O Doria inventou aquela história de 'Márcio Cuba' [para ligá-lo à esquerda], mas isso não procede." Em entrevista à Folha em julho, França afirmou que está "mais para o lado progressista", mas disse que passou a vida toda explicando que é como se ele fosse "a direita da esquerda". Para além da discussão sobre espectro político, a provocação de Boulos reverberou de imediato na seara do gênero. Nas horas seguintes ao debate, as mensagens com o nome de França mais replicadas no Twitter continham o termo "briga de casal". Buscas no Google associando o nome dele à palavra feminicídio, que não eram algo muito pesquisado, ganharam tração durante o programa da Band, embora já tenham entrado em tendência de queda. De modo geral, as reações deixaram um saldo negativo para ele. Tanto Boulos quanto França vinham fazendo acenos às mulheres, com propostas específicas para esse público e trunfos nas estratégias de comunicação. O psolista alçou sua vice, Luiza Erundina (PSOL), a um patamar atípico de relevância na campanha —o nome da ex-prefeita é martelado quase tanto quanto o do cabeça de chapa. O ex-governador escalou sua esposa, Lúcia França, para tarefas de protagonista. Ela assumiu uma intensa agenda de rua e a interlocução com ONGs e líderes comunitários, além de ter destaque nas propagandas. Coincidência ou não, o casal intensificou depois do ocorrido as postagens em redes sociais identificadas com causas femininas. Ele exaltou as cientistas que venceram o Nobel de Química; ela publicou vídeo de apoiadoras, falou de câncer de mama e elogiou as "mulheres incríveis" com quem tem falado. Boulos também colocou o tema em evidência. Visitou uma organização que atende mulheres vítimas de agressão e mostrou a esposa e as filhas durante transmissões. O ativista de moradia também tem aparecido em público cercado por correligionárias que são candidatas a vereadora. Com um desempenho melhor entre os mais ricos e os mais escolarizados, Boulos pode aumentar sua inserção na periferia ao se aproximar das eleitoras, na visão de aliados. Estrategistas dizem que elas têm ainda a capacidade de influenciar o voto de parentes e vizinhos. As mulheres representam 54,1% do total de eleitores na capital paulista. Outros postulantes também agitaram a bandeira feminina nos últimos dias. No sábado (10), o candidato à reeleição, Bruno Covas (PSDB), foi a uma base da Guarda Civil Metropolitana que cuida de casos ligados à Lei Maria da Penha e fez promessas para combater a violência contra a mulher. A taxa de eleitoras indecisas, conforme o Datafolha, cai na pesquisa estimulada, quando o entrevistado é apresentado aos nomes dos candidatos. Neste caso, apenas 5% respondem que não sabem (entre os homens, são 4%). Celso Russomanno (Republicanos), que lidera a pesquisa estimulada, com 27%, registra também o maior índice de apoio feminino entre todos os concorrentes. O deputado federal e apresentador de TV alcança 26% entre as mulheres, percentual que sobe para 29% entre os homens. França, que já tinha chamado de fake news a insinuação feita por Boulos no debate, voltou a criticar o oponente em nota enviada à Folha. O candidato do PSB tem dito que sua fala de 2018 buscava defender maneiras alternativas de resolver os chamados casos de desinteligência. "Boulos é um bom rapaz, um idealista. Mas até ele sabe que falsificou entendimentos 'forçados' de matérias jornalísticas para reproduzir uma mentira que ofende minha história de vida e também a biografia intelectual dele", afirmou. "Homem que agride mulher tem que ser preso. Ponto final", completou. "O Estado deve, sim, ter profissionais diferentes para atender cada tipo de ocorrência. Foi o que eu afirmei em 2018 e que foi distorcido em prol de cliques e de lacrações no ambiente virtual e mesmo no debate." França repetiu que Erundina foi sua colega de partido e conviveu com ele em Brasília. A deputada federal, segundo o ex-governador, "não é uma mulher que contemporize com alguém com o perfil que ele [Boulos], de forma rasa, procurou descrever". A assessoria não respondeu se o imbróglio levou a alguma mudança de estratégia. França afirmou na nota que Lúcia "sempre foi independente para decidir o quanto gostaria de participar" de suas campanhas e que os dois são parceiros. "Não fazemos política para atenuar críticas, mas por convicção."
*”STJ chama decisão do TJ-SP de censura e permite à Folha acesso a boletins de ocorrência”* - A Segunda Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) aceitou um recurso da Folha e permitiu que o jornal tenha acesso à lista de entrada de corpos em unidades do IML (Instituto Médico Legal) e aos óbitos registrados em boletins de ocorrências policiais no estado de São Paulo. Por unanimidade (5 a 0), o colegiado acompanhou a posição do relator, ministro Og Fernandes, de que houve "inequívoca censura prévia" no caso. O TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) havia proibido a divulgação dos dados sob o argumento de que a medida ofereceria risco à segurança e à privacidade dos parentes das vítimas por possível exposição em reportagens. Os ministros do STJ, porém, afirmaram que não é função do Judiciário tampouco do órgão que negou acesso avaliar a forma como o veículo de imprensa pretende usar as informações. O colegiado seguiu o entendimento do relator de que a decisão do tribunal paulista configura censura prévia. O STJ também declarou que o fato de haver um portal público com os dados solicitados não autoriza o órgão a rejeitar o pedido de acesso à informação. O pedido de acesso aos dados foi feito pelo repórter da Folha Rogério Pagnan, que figura com o jornal como um dos autores do processo. A solicitação foi dirigida à Secretaria de Segurança Pública do governo estadual, à época chefiada por Alexandre de Moraes, atual ministro do STF (Supremo Tribunal Federal). O requerimento era para que fossem fornecidos os dados relativos ao ano de 2006 e ao período entre 1 de novembro de 2014 e 31 de outubro de 2015. O pedido era relativo ao nome das vítimas, ao número do boletim de ocorrência equivalente, ao distrito policial que solicitou os exames do IML, à natureza da ocorrência, à data da entrada do corpo e ao número de controles dos exames necroscópico. Em primeira e segunda instâncias, foram dadas decisões liminares (provisórias) em favor do mandado de segurança impetrado em 2016 pela Folha. A ordem, porém, nunca foi cumprida pelo Executivo estadual. Depois, no julgamento de mérito da causa, o magistrado de primeiro grau manteve o entendimento e deu ganho de causa ao jornal novamente. Em segundo grau, no entanto, o caso teve uma reviravolta. A 10ª Câmara de Direito Público do TJ-SP reviu o entendimento fixado na análise da liminar, e, no mérito, rejeitou a ação. Prevaleceu o argumento da relatora, desembargadora Teresa Ramos Marques, de que haveria no caso "risco à privacidade e à segurança dos familiares, valores maiores a serem protegidos, em detrimento do acesso pretendido pela imprensa privada". Além disso, a magistrada afirmou que o governo criou um portal que fornece as informações que haviam sido solicitadas. "A imprensa não necessita mais da impetração pois poderá acessar esse mesmo portal para colher as informações que pretende para a verificação da eficácia do serviço público", disse a desembargadora. O STJ, porém, declarou que o fato de haver um portal público com os dados solicitados não autoriza o órgão a rejeitar o pedido de acesso à informação. Segundo o relator do caso na corte, Og Fernandes, não é função da administração pública ou do Judiciário apreciar as razões do veículo de imprensa ao requerer dados que não são sigilosos. O ministro sustentou que não se pode inviabilizar o acesso "pelo mero temor de que incerta e eventual veiculação midiática causará potencialmente danos". "Não há razão nem mesmo em supor que os dados públicos virão a ser publicados pela imprensa, que pode aproveitá-los de uma infinidade de formas diversas como subsídio à atividade jornalística", ressaltou. Para o ministro, a decisão do TJ-SP afrontou a Lei de Acesso à Informação e o direito constitucional à liberdade de imprensa. "Não está [nem] sequer diante de produto jornalístico acabado, cuja construção poderia ensejar, de forma excepcional e ainda assim questionável, controle a sua publicação. Configura inequívoca censura prévia", disse. Foi uma dupla censura, argumentou o ministro: impediu o acesso à informação pública e contrariou a liberdade de imprensa. Og Fernandes afirmou que a existência de portal com dados solicitados apenas configura meio de cumprimento da obrigação de fornecer os dados, "mas não enseja a rejeição de pedido de informações nem afasta seu direito líquido e certo de tê-las". O presidente da Segunda Turma, ministro Herman Benjamim, classificou o julgamento como de "maior relevância" e destacou a importância da decisão. Os ministros Mauro Campbell, Francisco Falcão e Assusete Magalhães também acompanharam o relator. A advogada da Folha no processo, Taís Gasparian, relembrou que, antes da decisão da 10ª Câmara de Direito Público do TJ-SP, a Justiça havia reconhecido o direito de acesso aos dados em três oportunidades: nos julgamentos das liminares em primeira e segunda instâncias e na análise do mérito em primeiro grau. Ela afirmou, ainda, que o portal inaugurado pela Secretaria de Segurança Pública não oferece os dados que foram requeridos pela Folha. Gasparian disse acreditar que a decisão do STJ estabelece um importante precedente. "Embora a atualidade da notícia não se faça mais presente, trata-se de uma decisão que impõe um precedente, facilitando, por certo, julgamentos posteriores. É inadmissível que o poder público adote e se mova pelo princípio do segredo, quando se sabe que a transparência é fundamental em governos democráticos", disse. Ao negar o pedido da Folha, a Secretaria de Segurança havia argumentado que não poderia fornecer as informações "em função de tratar de documento que inclui dados pessoais como nome da vítima (caso identificada) e ou demais dados que possam ensejar a identificação da vítima ou de seus familiares". Além disso, o órgão citou que a solicitação da Folha envolvia "informações a respeito da causa da morte sujeitas ao sigilo médico".
CELSO ROCHA DE BARROS - *”O que acontecerá se a democracia brasileira for salva por seus defeitos?”* *”Com promessas de meritocracia e choque de gestão, SP tem recorde de candidatos liberais”*
*”Longe da Prefeitura do Rio há 32 anos, esquerda carioca não supera divisão”* - A eleição municipal parecia uma ótima oportunidade para esquerdistas quebrarem o ciclo vitorioso de chapas do centro à direita, com os dois principais concorrentes a prefeito do Rio, o atual no cargo, Marcelo Crivella (Republicanos), e seu antecessor Eduardo Paes (DEM) enroscados em investigações policiais. A esquerda esteve à frente do Executivo carioca mais de três décadas atrás, com Saturnino Braga eleito pelo PDT no primeiro pleito da redemocratização. E nunca mais. A incapacidade de superar obstáculos partidários 32 anos depois e se unir em torno de um candidato comum, contudo, mostra um campo pulverizado que pode deixar todos fora da reta final. Os cinco candidatos da arena progressista que pontuaram na pesquisa Datafolha divulgada na quinta (8) somaram 26% das intenções de voto, quatro pontos atrás do líder, Paes, e 12 acima de Crivella. Quase todos os debates internos para chapas conjuntas, contudo, foram a pique —só o PT dias atrás convenceu o PC do B a abrir mão da candidatura de Enfermeira Rejane, agora vice de Benedita da Silva. Em maio, o deputado Marcelo Freixo (PSOL), que em 2016 foi para o segundo turno contra Crivella, evocou a fragmentação da esquerda para justificar por que decidiu nem tentar a disputa neste ano. Ele reitera a decepção com a falta de um acordo interno. "Na minha opinião, sem querer ser arrogante, cada um olha pro seu quintal, na quantidade de vereadores para eleger, o que é legítimo. É muito importante fazer as legendas terem visibilidade. Só que tem um tufão arrancando nossos telhados, e tem gente tirando folha do quintal." Para Freixo, "o momento é de derrubar candidatos bolsonaristas". Este seria sobretudo o prefeito Crivella, que conta com o apoio da família Bolsonaro e também com recursos judiciais para poder concorrer. Em setembro, o TRE-RJ (Tribunal Regional Eleitoral do Rio) o tornou inelegível até 2026 por levar funcionários da prefeitura em 2018 a um ato de campanha do filho, então candidato à Câmara. Dentro do próprio PSOL de Freixo, porém, a cisão transborda. No mês passado, artistas como Caetano Veloso e Malu Mader assinaram um abaixo-assinado pedindo que reconsiderasse disputar a prefeitura. Acontece que a deputada estadual Renata Souza, ex-assessora de Marielle Franco, já havia sido anunciada como candidata do partido. E ficou parecendo, para parte do eleitorado à esquerda, que um homem branco estava tirando o lugar de uma mulher negra. Mais uma vez. A petição foi associada à produtora Paula Lavigne e ao antropólogo Luiz Eduardo Soares. O ex-secretário de Segurança Pública no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nas redes sociais ver "três mulheres honradas e respeitáveis" vindas do campo progressista e que "disputarão entre si os votos do campo democrático". Além de Renata, Benedita e Enfermeira Rejane, que ainda não era vice da petista, eram mulheres negras no páreo —Suêd Haidar (PMB) também, mas sem o perfil progressista. "Quem não se conforma com a divisão e não se entrega a uma derrota anunciada tenta trazer de volta Marcelo Freixo e sua disposição de unir", afirma Soares. "Nenhum nome tem a mesma força junto à sociedade e tem conclamado tanto à necessidade de unir." Freixo diz ter sido pego de surpresa. Estava em casa, com suspeita de Covid-19 (era gripe), quando recebeu mensagem de Paula Lavigne: "Olha seu email". Era uma reportagem falando sobre a demanda dos artistas. Conta que na mesma hora ligou para Souza. A psolista aponta "desprezo a uma candidatura de mulher negra" de quem não cogitou que Freixo falava em nome dela quando se disse disposto a retomar conversas por unidade na esquerda. "Sempre disse que o pragmatismo político é classista, racista e machista. Quase que eu viro um empecilho ao Freixo, olha que loucura, foi ele que me convenceu [a concorrer]." Souza pontuou 3% no Datafolha, atrás das outras duas concorrentes de partidos progressistas, a deputada federal Benedita (8%) e a deputada estadual Martha Rocha, do PDT (10%). Rocha preocupa Paes, por ter espaço para prosperar com eleitores mais ao centro. Seu nome cresce nas sondagens quando é apresentada como delegada —ela é ex-chefe da Polícia Civil do Rio. O PDT até ensaiou uma aliança com a Rede. O acordo era o seguinte: o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) abriria mão de pleitear a cadeira de prefeito se Rocha e Bandeira de Mello, o candidato da Rede, se unissem numa mesma chapa. A ideia era ver, em pesquisas internas, qual deles tinha maior viabilidade eleitoral. O primeiro colocado chamaria o segundo para ser vice. Acontece que Bandeira de Mello defendia que o levantamento fosse feito apenas com o eleitor que já conhecesse os candidatos. Só que ele é ex-presidente do Flamengo, o time mais popular do Brasil, e logo bem familiar para o eleitorado. O PDT ficou com a impressão de que Mello sairia candidato ainda que Rocha tivesse desempenho melhor, o que de fato aconteceu em pesquisas internas. O PSB de Molon ficou ao lado da legenda, até porque a prioridade é a eleicão no Recife de João Campos, filho do ex-presidenciável de 2014 Eduardo Campos, morto durante a campanha num acidente de avião naquele ano. O apoio no Rio seria uma espécie de quitação eleitoral pela parceria com pedetistas no Nordeste. "Acho que essa dicotomia esquerda-direita está ultrapassada. Eu me considero um candidato progressista, que se preocupa com a redução das desigualdades e com o respeito ao meio ambiente, mas que também se preocupa com responsabilidade fiscal", afirma Mello. Para Freixo, "faltou maturidade a todos nós", e ele não se exclui dessa conta. "A culpa é de todos nós."
*”Varrido da Grande SP em 2016, PT aposta em ex-prefeitos para recuperar terreno”* - Na tentativa de retomar o comando de cidades da região metropolitana de São Paulo, o PT aposta em ex-prefeitos para sair vitorioso das urnas. A estratégia se repete em seis cidades, o equivalente a metade dos municípios já governados pela sigla nos últimos 20 anos com candidaturas em novembro. Em 2016, na esteira do impeachment da presidente Dilma Rousseff, o partido foi praticamente varrido da região metropolitana, assumindo apenas uma prefeitura, a de Franco da Rocha, contra nove na eleição anterior. Agora, o PT está na disputa de 25 das 39 cidades da Grande São Paulo, sem contar a candidatura de Jilmar Tatto na capital. Desde 2000, 17 municípios da região já elegeram ao menos uma vez prefeitos da sigla, segundo dados do TSE disponibilizados pelo Centro de Política e Economia do Setor Público da Fundação Getulio Vargas (Cepesp Data/FGV). O secretário-geral do PT no estado, Chico Macena, diz que, além de ex-mandatários, o partido aposta em pessoas já reconhecidas na política local. “São pessoas jovens do ponto de vista de uma geração e já com uma bagagem política e capacidade”, diz, citando as vereadoras Bete Siraque e Rosângela Santos, que disputam as prefeituras de Santo André e Embu das Artes, respectivamente. Embu das Artes e Guarulhos são as cidades onde o PT governou por mais tempo neste século. Foram quatro mandatos consecutivos em cada. Osasco e Santo André tiveram três vitórias do partido desde 2000. Foi durante o segundo mandato de Lula na Presidência que o partido teve o seu melhor resultado na Grande São Paulo, com 11 prefeitos em 2008. Naquele ano, Luiz Marinho, que comandou dois ministérios de Lula, foi eleito pela primeira vez prefeito de São Bernardo do Campo, cargo que disputa novamente. Na ocasião, Marinho desfilou pelas ruas da cidade ao lado do então presidente. Foi também em parceria com o governo federal que o prefeito obteve recursos para obras na cidade, mesmo efeito que beneficiou os governos de Elói Pietá em Guarulhos e de Emídio de Souza em Osasco. Esse legado promete embalar a candidatura dos três petistas, que governaram os municípios por dois mandatos. Em Guarulhos, pesquisa Ibope realizada nos dia 25 e 28 de setembro com 805 eleitores mostra Pietá tecnicamente empatado com o atual prefeito e candidato à reeleição, Gustavo Henric Costa (PSD), o Guti. O mandatário tem 25% das intenções de voto, contra 22% de Pietá, que governou a cidade de 2001 a 2008. A margem de erro da pesquisa é de três pontos percentuais, para mais ou para menos. Em uma simulação de segundo turno, a posição se inverte, mas segue o empate técnico: Pietá com 38%, e Guti com 36%. O ex-prefeito petista é menos rejeitado que o atual ocupante do cargo, mas ambos são os mais rechaçados pelos entrevistados. Não votariam em Guti de jeito nenhum 31% dos entrevistados. Em Pietá, 26%. Também retornam ao pleito de 2020 os ex-prefeitos José de Filippi, em Diadema, Sergio Ribeiro, em Carapicuíba, e Ramon Velasquez, em Rio Grande da Serra. Num contexto de pandemia, a presença física de Lula em atividades de campanha é incerta. No fim de outubro, o ex-presidente completará 75 anos. Ele tem seguido a quarentena desde o início da pandemia, em março, segundo integrantes do partido, e tem usado a internet para fazer política. “[Lula] Está com uma disponibilidade incrível, porque tem participado de muitas lives e reuniões com a militância. Agenda física nós não sabemos”, afirma Macena. Pietá sonha com a presença do ex-presidente na campanha. “Lula foi o presidente que mais ajudou Guarulhos e nos ajudou a construir o maior hospital da cidade. Se depender dele, aparece na campanha”, diz. O ex-presidente mora em São Bernardo, onde começou na política como líder sindical, ao comandar greves de metalúrgicos no final dos anos 1970, durante a ditadura militar. Na cidade, ele recebeu o apoio de militantes nas horas que antecederam sua prisão, em abril de 2018, após condenação em segunda instância pela Lava Jato. Presidente do PT no estado, Marinho afirma que a sigla prepara formas de fazer a imagem de Lula circular pelo país, assim como a do ex-prefeito Fernando Haddad e da ex-presidente Dilma. “É uma liderança que respeitamos e é respeitada. Há quem o odeie e quem o ame. Acima de tudo, ele nos representa e lidera. [O Lula] participará de forma efetiva das nossas campanhas, não só da minha”, afirma o petista, acrescentando que a presença física dependerá da liberação dos médicos. “Quando os profissionais da saúde liberarem, provavelmente ele participará", diz. Ex-advogado de Lula, Emídio destaca que essa será uma campanha diferenciada, com menos corpo a corpo e mais interação nas redes sociais. Ele lembra que Lula participou de live com ele recentemente. Ainda que não esteja presente em carreatas, Lula tem contribuído para nacionalizar o discurso da campanha, com críticas à condução da pandemia pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), como na mensagem divulgada no feriado do 7 de Setembro. “Estamos entregues a um governo que não dá valor à vida e banaliza a morte. Um governo insensível, irresponsável e incompetente, que desrespeitou as normas da Organização Mundial de Saúde e converteu o coronavírus em uma arma de destruição em massa”, afirmou. O tom também marca as peças divulgadas pelo partido, sob o slogan “na hora do vamos ver, quem defende você é o PT”, destacando programas nacionais, como o Bolsa Família e o Minha Casa Minha Vida. Macena afirma que a crítica da legenda é feita às políticas do governo e que o impacto da pandemia na economia dos municípios e no desemprego afetará diretamente as realidades locais. “Parece que a gente fala que tem um debate nacional a ser feito descolado dos municípios e não é isso. Debate nacional a ser feito é sobre o cotidiano das pessoas e inclusive das perspectivas de cada prefeitura no âmbito local resolver os problemas”, diz. A polarização com o PSDB em algumas cidades, como São Bernardo do Campo, também deve marcar mais uma vez a retórica dos candidatos petistas, mas, na avaliação de Macena, os tucanos estão enfraquecidos com a divisão da centro-direita.
*”Candidatos aproveitam cercadinho do Alvorada para fazer de Bolsonaro cabo eleitoral”*
*”Assessor e amigo de Bolsonaro, almirante ganha R$ 20 mil extra de empresa do BB”* - Amigo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e hoje secretário especial da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência, o almirante da Marinha Flávio Augusto Viana Rocha, 58, recebe R$ 20 mil a mais de remuneração mensal por ter sido indicado em julho para representar o governo em uma empresa ligada ao Banco do Brasil. Rocha é o mais cotado para assumir a Secretaria-Geral da Presidência, hoje ocupada por Jorge Oliveira, nome de Bolsonaro para uma cadeira no TCU (Tribunal de Contas da União). O almirante foi indicado pelo Banco do Brasil para uma vaga de membro titular do Conselho de Administração da Brasilseg, empresa do ramo de seguros fruto de uma parceria entre a instituição brasileira e o grupo espanhol Mapfre. A nomeação de Rocha foi efetivada em 31 de julho, para três anos de mandato. Pela participação no colegiado, ele tem direito a uma remuneração mensal bruta de R$ 20 mil. De acordo com o Portal da Transparência, o salário bruto pago ao secretário especial em julho, no qual não incidiu o valor devido por sua participação como conselheiro da Brasilseg, foi de R$ 44 mil. Constou um desconto de R$ 1.446,47 a título de "abate-teto". A informação sobre os salários pagos aos militares em agosto e setembro não havia sido disponibilizada pelo governo até a publicação deste texto, mas a verba paga a servidores públicos por participação em conselhos de empresas geralmente fica de fora do cálculo do teto salarial. O teto do funcionalismo público é de R$ 39,3 mil, vencimento pago aos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). Hoje um dos auxiliares mais próximos de Bolsonaro, Rocha recebeu elogios do chefe do Executivo em fevereiro. Ao nomeá-lo, o presidente enalteceu o currículo do auxiliar e afirmou que estava "comprando" o passe dele na Marinha. Na ocasião, Bolsonaro promoveu uma mudança administrativa. Até então um setor da Secretaria-Geral da Presidência, a SAE ganhou novo status, passando a ser uma estrutura ligada diretamente ao presidente. Conforme reportagem da Folha publicada em julho, o almirante, apelidado de "a sombra do presidente", tornou-se um dos principais conselheiros e articuladores de Bolsonaro, com participação em decisões estratégicas e acesso livre ao gabinete presidencial. Descrito como discreto, sociável e apaziguador, Rocha atuou para arrefecer crises recentes, ajudou na sucessão do Ministério da Educação e coordenou a transição do Ministério da Saúde em meio à pandemia do coronavírus. Conhecido no Executivo como almirante Rocha, o secretário atuou como chefe da assessoria parlamentar da Marinha na Câmara. Caso se torne ministro, ele será o segundo militar da ativa no primeiro escalão. A Brasilseg, cuja razão social é BB Mapfre Participações, é resultado de uma parceria entre a BB Seguros e o grupo Mapfre, firmada em 2011 e com prazo de 20 anos. De acordo com informações disponibilizadas pelo banco, a Brasilseg é dona de 100% do capital de outras duas empresas, a Brasilseg Companhia de Seguros, que atua nos ramos de seguros de vida, habitacional e rural, e a Aliança do Brasil Seguros, que atua na área de riscos de seguros residenciais e empresariais. No dia 6 de julho, um comitê do BB encarregado de analisar nomes indicados a órgãos de governança de entidades ligadas ao banco analisou o nome de Rocha e se manifestou favoravelmente. No fim daquele mês, a indicação foi efetivada. Em resposta a perguntas enviadas pela Folha, o almirante afirmou, por meio de sua assessoria, que sua indicação "foi feita pelo Banco do Brasil que, como sócio da empresa, tem direito a indicar representantes ao referido conselho". Ele frisou que os conselheiros opinam em processos de tomada de decisões e definição de estratégias, "contribuindo, dessa forma, para a boa governança da empresa", e que tem a qualificação necessária para desempenhar a atividade. "O secretário Flávio Rocha possui comprovada experiência nas áreas de estratégia, gestão e administração, fruto de sua capacitação profissional e de sua trajetória ao longo de quase 40 anos de serviço público", disse a nota da assessoria. "Os membros do Conselho de Administração atuam com autonomia e, como já mencionado, são responsáveis por contribuir para a boa governança da empresa." O conselho realiza regularmente um encontro a cada mês, mas pode, se necessário, promover reuniões extraordinárias. Rocha informou que já participou de duas reuniões ordinárias e de um encontro extraordinário desde que foi efetivado. Sobre a remuneração bruta de R$ 20 mil pela participação no colegiado, o almirante disse que todos os membros do órgão recebem valor mensal fixo definido e custeado pela própria Brasilseg. "O valor líquido da remuneração, após descontado o Imposto de Renda, é de R$ 14.987,08", informou. A Folha pediu esclarecimentos à direção do Banco do Brasil, mas a resposta ficou a cargo da BB Seguros, que confirmou a efetivação do almirante para o posto de conselheiro, sem fornecer mais detalhes, como a remuneração. Bolsonaro deverá decidir sobre a ida de Rocha para a Secretaria-Geral da Presidência após o nome do atual titular da pasta, Jorge Oliveira, ser sabatinado e aprovado no Senado para ocupar uma cadeira do TCU. Quando da indicação de Rocha para o conselho da Brasilseg, o presidente do Banco do Brasil ainda era Rubem Novaes. Uma das polêmicas da gestão de Novaes ocorreu ainda no primeiro mês do governo Bolsonaro, envolvendo a nomeação de Antônio Hamilton Rossell, filho do vice-presidente Hamilton Mourão, para a assessoria especial da presidência do banco. Com a ascensão no banco público, o filho do vice passou a ganhar R$ 36,3 mil, o triplo do salário que recebia antes. A função equivale a um cargo de executivo. A decisão gerou desconforto na cúpula do governo, segundo relatos. Para integrantes da equipe ministerial, a escolha divergia da conduta defendida por Bolsonaro de acabar com privilégios.
*”Brasileiros relatam 'inferno' de pegar Covid-19 nas prisões de imigrantes dos EUA”* TODA MÍDIA - *”Sinovac recebe 'grande atenção'; país racha por causa das vacinas”* MATHIAS ALENCASTRO - *”Democratas estão dando um show de sangue frio e disciplina”* *”Candidato de direita desiste na Bolívia e fortalece frente contra nome de Evo”* *”Jovem italiano que evangelizava pela internet é beatificado por milagre no Brasil”* *”Trem atinge ônibus que ia para templo budista e deixa 20 mortos na Tailândia”*
*”Desigualdade entre servidores varia por atividade, Poder e região do país”* *”Reforma administrativa levanta discussão sobre definição de servidor público”* *”Servidores admitem reforma administrativa, mas divergem sobre mudanças”*
PAINEL S.A. - *”Expansão da abertura de shoppings preocupa lojistas”* PAINEL S.A. - *”Aluguel em Manhattan atinge menor valor em sete anos, diz pesquisa”* PAINEL S.A. - *”Sem viagens a negócios, companhias aéreas nos EUA procuram turistas”* PAINEL S.A. - *”Conserto de ar-condicionado disparou com o calor”* PAINEL S.A. - *”Fabricante de brinquedo relança bonecos He-Man dos anos 1980”* PAINEL S.A. - *”Dono da Brinquedos Estrela fala sobre o Dia da Criança no ano da pandemia”*
*”Conselhinho esvaziado compromete punição a irregularidade financeira”*
*”Trabalho doméstico perde 500 mil postos na pandemia”* - A empregada doméstica Barbara Cristina, 40, começou 2020 trabalhando em três residências diferentes no Rio de Janeiro, com uma renda mensal próxima a R$ 2 mil. Ela chega ao fim do ano, no entanto, desempregada e sem nenhuma fonte de renda, contando com a ajuda do namorado para pagar as contas. A situação de Cristina é a mesma que muitas domésticas enfrentam após a chegada da pandemia de Covid-19 ao país. As medidas adotadas para conter a disseminação da doença, como o distanciamento social e as restrições para o funcionamento de comércio e serviços, afetaram sobretudo trabalhadores do setor de serviços. Segundo Barbara, os empregadores alegaram motivos distintos para a dispensa, mas sempre ligados à pandemia. Ela conta ter ficado sem trabalho em meados de março e abril, quando a maior parte do país passou a adotar medidas restritivas para combater o novo coronavírus. “Em uma das casas, fui mandada embora porque o orçamento dos patrões caiu, eles trabalham com empresas que foram afetadas pela pandemia. Nas outras, como tinham idosos ou crianças, ficaram com medo que eu levasse a pandemia para dentro da casa deles e me dispensaram”, afirma. Números do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que os trabalhadores domésticos e ligados à prestação de serviços às famílias ainda são os que mais sofrem com a pandemia da Covid-19 no Brasil. Mesmo com a ligeira recuperação em outras áreas, principalmente aquelas com trabalhos que exigem maior qualificação, que se adaptaram ao home office, esses segmentos seguem sem conseguir criar novas vagas. Segundo dados da Pnad Covid, pesquisa criada pelo IBGE para mensurar os efeitos da pandemia no país, desde maio foram cerca de 500 mil postos de trabalho perdidos nos serviços domésticos. Em um ano, o setor doméstico perdeu 1,7 milhão de postos, de acordo com a pesquisa Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua referente a julho. Por utilizarem metodologias distintas, as duas pesquisas não são comparáveis, mas apontam o cenário dramático do trabalho doméstico. Janaina Mariano de Souza, presidente do Sindicato das Empregadas e Trabalhadores Domésticos da Grande São Paulo, diz que o setor está em queda livre: a cada 10 atendimentos feitos pela entidade, 8 são de domésticas desempregadas no período. “Para nossa categoria, a pandemia ainda está fazendo estrago, o número de doméstica desempregadas está crescendo.” Além das demissões, contratos estão sendo suspensos. A estimativa é que para cada 100 novos papéis que chegam ao sindicato, 98 são para suspensão do serviço, com base na medida provisória instaurada pelo governo. A preocupação é que esses empregos sejam encerrados após o fim da iniciativa. Rodolpho Tobler, da Fundação Getulio Vargas, aponta que dois fatores estão prejudicando os serviços domésticos a voltar a criar vagas. O primeiro é a cautela em relação à renda, o segundo o medo de contágio da Covid-19. “As pessoas evitam consumir serviços porque tiveram demissões ou salários reduzidos. E a pandemia não está controlada, esse tipo de serviço demanda presença física, não tem como ter serviço doméstico sem ser assim, precisa estar presencialmente e isso tudo complica”, afirma o economista. Ele avalia que, pelo fato de os empregados domésticos utilizarem transporte público para trabalhar, acabam causando temor nos patrões de se contaminarem e levarem a doença para seus lares. “E tem a questão da renda, ninguém tem certeza de que o salário vai continuar estável, as pessoas estão postergando esse consumo e aproveitam para não ter gastos”.” O especialista da FGV afirma que o corte no auxílio emergencial vai pressionar o mercado de trabalho, fazendo as pessoas irem às ruas em busca de emprego. “Com o benefício caindo pela metade, isso pressiona o orçamento das famílias e elas ficam obrigadas a procurar emprego. Os R$ 300 não são suficientes para se manter, mas a economia não reage tão rápido para absorver a todos, e muito vão fazer bico, para conseguir renda”, diz. Além do trabalho doméstico, outros serviços com características semelhantes, como baixos salários e alta informalidade, também foram duramente afetados pela pandemia do novo coronavírus. Segundo a Pnad Covid, desde maio foram perdidos 350 mil vagas em alojamento e alimentação (como hotéis e restaurantes) e 300 mil em outros serviços. O segmento de outras atividades, que agrega serviços menores que não se encaixam em nenhum dos outros pesquisados, registrou perda de 2,9 milhões. Somados, esses serviços concentram 4 milhões de postos de trabalho perdidos durante a pandemia e ainda não mostraram reação, apesar do afrouxamento da quarentena nas últimas semanas. Enquanto isso, outros setores já mostram uma retomada gradual, como os de construção, comércio e reparação de veículos e motocicletas, e nas indústrias geral e de transformação. Para o professor Ricardo Macedo, do Ibmec, esse cenário ainda se relaciona com a crise sanitária. Como serviços domésticos e prestados à famílias envolvem contato direto e aglomeração, a demanda segue desaquecida por um temor do consumidor de se expor. O professor Otto Nogami, do Insper, diz que o processo de retomada do emprego nos serviços enfrenta dificuldades mesmo com a flexibilização. “Muitos empresários estão descobrindo que não está valendo a pena retomar a atividade, pois está tendo mais prejuízo que lucro. Eles preferem manter o negócio fechado até que a coisa realmente se estabilize e comece a voltar à normalidade de uma maneira mais consistente.” Outro fator que explica a falta de reação do emprego nesses setores é o auxílio emergencial, benefício elevou a renda dos mais pobres a patamares inéditos, permitindo com que ficassem em casa em vez de se expor ao vírus. Com o corte pela metade do benefício, a tendência é que esses brasileiros voltem às ruas para buscar um trabalho, o que vai pressionar a taxa de desocupação e de informalidade. Soma-se a isso a alta na inflação de alimentos —em setembro, o IPCA registrou a maior alta para o mês desde 2003. “A cesta básica ficou comprometida. Em uma questão de sobrevivência e manutenção de dignidade, essas pessoas serão obrigadas a voltar, e a informalidade vai crescer”, avalia o professor Ricardo Macedo.
*”História em quadrinhos mostra como o coronavírus escancarou a desigualdade no trabalho doméstico”* - A pandemia evidenciou a desigualdade no trabalho doméstico no Brasil, exercido sobretudo por mulheres negras. Rosane, que tem carteira assinada, e Luciana, sem o registro, representam esse cenário. Elas, que preferiram não ser identificadas, têm as histórias contadas na forma de quadrinhos. O roteiro é de Triscila Oliveira e a ilustração de Leandro Assis, autores das séries “Os Santos — Uma tira de ódio” e “Confinada”, publicadas no Instagram. Desde setembro último, eles também são chargistas da Folha.
RONALDO LEMOS - *”TSE cria ação contra Fake News”* *”Reação do emprego vai depender de crédito”* MARCIA DESSEN - *”Perda difícil de engolir”* *”Entenda o que são BDRs e como investir nesses papéis”* *”Cresce interesse de techs brasileiras por emissões em NY, diz diretor da Bolsa nos EUA”*
ENTREVISTA DA 2ª - *”'Enfrentamos hoje a volta de um estado de fome epidêmica no Brasil', diz historiadora”*: Após anos dedicados aos estudos sobre a fome e os hábitos alimentares dos brasileiros, é de sua presença diária nas ruas da zona norte de São Paulo, alimentando uma legião de famintos e desempregados, que a historiadora Adriana Salay, 36, tira suas conclusões. “Se esse Estado que está hoje colocado não entende que essa população precisa sair da situação de fome, temos que fazer uma mobilização da sociedade civil e criar esse enfrentamento com o Estado”, afirma. Ao lado do marido, Rodrigo Oliveira, chef do restaurante Mocotó, Adriana criou o projeto Quebrada Alimentada, que distribui 200 marmitas por dia e 220 cestas básicas por mês desde o início da pandemia do novo coronavírus. Debruçada sobre a obra de Josué de Castro, autor de “Geografia da Fome” e ex-presidente do Conselho Executivo da FAO, o órgão das Nações Unidas para agricultura e alimentação, ela vê a fome epidêmica, causada pela emergência sanitária, se juntar à fome endêmica no país. Segundo a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE, 37% das famílias viviam em insegurança alimentar em 2018. Essa porcentagem era de 23% em 2013. A realidade de 2020 deve se revelar ainda pior. Não à toa, o Relatório Global de Crises Alimentares, do Programa Mundial de Alimentação (PMA), da ONU, apontou que a pandemia pode fazer o número de pessoas em insegurança alimentar duplicar no mundo. Na última sexta-feira (9), o programa da ONU ganhou o Prêmio Nobel da Paz pelos esforços em combater a fome e evitar que ela seja usada como arma em conflitos. Nesta semana, o projeto de Adriana e Rodrigo fará parte de uma ação batizada de “Gente é pra brilhar, não pra morrer de fome”. Organizada pelo coletivo Banquetaço, a campanha terá programação online (genteprabrilhar.org) para debater a fome a partir desta segunda (12) até sexta (16). No sábado (17) e no domingo (18), “marmitaços” em diferentes capitais devem distribuir refeições nas ruas. Chefs como Rodrigo, Helena Rizzo, Paola Carosella, Bel Coelho e Bela Gil fazem parte da campanha. - O que mudou na geografia da fome desde que Josué de Castro publicou o livro homônimo? - Tivemos avanços importantes. Quando ele publicou (1946), há dados expressivos de que populações periféricas do Recife, por exemplo, usavam 70% da renda em alimentação. Isso era normal. Não que hoje isso tenha passado, mas tivemos avanços como os programas de transferência de renda e de cisternas no sertão. Passamos por uma seca importante recentemente no sertão que não gerou retirantes e situações de fome como estavam colocadas na época do Josué de Castro. Eu encontrei na imprensa, por exemplo, cenas de canibalismo nas secas sertanejas nos anos 30. Cenas como essas e campos de concentração para refugiados das secas, em 1932, não estão mais colocadas hoje. Josué separa fomes epidêmicas —devido a crises— e endêmicas —estruturais. Agora, temos menos crises de fome, mas temos uma manutenção da fome endêmica.
- Hoje, devido à pandemia, temos a volta da fome epidêmica? - Sim. Na minha perspectiva, sim. E por isso vem toda essa movimentação. Por causa da Quebrada Alimentada começamos a gravar um documentário com depoimentos de pessoas que procuram o programa. Há depoimentos que são muito representativos desse momento. Alguém que ganha um salário mínimo (R$1.045) e vive com mais três pessoas, por exemplo, está em uma situação de fome estrutural, porque o salário mínimo hoje no Brasil não alimenta adequadamente quatro pessoas com os outros custos de vida. Outras pessoas que não estavam nessa situação são alçadas a esse lugar porque perderam renda. Um dos depoimentos, por exemplo, é de uma camelô que trabalhava no Brás. Com o fechamento do comércio, ela perdeu toda sua renda. Mesmo tendo conseguido R$ 1.200 de auxílio emergencial do governo federal, porque ela é responsável pela casa e vive com três filhos, não consegue se alimentar a todos. Ela paga R$ 800 de aluguel. Com R$ 400 não consegue. Ela passou 15 dias comendo apenas arroz. A fome é um processo, não é um fato posto. Ela narra exatamente esse processo da fome. Primeiro, começa a diminuir a quantidade das refeições; depois, a mulher, que é a pessoa que faz a gestão da fome na maioria dos lares, começa a pular refeições. E só então os filhos deixam de comer. Ela narrou exatamente isso, sem ter conhecimento científico, da entrada na situação de crise de fome por causa da pandemia. Antes, ela não estava nesse lugar e tinha renda suficiente para alimentar a família. Ela mora aqui, na Vila Medeiros, na zona norte. É um bairro com algumas vulnerabilidades, mas não é o lugar mais vulnerável. Estamos bem no meio do caminho em termos de IDH na cidade.
- É isso que encontram nas ruas quando distribuem marmitas e cestas básicas? - Há duas figuras importantes aí. Fiz entrevistas com 220 famílias que se cadastraram no programa de cestas básicas para entender o que estava acontecendo. Há um perfil de famílias que já estavam em situação difícil e outro muito grande de famílias em que alguém perdeu emprego. Das 220 famílias, 180 estão nesse perfil. O que temos que pensar numa sociedade monetizada como a nossa, é que a renda é fator decisivo para comer ou não. É só olhar para POF de 2018, que saiu no mês passado, os números de fome aumentaram muito. E São Paulo é o estado, em números absolutos, que tem mais gente nessa situação. E o que significa a pandemia [nesse cenário]? Temos que pensar o que o auxílio emergencial compra em São Paulo e o que compra em uma cidade pequena no interior de Pernambuco. Os R$ 600 podem ser suficientes lá, mas aqui não paga um aluguel. E agora, metade disso.
- Qual sua avaliação da atuação das três esferas de governo contra a fome durante a pandemia? - São três esferas diferentes, mas que estão caminhando juntas no combate à fome fazendo muito aquém do que deveriam nesse momento. Vale lembrar que o valor do auxílio emergencial não foi definido no Executivo, mas no Legislativo. É uma medida importante, mas não é o suficiente. Há algumas políticas públicas que deveriam ser implementadas ou mantidas nesse momento, como o programa de aquisição alimentar para o PNAE, que é o programa de alimentação escolar, que praticamente acabou. A escola é um lugar privilegiado para acessar essas famílias em vulnerabilidade. As escolas públicas têm o mapeamento dessas famílias, elas têm um programa de aquisição alimentar que é muito importante, porque 30% desses alimentos precisam vir da agricultura familiar. Quando você desmantela esse programa, não são só essas famílias que são prejudicadas, como também esses agricultores. Defendemos a implementação de algumas políticas como o auxilio aluguel, a intensificação dos restaurantes populares, e nada disso tem sido feito. Não há uma política de contenção de fome em nenhuma das esferas de governo.
- Isso te surpreende de alguma forma, ou em que medida, após o país ter conseguido reduzir de forma expressiva a fome? - Saímos do Mapa da Fome da FAO, em 2014. Mas, em minha concepção, enquanto tivermos alguém passando fome, precisamos falar sobre isso. São inegáveis os avanços dos governos anteriores na erradicação fome, e todos os dados mostram isso. E não só o Brasil avançou. Mas pensando nos governos que estão instalados hoje, não me surpreende. Quando a pandemia chegou, com o entendimento que tenho e olhando para os trabalhos de Josué de Castro, já sabia o que iria ocorrer. As crises são fatores geradores de fome. O que mudou para mim? Não posso mais ficar só nos livros. Sei o que está acontecendo e é hora de agir. Aí vem o Quebrada Alimentada e o Gente Nasceu para Brilhar. Se esse Estado que está hoje colocado não entende que essa população precisa sair dessa situação de fome, temos que fazer uma mobilização da sociedade civil para colocar esse problema na pauta e criar esse enfrentamento com o Estado.
- Mas o Estado não tem condições de responder a isso minimamente? - É papel do Estado. Ele tem todas as ferramentas. Tem o cadastro único, que mapeia as pessoas em vulnerabilidade alimentar, CCAs [Centros para Crianças e Adolescentes, serviço municipal] que acolhem as crianças e podem fazer a distribuição por lá, tem os restaurantes populares, o programa de merenda escolar. Tem todas as ferramentas, o que falta é vontade política para que isso aconteça. Não à toa, na nossa campanha são mais de cem grupos que se mobilizaram. A gente fala muito que estamos enxugando gelo porque não estou resolvendo o problema. Se eu dou uma marmita hoje, essa família vai estar com fome de novo amanhã, porque ela não tem acesso a renda para se alimentar de forma adequada e saudável. É papel do Estado fornecer essa alimentação. O papel da sociedade civil nesse momento se dá para levantar essa bandeira. Esse Estado que está colocado não vai fazer isso por conta própria, a não ser que tenha uma cobrança.
- Vocês já sentiram algum tipo de censura a esse tipo de mobilização? - Já. A gente escuta muito que tem gente que pega as marmitas para vender. Tem críticas de quem diz que essa fome é resultado, porque mandaram todo mundo ficar em casa [durante a pandemia]. Mas acredito que o saldo ainda é positivo.
- Há pouco tempo a primeira dama do estado de São Paulo, Bia Doria, disse que viver na rua é uma situação cômoda. Qual sua avaliação sobre essa afirmação? - Acredito que é problemático pelo lugar que ela está e atribuo essa fala à falta de conhecimento sobre o estado que o marido dela governa. Se você começar a entender os mecanismos que vão gerar população de rua e de pessoas com fome, você não pode culpar o indivíduo por estar ali. São as dinâmicas sociais que vão gerar essa situação e a falta de conhecimento que vai gerar uma fala equivocada como essa.
- De que forma isso faz parte da sua pesquisa? - O entendimento desse fenômeno é justamente o centro da minha pesquisa. Essa leitura da fome enquanto crise não deixou de existir. Quando você olha para a fala do presidente Jair Bolsonaro quando ele disse que não existia fome no Brasil porque não existe pessoas esqueléticas na rua, está defendendo uma posição. Ele tira de campo a noção de fome estrutural. Isso não é algo único e posto. É uma disputa. Existiam as teorias neomalthusianas de que a população cresceria mais do que a produção de alimentos. Isso caiu por terra porque já produzimos para alimentar o mundo, mas ainda somos um mundo com fome porque as pessoas têm acessos diferentes ao alimento. Esses debates e essas disputas existem inclusive sobre os níveis de insegurança alimentar. Hoje, a FAO considera como fome apenas insegurança alimentar grave, só que a insegurança alimentar moderada já é uma família pular refeição. Os nomes formam as coisas. Se eu tiro o termo fome, para boa parte da sociedade isso muda a intensidade do fenômeno.
- O Nobel da Paz para o PMA, da ONU, te surpreendeu? - Nesse momento de crise, no qual a fome no mundo pode chegar a índices inimagináveis e o Brasil pode se tornar um dos epicentros emergentes da fome no mundo, segundo a Oxfam, o prêmio deixa seu recado de quais estratégias ele quer fomentar. Josué de Castro, lá nas décadas de 1950 e 1960, já falava que guerra e fome estão interligadas, por isso alimento e paz também. Acredito que é uma boa resposta aos ataques que essas organizações vêm sofrendo de políticas nacionalistas como as de Trump e Bolsonaro.
*”Decisão de Marco Aurélio divide congressistas, que falam de novo em mudança na lei penal”* - A decisão do ministro Marco Aurélio Mello (STF) de soltar um dos chefões do PCC (Primeiro Comando da Capital) com base em artigo incluído pelo grupo de trabalho do pacote anticrime opôs deputados neste domingo (11) e foi considerada despropositada pelo Palácio do Planalto. No Congresso, um grupo ligado ao presidente Jair Bolsonaro e defensor da Operação Lava Jato articula a apresentação de projetos de lei para retirar do Código de Processo Penal o dispositivo que determina que, a cada 90 dias, seja revista a decisão de manter a prisão preventiva de um acusado de crime. No campo contrário, deputados defendem o dispositivo e argumentam que o objetivo fundamental do texto é impedir que pessoas pobres presas injustamente passem longos períodos encarceradas sem julgamento. O artigo 316 do CPP foi usado pelo ministro Marco Aurélio na decisão de soltar André de Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap, na sexta (9). O traficante estava preso desde o final de 2019 sem uma sentença condenatória definitiva, excedendo o limite de tempo previsto na legislação brasileira. Ele foi solto na manhã de sábado (10) e é considerado foragido pelo MP-SP (Ministério Público de São Paulo). O artigo determina que, decretada a prisão preventiva, “deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal". Após André do Rap ser solto, o presidente do STF, Luiz Fux, suspendeu a decisão de Marco Aurélio e determinou o retorno imediato do criminoso à penitenciária de Presidente Venceslau, no interior de São Paulo. A decisão de soltura foi avaliada como desmedida e despropositada no Palácio do Planalto. Para auxiliares presidenciais, apesar de Marco Aurélio ter se baseado no artigo 316, o ministro deveria ter ponderado que, neste caso, tratava-se de um preso de alta periculosidade e que, portanto, não deveria ter sido beneficiado pela previsão legal. O entorno do presidente também considera que a decisão acaba reforçando o discurso de Bolsonaro sobre a necessidade de ministros de perfil conservador no STF. Para a vaga de Marco Aurélio, que será aberta no próximo ano, o presidente já disse que poderá indicar um pastor evangélico. O episódio provocou reações inflamadas de congressistas que defendem um endurecimento do sistema penal brasileiro. A deputada Carla Zambelli (PSL-SP), ex-vice-líder do governo na Câmara, afirmou que vai apresentar projeto de lei para retirar do CPP a “obrigação do juiz de reavaliar a prisão preventiva a cada 90 dias.” “Contamos com o apoio da população e dos profissionais da segurança pública”, escreveu em uma rede social. Relator do texto elaborado pelo grupo de deputados que analisou o pacote anticrime do ex-ministro Sergio Moro (Justiça) e do ministro Alexandre de Moraes, o deputado Capitão Augusto (PL-SP) criticou o dispositivo. “Lutei muito contra isso, eu avisei que daria problema. Fui vencido no grupo de trabalho e incluíram no relatório contra minha vontade”, afirmou o congressista. "Tudo que ficou de fora do pacote original do Moro e aquilo que foi incluído contra nossa vontade, como essa questão e o famigerado juiz de garantias, vamos tentar reverter ano que vem. É minha bandeira da candidatura para Presidência da Câmara”. Os dois itens citados —revisão da prisão preventiva e o juiz de garantias— foram incluídos pelo grupo de trabalho da Câmara. O presidente Jair Bolsonaro vetou 25 dispositivos na lei anticrime que tinham sido aprovados pelo Congresso, mas manteve os dois criticados pelo parlamentar. Capitão Augusto, coordenador da frente parlamentar da segurança pública, afirmou que vai protocolar, no Senado, um pedido de impeachment contra o ministro Marco Aurélio. “Não pode ficar barato. Que sirva de lição para os demais”, disse. Moro também criticou a inclusão do dispositivo na lei anticrime. "O artigo que foi invocado para soltura da liderança do PCC não estava no texto original do projeto de lei anticrime e eu, como ministro da Justiça e Segurança Pública, me opus à sua inserção por temer solturas automáticas de presos perigosos por mero decurso de tempo", afirmou. O artigo 316 do CPP, porém, é defendido por outra ala de deputados que participaram da construção do texto no grupo de trabalho. “As críticas são completamente despropositadas. A prisão preventiva precisa ser reavaliada periodicamente porque decretada sobre fatos que se alteram ao longo do processo”, afirma o deputado Fábio Trad (PSD-MS). “Milhares de presos provisórios são esquecidos nos cárceres brasileiros por período de tempo que ultrapassa o razoável. Por isso, o dispositivo impõe a reavaliação fático-jurídica da necessidade da prisão cautelar que, aliás, só deve ser utilizada em casos excepcionais.” O deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), candidato a prefeito em Belo Horizonte, também defende o dispositivo e afirma que prisão preventiva não é condenação e deve ser reavaliada a cada 90 dias. No entanto, ressalta que, entre os elementos para fundamentar a manutenção da prisão está a periculosidade do agente. “Não conheço profundamente o caso do André do Rap, mas em minha opinião não haveria razões para soltá-lo”, disse. Já o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), candidato a prefeito de São Paulo, afirma que a lei não está errada. “Infelizmente, o Brasil é um paraíso para quem tem dinheiro. E toda sorte de injustiça acontece contra os pobres”, disse. “Errada está a execução penal que não funciona para os pobres, quase todos pretos, presos sem julgamento.” Neste domingo, Marco Aurélio defendeu sua decisão de soltar André do Rap. "O juiz não renovou, o MP não cobrou, a polícia não representou para ele renovar, eu não respondo pelo ato alheio, vamos ver quem foi que claudicou", disse o ministro à Folha. Para Marco Aurélio, a decisão do presidente da corte de revogar o habeas corpus concedido ao traficante é "péssima" para o Supremo. O ministro afirma que a ação de Fux "é um horror". "Sob minha ótica ele adentrou o campo da hipocrisia, jogando para turma, dando circo ao público, que quer vísceras. Pelo público nós nem julgaríamos, condenaríamos e estabeleceríamos pena de morte", disse. Reservadamente, ministros avaliam que a corte só saiu perdendo diante das decisões conflitantes de Marco Aurélio e Fux. A maioria dos magistrados discorda do entendimento adotado por Marco Aurélio e aponta preocupação com o nível de periculosidade do réu em questão. Esses integrantes do tribunal, contudo, também consideram ruim o fato de o presidente rever despacho de um dos colegas. Como deu a decisão quando o traficante já havia sido solto, o mais adequado seria remeter o caso ao plenário na sessão seguinte, nem que fosse virtualmente, analisam ministros. Dentro do STF, porém, há divergências sobre a tese levantada por Marco Aurélio. Em maio, por exemplo, Edson Fachin rejeitou o pedido de um caso similar ao de André do Rap. O ministro não decidiu pela soltura do acusado, mas determinou ao juiz de primeiro grau que reanalisasse a prisão preventiva em respeito ao artigo 316 do CPP. Fux também entendeu que não seria o caso de o STF analisar se a renovação da prisão havia sido feita porque o tema não foi analisado pelas instâncias inferiores antes de chegar ao Supremo. Na decisão, o ministro ressalta que a prisão foi decretada em maio de 2014 pela Quinta Vara Federal da Subseção Judiciária de Santos/SP e só foi cumprida cinco anos depois, em setembro de 2019. Ao decidir pela prisão de André do Rap, Fux atendeu a um pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República).
*”Crítico de Marco Aurélio, Fux deu decisão para prender Battisti; ordem vazou e terrorista fugiu para Bolívia”*
*”Criminalistas divergem sobre decisões referentes à soltura de chefe do PCC pelo STF”* - A decisão do ministro Marco Aurélio Mello, do STF (Supremo Tribunal Federal), que permitiu que o traficante André de Oliveira Macedo, 43, conhecido como André do Rap, saísse pela porta da frente da Penitenciária de Presidente Venceslau, no interior paulista, provocou um intenso debate no meio jurídico neste final de semana. O ministro havia considerado, no dia 2 de outubro, que André do Rap estava preso desde o final de 2019 sem uma sentença condenatória definitiva, excedendo o limite de tempo previsto na legislação brasileira. Considerado um dos principais chefes do PCC (Primeiro Comando da Capital), facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios, ele foi condenado a 15 anos, 6 meses e 20 dias de prisão. Seus advogados recorreram da decisão, emitida em 2013, e ainda não há trânsito em julgado. Não menos polêmica foi a decisão do presidente do STF, Luiz Fux, que suspendeu a ordem de Marco Aurélio Mello e determinou o retorno imediato de André do Rap à prisão. A defesa de André do Rap afirmou que ele iria de Presidente Venceslau para Guarujá (SP), mas segundo o Jornal Nacional, da TV Globo, ele foi monitorado por investigadores e seguiu para Maringá (PR), de onde autoridades acreditam que ele fugiu para o Paraguai. O traficante é considerado agora foragido da Justiça. A maioria dos criminalistas ouvidos pela Folha concordaram com a decisão de Marco Aurélio Mello. Mas houve divergências. “Decisão correta do ministro, uma vez que estava caracterizado o excesso de prazo da prisão”, diz Luís Henrique Machado, mestre em direito penal pela Universidade Humboldt de Berlim, na Alemanha. “André do Rap estava preso, sem culpa formada, desde 15 de dezembro de 2019. A lei anticrime é clara. Se a medida não for reavaliada de ofício pela autoridade judicial dentro de 90 dias quando da decretação, a prisão deve ser relaxada.” Marco Aurélio Mello, em entrevista à Folha, disse que cumpriu sua obrigação de aplicar o trecho introduzido no Código de Processo Penal pelo pacote anticrime que prevê a necessidade de o juiz renovar a prisão preventiva a cada 90 dias, o que não ocorreu no caso. "O juiz não renovou, o MP não cobrou, a polícia não representou para ele renovar, eu não respondo pelo ato alheio, vamos ver quem foi que claudicou", disse o ministro. Rogério Taffarello, que é mestre em direito penal pela USP e dirige a área penal de uma das principais bancas de advogados do país, concorda com o argumento de Marco Aurélio. “Cabe às autoridades responsáveis pelo caso cuidar para justificar a manutenção da prisão preventiva dentro desse prazo enquanto não há condenação definitiva. Se isso não ocorreu, a prisão passou a descumprir a lei”, diz Taffarelo. “O papel do juiz que recebe uma petição de habeas corpus é olhar se a lei foi cumprida no caso, ou se não foi. E ele deve julgar de acordo com a lei e não com o nome que conste na capa dos autos, goste-se ou não da pessoa que figure como o investigado ou réu no caso concreto.” O ex-juiz federal do TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) Henrique Herkenhoff tem outra visão e acha que havia motivo para manter o traficante preso. Antes do tribunal, Herkenhoff foi procurador da República e teve atuação destacada no combate à Scuderie Detetive Le Cocq, um grupo de extermínio que atuou entre as décadas de 1960 e 1980 e cometeu uma série de assassinatos no Rio de Janeiro e no Espírito Santo. “É bastante duvidoso que seja necessário reexaminar periodicamente a necessidade da prisão cautelar após a sentença condenatória, sem pedido do paciente [preso]”, diz o ex-juiz. “Se a decisão que determina a prisão está mal justificada, ou não foi proferida a decisão de revisão no prazo (que é impróprio, ou seja, não impede uma decisão tardia), o direito do preso é a uma decisão fundamentada, não à soltura, ainda mais de pessoa notoriamente perigosa, com evidente tendência a se evadir, já condenada em segunda instância, ainda que não transitado em julgado.” Herkenhoff sugere que o correto é fixar um prazo curto para que essa decisão seja proferida ou o próprio julgador suprimir a instância e fazer ele mesmo essa avaliação. A criminalista Dora Cavalcanti, conselheira do IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), diz que a decisão de Marco Aurélio causa uma reflexão. “O ministro encampou corretamente o novo texto do artigo 316 do Código de Processo Penal. Choca porque traz uma novidade marcante, a opção do pacote anticrime de colocar limites às prisões processuais intermináveis”, diz a advogada. “E o relator foi coerente com sua conhecida posição, julgar os processos pelo conteúdo, nunca pela capa. É o melhor que se pode esperar de um integrante da Suprema Corte.” Ao cassar a decisão de Marco Aurélio Mello, Fux aumentou ainda mais a temperatura do debate. Herkenhoff concorda com a decisão do presidente do STF e diz que “o julgador não pode viver em uma torre de marfim, aferrando-se a uma interpretação da lei que não leve em consideração as consequências práticas de suas decisões”. “Na verdade, esse filtro das consequências práticas de uma decisão deve ser feito pelo próprio relator. Como a fuga era quase certa e o preso, de uma periculosidade que, inclusive, ultrapassa a questão individual (não se trata apenas do que, sozinho, pode fazer em liberdade), era o caso de suspensão dos efeitos da decisão”, diz Herkenhoff. O juiz aposentado do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), Jorge Antônio Maurique, também disse que é sim possível que o presidente do STF decida dessa maneira, cassando a decisão do colega. “A decisão de Fux é de alguém preocupado com uma eventual crise de credibilidade do Poder Judiciário. Como autoridade máxima do Poder Judiciário brasileiro penso que é bem procedente a sua preocupação nesse sentido e desta forma que agiu”, diz Maurique. “Acredito que haverá de convocar uma reflexão do Poder Judiciário e também do Ministério Público sobre o tema e poderão ser criados, via CNJ [Conselho Nacional de Justiça] e CNMP [Conselho Nacional do Ministério Público], instrumentos e caminhos para isso.” Já o advogado Luís Henrique Machado considera que Fux decidiu de maneira equivocada. “Não concordo [com a decisão]. O presidente do Supremo não pode ter poder revisional sobres as decisões dos relatores nas respectivas turmas. Quem detém o poder de cassar a decisão do relator é o órgão colegiado”, diz Machado. “Concorde ou não com decisão do ministro Marco Aurélio, ela deveria ser cumprida. Decisão monocrática revogando liminar concedida por outro ministro, nessas circunstâncias, só fomenta a insegurança jurídica e desacredita o tribunal.” Rogério Taffarello diz que a lei 8437, usada por Fux para cassar a decisão de Marco Aurélio Mello só se aplica em casos relativos ao poder público. "É duvidosa a aplicação da lei à hipótese. Essa lei visa a proteger interesses diretos da Administração, como o patrimônio público, contra medidas liminares em ‘ações movidas contra o poder público’, tipicamente de direito administrativo", diz Taffarello. "Nao é esse o caso, pois se trata de matéria regida pelo código de processo penal. O que se discute é a legalidade da prisão preventiva decretada contra um indivíduo." O advogado Marco Aurélio de Carvalho diz que o presidente do STF jogou para a plateia. “Recebemos com surpresa e perplexidade a medida tomada pelo ministro Luiz Fux”, diz Carvalho. “Aumenta ainda mais a insegurança e o ativismo judicial que tanto combatemos. Típica ‘jogada’ para a plateia, o que incensa ainda mais as hordas ávidas por justiçamentos.”
THIAGO AMPARO - *”Por que Salles é perigoso”* ANÁLISE - *”Chefe do PCC pegou carona nos vícios e nas ironias do poder”* *”Quem é André do Rap, chefe do PCC que está foragido após decisão do STF”* *”Sem fiéis em missas, Aparecida celebra dia da padroeira com eventos virtuais”* *”Muito além de Aparecida, Nossas Senhoras acudiram de Lampião a Gonzagão”*
*”Prefeito aliado de Bolsonaro atua para flexibilizar legislação ambiental em Angra dos Reis”* MÔNICA BERGAMO - *”SP já arrecadou R$ 130 milhões para construir fábrica de vacinas para Covid-19”*
MÔNICA BERGAMO - *”Fim do auxílio emergencial pode levar economia paulista a instabilidade, alerta Meirelles”*: O secretário da Fazenda de São Paulo, Henrique Meirelles, alertou a equipe do governo de João Doria (PSDB-SP) que os números de recuperação da economia no estado, que voltaram aos níveis pré-pandemia, ainda estão sujeitos a chuvas, trovoadas e muita instabilidade. Ele mostrou que, graças ao auxílio emergencial pago pelo governo federal, as pessoas estão desempregadas, mas com renda, o que turbina o consumo e ajuda a economia a girar. Com o fim do auxílio, sobrarão apenas os desempregados —sem mais dinheiro para gastar.É neste contexto que a eficácia de uma vacina contra o novo coronavírus se tornaria essencial, segundo debate interno no governo. Só ela permitiria o controle da epidemia de Covid-19, e então uma retomada mais consistente da economia. Uma reportagem da Folha mostrou, na sexta, que o fim do auxílio emergencial, em dezembro, fará o número de pessoas consideradas pobres no Brasil saltar de 50,1 milhões para 66,2 milhões.
MÔNICA BERGAMO - *”Arthur do Val promete fim do rodízio e acabar com táxis em SP”* MÔNICA BERGAMO - *”STJ julga recurso de MC Leozinho contra SBT por hit 'Ela Só Pensa em Beijar'”* MÔNICA BERGAMO - *”Conselho regional de enfermagem critica abordagem da categoria na série 'Sob Pressão'”* MÔNICA BERGAMO - *”Prêmio terá categoria exclusiva para instrumentistas da Orquestra Jovem do Estado de SP”* MÔNICA BERGAMO - *”Ato no Theatro Municipal de SP prestará homenagem a vítimas de abusos policiais”*
CAPA – Manchete principal: *”Onda de calor leva prejuízos bilionários à economia”*
*”Verba concentrada – Partidos privilegiam candidatos com mandato e caciques locais”* *”Marco Aurélio critica Fux, e Maia defende lei”* *”Sem máscara, Bolsonaro fala com apoiadores e anda de jet ski em SP”*
*”Clima extremo – Ondas de calor derretem também a economia brasileira, alerta cientista”* *”Luta contra racismo avança lentamente na América Latina”* *”A saga dos manguezais – Especialistas temem ameaças a ecossistema costeiro fluminense”*
*”Dólar acima de R$ 5 – Câmbio beneficia exportadoras, mas dificulta planos de longo prazo”*
CAPA – Manchete principal: *”Número de calotes de pessoas e empresas cai na pandemia”*
EDITORIAL DO ESTADÃO - *”Fica para depois”*: É impressionante a capacidade do governo de Jair Bolsonaro de procrastinar decisões, das banais às mais urgentes. Nem se pode dizer que isso acontece porque o governo não tem rumo; ao contrário, os seguidos adiamentos seguem a lógica de uma administração que tem um único rumo: o da satisfação das condições para a reeleição do presidente Bolsonaro. Bolsonaro foi eleito com a promessa solene de revolucionar o Estado brasileiro, promovendo toda sorte de reformas e de planos de reorganização. O objetivo, segundo garantiu na campanha, era entregar ao País um Estado que estivesse a serviço dos contribuintes, e não se servindo destes. Era evidente, para quem tivesse um mínimo de informação, que Bolsonaro não tinha como entregar o que prometera, não em razão das circunstâncias, mas porque, em toda a sua trajetória política, sempre defendeu exatamente o contrário. Corporativista e estatólatra, o deputado do baixo clero notabilizou-se por votar contra todas as medidas necessárias para destravar o Estado e melhorar a qualidade das contas públicas. Alinhando-se ao PT, Bolsonaro rejeitou o Plano Real, sabotou projetos que restringiam privilégios de servidores e trabalhou contra a quebra do monopólio da Petrobrás sobre o petróleo e da União sobre os serviços de telecomunicações. Suas digitais estão também na oposição feroz às reformas da Previdência e administrativa. Foi essa coerência programática que garantiu a Bolsonaro sete mandatos como deputado e um eleitorado cativo. Como candidato à Presidência, contudo, viu-se obrigado a vestir a fantasia do liberal que nunca foi e a anunciar que, se eleito, faria as reformas que sempre desprezou. É esse o presidente que encomendou a seu Ministério da Economia a fórmula mágica da criação de um programa de transferência de renda sem, contudo, promover cortes de nenhuma espécie. Bolsonaro quer o melhor dos dois mundos: ganhar uma nova clientela eleitoral na base do populismo desbragado sem perder o apoio dos privilegiados do serviço público nem se indispor com empresários habituados a subsídios e incentivos. O ministro Paulo Guedes que se vire. Como a aritmética não aceita desaforo, Bolsonaro foi alertado de que a conta não fecha e que serão necessários cortes dolorosos para viabilizar o tal programa que ele tanto almeja. Dado que o presidente não admite nenhuma solução que possa ameaçar seu capital eleitoral, a saída tem sido adiar o anúncio oficial do programa e, o mais importante, de suas fontes de financiamento. Agora, a desculpa são as eleições. Segundo os operadores governistas, os parlamentares estarão engajados na campanha municipal e serão naturalmente refratários a discutir medidas de austeridade, impopulares por definição. Disso se depreende que as eleições são um imperativo mais relevante do que a emergência social que sobrevirá com o fim do auxílio emergencial. Os pobres que esperem, pois os governistas não querem atrapalhar a campanha dos aliados. Tem sido assim desde que Bolsonaro assumiu. O contraste entre a grandiloquência das juras de palanque e a ineficiência de seu governo é gritante. O ministro da Economia, Paulo Guedes, notabilizou-se por anunciar planos magníficos para “a semana que vem”, que teimosamente nunca chega. E nem se diga que essa frustração se dá pelo mau desempenho de ministros e assessores de Bolsonaro, pois vários deles fazem o que podem e trabalham duro. O problema, está claro desde sempre, é o presidente, cujo horizonte é estreito demais para quem precisa governar um País, e não o cercadinho do Alvorada. Se estivesse realmente interessado em ajudar os pobres e em entregar ao sucessor um País melhor do que recebeu, Bolsonaro já teria organizado uma base parlamentar sólida para aproveitar a disposição reformista demonstrada pelo Congresso e articularia a aprovação tanto de projetos de longo prazo, como as reformas administrativa e tributária, como medidas emergenciais para o atendimento dos milhões de brasileiros destituídos de quase tudo na pandemia. Mas aí não seria Bolsonaro.
*”USP lança ‘guia verde’ para ciência pautar candidatos”* - Pesquisadores criaram um guia prático para partidos e candidatos pautarem seus planos de governo pela ciência. Ele conta com 193 itens sobre as principais necessidades das cidades brasileiras e foi desenvolvido pelo Centro de Síntese- Cidades Globais e pelo Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), com base nos objetivos do desenvolvimento sustentável das Nações Unidas para 2030, articulando-se com uma retomada verde da economia brasileira após a pandemia de covid-19. “Nossa ideia é que essa agenda seja absolutamente suprapartidária e seja usada tanto por candidatos como pela população. Construímos itens gerais, que dão orientação para onde ir”, afirmou o professor Marcos Buckeridge, um dos coordenadores do trabalho. Cerca de 45% dos itens da agenda abordam temas das áreas de Educação (34 itens), Saneamento (30 itens) e Saúde (25 itens). As metas sobre mudanças climáticas são 18 dos itens e outras 17 são relacionadas diretamente com o meio ambiente. Todas as áreas estão inter-relacionadas com as demais, privilegiando a transversalidade dos temas. A agenda elaborada por USP Cidades Globais se junta a duas outras publicadas neste ano por entidades da sociedade civil que também defendem que a retomada no pós-pandemia seja feita em bases sustentáveis: a da Rede Nossa São Paulo/fundação Tide Setúbal e a do grupo C40, uma articulação internacional de grandes cidades – liderada pelo ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg – para promover políticas de combate às mudanças climáticas. Em comum, todas as propostas aliam o desenvolvimento sustentável ao combate à desigualdade no pós-pandemia. Os autores do novo guia acreditam que unir o combate às mudanças climáticas com a redução das desigualdades na cidade é uma forma de se obter uma cidade mais saudável. “Todos têm a ganhar com uma cidade mais saudável. O ar poluído se respira nos Jardins e na periferia”, disse Buckeridge. Os pesquisadores agora vão trabalhar para relacionar ao guia os textos de 1,45 mil teses acadêmicas que tratam de políticas urbanas. “Nosso objetivo é que o gestor tenha à sua disposição os itens relacionados ao desenvolvimento sustentável e a indicação do que foi produzido como ciência a esse respeito.” Muitas das ações do guia envolvem sugestões para o direcionamento de compras governamentais, como privilegiar as pequenas e médias empresas e a agricultura familiar. “Pensamos em um modelo de desenvolvimento como o alemão, de um capitalismo sustentável, que tem uma quantidade enorme de pequenas empresas.” O guia traz ainda, como pontos principais, a criação de oportunidades para mulheres, negros e LGBTS e de hortas comunitárias para populações vulneráveis a fim de combater a desigualdade nas cidades bem como indica a substituição da frota de ônibus e de caminhões movidos a combustível fóssil das prefeituras por veículos que usem energia limpa e até o uso da telemedicina para ampliar o acesso da população à saúde. Negacionismo. Ao relacionar as políticas públicas aos critérios de ciência, além da equidade, o guia da USP reforça uma tendência observada por cientistas políticos nesta eleição que é o surgimento de uma nova polarização na política: a divisão entre os que se sujeitam à ciência e seus conhecimentos e os que tem uma atitude negacionista em relação ao conhecimento, algo acentuado com a pandemia de covid-19. “A pandemia é o primeiro evento que recupera a política como forma de resolver os problemas da comunidade”, disse o cientista político José Álvaro Moisés. Para ele, essa recuperação mostrou a importância da saúde pública e do combate à desigualdade. Moisés ainda julga ser notável o fato de que esse debate venha da sociedade civil e não dos partidos. “Uma multiplicidade de organizações que está operando temas como o desenvolvimento sustentável.” Abandono. O papel dos partidos no debate é criticado pelo vereador paulistano Gilberto Natalini (sem partido). “Ninguém está falando da agenda verde como devia.” Após cinco mandatos consecutivos, ele decidiu não concorrer neste ano e romper com seu partido, o PV. “Aprovamos em 2009 a Lei de Mudanças do Clima, mas quase nada saiu do papel. Há um abandono da agenda sustentável.” Em um dos seus últimos atos na Câmara, Natalini vai fazer uma audiência pública para discutir o guia da USP. “É necessário ter uma cidade sobretudo mais viável.”
*”Eleição expõe polarização nas igrejas”* - Coletivos de cristãos e evangélicos criados em reação à eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, lançaram dezenas de candidatos por partidos de esquerda e centro-esquerda no pleito deste ano. O objetivo, segundo eles, é disputar com a direita os votos desse segmento que representa quase um terço do eleitorado, levando a polarização política para dentro das igrejas, território onde o bolsonarismo exerce hegemonia. A movimentação já provoca reação de grandes denominações, como a Igreja Universal do Reino de Deus, que tenta frear a atuação desses novos grupos. Criado em 2018 como resposta à atuação do bolsonarismo dentro das igrejas, o Cristãos Contra o Fascismo vem se preparando para disputar a primeira eleição neste ano. Serão 42 candidaturas a vereador, algumas delas coletivas, e três a prefeito em todo o Brasil por sete partidos diferentes: PT, PDT, PSOL, PCDOB, Cidadania, Rede e UP. Os candidatos têm origem em igrejas como Assembleia de Deus, Presbiteriana, Batista e Católica. “Estava havendo uma perseguição dentro das igrejas em função das escolhas políticas e assuntos envolvendo LGBTS, negros e pobres”, disse Diana Brasilis, candidata a vereadora em São Paulo pelo PDT e integrante do grupo, que já reúne mais de 40 mil pessoas. O Cristãos Contra o Fascismo é apenas um dos vários coletivos de religiosos, na maior parte evangélicos, surgidos nos últimos anos como espaço para expressão política de fiéis que discordam da linha ideológica conservadora de direita predominante nas principais denominações. Movimento pela Bancada Evangélica Popular, Frente Evangélica pelo Estado de Direito, Evangélicas pela Igualdade de Gênero, Evangélicos pela Diversidade e outros registraram candidatos neste ano e vão disputar os votos no segmento que, segundo pesquisas, foi determinante para a vitória de Bolsonaro em 2018. As iniciativas se somam aos esforços dos partidos de esquerda para aumentar o diálogo e voltar a disputar essa parcela do eleitorado. O PT, PSOL, PCDOB, PDT, PSB e Rede adotaram ações voltadas a este segmento. “Sempre tivemos bom diálogo, inclusive no governo Lula. Em 2014 Dilma (Rousseff) e Aécio (Neves, do PSDB) dividiram este eleitorado meio a meio. Só não tivemos sucesso em 2018, quando o Bolsonaro teve 70% entre os evangélicos e o Fernando Haddad, 30%. Desde então a gente vem tentando organizar esse diálogo”, disse Geter Borges, da coordenação nacional do Núcleo Evangélico do PT. Segundo ele, o partido terá 2.033 candidatos a vereador, 66 a prefeito e 68 a vice que se declaram evangélicos. É a primeira vez que o partido faz esse recorte, o que mostra maior atenção a este segmento. Mas, para Borges, a principal mudança vem dos próprios evangélicos: “Existe uma reação e vários agrupamentos estão surgindo”. ‘Alternativa’. O Movimento pela Bancada Evangélica Popular, por exemplo, deve lançar dez candidatos a vereador, quatro deles em São Paulo. “A gente está tentando oferecer uma alternativa de fé para o público evangélico e isso está atraindo muita gente. Até porque é na periferia, onde tem mais evangélicos, que há mais opressão”, disse Samuel Oliveira, candidato a vereador em São Paulo pelo PCDOB. Segundo ele, as igrejas tradicionais já detectaram a movimentação e estão reagindo. Na edição do dia 27 de setembro, a Folha Universal, jornal da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), publicou uma chamada na primeira página sobre grupos que propagam “a divisão entre evangélicos” e explicando porque a iniciativa é “questionável”. No programa “Entrelinhas”, veiculado no streaming da Iurd, o pastor Renato Cardoso dedicou 30 minutos a listar os motivos pelos quais evangélicos não podem ser de esquerda. Um dos argumentos é que, segundo ele, o evangelho sempre associa a palavra esquerda ao “mal”, embora os conceitos de esquerda e direita tenham surgido apenas na Revolução Francesa, muitos séculos depois da crucificação de Jesus Cristo. “Silas Malafaia, Edir Macedo e outros tinham um discurso hegemônico, sempre falando em nome de todos os evangélicos, e estão reagindo depois que a gente se levantou”, disse o pastor José Barbosa Júnior, da Comunidade Cristã da Lapa, no Rio. O surgimento de coletivos e candidaturas evangélicas de esquerda, diz ele, é um sintoma de que a polarização política também chegou aos templos religiosos. ‘Desigrejados’. Segundo o teólogo, muitos fiéis são forçados a sair das igrejas por discordância política com os pastores e acabam criando pequenos núcleos paraeclesiásticos. Diana Brasilis, do PDT, chama estes fiéis de “desigrejados”. Barbosa aponta ainda a dificuldade da esquerda para entender e dialogar com este segmento. “Como os evangélicos que têm mídia são os conservadores, a esquerda os rechaçou e entregou de bandeja para a direita”, acrescentou. Essa dificuldade foi detectada pela Fundação Perseu Abramo, do PT, na pesquisa Percepções e Valores Políticos nas Periferias de São Paulo, revelada pelo Estadão em 2017. O estudo mostrava que a base evangélica é menos conservadora do que se imaginava, principalmente em comparação com o discurso dos pastores, e que as igrejas ocuparam o vácuo deixado pelos partidos de esquerda na periferia a partir da chegada de legendas como o PT ao poder. “O diálogo com os evangélicos tem que ser menos pragmático e mais afetivo. O voto é consequência desse relacionamento, porque do outro lado tem o pastor que pergunta toda semana à senhorinha evangélica de coque no cabelo se está faltando alguma coisa na geladeira. Quem ela vai obedecer?”, questionou Vinícius Lima, evangélico, candidato a vereador em São Paulo pela Rede.
*”Reverenda trans tenta vaga na Câmara pelo PSOL”* - Primeira reverenda transsexual da América Latina, Alexya Salvador será candidata a vereadora em São Paulo pelo PSOL. Segundo ela, a esquerda errou ao tratar as igrejas evangélicas como “inimigas”. “A esquerda errou quando não quis dialogar. Agora, começa a repensar. Entendemos que Jesus, enquanto um homem político do seu tempo, lutou contra a opressão”, disse Alexya ao Estadão. Em sua participação nas redes sociais, a reverenda defende as causas de gênero. Em seu material de propaganda aparecem as cores da bandeira do movimento transgênero: azul, rosa e branco. Alexya frequenta a Igreja da Comunidade Metropolitana (ICM), uma denominação internacional fundada em 1968 nos Estados Unidos com a intenção de ser aberta à comunidade LGBT, seus familiares e amigos. Na eleição passada, Alexya se candidatou ao cargo de deputada estadual, também pelo PSOL. Conseguiu 10.486 votos.
*”Prefeitos candidatos à reeleição lideram na maioria das capitais”* - Faltando pouco mais de um mês para a eleição, pesquisas mostram um cenário favorável a prefeitos que tentam mais um mandato e complicado para quem busca fazer um sucessor. Desde 2 de outubro, o Ibope divulgou pesquisas em 15 capitais. Das nove em que há reeleição, seis prefeitos aparecem isolados na liderança. Nos outros seis municípios pesquisados, só Salvador aparece com vantagem para o sucessor do atual chefe do Executivo. O prefeito com maior vantagem é Alexandre Kalil (PSD), que teve 58% das intenções de voto em pesquisa do Ibope divulgada em 2 de outubro. O candidato numericamente mais próximo é o deputado estadual João Vítor Xavier (Cidadania), com 4%. Considerando a margem de erro de 3 pontos porcentuais, a vantagem de Kalil é de pelo menos 48 pontos. Kalil já disse que não pretende ir às ruas para pedir voto e faltou ao primeiro debate na TV aberta. A estratégia também foi adotada pelo prefeito de Curitiba, Rafael Greca (DEM), que lidera a disputa com 47% das intenções de votos, segundo pesquisa do dia 6, e faltou ao debate alegando falta de segurança sanitária. A distância é de, pelo menos, 33 pontos porcentuais para os demais. Numericamente, ele é seguido por Fernando Francischini (PSL), com 6%, e Goura Nataraj (PDT), com 5%, que estão empatados tecnicamente com outros candidatos. Com controle sobre a máquina municipal, prefeitos que concorrem à reeleição costumam ter mais facilidade para construir alianças com outros partidos, o que se reverte em mais tempo na propaganda de rádio e TV. Candidatos à recondução aparecem também na liderança em Florianópolis, Natal, Palmas e Aracaju. Em São Paulo, a pesquisa Ibope/estadão/tv Globo mostra Bruno Covas (PSDB) numericamente em segundo lugar, com 21% das intenções de voto. O levantamento, divulgado em 2 de outubro, revela um empate técnico com o primeiro colocado, Celso Russomanno (Republicanos), que tem 26% – a margem de erro é de três pontos para mais ou para menos. No Rio de Janeiro, o atual prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) tenta reverter a rejeição de 57% para melhorar sua colocação nas pesquisas. Alvo de investigação, que chegou a apreender seu celular, e de uma decisão judicial que o considerou inelegível, Crivella aparece com 12%, atrás de Eduardo Paes (DEM), com 27%. Alvo de um processo de impeachment em Porto Alegre, acusado de usar dinheiro da Saúde em campanhas publicitárias, Nelson Marchezan Jr. (PSDB) tem 9% das intenções de voto, contra 24% da primeira colocada, Manuela D’ávila (PCDOB). Sucessão. Nas cidades em que disputa é pela sucessão, candidatos apoiados pelos atuais prefeitos estão em situação de empate técnico em três e aparecem atrás das pesquisas Ibope em outras duas. A situação mais confortável é a do vice-prefeito de Salvador, Bruno Reis (DEM). Ele lidera as pesquisa com 42% das intenções de voto, contra 10% do Pastor Sargento Isidório (Avante), numericamente em segundo. No Recife, João Campos (PSB), com apoio do prefeito Geraldo Júlio (PSB), aparece com 23% das intenções de voto, enquanto Mendonça Filho (DEM) tem 19%. Como a margem de erro é de 3 pontos porcentuais, para mais ou para menos, os dois estão tecnicamente empatados. Em Goiânia, Maguito Vilela (MDB), apoiado pelo atual prefeito Iris Rezende (MDB), está empatado tecnicamente com o senador Vanderlan Cardoso (PSD): 20% a 21% das intenções de voto. Em Maceió, o candidato da situação, Alfredo Gaspar de Mendonça (MDB) tem 26%, enquanto JHC (PSB) tem 25%.
*”Deputados criticam ida de Abin a evento”* - Integrantes do Congresso Nacional se movimentam para questionar o governo Jair Bolsonaro sobre o envio de agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) à Conferência do Clima das Nações Unidas (COP-25) em dezembro do ano passado – revelado ontem pelo Estadão. Deputados criticam o Executivo por ter monitorado organizações não governamentais (ONGS), integrantes da comitiva brasileira e de delegações estrangeiras. O assunto deve ser discutido pela Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência, formada por deputados e senadores. O colegiado foi o mesmo que recentemente ouviu o ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, sobre um relatório de inteligência produzido pela pasta envolvendo 579 servidores públicos que integravam grupos “antifascistas”. Desta vez, o governo poderá ser cobrado pela comissão para enviar documentos relativos à atuação dos agentes da Abin no evento climático, realizado em Madri, na Espanha. “Já convivi com vários governos, nunca vi algo parecido. É uma ameaça às instituições e à democracia”, disse o deputado José Guimarães (PT-CE), integrante da Comissão de Inteligência do Congresso. Ele vai pedir ao presidente do colegiado, senador Nelsinho Trad (PSDMS), que acione os parlamentares para discutir o assunto. Conforme mostrou a reportagem, a presença da agência no evento é incomum e evidencia a postura conflituosa do governo Bolsonaro com organismos internacionais ligados ao meio ambiente. O Estadão consultou as listas oficiais das edições da COP de 2013 a 2018. Em nenhuma delas aparecem nomes de representantes do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) ou da Abin. Além disso, fontes acostumadas a participar de edições do evento disseram ser a primeira vez. A comissão do Congresso pode solicitar, por exemplo, relatórios produzidos pela Abin no encontro e questionar o governo sobre a motivação para o monitoramento. “Você pode divergir, mas não pode sair bisbilhotando. Com que objetivo fazer esse tipo de ação completamente ilegal do ponto de vista das regras democráticas?”, questionou Guimarães. Nas redes sociais, outros integrantes do Congresso também criticaram a atuação do governo na COP-25. “O governo brasileiro não só comete e estimula crimes contra o meio ambiente, como busca meios de sabotar o ambientalismo internacional”, escreveu o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) no Twitter. Ex-ministro do Meio Ambiente, o geógrafo e professor Carlos Minc classificou o envio dos agentes como “arapongagem no clima” em mensagem na mesma rede social. “Para Bolsonero mudança do clima é conspiração! Queimadas são churrasco e boi é bombeiro!”, afirmou Minc, comparando o presidente a Nero, imperador romano que assistiu ao incêndio de Roma sem fazer nada. O Estadão tenta desde quarta-feira ouvir a Abin e o GSI sobre o que motivou a presença de quatro agentes secretos no evento, quais as atividades que eles desenvolveram, os relatórios que produziram e qual o cargo deles no governo, mas ainda não obteve resposta. A ONU também não se manifestou.
*”Sem máscara, Bolsonaro passeia com a filha pela praia do Guarujá”*
*”Ministro do ASTF libera campanha de prefeito condenado”* - O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Napoleão Nunes Maia Filho deferiu um pedido de tutela provisória autorizando o prefeito de Duque de Caxias, Washington de Oliveira Reis (MDB), a disputar as eleições municipais deste ano. A decisão foi dada após recurso contra sentença do Tribunal de Justiça do Rio que condenou Reis, em 2018, por improbidade administrativa, em razão de dano aos cofres públicos e enriquecimento ilícito. Napoleão atribuiu efeito suspensivo ao recurso, o que afasta a inelegibilidade do prefeito até o julgamento final do caso pelo STJ. O ministro apontou que a decisão visava evitar “eventual perecimento de direito” do prefeito, “tendo em vista a fatalidade dos prazos do processo eleitoral, do qual Washington deseja legitimamente participar”. Segundo o acórdão do TJ fluminense, Washington de Oliveira firmou contrato milionário para a construção de uma praça em Duque de Caxias às vésperas do fim do mandato de prefeito, em 2008. Posteriormente, verificou-se que apenas 6,75% das obras foram efetivamente realizadas. A decisão de segunda instância condenou o prefeito à perda do cargo, suspensão dos direitos políticos por cinco anos e devolução de cerca de R$ 1 milhão aos cofres públicos, mais pagamento de multa civil equivalente ao dobro do valor do ressarcimento. Ao STJ, Reis alegou que a condenação o impede de concorrer nas eleições de 2020, devido às imposições da Lei da Ficha Limpa – segundo a qual, ficam inelegíveis condenados “em órgão judicial colegiado”, como o TJ do Rio. Nunes Maia, relator, considerou plausível a tese de que o prefeito não poderia responder por irregularidades praticadas por terceiros. Ele mencionou que, de acordo com a defesa, a participação do prefeito limitou-se à assinatura do contrato. “Realmente, a responsabilidade dos gestores públicos por atos praticados pelos agentes que atuam nas repartições subordinadas, especialmente quando há secretarias, comissões permanentes de licitação e outros setores administrativos, é tema que causa preocupação aos julgadores, uma vez que a improbidade administrativa demanda identificação de responsabilidade pessoal, ou seja, estritamente subjetiva, decorrente só e somente só de conduta própria personalíssima do agente”, afirmou. O ministro destacou ainda que o fato de exercer o cargo de prefeito não o torna “responsável por todo e qualquer ato infracional que eventualmente ocorra no âmbito interno da administração.” Em nota, Washington Reis afirmou que confia “plenamente na justiça de Deus e dos homens”.
*”Ataques a Marques quebram silêncio no bolsonarismo”* - A indicação do desembargador Kassio Nunes Marques para o Supremo Tribunal Federal (STF) causou insatisfação, segundo mensagens publicadas em grupos bolsonaristas do Whatsapp, e quebrou o silêncio habitual diante das polêmicas envolvendo o presidente Jair Bolsonaro. A conclusão é do pesquisador David Nemer, da Universidade da Virgínia, nos EUA, que monitora a atuação de bolsonaristas no aplicativo de troca de mensagens desde 2017. Segundo Nemer, foi possível identificar uma série de críticas nos grupos, principalmente após a publicação de notícias sobre inconsistências no currículo de Marques. O pesquisador notou que foram compartilhadas, nos últimos dias, notícias sobre suspeitas de cursos não realizados por Marques e sobre a dissertação de mestrado que tem trechos idênticos a passagens de artigos de outro advogado. Como o Estadão mostrou, a Universidade de La Coruña, na Espanha, negou a existência de um “Postgrado en Contratación Pública”, informado pelo magistrado em seu currículo entregue ao Tribunal Regional Federal da 1ª. Região (TRF-1), onde atua desde 2011. Em resposta, o desembargador disse que houve um erro de tradução na hora de montar o currículo. Além disso, cerca de 13% da dissertação que Marques entregou à Universidade Autónoma de Lisboa, em Portugal, é igual a trechos de artigos publicados, antes, pelo advogado Saul Tourinho Leal, sem qualquer referência. Tanto Marques quanto Leal negam o plágio e alegam que, embora haja “coincidências” entre os textos, as conclusões são diferentes. De acordo com Nemer, o link de um site que citou reportagem do Estadão sobre o currículo circulou em pelo menos 12 grupos. Também houve reproduções de um texto intitulado “País de falsários? Kassio Nunes mentiu sobre curso e plagiou dissertação”, publicado por um site conservador. Além disso, um texto do site bolsonarista Brasil Sem Medo exibia um questionamento: “como pode alguém que conseguiu o doutorado há apenas 10 dias já ter no currículo dois pós-doutorados?”. “Em um espaço em que Bolsonaro é intocável, o presidente começa a receber críticas como antes não se via. Isso abre espaço para que ele possa ser ainda mais questionado. Uma vez que você se acostuma a um posicionamento crítico, ele pode voltar mais forte na próxima vez. Antes eles ficavam em silêncio”, afirmou o pesquisador. Em um grupo denominado “Bolsonaro Eleito”, um integrante chamou a escolha de Marques de “o pior erro de Bolsonaro”. No mesmo grupo, outra postagem dizia que um site que o autor da mensagem considera “progressista” (Diário do Centro do Mundo) estava defendendo Marques e que isso era “preocupante”. Os apoiadores, no entanto, afirmaram em diversas postagens que o presidente mostrou ter razão em outros momentos em que foi questionado. Os exemplos foram a indicação de Augusto Aras para a Procuradoria-geral da República, em setembro do ano passado, e a saída de Sérgio Moro do Ministério da Justiça, em abril. Também alegaram que Bolsonaro não poderia indicar um conservador radical, pois o Senado não aprovaria. Desde 1894, os senadores aprovaram todos os indicados para o Supremo. Um vídeo do Youtube, checado pela reportagem, denota a preocupação dos bolsonaristas com o estrago em potencial da polêmica do currículo. “Sabe essas pessoas que estão falando que a escolha do presidente foi equivocada, que estão decepcionadas? São tantas falácias e mentiras que saem na imprensa que acabam realmente interferindo. O Kassio Nunes acabou de explicar mais uma mentira que foi contada contra ele, que ele mentiu em seu currículo”, diz o autor do vídeo. Questionamentos. Antes mesmo da polêmica do currículo, porém, já havia questionamentos a Marques, por parte de bolsonaristas que esperavam um ministro “terrivelmente evangélico” no STF, ou simplesmente conservador. Outra parte se incomodou com notícias sobre ligações de Marques com o centrão e com a esquerda. Segundo Nemer, foram os evangélicos e os blogueiros da ala mais radical bolsonarista que impulsionaram as críticas a Marques. O professor havia feito um levantamento em 75 grupos no dia 5, três dias após Bolsonaro indicar Marques ao STF. Ele identificou 132 mensagens críticas à escolha – como a de que Nunes seria esquerdista, teria votado contra a extradição de Cesare Battisti e liberou a compra de lagostas para os eventos de ministros da corte. Outras 151 criticavam a escolha por não ser Nunes “terrivelmente evangélico”. Nemer identificou até mensagens de integrantes que demonstram mais simpatia a Sérgio Moro, ex-ministro da Justiça, do que ao nome indicado por Bolsonaro ao STF. “Pelo menos não é comunista”, disse um usuário.
*”Trump se declara imune à covid e tenta na Florida reverter ascensão de Biden”*
*”Ultradireita exporta teses conspiratórias”* - No início da pandemia, quando milhares de soldados americanos começaram as manobras da Otan na Alemanha, Atila Hildmann fez uma pesquisa no Youtube para ver do que se tratava. Rapidamente encontrou vídeos postados por seguidores alemães do Qanon. Na narrativa do Qanon, este não foi um exercício da Otan. Foi uma operação secreta do presidente Donald Trump para libertar a Alemanha do governo da chanceler Angela Merkel – algo que eles aplaudiram. “O movimento Qanon disse que essas são as tropas que vão libertar o povo alemão de Merkel”, disse Hildmann, uma celebridade de culinária vegana que não tinha ouvido falar do Qanon. “Espero muito que o Qanon seja real.” Nos EUA, o Qanon já evoluiu de uma subcultura marginal da internet para um movimento de massa popular. Mas a pandemia está alimentando as teorias da conspiração para além das costas americanas, e o Qanon está se espalhando como metástase também na Europa. Grupos surgiram da Holanda aos Bálcãs. Na Grã-bretanha, protestos fazendo referência ao Qanon sob a bandeira de “Salvem nossas crianças” ocorreram já em mais de 20 cidades e vilarejos, atraindo um grupo demográfico mais feminino e menos de direita. Mas é na Alemanha que o Qanon parece ter feito as incursões mais profundas. Com o que é considerado o maior número de seguidores – cerca de 200 mil – no mundo que não fala inglês, ele rapidamente tem conquistado audiência no Youtube, Facebook e no aplicativo de mensagens Telegram. “Os influenciadores e grupos de extrema direita foram os primeiros a impulsionar agressivamente o Qanon”, diz Josef Holnburger, cientista de dados que acompanha o Qanon na Alemanha. As autoridades estão perplexas porque uma teoria da conspiração aparentemente maluca a respeito de Trump lutando contra um “Estado Profundo” de satanistas e pedófilos ressoou na Alemanha. Questionado a respeito dos perigos do Qanon, o serviço federal de inteligência doméstica alemão respondeu com uma declaração dizendo que “tais teorias de conspiração podem se transformar em um perigo quando a violência antissemita ou violência contra funcionários políticos é legitimada com uma ameaça do ‘Estado Profundo’.” A mitologia e a linguagem que o Qanon usa – de alegações de assassinato de crianças para rituais a fantasias de vingança contra as elites liberais – evocam antigos tropos antissemitas e fantasias de golpe que há muito tempo animam a extrema direita alemã. Esses grupos estão tentando aproveitar a popularidade viral da teoria para atingir um público mais amplo. O Qanon está atraindo uma combinação ideologicamente incoerente de oponentes da vacina, teóricos marginais e cidadãos comuns que dizem que a ameaça da pandemia é exagerada e as restrições do governo injustificadas. Até alguns meses atrás, Hildmann era popularmente conhecido apenas por seu restaurante e livros de culinária e como convidado em programas de culinária na televisão. Mas com 80 mil seguidores no Telegram, ele se tornou um dos amplificadores mais importantes do Qanon na Alemanha. A teoria da conspiração Qanon surgiu nos EUA em 2017, quando um usuário com pseudônimo afirmou ter acesso ao nível mais alto de acesso a informações confidenciais dos EUA – o Q – começou a enviar mensagens criptografadas no fórum de mensagens 4Chan. Para historiadores e especialistas em extremismo de extrema direita, o Qanon é um fenômeno muito novo e muito antigo. A ideia de uma elite sugadora de sangue e sem raízes que abusa e até come crianças é uma reminiscência da propaganda medieval sobre judeus bebendo o sangue de bebês cristãos, disse Miro Dittrich, um especialista em extremismo de extrema direita da Fundação Amadeu Antonio, com sede em Berlim. “É a versão do século 21 do libelo de sangue”, disse Dittrich. “A ideia de uma conspiração global das elites é profundamente antissemita. ‘Globalistas’ é um código para judeus.”
*”Cuidados para evitar covid-19 levam à queda de outras doenças respiratórias”* *”Ministro que soltou líder do PCC ataca Fux”*
*”Apesar da crise causada pela pandemia, inadimplência registra queda no País”* - A crise econômica provocada pela covid-19 no País elevou o desemprego a níveis recordes e provocou o fechamento de um sem-número de empresas. Mas, ao contrário do que se poderia esperar, os níveis de inadimplência, sejam de pessoas físicas ou jurídicas, recuaram. Segundo especialistas, esse quadro surpreendente é resultado direto do auxílio emergencial, dos programas de socorro às pequenas e microempresas e também da taxa de juros no piso histórico, o que permitiu um forte movimento de renegociação de dívidas por parte dos bancos. No auge da pandemia, as instituições financeiras também permitiram o adiamento dos pagamentos por 60 dias. A grande dúvida é como o calote vai se comportar quando todos esses socorros acabarem e a economia tiver de voltar a andar com as próprias pernas. O temor é que haja uma explosão da inadimplência no início do ano que vem. “A queda da inadimplência é algo inédito”, afirma o economista Luiz Rabi, da Serasa Experian, empresa que monitora a situação financeira de consumidores e empresas no País. Em julho, último dado disponível, 63,5 milhões de brasileiros estavam inadimplentes, segundo pesquisa da Serasa. São 2,5 milhões de pessoas a menos em relação a abril, quando o País parou por causa da covid-19. Também o número de empresas com dívidas em atraso recuou em julho para o menor nível do ano: 5,8 milhões. É exatamente a mesma quantidade de companhias inadimplentes registrada em julho do ano passado. Outro termômetro do calote é a quantidade de empresas que pediram recuperação judicial. Isto é, que reconheceram a incapacidade financeira de pagar as dívidas em dia e solicitaram à Justiça condições especiais. Os dados, coletados em todos os cartórios do País, mostram que neste ano, até agosto, 868 empresas procuraram esse caminho, um número 7,3% menor que o registrado no mesmo período de 2019. Para os oito primeiros meses do ano, o número de processos em 2020 foi o menor desde 2015. Pelo ritmo atual, a perspectiva é que 2020 termine com 1,3 mil pedidos. Em 2019, sem pandemia, foram 1.387 Rabi diz que o risco de o calote voltar a subir está ligado, num primeiro momento, aos consumidores, e depois às empresas. “Os brasileiros que perderam renda estão pendurados hoje no auxílio emergencial, que tem data e hora para acabar (no fim de dezembro).” Se até o fim do ano o quadro for ainda ruim para o emprego, a inadimplência da pessoa física pode subir e resvalar na pessoa jurídica, que não vai receber os créditos em dia. “A inadimplência está represada, não está extinta”, alerta Rabi. Fabio Bentes, economistachefe da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), considera que os bancos estão empurrando o problema da inadimplência com a “barriga”. Deram uma carência, por isso, o indicador não está saindo do lugar.” Bancos. Do início da crise até agosto, os bancos postergaram R$ 110,5 bilhões em dívidas, em um total de 14,2 milhões de contratos, segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Desse total, a maior parcela de beneficiados é de pequenas empresas e pessoas físicas, um volume de R$ 62,2 bilhões. Neste mês, vence a primeira rodada das carências concedidas, que pode vir acompanhada de aumento da inadimplência, num cenário de desemprego elevado. A preocupação dos bancos com risco de calote está estampada nos balanços. No segundo trimestre, Bradesco, Itaú Unibanco, Banco do Brasil e Caixa elevaram o gasto com provisões para devedores duvidosos em mais de R$ 14 bilhões, totalizando R$ 193,6 bilhões. Simone Pasianotto, economista-chefe da Reag Investimentos, aposta em pico da inadimplência das famílias já no fim deste ano. Bentes, da CNC, lembra que o auxílio emergencial de R$ 600 foi reduzido pela metade a partir de setembro. Ele questiona se, após o fim dessas medidas, a economia terá capacidade de voltar a crescer por conta própria para fazer frente à inadimplência, uma vez que o investimento não foi retomado.
*”Mercado se frustra com Bolsonaro, mas ainda mantém apoio”* - Se ainda tinha esperanças de uma agenda robusta de reformas, austeridade fiscal e privatizações daqui até 2022, o mercado financeiro perdeu de vez as ilusões durante a pandemia. A gota d’água em um copo já cheio de mágoas pelo não cumprimento de promessas de política econômica veio há duas semanas, quando o governo ameaçou dar uma pedalada fiscal para financiar o Renda Cidadã, programa de distribuição de renda que é a atual menina dos olhos do presidente Jair Bolsonaro. Ainda assim, o mercado reluta em desembarcar de vez do governo – seja porque a popularidade do presidente tem até crescido em meio à pandemia, seja pela avaliação de falta de opções, até o momento, para se apostar as fichas nas eleições de 2022. “Ninguém, em sã consciência, vai comprar uma briga com um presidente com 40% de popularidade”, definiu um diretor de um grande banco brasileiro ao Estadão. A reportagem conversou com uma dezena de executivos de bancos de varejo, bancos de investimento e fundos, e a avaliação é que itens importantes da agenda econômica devem demorar mais a avançar do que o prometido. No entanto, tanto pela forte posição do presidente quanto pela indefinição de outros nomes com chances eleitorais que defendam um ideário liberal, a estratégia atual do mercado é a de esperar para ver. Furar o teto de gastos – mecanismo instituído em 2016, no governo Michel Temer, que limita o crescimento das despesas ao aumento da inflação – pode ser perigoso: ao ameaçar fazer isso, por meio da manobra do uso do dinheiro dos precatórios, o governo federal foi alvo de uma saraivada de críticas. Caso decida jogar a austeridade fiscal para o ar, bancos, financeiras e fundos de investimento não devem apenas elevar o volume das críticas. Vão cobrar ainda mais caro para rolar a dívida pública brasileira – deixando o governo enforcado. A falta de confiança deve levar a juros mais altos, inflação e, mais adiante, aprofundar a recessão, segundo avaliação do mercado. Logo, ainda na definição de executivos de mercado, o governo Bolsonaro está em um dilema do tipo “o ovo ou a galinha”. Entendeu, graças ao auxílio emergencial, que distribuir dinheiro à população dá popularidade. De olho nesse capital político, o presidente pretende criar o Renda Cidadã, um programa de incentivo menor, mas permanente. A ameaça de furar o teto de gastos pode pegar mal com investidores, mas gastar mais tem ajudado na popularidade. Agenda. Outro tema de discussão em pauta no mercado é a dificuldade do ministro da Economia, Paulo Guedes, de entregar a agenda de reformas e competitividade prometida. Na visão do economista-chefe da Garde, Daniel Weeks, o ministro não tem conseguido convencer Bolsonaro que é “preciso cortar na carne para fazer ajustes”. Na briga com os articuladores políticos do governo – como o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR) –, Guedes parece estar em desvantagem. “O que vemos hoje é que a política está dando as cartas.” Se tudo continuar como está, diz Weeks, Bolsa e dólar vão continuar sob pressão. Para Luiz Fernando Figueiredo, sócio da Mauá Capital, qualquer que seja a solução encontrada para o Renda Brasil, vai ser difícil para o governo tirar a dúvida do mercado financeiro sobre seu comprometimento com o controle de gastos. “E essa dúvida faz com que a dívida pública não pare de subir. O fato é que o País empobreceu. E não é possível que o setor público não entre com sua cota de contribuição (nos sacrifícios)”, diz Figueiredo. “Ou a gente cuida disso (contas públicas) ou o Brasil vai cair no precipício”, acrescenta.
*”Eventual saída de Guedes não é mais um tabu”* - A saída do ministro da Fazenda, Paulo Guedes, não é mais um tabu entre os tomadores de decisão do mercado financeiro. Pelo contrário: pode ser até solução. “Se o Guedes estiver indo embora e o governo disser: estou trazendo dois nomes – um para o ministério e outro para a articulação política – que o mercado veja como capazes de empurrar as reformas administrativa e tributária, além das privatizações, todo mundo vai adorar”, disse um gestor de um fundo de investimento. A permanência do ministro, atualmente, é vista como um “bote de salvação” apenas para o teto de gastos – que é o mínimo para que o País continue a poder pensar em recuperação da economia em 2021 e 2022. Ficou claro, porém, que ele não deve conseguir empurrar uma agenda mais ousada. Dessa forma, avaliam economistas e gestores de bancos, o volume do clamor “fica Guedes” tem diminuído nos últimos meses.
*”Reforma administrativa não sai este ano, admite Maia”*
*”Instituição vê risco em avanço de big techs”* - O avanço das big techs, como são chamadas as gigantes do setor de tecnologia, no setor financeiro têm sido maior em países emergentes do que nas economias desenvolvidas, aproveitando-se da lacuna gerada pela baixa inclusão financeira nessas regiões, de acordo com relatório publicado ontem pelo Conselho de Estabilidade Financeira (FSB, na sigla em inglês). Motivadas pelo crescente acesso de celulares à internet, pesos pesados como Apple, Google, Facebook e Amazon têm alcançado pessoas que até então não eram atendidas pelas instituições tradicionais. Por outro lado, alerta a entidade, esse avanço pode dar origem a vulnerabilidades e riscos ao sistema. “O uso da tecnologia deu origem a serviços financeiros que podem ser mais baratos, convenientes e adaptados às necessidades dos usuários, oferecendo oportunidades para melhorar o bem-estar do consumidor e apoiar a estabilidade financeira”, afirma o órgão internacional. “No entanto, a expansão da atividade das big techs também dá origem a riscos operacionais e à proteção ao consumidor e preocupações sobre seu domínio no mercado.” Comandada pelo vice-presidente do Federal Reserve (o banco central dos Estados Unidos), Randal Quarles, o FSB é responsável por coordenar o trabalho internacional de autoridades financeiras a fim de estabelecer políticas de regulamentação e supervisão que contribuam para a estabilidade do sistema financeiro. O Brasil participa do órgão desde sua criação, em abril de 2009. Para realizar o relatório, o FSB analisou informações de 27 jurisdições, incluindo o Brasil. Segundo o organismo, a experiência de alguns países mostra o papel positivo que uma forte regulamentação, supervisão e outras políticas podem desempenhar no apoio à inovação do setor financeiro e, ao mesmo tempo, na mitigação dos riscos. Para 70% das 27 jurisdições consultadas, a regulamentação local apoiou o avanço das gigantes no sistema, como, por exemplo, na África Subsaariana. A China é o maior mercado de crédito para big techs, por meio de empresas como as gigantes Alibaba e Tencent, dona do Wechat. Conforme o FSB, o volume de empréstimos concedido por big techs no País foi estimado em US$ 516 bilhões em 2019, com centenas de milhões de usuários individuais. “Níveis mais baixos de inclusão financeira nos países emergentes criam uma fonte de demanda para os serviços das big techs, particularmente entre populações de baixa renda e em áreas rurais, onde são mal atendidas por instituições tradicionais.” Impulsionadas pelo crescente acesso da população a telefones celulares com acesso à internet – 65% da população global possuem algum tipo de dispositivo móvel –, as gigantes de tecnologia têm conseguido oferecer serviços financeiros, incluindo crédito, a consumidores que até então ficavam à margem do setor justamente por não ter histórico de crédito. Além disso, usam novas fontes de informações sobre os clientes, apoiando-se, sobretudo, nos dados gerados com seus negócios de tecnologia, principal preocupação de órgãos reguladores ao redor do mundo. “Quando as big techs são as principais ou mesmo as únicas provedoras de serviços financeiros para algumas populações de países emergentes, elas podem ser particularmente propensas a dominar o mercado”, diz o FSB. Brasil. O Banco Central brasileiro tem monitorado as gigantes de tecnologia bem de perto e já demonstrou, em diversas ocasiões, que esses grupos não vão passar ilesos ao crivo regulatório. Há cerca de quatro meses, por exemplo, ordenou a suspensão do sistema de pagamentos do aplicativo de conversas Whatsapp, do Facebook, alegando a necessidade de apurar questões de concorrência e fragmentação do sistema. Vale lembrar que a big tech optou por ofertar a ferramenta primeiro no Brasil, onde tenta avançar sobre serviços financeiros, aliando-se a nomes locais como Banco do Brasil, Cielo e Nubank. O BC brasileiro já admitiu que as big techs representam um “desafio” sob a ótica da regulação. Assim como o FSB, o órgão também vê ganhos de eficiência e impulso à inclusão social com a chegada das gigantes da tecnologia, mas, por outro lado, teme novos e “complexos” trade-offs (trocas) em relação à tríade estabilidade financeira, competição e proteção de dados. “As big techs possuem uma grande base de consumidores, fácil acesso a informações e modelos de negócio robustos. Essas diferenças podem ser um grande desafio na regulação”, avaliou o BC, em recente relatório.
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